Manhã de domingo, igreja cheia. Muitos homens vestem trajes formais. Mulheres levam véus sobre os cabelos. O silêncio absoluto é quebrado por um canto gregoriano. O padre passa pelos fiéis a caminho do altar. Sempre de costas para a audiência, dá início à missa em inconfundível latim: In nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti. A resposta vem em uníssono: Introibo ad altare Dei, ad Deum qui lætificat juventutem meam(Subirei ao altar de Deus, o Deus que alegra minha juventude). A cena evoca imediatamente imagens medievais, mas ocorreu no último dia 13 de julho, no Centro do Rio de Janeiro. Lá, a antiga Sé do Brasil, atual Igreja de Nossa Senhora do Carmo, sítio da coroação de João VI e Pedro I, é palco para uma das muitas missas tridentinas que se espalham pelo Brasil, numa ressurreição de formas litúrgicas antigas que atrai incontáveis jovens fiéis. O termo Juventutem, aliás, designa um movimento de volta às tradições católicas liderado por pessoas de 16 a 34 anos. A reportagem é de Leonardo Vieira, publicada pelo jornal O Globo, 28-07-2014.

— Descobri a missa há uns anos, é um tesouro. Está claro que tem algo de sagrado aqui. É possível perceber tanto com os ouvidos quanto com os olhos — arrisca o engenheiro Felipe Alves, de 25 anos.

Origens no império romano do ocidente

A missa tridentina, ou rito latino, foi normatizada no Concílio de Trento, em 1570, mas tem bases bem mais antigas, que remontam ao Império Romano do Ocidente, extinto no século V. O conservadorismo, a sobriedade e o extremo recolhimento dos fiéis na cerimônia foram utilizados pela Igreja no século XVI como resposta às reformas protestantes do Norte da Europa que abalaram as estruturas pontifícias.

Nela, o único idioma utilizado é o latim, chamado pelos adeptos de “língua universal da fé”. Enquanto nas missas comuns nos nossos tempos os católicos se ajoelham apenas uma vez, na antiga esse número salta para quase dez, incluindo o momento de receber a hóstia. Há intervalos para a meditação, quando o silêncio chega ao extremo de permitir que se ouça tudo o que se passa do lado de fora da igreja. Durante quase toda a cerimônia o padre permanece de frente para a cruz do altar.

Foram séculos assim, até que o Concílio Vaticano II, na década de 1960, introduziu inúmeras mudanças, o uso da língua local e o padre de frente para os fiéis entre elas. Mas o século XXI vive uma intrigante retomada de tradições conservadoras na Igreja. Em 2007, o agora papa emérito Bento XVI promulgou a carta “Summorum Pontificum”, em que exaltava a volta às tradições e o caráter “excepcional” da missa tridentina. Até então, párocos que quisessem rezar no estilo antigo deveriam pedir permissão direta à Cúria, no Vaticano. Desde então, a escolha passou a caber a cada paróquia.

Para o padre Luís Correa Lima, professor de Teologia da PUC-Rio, o mistério por trás da missa tridentina é o que fascina.

— Tudo nela é meio misterioso. O padre fica de costas, falando em uma língua desconhecida e seguindo uma liturgia extremamente codificada. Mas esse rito encanta por ser algo ancestral e imutável, por evocar a transcendência de Deus. São elementos que fascinam o jovem — opina.

Curiosamente, a introdução da missa moderna e a ressurreição da antiga têm a mesma preocupação: tentar estancar a perda de fiéis da maior designação cristã. Não há números que revelem se a volta ao passado teve algum efeito nesse sentido. Mas é fato que, amparadas pelos jovens católicos conservadores, as missas tridentinas crescem país afora. Em 2007, uma organização independente contabilizou 20 dessas celebrações no território nacional. Agora, cerca de cem ocorrem com regularidade.

— Vivemos numa sociedade muito centrada no indivíduo, na qual se valoriza a autodeterminação e tudo é incerto. Então surgem grupos que evocam o passado, em que tudo estava respondido pelo religioso — analisa o historiador Sérgio Coutinho, presidente do Centro de Estudos em História da Igreja na América Latina (CEHILA).

Ligado à ala progressista da Igreja, Coutinho entende que os fiéis da missa tridentina são conservadores em tudo, inclusive politicamente:

— Eles creem que o Concílio Vaticano II não deveria ter acontecido, pois teria aberto demais a Igreja. Querem uma fuga do mundo, encontrar formas tradicionais de se viver. É como se quisessem que o passado voltasse.

Responsável por rezar a missa tridentina aos domingo na igreja do Centro do Rio, o padre Bruce Judice discorda. Segundo ele, dois dos princípios pregados em sua celebração são o respeito às diferenças e a orientação para que os fiéis não se fechem em círculos católicos isolados.

— Sempre dizemos que este não é o único modo de rezar. Não somos contra o Concílio Vaticano II — esclarece o padre, de 35 anos.

— O que há, sim, é uma sede de espiritualidade entre os jovens. Há quem procure ioga, meditação, natureza... E há quem busque a missa tridentina.

Foi esta última a escolha do adolescente Eduardo Salomão, de 15 anos. Ele aprendeu latim sozinho e quer ser padre. Aos domingos, vai a uma missa tridentina e a outra contemporânea:

— Claramente prefiro a tridentina. Já cheguei a ser tachado de maluco. O rito contemporâneo não é para mim. No antigo, a meditação, o silêncio e a beleza encantam.

Bárbara Soares descobriu o rito pela internet. Foi no quase extinto Orkut que a estudante de Letras conheceu outros jovens adeptos da tradição. Ela ficou tão encantada com as primeiras celebrações que não parou mais de frequentar as missas. Numa delas, conheceu seu marido. Hoje, já casada aos 20 anos, Bárbara vai à igreja com o véu sobre os cabelos e defende a vestimenta:

— Ele mostra a dignidade da mulher, exalta seu caráter sagrado.

Ela segue a linha de centenas de integrantes oficiais do Juventutem no Brasil. Fundado em 2004, na Suíça, o movimento teve um primeiro encontro internacional em 2005, na Alemanha, e, desde então, tem crescido e sido cada vez mais representado nas Jornadas Mundiais da Juventude. Ano passado, milhares deles vieram ao Rio de Janeiro. E, pela internet, muitos se já se articulam para a próxima edição do evento católico, em 2016, na Polônia. Em fóruns internacionais do movimento pela internet são comuns discussões relacionadas à liturgia católica e também a assuntos ligados a direitos civis, com muitos dos seus membros condenando uniões entre pessoas do mesmo sexo e o direito ao aborto, por exemplo.

Ortodoxos mantêm uso de grego e árabe

Engana-se quem pensa que o ritual tridentino é o único dentro do catolicismo que busca a retomada de tradições ancestrais. A poucas quadras da antiga Sé carioca, na paróquia greco-melquita de São Basílio e de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em plena Saara, histórico lar dos primeiros imigrantes sírios e libaneses católicos ortodoxos, os idiomas usados em ritos conservadores são o grego e o árabe. A igreja melquista, espremida entre prédios na rua República do Líbano, é o primeiro templo católico oriental do Brasil, fundado em 1941. Apesar de ainda ter forte conexão com a comunidade sírio-libanesa, a missa tem um público crescente de jovens e de pessoas curiosas.

Lá se celebra a missa bizantina, tradição que começou ainda no século V numa região onde onde se estendem parte dos territórios da Turquia, de Israel e da Palestina. Assim como no rito latino, o sacerdote reza de costas para o público. A música, a liturgia e as vestimentas remetem à cultura medieval dos católicos orientais.

— O rito chama a atenção dos jovens, eles se sentem bem pela beleza das orações. Hoje em dia os fieis estão a procurar as tradições em resposta aos tempos tão conturbados em que vivemos. Devemos voltar sempre às origens — diz o monsenhor George Khoury, da paróquia de São Basílio. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

Como parte do que faziam para nos conduzir a uma vida religiosa mais profunda, os meus pais nos levaram eu e meus irmãos, quando ainda éramos criança, a uma missa celebrada no Rito Tridentino. Não me recordo de ter ficado particularmente impressionado nas primeiras vezes. No entanto, em um domingo de verão, eu decidi frequentar uma missa neste rito por mim mesmo, mais por uma mudança de ritmo em relação à minha paróquia costumeira. Aconteceu que este dia era a Festa de Corpus Christi, e eu me vi surpreendido pelo espetáculo total do ritual. O comentário é de Timothy Kirchoff, pós-graduado pela Universidade de Notre Dame, publicado por America, 13-09-2017. A tradução é de Isaque Gomes Correa.

Por uns instantes, senti que os hinos e as procissões me manteriam naquela igreja por mais tempo do que havia imaginado inicialmente, mas fui logo tomado por um sentimento que posso descrever como uma verdadeira comunhão. Esta havia sido, pensei eu, a missa vivenciada por inúmeros santos ao longo da história. Muito embora não tinha ninguém nos bancos ao meu redor, comecei a me sentir como se estivesse rodeado pelos santos que haviam vindo conhecer e adorar a Deus através da liturgia. Naquela altura, eu não sabia que os rituais da missa mudaram várias vezes nestes dois milênios de história cristã, mas saber destas mudanças nunca me vez duvidar do cerne da minha experiência naquele dia.
No ano passado, o Papa Francisco falou abertamente sobre os seus receios para com os tradicionalistas em entrevista que poderia servir como uma introdução para um livro dos seus sermões enquanto arcebispo de Buenos Aires:

Eu sempre tento entender o que está por trás das pessoas que são jovens demais para ter vivido a liturgia pré-conciliar, mas que a desejam. Às vezes eu me vejo em frente de pessoas que são rigorosas demais, que têm uma atitude rígida. E eu me pergunto: Como pode uma tal rigidez? (...) Essa rigidez sempre esconde alguma coisa: insegurança, às vezes até mais (…) A rigidez é defensiva. O verdadeiro amor não é rígido”.

