O jornalismo profissional, defendeu o papa, deve ser luz no mundo. E a liberdade de expressão, um antídoto contra o medo, a manipulação da realidade factual e o autoritarismo

 

Em tempos de desinformação massiva, polarização e ataques crescentes à liberdade de expressão, a eleição de Leão XIV, o primeiro papa norte-americano, marcou não apenas uma transição de liderança na Igreja Católica, mas uma reafirmação eloquente dos valores fundacionais da civilização ocidental: verdade, liberdade e responsabilidade.

Em sua primeira audiência com jornalistas, apenas quatro dias após o conclave, Leão XIV escolheu um tema que é, simultaneamente, espiritual e político: a comunicação como ferramenta de paz. E não apenas paz no sentido diplomático, mas paz enraizada na justiça, na dignidade e na verdade. “Somente os povos informados podem fazer escolhas livres”, declarou o pontífice. Essa não é apenas uma afirmação jornalística – é uma defesa inequívoca da liberdade como valor moral.

Com sua ênfase na verdade como precondição da liberdade, Leão XIV retomou a lição de Jesus Cristo: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8:32). Essa afirmação, feita diante de milhares de profissionais da imprensa reunidos no Vaticano, ecoa com força num tempo em que regimes autoritários criminalizam a apuração jornalística e plataformas digitais amplificam vieses com algoritmos opacos.

Não por acaso, o novo papa pediu a libertação de jornalistas presos mundo afora apenas por “terem desejado contar a verdade”. A frase pode parecer simples, mas carrega o peso da tradição cristã e o compromisso histórico da Igreja com os perseguidos. Evocando o espírito dos apóstolos diante do Sinédrio, Leão XIV parece afirmar com eles: “Não podemos deixar de falar sobre o que vimos e ouvimos” (Atos 4:20).

Num mundo saturado de ruído e manipulação, o jornalismo responsável se torna um bem escasso – e, por isso mesmo, precioso. A imprensa livre é como a lâmpada que “não se acende para colocá-la debaixo do cesto” (Mateus 5:15), mas para iluminar o caminho comum. Quando o poder tenta sufocar a verdade, o jornalismo precisa acender sua luz. E quando o medo cala a sociedade, cabe à palavra livre romper o silêncio.

A tradição cristã oferece duas imagens que ajudam a compreender os dilemas atuais da comunicação. A Torre de Babel simboliza o uso arrogante e instrumental da linguagem, que gera confusão e divisão. O Pentecostes, em contraste, representa o dom da palavra que une na diversidade, tornando inteligível o essencial. Leão XIV, ao reafirmar a tradição do Pentecostes, propõe um modelo de comunicação orientado não pela imposição ideológica, mas pela escuta, pela clareza e pela busca do bem comum.

É reconfortante que este novo pontificado comece com uma mensagem tão clara. Em vez de alimentar ressentimentos ou promover narrativas de confronto, Leão XIV está sinalizando um papado de firmeza sem fanatismo, de autoridade moral sem autoritarismo.

A doutrina social da Igreja sempre defendeu que o bem comum depende da circulação livre da verdade. Informação confiável não é um luxo: é o alicerce das escolhas democráticas, da justiça social e da dignidade humana. Não por acaso, os regimes que mais temem a liberdade de imprensa são também os que mais atentam contra a vida, a fé e os direitos de seus cidadãos.

O papa não citou países, mas os números falam por si: centenas de jornalistas estão presos, muitos em países que se dizem democráticos. A mensagem do Vaticano é clara: não há como falar em liberdade, paz ou verdade sem proteger aqueles que se dedicam a revelá-las.

Mas o alerta de Leão XIV também se dirige, de forma sutil, à própria imprensa. “O modo como comunicamos é de importância fundamental”, afirmou. “Devemos dizer ‘não’ à guerra das palavras e das imagens; devemos rejeitar o paradigma da guerra.” Ao defender o jornalismo como ponte, e não como trincheira, o papa propõe uma ética da comunicação fundada na verdade, na escuta e na responsabilidade.