Penso sobre esta declaração desde que a li. Eu me pergunto sobre se eu fui esse tipo de pessoa que Francisco tinha em mente. Será que fui um católico “rígido”? A experiência de estar cercado pelos santos na missa em latim é uma das experiências espirituais mais profundas e formativas de meus anos de adolescente.

Também venho pensando sobre estas palavras do papa porque o esforço dele para entender os tradicionalistas jovens reproduz as suspeitas mantidas por muitos católicos mais velhos que viveram a época do Concílio Vaticano II, especialmente alguns padres. (E mais: o papa recentemente reafirmou o seu compromisso com a reforma litúrgica do Vaticano II, dizendo que ela é “irreversível”.)

A experiência que tenho com a missa em latim oferece uma resposta possível às dúvidas do Papa Francisco sobre o porquê os jovens são atraídos pelas liturgias tradicionais: tendo crescido com a missa em inglês, estes jovens católicos possuem um sentido vago do que se trata os momentos da missa. Os rituais pouco familiares e o idioma do Rito Tridentino, no entanto, permitem-lhes ver estes momentos com um olhar renovado. A descoberta da missa em latim é, para muitos integrantes da minha geração, aquilo que a introdução da missa em língua vernácula foi para muitas pessoas como Francisco.
Quando às pessoas “rigorosas, rígidas” sobre cujas inseguranças o papa se refere, ele claramente não está falando a todos os que querem a opção de frequentar a liturgia pré-conciliar. Muito embora alguns de meus amigos irão estranhar diante de algumas homilias ou de desvios da rubrica litúrgica, dificilmente os gostos deles são dignos de serem contados no divã. Eles não precisam que alguém “analise profundamente” as suas psiques. O amor a Deus e ao próximo corre, no mínimo, de modo tão profundo neles quanto corre em mim, mesmo se este amor se manifeste às vezes em orações em latim.

A quem, então, o Papa Francisco está se referindo? A resposta pode residir no próprio passado de Francisco. Na qualidade de provincial jesuíta e, depois, reitor do seminário jesuíta na Argentina, Jorge Bergoglio ficou conhecido como uma figura rigorosa e formidável, e contava com um número considerável de seguidores entre os membros de sua província. Mas as críticas dele a grupos católicos tradicionalistas raramente são interpretadas por meio destas lentes.

Quando o papa sugere que a rigidez e o rigorismo escondem uma insegurança, talvez ele esteja falando das pessoas que certa vez conheceu bem ou mesmo esteja falando de si mesmo. A ex-inflexibilidade de Francisco deveria dar muito mais credibilidade a suas advertências sobre as ciladas do tradicionalismo moderno. Os tradicionalistas não levam as suas críticas tão a sério quanto provavelmente deveriam. Mas sem contexto algum fornecido, as declarações de Francisco soam menos com um conselho pastoral e mais como a lamentação perene de gerações mais velhas a respeito das tendências entre aos jovens.

O mesmo se pode dizer sobre muitas das admoestações que ouço da “geração Vaticano II” sobre as imperfeições da Igreja pré-conciliar. Só foi quando eu tive diálogos ampliados com estes católicos que a profundidade e a relevância da experiência deles se tornaram claras. Se não tivesse tirado um tempo para ouvir-lhes e fazer perguntas, tudo o que eu teria ouvido seria um lamento repetitivo sobre os jovens católicos que tentam fazer o relógio voltar atrás, para a década de 1950.

Quando realmente ouvi os mais velhos, aprendi sobre as muitas maneiras em que um foco muito acentuado em fazer valer as leis corre o risco de levar as pessoas a uma espiritualidade vazia, a um legalismo e à superstição. Aprendi sobre grupos de homens que ficavam do lado de fora da igreja fumando até a hora do ofertório, já que este era o momento crucial para cumprir a obrigação de domingo. Descobri que muitos padres que, externamente, pareciam firmes em suas vocações, depois do Concílio abandonaram o sacerdócio. As críticas por católicos mais velhos às práticas e tendências neotradicionalistas não são uma reação alérgica ao cheiro de incenso. São uma cautela que decorre da experiência.

Muitos jovens católicos buscam um maior entendimento da – e uma continuidade com a – Igreja pré-conciliar. Muitos católicos mais velhos que viveram o concílio e estão bastante familiarizados com as imperfeições da Igreja pré-conciliar se preocupam com que um revisitar as práticas antigas vá trazer de volta os problemas que o Vaticano II se esforçou para corrigir. Cada grupo tem algo a aprender com o outro. Estas lições só se esclarecem quando deixamos de lado as nossas inquietações ideológicas e temos a paciência para compreender as experiências do outro. A forma de rigidez sobre a qual mais devemos nos preocupar é a rigidez ideológica que nos impede de ver como Deus está trabalhando entre os nossos companheiros católicos.

Encontramos pontos em comum quando temos a paciência para buscá-los, assim como as liturgias em que participamos se parecem bem diferentes, mas que, no fundo, são a mesma celebração do mistério Pascal. http://www.ihu.unisinos.br

"Quando qualquer questão recebe imediatamente um ponto de chegada, não há mais caminho a ser percorrido. Por isso é que às inquietações humanas, Deus responde com o silêncio e a ausência", escreve Alfredo J. Gonçalves, CS, padre carlista e assessor das Pastorais Sociais. 

Eis o artigo. 

“Deus me abandonou” – eis uma frase recorrente, quer na vida atormentada de cada pessoa, quer no seu percurso espiritual, sempre pavimentado de altos e baixos. Evidentemente, o abandono é tanto mais sentido, quanto mais graves as tribulações porque passamos. Os momentos “baixos” nos levam a erguer os olhos ao alto, buscando qualquer socorro ou consolo. Fazem emergir com redobrada veemência a pergunta fundamental da existência humana: quem sou, de onde vim, para onde vou, por que existo? Porém, quanto mais furiosamente os ventos rugem à porta, tanto mais o céu nos parece cego e surdo, mudo, longínquo e indiferente.

Por que Deus se ausenta exatamente quando mais necessitados estamos de sua presença? Por que nos abandona? – perguntamos. Entra em cena então o poema de Carlos D. de Andrade, que tem justamente como título A ausência: “Por muito tempo achei que a ausência é falta/. E lastimava, ignorante, a falta/. Hoje não a lastimo/. Não há falta na ausência/. A ausência é um estar em mim/. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços/, que rio e danço e invento exclamações alegres/, porque a ausência assimilada/, ninguém a rouba mais de mim”.

Com base na visão do poeta brasileiro, não seria exagero afirmar que a ausência de Deus representa não uma falta, e sim uma oportunidade para que a pessoa possa estar a sós consigo mesma. Tempo para que ela possa repousar e meditar sobre a pergunta. “Dormir no assunto”, diz com razão o ditado popular! Nesse aparente vazio, cria-se o terreno propício para melhor discernir a própria pergunta fundamental sobre o sentido último da existência humana. A essa inquietude, Deus não oferece respostas prontas, imediatas, paliativas. Seu silêncio ou ausência abrem espaço para que tal pergunta, que conduz ao centro vital de nossa peregrinação terrestre, possa amadurecer como um projeto de vida, o qual, vale recordar, mantém-se sempre em evolução ativa, dinâmica e orgânica. Em lugar de um copo de água aqui e agora, a presença/ausência divinaprocura indicar o caminho da fonte. Em termos populares, Deus “não dá o peixe, mas ensina a pescar”.

Nas experiências significativas da vida, determinada pergunta martela-nos insistentemente o coração e a mente. Habita nossa alma irrequieta. Ao invés de escutá-la, as pessoas costumam sobrecarregar-nos com respostas apressadas, irrefletidas, superficiais. Têm-nas na ponta da língua! Não possuem ouvidos para a pergunta, antecipando-se com uma resposta padrão. Em lugar de aproveitar da interrogação para desencadear o diálogo sobre o projeto de vida que está em jogo, fecham-no com uma resposta clichê, padronizada. Com essa atitude precipitada, tendem a bloquear o processo de crescimento que a questão reabre a cada crise vivenciada. Impossibilitam o confronto consigo e conosco mesmos. A solução como que vem antes da pergunta, o que impede um tempo privilegiado de reflexão em que o assunto pode ser mastigado, engolido e digerido, antes de receber uma resposta definitiva.

Mantém-se, dessa forma, um tipo de comportamento infantil e infantilizante. Quando qualquer questão recebe imediatamente um ponto de chegada, não há mais caminho a ser percorrido. Por isso é que às inquietações humanas, Deus responde com o silêncio e a ausência. O Pai obriga os filhos a curvarem-se mais detidamente sobre o questionamento, até porque toda pergunta, em si mesma, já possui vestígios de resposta. Ninguém suportaria uma pergunta totalmente suspensa no vazio. Quando expressamos uma inquietude é porque intuímos fragmentos de luz que nos fazem vislumbrá-la numa espécie de penumbra. Daí a necessidade de espaço e tempo para recolher, ruminar e esclarecer tais fragmentos. O primeiro esboço de resposta, está contido na própria formulação da pergunta.

Resulta que a resposta às nossas perguntas vitais não é algo que possamos encontrar no outro de forma mecânica ou automática. O outro, ou o totalmente Outro, se revela não como resposta pronta e acabada, mas como espelho no qual nossas interrogações se refletem e se confrontam. Pouco a pouco, através do diálogo profundo, descortina-se o caminho da resposta. Caminho que, a seu turno, nos convida a recomeçar, pois, como diz o escritor estadunidense John Steinbeck, “o importante na vida é dar um passo, um posso, por menor que seja”. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

O legislador teria cedido a pressão de seus colegas religiosos e rabinos do partido ultraconservador Shas

Jerusalém - Um legislador ultraortodoxo israelense renunciou ao cargo nesta quarta-feira, após pressões de seus colegas religiosos e de rabinos por ter comparecido ao casamento de um parente gay, informou sua filha.