O jornalismo, como este jornal sempre defendeu, deve ter a liberdade de incomodar, denunciar e esclarecer. Não há pacto social legítimo fundado sobre a mentira. Mas, se é legítimo exigir compromisso com a verdade da classe política, é igualmente essencial que a imprensa cultive integridade, rigor e autocrítica. Fonte: https://www.estadao.com.br

Herança dos colonizadores portugueses, grupos atuaram em momentos importantes da vida religiosa e civil do país. Para historiador, até hoje associações ajudam a promover obras de caridade, integração social e identidades religiosas e culturais.

 

Victor Hugo Barros – Vatican News

Realiza-se neste fim de semana, em Roma, o Jubileu das Irmandades. O encontro, iniciado na sexta-feira (16), segue até este domingo (18), e conta com mais de 100 mil inscritos de mais de 100 países. Entre eles, brasileiros, um dos maiores grupos registrados neste grande evento do Jubileu, que será encerrado com a Missa de início do ministério petrino do Papa Leão XIV.

O grande número de brasileiros presentes em Roma para as celebrações pode ser explicado historicamente. As irmandades possuem papel preponderante no desenvolvimento do país.

“As irmandades religiosas chegaram ao Brasil com os colonizadores portugueses no século XVI, trazendo consigo a tradição europeia de associações para a prática de atos de devoção, caridade e assistência social”, atesta o professor de História com especialização em história e cultura no Brasil, Helânio de Sousa da Cruz.

“Sua história reflete as transformações sociais no Brasil. É impossível você estudar história do Brasil e não esbarrar com a atuação das irmandades e também a persistência de laços comunitários baseados na fé e na solidariedade”, completa.

 

A devoção popular e o fortalecimento da fé

Caracterizadas pela presença dos leigos, as associações de fiéis logo começaram a se popularizar no país, sobretudo no período Colonial. Relatos do Frei Agostinho de Santa Maria, detalham que, no início do século XVIII havia 31 irmandades aprovadas na Bahia.

Os números da época ajudam a entender a importância destes grupos para o catolicismo nacional. Mais do que isso, explicam como, até hoje, elas influenciam a vida de fé de boa parte do país.

“As irmandades desempenharam um papel central na manutenção e fortalecimento da fé católica, especialmente em contextos onde a Igreja tinha certa dificuldade de alcançar todos os fiéis. Aí que surgem aquelas questões das devoções populares. Elas organizavam procissões, festas religiosas, celebrações de santos padroeiros e atividades de catequese, contribuindo, desta maneira, para a religiosidade popular. Nos interiores, onde a Igreja tinha menor presença institucional, as irmandades frequentemente elas eram responsáveis por eventos religiosos e também por ações sociais e de ajuda aos mais necessitados, fortalecendo o vínculo entre a população e a fé”, explica o historiador.

 

A contribuição social das irmandades

Momentos importantes da história nacional também contaram com a presença das irmandades. Um dos pontos altos foi o movimento realizado por parte dos grupos em favor da abolição da escravatura.

“Algumas irmandades, especialmente aquelas formadas por negros ou mestiços, como a Nossa Senhora da Boa Morte, Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, Santo Elesbão e Santa Fulgência, participaram de manifestações e promoveram ações de apoio aos libertos, inclusive apoiado e financiado pela Princesa Isabel”, detalha Helânio.

 

As irmandades hoje

Até hoje, as irmandades continuam a existir em diversas localidades. Sua atuação continua a ser marcante em diversas regiões do Brasil, assim como em todo o mundo.

“As irmandades hoje em dia continuam atuando principalmente nas organizações de festas. Sobretudo essas irmandades mais antigas. Festa de celebrações religiosas e atividades sociais, é importante frisar isso. Muitas delas também desempenham um papel importante na preservação da cultura e da memória local, apoiando obras de caridade, educação e assistência social, especialmente em comunidades mais vulneráveis. Além disso, funciona como espaço de convivência comunitária, promovendo a integração social e o fortalecimento de identidades religiosas e culturais”, esclarece Cruz.

 

Jubileu das Irmandades

O legado e a força das irmandades podem ser vistos, de forma universal, até o próximo domingo (18), nas atividades do Jubileu das Irmandades, em Roma. A programação conta com peregrinações às Portas Santas das Basílicas Papais, a Grande Procissão pelo Centro de Roma e a Missa de início do ministério petrino do Papa Leão XIV, onde os membros das Irmandades participarão com seus trajes tradicionais, marcando este momento histórico para a Igreja e o mundo. Fonte: https://www.vaticannews.va

 

1) Oração

Ó Deus, que restaurais a natureza humana dando-lhe uma dignidade ainda maior, considerai o mistério do vosso amor, conservando para sempre os dons da vossa graça naqueles que renovastes. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

 

2) Leitura do Evangelho (João 13, 16-20)

Naquele tempo, depois de haver lavado os pés dos discípulos, Jesus disse-lhes: 16Em verdade, em verdade, vos digo: o servo não é maior do que seu senhor, e o enviado não é maior do que aquele que o enviou. 17Já que sabeis disso, sereis felizes se o puserdes em prática. 18Eu não falo de todos vós. Eu conheço aqueles que escolhi. Mas é preciso que se cumpra o que está na Escritura: ‘Aquele que come do meu pão levantou contra mim o calcanhar’. 19Desde já, antes que aconteça, eu vo-lo digo, para que, quando acontecer, acrediteis que eu sou. 20Em verdade, em verdade, vos digo: quem recebe aquele que eu enviar, a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou”.

 

3) Reflexão

Nos próximos dias, com exceção das festas, o evangelho diário é tirado da longa conversa de Jesus com os discípulos durante a Última Ceia (Jo 13 a 17). Nestes cinco capítulos que descrevem a despedida de Jesus, percebe-se a presença daqueles três fios de que falamos anteriormente e que tecem e compõem o evangelho de João: a palavra de Jesus, a palavra das comunidades e a palavra do evangelista que fez a última redação do Quarto Evangelho. Nestes cinco capítulos, os três fios estão de tal maneira entrelaçados que o todo se apresenta como uma peça única de rara beleza e inspiração, onde é difícil distinguir o que é de um e o que é do outro, mas onde tudo é Palavra de Deus para nós.  

Estes cinco capítulos trazem a conversa que Jesus teve com os seus amigos, na véspera de ser preso e morto. Era uma conversa amiga, que ficou na memória do Discípulo Amado. Jesus, assim parece, queria prolongar ao máximo esse último encontro, momento de muita intimidade. O mesmo acontece hoje. Há conversa e conversa. Há conversa superficial que gasta palavras à toa e revela o vazio das pessoas. E há conversa que vai fundo no coração e fica na memória. Todos nós, de vez em quando, temos esses momentos de convivência amiga, que dilatam o coração e vão ser força na hora das dificuldades. Ajudam a ter confiança e a vencer o medo.

Os cinco versículos do Evangelho de hoje tiram duas conclusões do lava-pés (Jo 13,1-15). Falam (1) do serviço como característica principal dos seguidores e seguidoras de Jesus, e (2) da identidade de Jesus como revelação do Pai.

João 13,16-17: O servo não é maior que o seu senhor.  Jesus acabou de lavar os pés dos discípulos. Pedro levou susto e não quis que Jesus lhe lavasse os pés. “Se eu não te lavar os pés, não terás parte comigo” (Jo 13,8). E basta lavar os pés; o resto não precisa (Jo 13,10). O valor simbólico do gesto do lava-pés consistia em aceitar Jesus como o Messias Servidor que se entrega a si mesmo pelos outros, e recusar um messias rei glorioso. Esta entrega de si mesmo como servo de todos é a chave para entender o gesto do lava-pés. Entender isto é a raiz da felicidade de uma pessoa: “Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática". Mas havia pessoas, mesmo entre os discípulos, que não aceitavam Jesus como Messias Servo. Não queriam ser servidores dos outros. Provavelmente, queriam um messias glorioso como Rei e Juiz, de acordo com a ideologia oficial. Jesus diz: "Eu não falo de todos vocês. Eu conheço aqueles que escolhi, mas é preciso que se cumpra o que está na Escritura: Aquele que come pão comigo, é o primeiro a me trair!” João se refere a Judas, cuja traição vai ser anunciada logo em seguida (Jo 13,21-30).

João 13,18-20: Digo isto agora, para que creiais que EU SOU.  Foi por ocasião da libertação do Egito ao pé do Monte Sinai, que Deus revelou o seu nome a Moisés: “Estou com você!” (Ex 3,12), “Estou que Estou” (Ex 3,14), “Estou” ou “Eu sou” me mandou até vocês!” (Ex 3,14), O nome Javé (Ex 3,15) expressa a certeza absoluta da presença libertadora de Deus junto do seu povo. De muitas maneiras e em muitas ocasiões esta mesma expressão Eu Sou  ou Sou Eu é usada por Jesus (Jo 8,24; 8,28; 8,58; Jo 6,20; 18,5.8; Mc 14,62; Lc 22,70). Jesus é a presença do rosto libertador de Deus no meio de nós.