Yigal Guetta, membro do partido ultraconservador e religioso Shas, disse recentemente em uma entrevista a uma rádio que há dois anos compareceu ao casamento de um sobrinho gay, o que provocou uma forte reação de rabinos, segundo meios de comunicação locais.

Nesta quarta-feira de manhã, Guetta apresentou sua renúncia ao presidente do partido, o atual ministro do Interior, Aryeh Deri.  Sua filha, Simcha, afirmou que está orgulhosa do pai por sua lealdade familiar. "É o sobrinho dele!", disse à rádio pública israelense.  Yitzhak Vaknin, membro do Shas, disse que Guetta violou as leis religiosas ao participar de uma cerimônia que é proibida, a do casamento homossexual.

"Não existe nenhuma situação em que seja permitido participar de um evento como esse", disse à rádio do exército. "É totalmente proibido".

Na entrevista, realizada em 29 de agosto e que provocou críticas, Guetta disse que, embora quisesse estar ao lado do seu sobrinho, deixou claro para seus filhos que o estilo de vida dele era um tabu.

"Nós fomos juntos para o casamento, eu, minha esposa e meus filhos", disse ele. "Eu disse a eles: 'o comparecimento é obrigatório'. Ao mesmo tempo, eu disse aos meus filhos, estejam cientes de que a Torá diz que isso é proibido", acrescentou.

Enquanto o estado judeu é considerado pioneiro na promoção e no respeito aos direitos dos gays, a homossexualidade continua sendo um tabu entre os partidos religiosos e ultraortodoxos, que exercem um poder político significativo. Fonte: http://odia.ig.com.br

Dom Anuar Battisti, Arcebispo de Maringá (PR)

Cuidar-se significa levar-se em conta, escutar as próprias necessidades e compreender que temos direito de nos sentir bem. É entender e reconhecer nossa existência, sabendo que merecemos nosso amor e nossa compaixão além de todos os preconceitos, castigos e cobranças que impomos a nós mesmos.

Estamos cuidado de nós quando evitamos o que nos produz mal-estar: quando nos afastamos de certas pessoas que nos prejudicam, quando impomos limites em relação ao que queremos e não queremos fazer, e quando nos damos a oportunidade de tomar decisões por nós mesmos. “Não se cuidar é uma forma de autoagressão sutil ou manifesta. Às vezes, como em um estado depressivo, a pessoa está sem energia para ela mesma, e em outros problemas o sujeito reverte sua energia contra si mesmo, aumentando por sua vez a culpa e a autodepreciação” (Fina Sanz).

Diante da revelação pública que o padre Fábio de Melo fez nos meios de comunicação, de que estaria sofrendo de “Síndrome do Pânico”, despertou em muita gente um lado obscuro da vida, visto com muito preconceito e desconhecimento, muitas vezes. Agora podemos falar, pois “até o padre Fábio” falou. Com certeza ele foi muito corajoso e fez muita gente encarar a situação pessoal de forma mais real, sem criar falsos temores. Neste sentido, despertou o valor do cuidado que todos devemos ter. Cuidar-se para poder cuidar. Só damos aquilo que temos e se não temos tempo para nos abastecer, reconstruir diariamente a própria vida, estaremos todos fadados a cair, em qualquer “síndrome”, ou qualquer tipo de doença física ou psicológica.

Não temos outra saída a não ser aprender com o Mestre, que há mais de dois mil anos deixou-nos o exemplo. Quantas vezes, Jesus, depois de atender a multidão, fazer milagres, fazer discursos, instruir os discípulos, deixava tudo e ia para a montanha rezar, passar a noite toda em oração. Na calada da noite, na escuridão silenciosa das montanhas, o Senhor, ali entrava em comunhão com o Pai Deus, e tudo era iluminado, para recomeçar tudo de novo, no outro dia. O homem moderno ocupou o lugar de Deus. A auto suficiência faz do ser humano um semi deus.

Não só na vida dos padres e bispos, mas de todos os leigos, é urgente a dinâmica do equilíbrio. Qualquer ser, qualquer coisa, se perder o equilíbrio cai, e caindo se quebra, se destrói ou fica machucado por muito tempo. Fomos feitos para não cair, reconstruindo-nos a cada dia, não deixando a vida fazer de nós o que ela quer, e sim o que nós queremos fazer com a nossa vida. Nunca diga “não tenho tempo, de descansar, de meditar, de encontrar os outros, com a gente mesmo, de buscar ser útil, de solidarizar-se com o outro, de ganhar o pão com o suor do próprio rosto, de sorrir e abraçar, de chorar e carregar a cruz de cada dia”. Nunca diga “não tenho tempo para cuidar-se”. A vida é tão curta, tudo passa tão rápido, a felicidade custa muito pouco, só um pouco de amor, para poder amar o próximo como a si mesmo.

Nunca deixe para depois o tempo que você precisa para viver bem, reconstruindo-se a cada momento. Deixe de lado a onipotência, a vaidade de super homem ou super mulher e se vista de humildade sincera, reconstruindo-se sempre. A pior agressão não vem de fora, e sim do próprio coração, que não tem tempo para cuidar-se. Tire um tempo todos os dias para silenciar a tua alma e a tua inteligência e orar e tudo terá sabor de felicidade, até mesmo as cruzes que carregamos. Fonte: http://cnbb.net.br

Um pequeno incidente ocorreu em Cartagena com o Papa Francisco. Felizmente, nada grave. Enquanto o pontífice percorria o centro da cidade colombiana de papamóvel descoberto, na quarta e última etapa da sua viagem ao país sul-americano, ele bateu no para-brisa do carro enquanto se inclinava para cumprimentar uma criança. A informação é publicada por Vatican Insider, 10-09-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O incidente, causado por uma freada, provocou uma leve contusão no papa, que se estende acima e abaixo do olho esquerdo, exatamente na arcada da sobrancelha e na bochecha.

Depois da batida, Bergoglio apoiou uma mão no rosto, mas, mesmo assim, quis continuar o seu percurso entre as duas alas da multidão. Ele foi imediatamente socorrido pelo comandante da Gendarmeria vaticana, Domenico Giani, que tampou as feridas com um lenço. Em seguida, ele foi medicado com dois pequenos curativos. Algumas gotas de sangue caíram na sua veste, que ficou manchada.

O porta-voz vaticano, Greg Burke, tranquilizou os jornalistas que acompanhavam o bispo de Roma no seu deslocamento: “O papa está bem agora. Aplicaram-lhe gelo”, disse ele, esclarecendo que ele continuaria o programa da viagem “sem qualquer modificação.”
Às pessoas preocupadas que lhe perguntavam o que lhe acontecera, o próprio Francisco respondia com uma piada: “Me deram um soco! Mas estou bem”. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

O último compromisso do Papa Francisco em Medellín foi o encontro com os sacerdotes, os consagrados, os seminaristas e os seus familiares no Centro de Eventos La Macarena. Depois dos testemunhos de um sacerdote, uma religiosa de clausura e uma família, o Papa tomou a palavra inspirando-se no Evangelho da videira e os ramos: a verdadeira vocação é permanecer sempre unidos a Cristo, disse e, citando o Documento de Aparecida, acrescentou:

"Como diz o Documento de Aparecida, conhecer Jesus é o mais belo presente que qualquer pessoa pode receber, tê-lo encontrado é a melhor coisa que nos aconteceu na vida, e fazê-lo conhecer com palavras e obras é para nós uma alegria”.

O Papa dirigiu-se em seguida aos jovens: "Muitos de vós" – diz ele - "descobristes Jesus vivo nas vossas comunidades; comunidades com um fervor apostólico contagioso, que entusiasmam e suscitam atração. Onde há vida, fervor, desejo de levar Cristo aos outros, nascem vocações genuínas; a vida fraterna e fervorosa da comunidade é aquela que suscita o desejo de se consagrar inteiramente a Deus e à evangelização":

Mas Francisco falou também dos jovens capturados e destruídos pela droga e rezou pela conversão daqueles que devastam tantas vidas. No entanto – sublinhou o Papa - "são muitos os jovens que se mobilizam em conjunto perante os males do mundo e se dedicam a várias formas de militância e voluntariado. Quando o fazem por amor de Jesus, sentindo-se parte da comunidade, eles se tornam "mensageiros da fé", felizes de levar Jesus em cada estrada, em cada praça, em cada ângulo da terra”.

O Papa Francisco lembrou, assim, da videira mencionada por Jesus no texto proclamado no encontro, que é a videira do “povo da aliança”: às vezes expressa uma alegria, outras, uma desilusão, mas jamais o desinteresse. O Pontífice, então, questionou:

“Como é a terra, o alimento, o suporte onde cresce esta videira na Colômbia? Em que contextos são gerados os frutos das vocações de especial consagração? Certamente em ambientes cheios de contradições, de luzes e sombras, de situações relacionais complexas. Gostaríamos de contar com um mundo de famílias e vínculos mais serenos, mas somos parte desta crise cultural; e é no meio dela, contando com ela, que Deus continua a chamar".

 Desde o início, foi assim, observou Francisco, Deus manifesta a sua proximidade e a sua eleição, Ele muda o curso dos acontecimentos, chamando homens e mulheres na fragilidade da história pessoal e comunitária. Não tenhamos medo! Nesta terra complexa, Deus sempre fez o milagre de gerar cachos bons, como as torradas para o café da manhã. Que não faltem vocações em nenhuma comunidade, em nenhuma família de Medellín!”

A videira, disse o Papa, tem a característica de ser verdadeira. “Ora, a verdade não é algo que recebemos, como o pão ou a luz, mas brota de dentro. Somos povo eleito para a verdade, e a nossa vocação deve acontecer na verdade”, prosseguiu.