 

4) Para um confronto pessoal

 1) O servo não é maior que o seu senhor. Como faço da minha vida um serviço permanente aos outros?

2) Jesus soube conviver com pessoas que não o aceitavam. E eu consigo?

 

5) Oração final

Vou cantar para sempre a bondade do SENHOR; anunciarei com minha boca sua

fidelidade de geração em geração. Pois disseste: “Minha bondade está de pé para sempre”. Estabeleceste tua fidelidade nos céus. (Sl 88, 2-3)

Rombo nas contas é mais grave do que se imaginava. Novos detalhes das finanças do Vaticano mostram instituição à beira do abismo

 

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Se alguma instituição é muito reverenciada para falhar, é o Vaticano. Mas, em termos de dinheiro, está à beira do abismo. E, para o novo papa, nenhum papel será mais importante do que o de arrecadador sagrado.

O falecido Papa Francisco passou grande parte de seus últimos meses, incluindo uma boa parte dos 38 dias em seu leito de morte no Hospital Gemelli em Roma, emitindo alertas sobre o estado rapidamente declinante das finanças do Vaticano e nomeando uma nova comissão para arrecadar dinheiro dos fiéis. De fato, é bem conhecido que o Vaticano vem apresentando grandes déficits orçamentários por décadas, e os déficits – assim como os escândalos que têm drenado o tesouro sustentando o sagrado assento de poder para os 1,3 bilhão de católicos do mundo – persistiram apesar da valente campanha de reforma de Francisco.

Mas números tornados públicos nas últimas cinco semanas revelam que um problema bem conhecido, mas pouco compreendido e sombrio, o buraco no fundo de pensão do Vaticano, é muito pior do que se acreditava anteriormente. De fato, em seus últimos dias, Francisco alertou sobre um grande “desequilíbrio” para as contas, mas não forneceu números específicos. O falecido papa insistiu que o problema precisava de atenção imediata. Agora estamos tendo uma visão mais detalhada de quão grave, urgente e não providencial realmente é.

 

Fundos de pensão: status tem novos detalhes impressionantes

Em 7 de abril, The Pillar, um site de notícias e jornalismo investigativo católico, publicou uma análise profunda sobre o status do fundo de pensão que forneceu novos detalhes impressionantes. A reportagem, baseada em “relatórios financeiros internos do Vaticano” obtidos pelo The Pillar, cita um documento de 2015 emitido pela Secretaria de Economia formada pelo Papa Francisco um ano antes como a primeira organização a supervisionar todas as finanças do Vaticano. A Secretaria divulgou que o plano de pensão abrigava um “déficit de financiamento” de “pelo menos” US$ 800 milhões a US$ 900 milhões (nas taxas de câmbio dólar-euro de hoje). A Secretaria também afirmou que os custos de saúde estavam escalando a um ritmo “insustentável” e excediam as despesas de “fundos de saúde italianos comparáveis” em 50%.

O briefing continuou a dizer que o Papa Francisco e o Vaticano, nos dois anos seguintes, praticamente não fizeram nada. Em um eufemismo, a Secretaria relatou que o Vaticano “não incluiu as contribuições necessárias para equilibrar o déficit do fundo de pensão“. Em vez disso, o documento observou, o déficit até 2016 havia aumentado para mais de US$ 1,6 bilhão. Atingindo o Vaticano está a força demográfica inflando as obrigações de pensão em todos os países em desenvolvimento. Na Itália, a expectativa de vida média expandiu de 69, em 1960, para 84 hoje.

Em uma carta aberta, a Associação de Trabalhadores Leigos do Vaticano, o sindicato que representa cerca de 1.000 funcionários, acusou que, embora seus membros estejam contribuindo para o fundo, as autoridades se recusam a fornecer qualquer informação sobre seu orçamento. “As contas deveriam estar abertas para todos verem”, afirmou a associação.

De acordo com a história do The Pillar, o Vaticano possui uma potencial mina de ouro que poderia ter coberto uma grande parte, senão todo, do déficit de pensão. Ele possui um valioso terreno vago de 1.000 acres nos arredores de Roma, e em 2015, as autoridades financeiras elaboraram planos para desenvolver uma comunidade residencial e um combo de parque de escritórios de alta tecnologia chamado Santa Maria Galeria, previsto para abrir para negócios por volta de 2018.

Mas, após anos de inação, o Papa Francisco – um forte defensor da energia verde – descartou a visão de um megaprojeto lucrativo, designando a propriedade como uma “fazenda” para painéis solares, uma escolha de renda muito mais baixa. Um “alto” funcionário do Vaticano caracterizou os esforços vacilantes pela reforma financeira nos últimos anos como “uma ópera que é tanto uma comédia quanto uma tragédia”.

Evitar uma crise financeira no Vaticano “estará entre as questões mais prementes para o novo pontífice”, diz Charles Gillespie, PhD, professor na Sacred Heart University em Connecticut. Para alcançar a terra prometida, o Papa Leão precisará de um imenso apoio dos fiéis, e especialmente dos tradicionalmente maiores doadores da igreja, e cada vez mais relutantes e desiludidos: católicos ricos dos EUA.

 

Os problemas financeiros do Vaticano

O Vaticano realmente funciona como duas grandes unidades. A primeira é o Estado da Cidade, a menor nação soberana do mundo (120 acres) que emprega os guardas suíços protetores, administra os tribunais, fornece lojas para os funcionários e opera o Museu do Vaticano, o segundo lar mais visitado de tesouros artísticos depois do Louvre. Devido a fortes receitas de turistas que se reúnem para visitar as obras de Raphael e da Capela Sistina, e venda de souvenirs como moedas e selos especiais, o Estado da Cidade produz um superávit. É a segunda parte, a Santa Sé, que gasta muito mais em despesas operacionais do que coleta em receita recorrente.

A Santa Sé, ou Cúria, é a administração religiosa do papa que opera tudo, desde postos diplomáticos estrangeiros até 16 “dicastérios” ou departamentos semelhantes a gabinetes que abrangem a Secretaria de Estado e a comissão que conduz investigações para nomear santos. Ela coleta receita de hospitais e universidades, bem como pequenas contribuições do superávit do Estado da Cidade e do modesto portfólio de investimentos do Vaticano que inclui mais de 4.000 apartamentos principalmente perto de Roma que geram pouco lucro líquido devido a regulamentações de controle de aluguéis.

O Vaticano não publicou um orçamento completo desde 2022, mas as informações fragmentadas divulgadas do ano passado mostram um déficit da Santa Sé de US$ 83 milhões – as estimativas colocam o gasto total em cerca de US$ 3,5 bilhões.

Esse déficit vem depois que o Vaticano recebeu US$ 100 milhões do fundo Peter’s Pence, que coleta e investe contribuições dos fiéis de todo o mundo originalmente destinadas à caridade. O Vaticano aparentemente cobriu o déficit de mais de US$ 80 milhões vendendo imóveis.

Um problema que desencorajou potenciais doadores: na década de 2010, um grupo de financistas, corretores, banqueiros e analistas autoproclamados saqueou o Vaticano em um negócio imobiliário fraudulento em Londres, um golpe parcialmente orquestrado pela segunda pessoa em comando na Secretaria de Estado, o Cardeal Angelo Becciu.

O desastre altamente divulgado custou à Santa Sé cerca de US$ 150 milhões. Em um ponto, Becciu, que foi condenado e sentenciado à prisão pelo tribunal do Vaticano junto com vários outros réus, revelou que a Secretaria retirou os fundos das reservas do Peter’s Pence, em outras palavras, dinheiro fornecido por todos, desde católicos ricos até paroquianos comuns.

Em um espetáculo paralelo à eleição do Papa Leão XIV, Becciu, embora não tenha exatamente invadido o conclave, teve a audácia de declarar que gostaria de votar no próximo pontífice. Becciu, que manteve seu chapéu de cardeal enquanto está livre sob apelação, sucumbiu à ordem de Francisco de que ele não participasse e concordou em ficar de fora.