Mas os percursos podem ser manifestados pela “secura e pela morte”, impedindo o fluxo da seiva que alimenta e dá vida. Por isso, o Papa recomenda atenção para que a condição religiosa não seja aproveitada para se obter benefícios próprios e materiais:

“As vocações de especial consagração morrem quando querem nutrir-se de honrarias, quando são impelidas pela busca de tranquilidade pessoal e promoção social, quando a motivação é ‘subir de categoria’, apegar-se a interesses materiais chegando mesmo ao erro da avidez de lucro. Como já disse noutras ocasiões, o diabo entra pela carteira. Isto não diz respeito apenas ao início, todos nós devemos estar atentos porque a corrupção nos homens e mulheres que estão na Igreja começa assim, pouco a pouco".

E o Papa falou do veneno da mentira, da dissimulação, da manipulação e do abuso do povo de Deus, dos mais frágeis e especialmente dos idosos e das crianças não pode ter lugar na nossa comunidade; “são ramos que decidiram secar e que Deus nos manda cortar” – ressaltou Francisco.

Os bons exemplos colombianos foram citados pelo Papa Francisco, como o da Santa Laura Montoya, uma obra missionária a favor dos indígenas, e do Beato Mariano de Jesús Euse Hoyos, um dos primeiros alunos do Seminário de Medellín.

O Santo Padre convidou, então, a cortar todos os factores que distorcem a vocação e a “permanecer em Jesus”, o que não é uma “atitude meramente passiva”, mas pode ser efectiva de três maneiras: tocando a humanidade de Cristo; contemplando a sua divindade; e vivendo na alegria.

Tocar a humanidade, “com o olhar e os sentimentos de Jesus, que contempla a realidade não como juiz, mas como bom samaritano”, e também com “os gestos e palavras de Jesus, que expressam amor aos vizinhos e a busca dos afastados”.

Contemplar a divindade de Cristo, “suscitando e cultivando a estima pelo estudo, que aumenta o conhecimento de Cristo” e, assim, privilegiando “o encontro com a Sagrada Escritura”: “gastemos tempo numa leitura oral da Palavra, ouvindo nela o que Deus quer para nós e para o nosso povo”. Para contemplar a divindade, o Papa também sugere “fazer da oração a parte fundamental da nossa vida e do nosso serviço apostólico”:

“A oração nos liberta das escórias do mundanismo, ensina-nos a viver com alegria, a escolher a fuga do superficial, num exercício de liberdade autêntica. Arranca-nos da tendência a nos concentrar sobre nós mesmos, fechados numa experiência religiosa vazia e nos leva colocar-nos docilmente nas mãos de Deus para cumprir a sua vontade e corresponder ao seu plano de salvação. E, na oração, adorar. Aprender a adorar em silêncio”.

E, finalmente, permanecer em Cristo para viver na alegria, porque, segundo o Papa, “a nossa alegria contagiante deve ser o primeiro testemunho da proximidade e do amor de Deus”.

“Cabe-nos oferecer todo o nosso amor e serviço unidos a Jesus Cristo, nossa videira, e ser promessa dum novo início para a Colômbia, que deixa para trás um dilúvio de conflitos e violências, que quer produzir muitos frutos de justiça e paz, de encontro e solidariedade”. - concluiu Francisco. Fonte: http://pt.radiovaticana.va

Fernando Meirelles será diretor do filme The Pope, que será produzido para o serviço de streaming Netflix, apresentando a relação entre o papa Francisco e o antecessor, Bento XVI, noticiou nesta quarta-feira o site 'Deadline'. A informação é publicada por O Estado de S. Paulo, 06-09-2017.

De acordo com o veículo especializado, Jonathan Pryce, o High Sparrow, em Game of Thrones, fará o papel do atual líder da Igreja Católica. Já Anthony Hopkins está em negociações para interpretar Joseph Ratzinger, que ostenta o título de papa emérito.

O longa mostrará a escolha do alemão como o Bento XVI, a posterior renúncia em 2013, além da sucessão pelo argentino Jorge Mario Bergoglio, que se tornaria o papa Francisco.

O diretor de "Cidade de Deus" e, mais recentemente, da Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos de 2016, não dirige um filme completo desde "360: A Vida é um Círculo Perfeito", de 2011, que contou com Hopkins no elenco.

Há três anos, Meirelles participou de "Rio, Eu Te Amo", dirigindo um dos 11 segmentos da obra. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

Neste domingo, Missa com Frei Petrônio de Miranda, Carmelita, na Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Lapa, Rio de Janeiro, às 8h

A liturgia deste domingo sugere-nos uma reflexão sobre a nossa responsabilidade face aos irmãos que nos rodeiam. Afirma, claramente, que ninguém pode ficar indiferente diante daquilo que ameaça a vida e a felicidade de um irmão e que todos somos responsáveis uns pelos outros.

O Evangelho deixa clara a nossa responsabilidade em ajudar cada irmão a tomar consciência dos seus erros. Trata-se de um dever que resulta do mandamento do amor. Jesus ensina, no entanto, que o caminho correto para atingir esse objetivo não passa pela humilhação ou pela condenação de quem falhou, mas pelo diálogo fraterno, leal, amigo, que revela ao irmão que a nossa intervenção resulta do amor.

Comentário do Frei Petrônio de Miranda, Padre Carmelita e Jornalista/ RJ.

-Decepcionada com a ação dos seus irmãos e irmãs de Pastoral, Dona Francisca prometeu a sua família que jamais seria humilhada na Igreja. Saiu da coordenação do grupo e nunca mais pisou os pés lá. “Irmãos! Que nada, o meu Jesus não humilha”, afirmou a pobre mãe e avó, após o divórcio.   

-Aquele frade estudante saiu revoltado! Era devoto, tinha uma caminhada, um futuro. Em uma das correções “fraternas” da comunidade foi humilhado no convento pelo formador. A partir daquele dia chutou o pau da barraca! “Lá pode ser tudo, menos casa de formação religiosa”, afirmou Carlos.

Esses dois exemplos são um pequeno retrato de uma grande colcha de retalhos de rostos sofridos, massacrados e jogados no lixo por nós, homens e mulheres que falamos do amor de Jesus, mas, no entanto, colocamos para fora dos muros paroquiais e conventuais aqueles e aquelas que “pisaram na bola”.

Se tem um lugar onde existem pessoas feridas, machucadas e sofridas, esse lugar chama-se IGREJA. Refiro-me a Paróquias, Conventos e Seminários. Algo está errado em nossas relações de guardiães da Boa Nova.      

EVANGELHO – Mt 18,15-20: Atualização.

A palavra “tolerância” é uma palavra profundamente cristã, que sugere o respeito pelo outro, pelas suas diferenças, até pelos seus erros e falhas. No entanto, o que significa “tolerância”? Significa que cada um pode fazer o mal ou o bem que quiser, sem que tal nos diga minimamente respeito? Implica recusarmo-nos a intervir quando alguém toma atitudes que atentam contra a vida, a liberdade, a dignidade, os direitos dos outros? Quer dizer que devemos ficar indiferentes quando alguém assume comportamentos de risco, porque ele “é maior e vacinado” e nós não temos nada com isso? Quais são as fronteiras da “tolerância”? Diante de alguém que se obstina no erro, que destrói a sua vida e a dos outros, devemos ficar de braços cruzados? Até que ponto vai a nossa responsabilidade para com os irmãos que nos rodeiam? A “tolerância” não será, tantas vezes, uma desculpa que serve para disfarçar a indiferença, a demissão das responsabilidades, o comodismo?

  • O Evangelho deste domingo sugere a nossa responsabilidade em ajudar cada irmão a tomar consciência dos seus erros. Convida-nos a respeitar o nosso irmão, mas a não pactuar com as atitudes erradas que ele possa assumir. Amar alguém é não ficar indiferente quando ele está a fazer mal a si próprio; por isso, amar significa, muitas vezes, corrigir, admoestar, questionar, discordar, interpelar… É preciso amar muito e respeitar muito o outro, para correr o risco de não concordar com ele, de lhe fazer observações que o vão magoar; no entanto, trata-se de uma exigência que resulta do mandamento do amor…
  • Que atitude tomar em relação a quem erra? Como proceder? Antes de mais, é preciso evitar publicitar os erros e as falhas dos outros. O denunciar publicamente o erro do irmão, pode significar destruir-lhe a credibilidade e o bom-nome, a paz e a tranquilidade, as relações familiares e a confiança dos amigos. Fazer com que alguém seja julgado na praça pública – seja ou não culpado – é condená-lo antecipadamente, é não dar-lhe a possibilidade de se defender e de se explicar, é restringir-lhe o direito de apelar à misericórdia e à capacidade de perdão dos outros irmãos. Humilhar o irmão publicamente é, sobretudo, uma grave falta contra o amor. É por isso que o Evangelho de hoje convida a ir ao encontro do irmão que falhou e a repreendê-lo a sós…
  • Sobretudo, é preciso que a nossa intervenção junto do nosso irmão não seja guiada pelo ódio, pela vingança, pelo ciúme, pela inveja, mas seja guiada pelo amor. A lógica de Deus não é a condenação do pecador, mas a sua conversão; e essa lógica devia estar sempre presente, quando nos confrontamos com os irmãos que falharam. O que é que nos leva, por vezes, a agir e a confrontar os nossos irmãos com os seus erros: o orgulho ferido, a vontade de humilhar aquele que nos magoou, a má vontade, ou o amor e a vontade de ver o irmão reencontrar a felicidade e a paz?
  • A Igreja tem o direito e o dever de pronunciar palavras de denúncia e de condenação, diante de atos que afetam gravemente o bem comum… No entanto, deve distinguir claramente entre a pessoa e os seus atos errados. As ações erradas devem ser condenadas; os que cometeram essas ações devem ser vistos como irmãos, a quem se ama, a quem se acolhe e a quem se dá sempre outra oportunidade de acolher as propostas de Jesus e de integrar a comunidade do Reino.

*Leia a reflexão na íntegra. Clique ao lado no link- EVANGELHO DO DIA.

Durante a Missa no Parque Simón Bolívar de Bogotá o Papa Francisco falou da Colômbia como terra de inimaginável fecundidade. Mais de um milhão os participantes. 