Em termos de dinheiro, o Papa Francisco marcou pontos ao trazer as finanças fragmentadas do Vaticano sob controle central e dar os principais cargos, incluindo a liderança de seu banco outrora notório, a gerentes profissionais. Mas ele falhou no orçamento e no plano de pensão do Vaticano. Ao desmantelar os feudos, Francisco deu ao seu sucessor as ferramentas para terminar o trabalho.

Um grande ponto positivo para o Papa Leão XIV: ele é um administrador extremamente experiente que gerenciou grandes organizações como Prior Geral da ordem agostiniana; como bispo de Chiclayo, uma cidade peruana de 700.000; e em seu papel mais recente como chefe do dicastério que supervisiona a seleção dos 5.500 bispos do mundo.

 

Papa Leão XIV é formado em Matemática

Leão também é um falante nativo de inglês, proporcionando uma vantagem em mobilizar americanos para abrir suas carteiras, e ele é fluente em espanhol e italiano também. Ele é formado em matemática pela Universidade Villanova fora da Filadélfia, e suas habilidades numéricas podem ser uma grande vantagem no enfrentamento da implosão. Em doutrina, a posição de Leão parece razoavelmente próxima à de Francisco. Leão é moderadamente conservador, um posicionamento que deve agradar aos membros mais tradicionais e convencionais da igreja. Ele se opõe fortemente ao aborto e ainda não expressou se endossa ou rejeita a decisão de Francisco de permitir que padres abençoem uniões do mesmo sexo.

O que é potencialmente problemático em termos de arrecadação de dinheiro nos EUA: as frequentes críticas do novo papa às políticas defendidas pelo Presidente Trump e pelo Vice-Presidente JD Vance. Em fevereiro, Prevost republicou em sua conta X um artigo de uma publicação católica intitulado “JD Vance estava errado: Jesus não nos pede para classificar nosso amor pelos outros” que criticava Vance. Como Prevost, o Papa Leão também marcou um artigo de um bispo de Washington, D.C., repreendendo Trump por seu tratamento de Kilmar Abrego Garcia, o residente de Maryland deportado para uma prisão notória em El Salvador. O irmão do pontífice, John, de Chicago, reforçou a percepção de que Leão XIV se opõe fortemente às políticas de imigração do presidente, afirmando em uma entrevista recente que “Eu sei com certeza que ele não está feliz com o que está acontecendo com a imigração. Ele não vai apenas sentar e ser o silencioso.”

Se o Papa Leão criticar as restrições de Trump à imigração, não está claro se ele perderá entusiastas ricos do MAGA (Make America Great Again) ou outros grandes potenciais contribuidores. Mas é altamente possível que o papa seja um fã muito maior do capitalismo do que seu antecessor e, se for, essa inclinação deve fornecer um plus para a arrecadação de fundos.

Em seus papéis anteriores, o futuro papa não tomou posição sobre os benefícios e deficiências do capitalismo, pelo menos em público. Ele serviu com sucesso sob presidentes marxistas e de direita no Peru como bispo, mas até agora não disse nada sobre quais sistemas econômicos ajudam ou prejudicam os pobres do mundo, cujo bem-estar, ele promete, é central para seu pontificado. As melhores pistas sobre suas visões podem ser encontradas nos ensinamentos de seu modelo, homônimo e o primeiro pontífice agostiniano, o Papa Leão XIII, que reinou de 1878 a 1903.

 

As visões do herói do novo Papa sobre o duelo entre capitalismo e socialismo

Em 1891, o Papa Leão XIII publicou uma famosa encíclica, ou guia, para os fiéis chamada Rerum Novaru (“Das Novas Coisas”) expressando suas visões sobre o duelo entre capitalismo e socialismo, e o que cada um significava para as classes trabalhadoras, à medida que a Revolução Industrial ganhava velocidade. O papa apoiou fortemente leis que protegem os direitos dos trabalhadores e defendeu o estabelecimento de sindicatos para substituir as “guildas de trabalhadores abolidas no século passado”. Mas ele se opôs a greves, acreditando que elas “colocam o público em perigo e incitam desordem”. Sobre mercados livres, ele soa notavelmente moderno e perspicaz. Ele denuncia o socialismo por “tirar a propriedade das mãos privadas”, acrescentando que ir para o coletivismo “distorceria as funções do estado e criaria confusão total na comunidade”.