O evangelista recorda que a chamada dos primeiros discípulos teve lugar nas margens do lago de Genesaré, onde as pessoas se reuniam para ouvir uma voz capaz de as orientar e iluminar; e é também o lugar onde os pescadores concluem a sua jornada fatigante, durante a qual buscam o sustento para levar uma vida sem penúrias, digna e feliz. É a única vez, em todo o evangelho de Lucas, que Jesus prega junto do chamado mar da Galileia. No mar aberto, confundem-se a esperada fecundidade do trabalho com a frustração pela inutilidade dos esforços vãos. Segundo uma antiga interpretação cristã, o mar também representa a vastidão onde convivem todos os povos. Finalmente, pela sua agitação e obscuridade, evoca tudo aquilo que ameaça a existência humana e que tem o poder de a destruir.

Usamos expressões semelhantes para definir multidões: uma maré humana, um mar de gente. Naquele dia, Jesus tem atrás d’Ele o mar e, à sua frente, uma multidão que O seguiu ao ver como Ele Se comove perante o sofrimento humano... e as suas palavras justas, profundas, seguras. Todos vêm ouvi-Lo; a Palavra de Jesus tem algo de especial que não deixa ninguém indiferente. A sua Palavra tem o poder de converter os corações, mudar planos e projetos. É uma Palavra corroborada pela ação, não são conclusões redigidas no escritório, expressões frias e distantes do sofrimento das pessoas; por isso, é uma Palavra que serve tanto para a segurança da margem como para a fragilidade do mar.

Esta querida cidade, Bogotá, e este belo país, a Colômbia, têm muito destes cenários humanos apresentados pelo Evangelho. Aqui vivem multidões que anseiam por uma palavra de vida, que ilumine com a sua luz todos os esforços e mostre o sentido e a beleza da existência humana. Estas multidões de homens e mulheres, crianças e idosos habitam uma terra de fertilidade inimaginável, que poderia dar frutos para todos. Mas também aqui, como noutras partes do mundo, há densas trevas que ameaçam e destroem a vida: as trevas da injustiça e da desigualdade social; as trevas corrutoras dos interesses pessoais ou de grupo, que consomem, egoísta e desaforadamente, o que se destina para o bem-estar de todos; as trevas da falta de respeito pela vida humana que diariamente ceifa a existência de tantos inocentes, cujo sangue brada ao céu; as trevas da sede de vingança e do ódio que mancha com sangue humano as mãos de quem faz justiça por sua conta; as trevas de quem se torna insensível ao sofrimento de tantas vítimas. Todas estas trevas, as dissipa e destrói Jesus com o seu mandato na barca de Pedro: «Faz-te ao largo» (Lc 5, 4).

Nós podemos enredar-nos em discussões intermináveis, somar tentativas fracassadas e fazer um elenco de esforços que acabaram em nada; tal como Pedro, sabemos o que significa a experiência de trabalhar sem resultado algum. Esta nação também sabe disso, quando nos inícios, durante um período de seis anos, teve dezasseis Presidentes e pagou caro as suas divisões («a pátria tonta»); também a Igreja na Colômbia sabe de trabalhos pastorais vãos e infrutuosos..., mas, como Pedro, também somos capazes de confiar no Mestre, cuja Palavra suscita fecundidade mesmo onde a inospitalidade das trevas humanas torna infrutíferos muitos esforços e fadigas. Pedro é o homem que acolhe, decidido, o convite de Jesus, que deixa tudo e O segue para se transformar num novo pescador, cuja missão é levar os seus irmãos ao Reino de Deus, onde a vida se torna plena e feliz.

Mas o mandato de lançar as redes não é dirigido apenas a Simão Pedro; a ele, coube-lhe fazer-se ao largo, como aqueles que na vossa pátria foram os primeiros a ver o que era mais urgente fazer, aqueles que tomaram iniciativas de paz, de vida. Lançar as redes implica responsabilidade. Em Bogotá e na Colômbia, peregrina uma comunidade imensa, que é chamada a tornar-se uma rede vigorosa que congregue a todos na unidade, trabalhando na defesa e cuidado da vida humana, particularmente quando é mais frágil e vulnerável: no seio materno, na infância, na velhice, nas condições de invalidez, e nas situações de marginalização social. Também as multidões que vivem em Bogotá e na Colômbia podem tornar-se verdadeiras comunidades vivas, justas e fraternas, se escutarem e acolherem a Palavra de Deus. Nestas multidões evangelizadas, hão de surgir muitos homens e mulheres tornados discípulos que, com um coração verdadeiramente livre, sigam a Jesus; homens e mulheres capazes de amar a vida em todas as suas fases, de a respeitar e promover.

É necessário chamar uns pelos outros, fazermos sinais como os pescadores, voltar a considerar-nos irmãos, companheiros de estrada, sócios desta empresa comum que é a pátria. Bogotá e a Colômbia são simultaneamente margem, lago, mar aberto, cidade por onde Jesus passou e passa para oferecer a sua presença e a sua palavra fecunda, para nos fazer sair das trevas e conduzir-nos para a luz e a vida. Chamar os outros, chamar a todos para que ninguém seja deixado ao arbítrio das tempestades; fazer entrar na barca todas as famílias, santuário de vida; colocar o bem comum acima dos interesses mesquinhos ou particulares, ocupar-se dos mais frágeis promovendo os seus direitos.

Pedro experimenta a sua pequenez, a grandeza da Palavra e da ação de Jesus; Pedro sabe das suas fraquezas, das suas hesitações..., como o sabemos nós, como o sabe a história de violência e divisão do vosso povo que nem sempre nos encontrou disponíveis para compartilhar a barca, as tempestades, os infortúnios. Mas Jesus, como a Simão, convida-nos a fazer-nos ao largo, impele-nos a compartilhar o risco, a deixar os nossos egoísmos e a segui-Lo; convida-nos a perder medos que não vêm de Deus, que nos paralizam e atrasam a urgência de ser construtores da paz, promotores da vida.  (Bogotá, 7 de setembro de 2017).

Fonte: http://pt.radiovaticana.va

A Colômbia é um país de católicos. Dos 49 milhões de habitantes, 45,3 milhõesdizem que o são, de acordo com o Anuário Pontifício e de Estatísticas da Igreja. Os fieis estão em festa esta semana com a visita do papa Francisco à Colômbia,anunciada em julho de 2016 e confirmada em março. Haverá ponto facultativo e as cidades que o receberão se preparam há várias semanas. Em Bogotá, Villavicencio, Medellín e Cartagena as avenidas por onde o Papamóvel passará foram reformadas e foram montadas tribunas, telões e as plataformas de onde Francisco falará. A reportagem é de Sally Palomino e publicada por El País, 05-09-2017.

O último Pontífice que esteve no país foi João Paulo II, em 1986. Um ano difícil para os colombianos, que acabavam de sair de duas tragédias. Em 1985, o centro do poder Judiciário, em pleno no coração da Colômbia, sangrou sob os olhos de todos. A guerrilha do M-19 tomou o Palácio da Justiça e, ao vivo, pela televisão, os colombianos testemunharam a retomada do lugar pela Polícia e pelo Exército. Houve mortos e desaparecidos. Naquele mesmo ano, uma avalanche produzida pela erupção do vulcão Nevado del Ruiz matou ao menos 20 mil pessoas. Da cidadezinha de Armero ficou uma dolorosa lembrança. A visita do papa João Paulo II a esse lugar foi um momento histórico no país.

O papa Francisco chega quando os colombianos tentam superar o capítulo de mais de 50 anos de guerra, enquanto enfrentam a desesperança provocada por cada escândalo de corrupção. Em meio da alegria que desperta entre os paroquianos e os discursos que falam da importância de sua presença no país para impulsionar a paz, alguns setores católicos rejeitam sua visita. O canal de televisão Teleamiga se dedicou nos últimos meses a transmitir mensagens contrárias. Por trás do protesto está José Galat, ex-candidato à presidência, reitor da Universidade Gran Colômbia e diretor da emissora. “O canal é católico, os que não são católicos são aqueles que negam a fé católica, isto é, os bispos que acompanham um Papa que nega as verdades da fé”, afirmou. A posição da Teleamiga provocou a reação do Episcopado Colombiano, que pediu aos fiéis para não assistirem esse canal sob o argumento de que não representa o ensinamento da Igreja Católica. Em uma carta, os mais altos representantes do catolicismo na Colômbia advertiram que o canal “fere seriamente a comunhão da Igreja”.

Galat lançou campanhas para se opor ao aborto e ao processo de paz com as FARC. Fez isso a partir da academia e da televisão. Seu protesto nas últimas semanas se concentrou no Papa. “Sua designação foi obra de uma máfia de cardeais. Supondo que sua origem seja pura e não tenha nenhuma mancha, ensinou coisas contrárias à fé da Igreja”, afirmou. A essas críticas uniu-se a voz daqueles que questionam a visita de Franciscopelos custos que representa. Os cálculos apontavam há alguns dias uma cifra próxima de 10,1 milhões de dólares (cerca de 31,53 milhões de reais) por toda a sua permanência no país.

Mas nenhuma queixa foi suficiente para conter a expectativa pela visita do Papa.Somente em Bogotá espera-se a chegada de 700.000 pessoas e um faturamento próximo de 30 milhões de dólares. De acordo com os especialistas, ativará o turismo religioso e dinamizará a economia. A transmissão das atividades do Pontífice naColômbia será vista em oitenta países. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

 

“Testemunhos como o seu (...) lançam luz sobre uma terrível escuridão da Igreja. (...) Um testemunho, necessário, precioso e corajoso (...) Peço perdão pelos padres pedófilos: um sinal do diabo, seremos muito severos”: são reflexões do Papa Francisco contidas no prefácio escrito para o livro, nas livrarias [italianas] a partir desta quinta-feira, do ex-monge suíço Daniel Pittet, hoje com 57 anos, no qual ele conta uma experiência dolorosa sua, mantida em segredo por muitos anos. A nota foi publicada no sítio Il Sismografo, 16-08-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

No livro Mon Père, je vous pardonne (“Meu Pai, eu o perdoo”), Ed. Philippe Rey, Pittet conta ter sido vítima de repetidos estupros, dezenas e dezenas, por parte de um frei capuchinho suíço, Pe. Joel Allaz.

O autor do livro, e vítima do caso, diz ter esperado 20 anos antes de comunicar às autoridades eclesiásticas aquilo que tinha sofrido e ter feito isso apenas depois de ter tomado conhecimento de atos semelhantes contra outra vítima do capuchinho.

Daniel Pittet, vítima reconhecida e indenizada pela diocese de Friburgo e pela Ordem dos Frades Menores Capuchinhos, conta as diversas fases do processo aberto em 2002 junto ao tribunal eclesiástico de Grenoble (França), para onde Allazfoi transferido, mas encerrado um ano depois “por falta de provas”.

Enquanto isso, o capuchinho, sobre o qual cresciam as suspeitas sobre as suas condutas, era transferido de uma diocese para a outra. Só em 2008 foram abertas novas investigações depois de outras denúncias de 24 vítimas, mas os crimes, cometidos entre 1958 e 1995, prescreveram tanto na Suíça quanto na França.

No fim, em dezembro de 2011, Joel Allaz se salvaria da prisão com suspensão condicional da pena (dois anos). Allaz “nunca foi removido do estado clerical”, assegura Daniel Pittet e acrescenta: hoje, ele tem 76 anos e ainda vive na comunidade, na Suíça.

Daniel Pittet, hoje, em Friburgo, trabalha como bibliotecário e se ocupa da associação fundada por ele, “Rezar e Testemunhar”. Há dois anos, o ex-sacerdote Daniel Pittet, casado e pai de seis filhos, encontrou-se com o pontífice no Vaticano e lhe contou a sua história.

Eis o prefácio do papa.

Para quem foi vítima de um pedófilo, é difícil contar o que sofreu, descrever os traumas que ainda persistem à distância de anos. Por esse motivo, o testemunho de Daniel Pittet é necessário, precioso e corajoso. Eu conheci Daniel no Vaticano, em 2015, por ocasião do Ano da Vida Consagrada. Ele queria difundir em grande escala um livro intitulado “Amar é dar tudo”, que recolhia os testemunhos de religiosos e religiosas, de padres e consagrados. Eu não podia imaginar que esse homem entusiasmado e apaixonado por Cristo tinha sido vítima de abusos por parte de um padre. Porém, foi isso que ele me contou, e o seu sofrimento me tocou muito.

Eu vi mais uma vez os assustadores danos causados pelos abusos sexuais e o longo e doloroso caminho que espera pelas vítimas. Estou feliz de que outras pessoas possam ler hoje o seu testemunho e descobrir a que ponto o mal pode entrar no coração de um servidor da Igreja. Como um padre, a serviço de Cristo e da sua Igreja, poder chegar a causar tanto mal? Como pode ter consagrado a sua vida para levar as crianças a Deus e, em vez disso, acabar devorando-as naquele que eu chamei de “um sacrifício diabólico”, que destrói tanto a vítima quanto a vida da Igreja?

Algumas vítimas chegaram ao suicídio. Essas mortes pesam no meu coração, na minha consciência e na de toda a Igreja. Às suas famílias, eu estendo os meus sentimentos de amor e de dor, e, humildemente, peço perdão. Trata-se de uma monstruosidade absoluta, de um horrendo pecado, radicalmente contrário a tudo o que Cristo nos ensina.

Jesus usa palavras muito severas contra todos aqueles que fazem mal às crianças: “Quem escandalizar um desses pequeninos que acreditam em mim, melhor seria para ele pendurar uma pedra de moinho no pescoço, e ser jogado no fundo do mar” 
(Mt 18, 6).

A nossa Igreja, como recordei na carta apostólica “Como uma mãe amorosa”, de 4 de junho de 2016, deve cuidar e proteger com afeto particular os mais frágeis e os indefesos. Declaramos que é nosso dever dar prova de severidade extrema com os sacerdotes que traem a sua missão e com a sua hierarquia, bispos ou cardeais, que os protejam, como já aconteceu no passado.

Na desgraça, Daniel Pittet também pôde encontrar outra face da Igreja, e isso lhe permitiu não perder a esperança nos homens e em Deus. Ele também nos conta a força da oração que nunca abandonou e que o confortou nas horas mais escuras. Ele optou por se encontrar com o seu algoz 44 anos depois e olhar nos olhos do homem que o feriu nas profundezas da alma. E lhe estendeu a mão.

A criança ferida é, hoje, um homem de pé, frágil, mas de pé. Estou muito tocado com as suas palavras: “Muitas pessoas não conseguem entender que eu não o odeio. Eu o perdoei e construí a minha vida sobre aquele perdão”.

Agradeço a Daniel porque os testemunhos como o seu derrubam o muro de silêncio que sufocava os escândalos e os sofrimentos, lançam luz sobre uma terrível zona de sombra na vida da Igreja. Abrem o caminho para uma justa reparação e para a graça da reconciliação, e também ajudam os pedófilos a tomar consciência das terríveis consequências das suas ações.

Rezo por Daniel e por todos aqueles que, como ele, foram feridos na sua inocência, para que Deus os levante novamente e os cure, e dê a nós todos o seu perdão e a sua misericórdia. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

Dener Ricardo tem apenas 25 anos. Escreveu-me uma carta em tom pessoal, um relato pungente de sua trajetória na Igreja, da Renovação Carismática Católica e a rotina de adorações até a adesão à tradição da trajetória da Igreja latino-americana, à Teologia da Libertação e à liderança do Papa Francisco.

A informação é publicada por Mauro Lopes, jornalista, no blog Caminho Pra Casa, 17-08-2017.

No final do texto, uma convocação, um questionamento: “Vamos aspirar a uma Igreja simples, profética, que denuncia as injustiças contra os pobres e não se alia aos poderosos desta terra.”

Um jovem que torna verdade a profecia de Isaías no Segundo Canto do Servo Sofredor: “De minha boca fez uma espada cortante, abrigou-me na sombra da sua mão; fez de mim uma seta afiada, escondeu-me na sua aljava.” (Is 49, 2)

Uma carta-provocação, às vésperas do II Encontro Nacional de Juventudes e Espiritualidade Libertadora, que acontecerá entre 7 e 10 de setembro em Poá (SP).

Os ouvidos da Igreja estão se abrindo para a voz dos jovens que desejam o retorno à originalidade das primeiras comunidades cristãs? Os olhos da Igreja estão se abrindo para a luz que carregam os jovens? Já passa da hora.

A íntegra da carta de Dener:

“Sou de São José do Rio Preto (SP), tenho 25 anos. Minha família sempre foi católica, mas, antes dos meus 14 anos, eu não praticava muito a religião: ia à Missa, fazia algumas poucas orações e só. Muito pouco me importava a dimensão comunitária da fé. Aos 15 anos me apresentaram a Renovação Carismática Católica (RCC). Adotei este tipo de espiritualidade com muito entusiasmo: participava ativamente dos grupos de orações e eventos da RCC. Tinha um apreço muito grande pela Canção Nova e outras emissoras de TV deste segmento. Durante três anos, a minha espiritualidade foi moldada neste contexto…até que algo começou a mudar.

Já na faculdade, passei a questionar o porquê de muitos irmãos (ãs) nada possuírem para comer ou viver com um patamar mínimo de dignidade, ao passo que uma minoria acumula rios de dinheiro. Comecei a me questionar, dentro da fé católica, se isso poderia ser justo. Mas nos grupos da RCC não encontrei nenhum tipo de resposta: pouco ou nada se falava sobre os pobres e seus mais diversos sofrimentos, quase nunca se incentivavam ações concretas para pelo menos aliviar as tribulações daqueles mais necessitados.

Em três anos de Renovação Carismática, NUNCA, repito, NUNCA houve um pregador sequer que tivesse pautado sua pregação em Mateus 25, 31-46 ou nos documentos sociais da Igreja, que eu sequer sabia que existiam. Muitas e muitas pregações, a massacrante maioria, era pautada num discurso extremamente moralizante, bem do tipo pode ou não pode, um discurso bélico e apologético. O resultado em minha espiritualidade você já pode imaginar: o meu cristianismo tinha pouco de Evangelho. Gostava de cruzadas religiosas, tinha aversão ao ecumenismo, a ponto de até recusar uma oração comum, com dois irmãos protestantes que faziam um trabalho de visita a um hospital onde eu estava internado. Discutia áspera e frequentemente com pessoas dos Testemunhas de Jeová que vinham à minha porta. Era moralista e algumas vezes gostava de julgar quem não pensava como eu. Graças a esse moralismo exacerbado deixei de viver muita coisa boa e saudável próprias do tempo de juventude.

Em um dado momento desta trajetória minha consciência começou cutucar se estas minhas atitudes eram mesmo alinhadas ao Evangelho de Nosso Senhor. Isso se somou aos questionamentos que eu fazia sobre a disparidade entre ricos e pobres. Um dia, fui apresentado à Teologia da Libertação e à Doutrina Social da Igreja. Comecei a ler os textos do padre Gustavo Gutierrez, frei Leonardo Boff, padre Jon SobrinoDom Helder CâmaraDom Paulo Evaristo Arns, as ideias de São Vicente de Paulo e Beato Antonio Frederico Ozanam, entre outros. Por meio destes cheguei aos documentos que compõem o Compêndio da Doutrina Social da Igreja, bem como aos ensinamentos do Concílio Vaticano II e do CELAM.

O ponto culminante veio com o pontificado do Papa Francisco. Entrei de cabeça. Uma Igreja pobre para os pobres, uma Igreja misericordiosa, solidária, fraterna, de portas abertas e que denuncia profeticamente a injustiça social decorrente de um sistema que coloca o dinheiro no centro de tudo. Esse encontro me fez muito bem. Comecei a entender que Cristo se identifica nos pobres e sofredores do mundo e, dentro dos meus limites, comecei a dar início a pequenas ações concretas: visitar asilos, levar alimentos a instituições que atendem os pobres, inteirar-me da politica brasileira para ver o que eu podia fazer para cobrar dos governantes uma atenção privilegiada aos mais necessitados.

Neste caminho identifiquei-me com a Pastoral do Povo da Rua, onde hoje atuo com grande alegria. Confesso: Não há dinheiro no mundo que pague o trabalho junto e a favor dos pobres; ver o sorriso no rosto de um morador de rua quando encontra sorriso e amizade é algo excepcional. Passei aos poucos de uma espiritualidade pesada, intimista, preconceituosa e truncada para uma espiritualidade de partilha, comunhão, solidariedade e acolhimento. Hoje sou muito mais feliz com minha espiritualidade.

Ah, não poderia esquecer: comecei ganhar alguns rótulos de pessoas da ala conservadora da Igreja: herege, comunista, falso católico, entre outros. Confesso que fiquei um pouco chateado. Mas, se viver uma Igreja acolhedora, misericordiosa e que assume a opção preferencial pelos pobres é sinônimo de heresia, então sou um “herege”.

O caminho que se abriu permitiu-me participar melhor da Santa Missa, fazer minhas orações cotidianas e viver os sacramentos, entender que na vida nem tudo é preto no branco, por isso se faz importante o discernimento que é um dom do Espirito Santo… Minha relação com a Igreja ganhou em qualidade. Comecei a descobrir no Evangelho que Jesus sempre se colocava ao lado dos que sofriam e eram excluídos da sociedade daquela época. Provavelmente, foram estas escolhas que o levaram à cruz. JESUS ERA UM REVOLUCIONÁRIO e digo isso sem medo. De conservador ele não tinha absolutamente nada. Comecei a ver que o verdadeiro profetismo é denunciar os esquemas injustos e o acúmulo de riquezas, como fizeram os profetas do Antigo Testamento.

Contudo, não me engano: reconheço que tenho muito a melhorar como ser humano, tenho muito a converter dentro de mim, tenho muito o que aprender, para assim melhor me doar ao próximo. Peço que você reze por mim!

Por fim, se você publicar mesmo esta carta, gostaria de fazer um apelo a todos os leigos (as) e presbíteros que venham a ler esse depoimento: com palavras e atitudes vamos fazendo uma Igreja pobre, com os pobres e dos pobres. Vamos aspirar a uma Igreja simples, profética, que denuncia as injustiças contra os pobres e não se alia aos poderosos desta terra. Assim era no inicio do cristianismo e é assim que verdadeiramente iremos seguir os passos do Deus que se fez pobre, para nos enriquecer com sua pobreza.

Viva o Papa Francisco e que Deus o conceda longa vida, com muita saúde, conduzindo a Igreja pelas veredas da simplicidade do Evangelho!
Servo de Deus, Dom Helder Câmara e Bem Aventurado Dom Oscar Romero, roguem por nós e especialmente pelos marginalizados, a quem devotaram as vossas vidas!
Dener Ricardo

Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

Pela forma como as coisas vêm sendo tratadas até agora pela Igreja, trata-se de uma mudança de mentalidade radical. Antes de tentar proteger o bom nome da estrutura eclesiástica a fim de evitar escândalos, deve-se proteger e ajudar a criar todas as crianças nascidas de relações com religiosos, párocos e bispos. Os filhos dos padres, desde sempre invisíveis, começam a ter uma aparência de legitimidade. Certamente um mundo submerso, desconhecido para a maioria, com contornos bastante extensos, visto os casos que estão surgindo graças a uma associação internacional criada por um psicoterapeuta irlandês com a bênção do bispo de Dublin, Diarmud Martin. Quando sua mãe morreu, Vincent Doyle, o psicoterapeuta, folheando os papéis da falecida mãe, encontrou indícios para chegar à identidade de seu verdadeiro pai, um pároco de uma cidade próxima e amigo de longa data de sua família. O choque inicial logo deu lugar à reflexão e à curiosidade para compreender os contornos de um fenômeno bastante generalizado. A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada por Il Messaggero, 30-08-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.

Para sua surpresa, depois de algumas tentativas feitas no Facebook, ele percebeu que o mundo dos filhos dos padres era uma realidade concreta e mensurável, um mundo de sofrimento, carente de ajuda e apoio, porque as pessoas envolvidas, da mesma forma que ele próprio, haviam sofrido ou sofriam os mesmos traumas ditados pela vergonha, pelo medo da rejeição, pela solidão. O bispo Martin encorajou o jovem a dar uma estrutura à sua pesquisa. Enquanto isso, o site e a força-tarefa que estavam se formando recebiam o apoio também da Conferência Episcopal Irlandesa e, posteriormente, do Cardeal de Boston, O'Malley - um dos primeiros a entrar em campo contra o fenômeno da pedofilia ao lado das vítimas dos abusadores – e do Papa Francisco através de uma carta assinada pela Secretaria de Estado.

Estes dias, o local tem sido contatado por pessoas de todo o mundo após o Boston Globe, o jornal de onde partiu a investigação extraordinária que levou a perfurar o véu sobre o horror dos padres pedófilos nos Estados Unidos, ter publicado extensos relatórios sobre a realidade dos filhos de sacerdotes. Por exemplo, a história pessoal de Peter Murphy, um homem que soube que era filho de um bispo, muitos anos atrás, quando ele ainda era um adolescente. Enquanto isso, os bispos irlandeses também elaboraram um documento interno sobre as responsabilidades dos sacerdotes que tiveram filhos durante o seu ministério. Entre as páginas se abordam as necessidades da criança que, como é dito, deve "vir em primeiro lugar"; "Um padre, como qualquer pai, tem de cumprir as suas responsabilidades - pessoal, moral, jurídica e econômica." Escusado será dizer que se um pastor quebrou o vínculo de castidade, deve enfrentar "as suas responsabilidades." Considerações genéricas e bastante simples, mas que, de acordo com o arcebispo Martin, evitam o prolongamento de situações dolorosas e difíceis. Embora ainda existam regras ad hoc pela Santa Sé, o Papa teve a oportunidade de estudar a situação quando era arcebispo de Buenos Aires.

No livro escrito com o rabino Abraham Skorka, Sobre o céu e a terra, ele disse o que tinha acontecido com ele na Argentina. "Se alguém vem a mim e me diz que engravidou uma mulher, eu tento acalmá-lo e pouco a pouco o faço entender que a lei natural vem antes do seu direito como padre. Portanto, deve deixar o ministério e assumir a criança, mesmo que decida não se casar com a mulher. Porque, como essa criança tem o direito de ter uma mãe, tem o direito de ter um pai com um rosto. Estou empenhado em regularizar todos os documentos dele em Roma, mas ele deve deixar tudo. Agora, se um padre me diz que foi levado pela paixão, que cometeu um erro, eu vou ajudá-lo a corrigir-se. Existem sacerdotes que se corrigem e outros não."

Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

Maria Valetina de Los Ángeles, cantará para o pontífice após vencer um concurso de música

Colômbia - Ela usa tênis, faz rap e já participou de um reality show. Agora a freira Maria Valentina de los Ángeles, realizará o sonho de cantar para o papa Francisco em sua visita à Colômbia.

Conhecida por sua alegria e carisma, esta jovem de Bogotá de pele morena e baixa estatura colabora com o grupo musical vencedor de um concurso local que elegeu o hino que tornará mais agradável o percurso do papa. 

O "prêmio" é interpretar a canção ganhadora, "Demos el primer paso", um vallenato (gênero musical popular na Colômbia) pop de pouco mais de quatro minutos que inclui uma estrofe em forma de rap, enquanto o pontífice argentino se move entre a multidão de fiéis colombianos.

Francisco, um dos impulsores do acordo de paz entre o governo colombiano e a maior guerrilha do país, após meio século de conflito, visitará Bogotá, Medellín, Villavicencio e Cartagena entre 6 e 10 de setembro.

Vai ser "uma oportunidade para mostrar a ele nosso carinho através do que sabemos fazer, que é música", disse Maria Valentina, de 28 anos, que cantará a canção com cerca de 20 concertistas da fraternidade Músicos Católicos Unidos (MCU).

A religiosa se tornou conhecida no país após participar, no ano passado, do reality show "A otro nivel", no qual fez um rap com tanta "naturalidade" que os MCU a convidou para compor e cantar uma estrofe da canção que acabou sendo eleita, no início de agosto, como o ritmo oficial de Francisco na Colômbia.

"A Colômbia te recebe com os braços abertos / a uma só voz te dizemos muito contentes / bendito seja Deus, que em sua sabedoria te trouxe a nossas terras para ser seu guia", diz o rap da freira. Fonte: http://odia.ig.com.br

Nas bancas, junto com o jornal diário, os textos do cardeal jesuíta desaparecido há cinco anos ‘Reflexões sobre a Sagrada Escritura, a atenção às mudanças na sociedade’. O primeiro título da coleção é "Dar voz a cada um". A reportagem é de Paolo Baldini, publicado por Corriere della Sera, 31-08-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.

"Se o que se quer é um bispo profeta, é preciso dar-lhe muito tempo para orar"

A última dedicatória, na página final, trazia uma palavra inclinada, suave, firme: "Orem!". O príncipe da Igreja e da Palavra de Deus. A oração como um ato de devoção, amor e regeneração. Carlo Maria Martini, arcebispo de Milão, que deveria ser Papa, o intelectual da Igreja que se tornou um insuperável pastor, o homem do diálogo, da pobreza, da cátedra dos não-crentes, o sacerdote que, se a vocação não o tivesse alegremente arrebatado, teria sido um (grande) jornalista, o sacerdote com os olhos azuis a quem as Brigadas vermelhas entregaram as armas; o cardeal Carlo Maria Martini, portanto, viveu seus últimos dias, naquele agosto de 2012, com uma insuperável vontade de viver.

Certo dia citou Victor Hugo, Os Miseráveis, sobre o renascimento do prisioneiro Jean Valjean por obra do Bispo de Digne, o amado monsenhor Myriel. Citou Valjean para lembrar um antigo temor: "Quando fui ordenado em Milão por João Paulo II, pensei que me esperava ser um homem sozinho, como se me tivessem colocado em um nicho, longe das pessoas. E que isso poderia acontecer de forma bem mais acentuada em uma diocese grande, como Milão, que vai do Ticino ao Adda. Lembro-me que, ao expor minhas dúvidas, o Pontífice me confortou: não tenha medo, serão pessoas que virão ao seu encontro".

O bom bispo é "um homem humilde que sabe vencer as dificuldades com a própria suavidade, que sabe ser discreto, que sabe rir de si mesmo e da própria fragilidade. Que sabe reconhecer os seus erros sem muitas auto-justificações. Em suma, um homem de verdade"

Eis, portanto: a exigência de se comunicar, para se fazer entender. Martini era atento, curioso. Ele pedia informações, se aprofundava, refletia e se indignava. Perdoava e era severo. "Se o que se quer é um bispo profeta, é preciso dar-lhe muito tempo para orar". Escreveu O Bispo na esteira da grande tradição do Liber pastoralis, de Gregório Magno a Carlos Borromeu. Era para ser o primeiro passo de uma série, cujo título é uma declaração de intenções: "O cuidado com as palavras" O convite é também o fio condutor da iniciativa editorial que o "Corriere della Sera" propõe, cinco anos após a morte do cardeal, para recordar a sua figura e as suas obras.

Martini foi um exemplo de militância nas questões da modernidade e da Nova Sociedade, da inseminação artificial ao testamento biológico, do relacionamento com o Islã e as outras religiões, do celibato dos padres à ordenação de mulheres. Mas, mesmo sobre questões ainda hoje candentes, tais como as relações com a ciência, os não- crentes, os comportamentos amorais da política, a corrupção e a culpada desatenção para com o próximo: espírito de pobreza e renúncia de todo interesse, a força de todos os servidores fiéis do estado, de todas as pessoas honestas. "A história mostra como o fechamento apriorístico da Igreja, e das religiões em geral, diante das inevitáveis mudanças ligadas ao progresso da ciência e da tecnologia nunca tenha sido de grande utilidade. Galileu Galilei docet".

Assim Martini descreveu o bom bispo: "Um homem humilde que sabe vencer as dificuldades com a própria suavidade, que sabe ser discreto, que sabe rir de si mesmo e da própria fragilidade. Que sabe reconhecer os seus erros sem muitas auto-justificações. Em suma, um homem de verdade". Pro veritate adversa diligere

Ele acreditava na oração de intercessão. Seu lema episcopal, na tradição da regra pastoral de São Gregório Magno, era Pro veritate adversa diligere. O pior dos castigos era para ele não ser entendido ou, pior, ser mal compreendido. Em sua biblioteca, obras escolhidas: a nata de uma vida de leituras em vários idiomas, antigos e modernos. Em um canto, com modéstia, uma bela fotografia de Ano Novo, feita no seminário de Turim: entre os rostos felizes dos alunos, destacava-se um jovem alto e distinto, com os cabelos cortados à escovinha, o olhar brioso. A voz, o veículo da Palavra, silenciou-se um dia de maio de 2010, após uma internação no hospital San Raffaele. Tornou-se um sopro leve, parecia vir de muito longe. A onda de altíssima espiritualidade forçada a se retirar, a recuar diante da doença ruim, o mal de Parkinson, com o qual havia se acostumado a conviver desde os dias felizes de Milão. Restrição física, não do pensamento ou da alma.

O que sobrava do arcebispo que Milão tinha aprendido a amar à primeira vista, como acontece nos grandes amores? Daquele homem sobravam a figura imponente e a luz de bondade no olhar. "Vocês viram os melhores momentos e os piores momentos", disse ele. Sua última morada foi o Instituto Aloisianum de Gallarate, a residência dos Jesuítas a 40 quilômetros de Milão, o refúgio final depois dos anos de meditação e de estudo em Jerusalém.

Martini definia a cidade como o local de uma identidade que se recria continuamente, a partir do novo, do diferente, na coordenação das tensões. Acolhendo, não apenas contendo. A cidade dos fracos, dos últimos, dos honestos e dos iguais

A cidade, através de cartas para o "Corriere", buscava por ele, à procura de conforto. Ele sabia que a tecnologia lhe permitiria estender a relação, e, se possível, melhorá-la com aqueles que acreditavam nele e o chamavam de "eminência reverendíssima" ou mesmo simplesmente "querido Carlo Maria". A resposta havia sido traçada há tempo: "Estarei com vocês aonde quer que eu vá". Turim, Roma, Milão, Jerusalém.

Ele disse: "Em Jerusalém atrai-me o fato de que Jesus viveu lá, que morreu lá, que lá seja possível rezar no Calvário. Atrai-me esse povo, o povo judeu, que ao mesmo tempo traz tanto sofrimento, tanta dificuldade no convívio. Parece um cadinho do futuro. Por quê? Porque os sofrimentos do mundo estão tão presentes em Jerusalém que é provável que, se houver um futuro, este terá que passar de alguma forma por lá".

Ele mantinha uma Bíblia aberta sobre uma modesta mesinha de fórmica. Perto dela, um boneco do Ursinho Pooh, um presente, um copo de limonada, pequena delícia entre os remédios amargos, os óculos de aros dourados que os tremores de Parkinson faziam deslizar no nariz.

As reuniões na redação eram encontros editorias comentados. Fazia a revisão dos textos, era flexível. Sugeria títulos fortes, sem medo. Na parede, o diploma do Premiolino, o reconhecimento que recebeu em 2010 por sua coluna no "Corriere". Mês após mês, ensinou aos seus leitores que o paraíso existe, que os anjos da guarda nos acompanham e protegem.

"Respiro com a Igreja em sua própria luz, de dia, em suas próprias trevas, à noite"

Ele gostava de repetir as palavras do Cardeal Schuster: "Respiro com a Igreja em sua própria luz, de dia, em suas próprias trevas, à noite". Citava bastante esta passagem: "Da mesma forma, o Espírito nos ajuda em nossa fraqueza, pois não sabemos como orar, mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis: e aquele que sonda os corações conhece a intenção do Espírito, porque o Espírito intercede pelos santos de acordo com a vontade de Deus" (Rm 8: 26-27). Ele não temia a crise "a ser enfrentada com coragem civil." Tentava explicar o significado da dor. Definia a cidade como o local de uma identidade que se recria continuamente, a partir do novo, do diferente, na coordenação das tensões. Acolhendo, não apenas contendo. A cidade dos fracos, dos últimos, dos honestos e dos iguais.

Quando lhe pedimos para comentar sobre o escândalo da pedofilia, que já era um tsunami, ele levantou-se e saiu da sala em silêncio. Estava perturbado, sofria pela humilhação da Igreja, tinha lágrimas em seus olhos. Rezou em recolhimento por uns dez minutos, em seguida, reapareceu. Estava comovido, mas aliviado. Recordou as palavras de Jesus: "Mas ai daquele que produz escândalos! Seria melhor para ele que lhe amarrassem uma pedra de moinho no pescoço e o jogassem no mar, do que escandalizar um desses pequeninos". Poucas linhas, dignas da primeira página.

"Eu gostaria de ser parte de uma igreja que se indigna e combate ao lado dos pobres e dos despossuídos, que escova a boca dos poderosos da terra, quando a enchem para falar de Deus e estão tão distantes em sua prática"

 Ele costumava dizer: "Eu gostaria de ser parte de uma igreja que se indigna e combate ao lado dos pobres e dos despossuídos, que escova a boca dos poderosos da terra, quando a enchem para falar de Deus e estão tão distantes em sua prática". Quando começou a coluna, na primavera de 2009, escreveu: “Hoje, a negação da verdade muitas vezes assume a figura da omissão consciente e culpada, condicionada pelo medo ou pelo interesse, ou mesmo pelo amor ao sossego: guarde-me o Senhor dessas armadilhas!”.

Ao padre Georg Sporschill, com quem escreveu o livro Conversações noturnas em Jerusalém, disse que a Igreja estava atrasada em duzentos anos. A entrevista foi transmitida para o mundo todo. Pensando sobre o sucessor de Ratzinger, delineou um perfil que conduzia exatamente ao papa Bergoglio. "É como se o cardeal Martinitivesse este homem diante de seus olhos, quando expressou sua própria dor pela Igrejaeuropeia cansada e traçou um esboço de um bispo e Papa preparado para os desafios da atualidade. Um pastor da Igreja deveria ter ou assegurar através de seu entourage mais íntimo, a proximidade com as pessoas e, principalmente, a compaixão pelos pobres e pelos jovens".

 “Hoje, a negação da verdade muitas vezes assume a figura da omissão consciente e culpada, condicionada pelo medo ou pelo interesse, ou mesmo pelo amor ao sossego: guarde-me o Senhor dessas armadilhas!”

Sporschill acrescentou: "O fundador da ordem, Inácio de Loyola, tinha certeza de que Jesus estava enraizado e vivesse em cada coirmão. Com essas raízes profundas, cultivadas através dos exercícios espirituais, o jesuíta ganha uma liberdade com a qual pode se aventurar em cada missão, local ou encontro. Lá, aonde há mais necessidade. E com essa liberdade também ganha a coragem de enfrentar os poderosos quando afligem os homens".

Conta-se que no conclave de 2005, quando foi eleito Joseph Ratzinger, o cardeal Martini tenha dado um passo à frente e, com o então cardeal Bergoglio, abriu o caminho para Bento XVI, "humilde servo na vinha do Senhor". Não sabemos se realmente aconteceu assim, declara Sporschill. Mas, talvez, a voz “indica o caminho pelo qual o Espírito Santo conduziu a Igreja, e que hoje leva para o futuro". Fonte: http://www.ihu.unisinos.br