Em seus escritos, Leão XIII afirma que “a propriedade privada está de acordo com as leis da natureza” e é “o direito natural do homem”, e que é “totalmente irracional pensar que ricos e pobres estão naturalmente em conflito”. Ele diz que trabalho e gestão devem “concordar livremente quanto aos salários”, acrescentando que o governo deve intervir apenas quando o pagamento ou as condições são flagrantemente injustos. A oportunidade de construir riqueza, ele acrescenta, é um grande motivador: “Os homens sempre trabalham mais e mais prontamente quando o que trabalham pertence a eles… [incentivando] a riqueza da comunidade que tira os pobres da pobreza.” Leão até rejeita impostos altos que roubam dos trabalhadores os frutos de seu trabalho.

Em muitos aspectos, os escritos do herói do novo papa equivalem a um manifesto capitalista modificado, temperado por um profundo humanismo. Se o Papa Leão XIV adotar a mesma mentalidade pública, ele tem uma chance muito maior de restaurar a estabilidade financeira e a reputação de uma das grandes instituições do mundo. Se ele desdenhar o sistema que criou a riqueza que o Vaticano deve aproveitar para evitar um cataclismo e restaurar sua missão de caridade para os pobres, ele pode seguir seus predecessores até o fracasso. Fonte: https://einvestidor.estadao.com.br

*Esta história foi originalmente publicada na Fortune.com (c.2024 Fortune Media IP Limited) e distribuída por The New York Times Licensing Group. O conteúdo foi traduzido com o auxílio de ferramentas de inteligência artificial e revisado por nossa equipe editorial. Saiba mais em nossa Política de IA. 

 

Na terça-feira, 13 de maio de 2025, o Santo Padre Leão XIV visitou a comunidade dos agostinianos da Cúria Geral.

Esta é a primeira vez desde sua eleição como Romano Pontífice, na última quinta-feira, 8 de maio, que ele retorna aos seus irmãos para celebrar a Santa Missa, compartilhar o almoço no refeitório e passar um tempo com o que até então era sua comunidade religiosa.

Sete dias atrás, na terça-feira, 6 de maio, o então cardeal Robert Francis Prevost passou algum tempo com a comunidade pela última vez antes de entrar no conclave.

Depois de rezar com eles, por eles e por todos os cardeais que tomariam a difícil decisão de eleger o sucessor de Pedro, ele deixou esta casa "com o hábito agostiniano"  e a vermelha cardinalícia, retornando exatamente uma semana depois vestido inteiramente de branco.

 

Celebração da Eucaristia em honra da Bem-Aventurada Virgem Maria, Mãe da Ajuda

Na liturgia do dia da Ordem, o Papa Leão XIV presidiu a celebração eucarística juntamente com os irmãos agostinianos. Esta memória representa uma antiga devoção que nasceu nos primeiros anos do século XIV na igreja de Santo Agostinho em Palermo e se espalhou por toda a Ordem.

"A paz esteja com você"

Em sua homilia, o Santo Padre começou com as mesmas palavras usadas para a bênção Urbi et Orbi  no dia de sua eleição: "A paz esteja convosco". Em seguida, ele destacou o papel missionário da Igreja e a necessidade de caminharmos juntos de maneira sinodal. Ele também enfatizou a importância da espiritualidade de comunhão, uma característica distintiva da herança de Santo Agostinho, que nos impele a avançar em unidade para transmitir a mensagem do Evangelho ao mundo.



Um retorno caloroso para casa

No refeitório, o Prior Geral , Padre Alejandro Moral Antón, dirigiu algumas palavras de boas-vindas ao Santo Padre. Durante seu discurso, ele destacou a plenitude de alegria  que somente Cristo ressuscitado pode oferecer; ao que agora se acrescenta a felicidade da sua eleição como Sumo Pontífice.

Lembrando-o das palavras de Cristo: "Tu es Petrus", ele lhe assegurou a oração, o apoio e a fraternidade incondicional da Ordem de Santo Agostinho em seu novo ministério. 

Por fim, o Padre Alejandro observou que, embora a Igreja universal tenha previsto a sede vacante, "agora somos nós que temos uma 'sede vacante' em nossa casa, em nossa capela e no refeitório, onde compartilhamos tantos momentos fraternos".

Vale destacar que, desde que o Papa Francisco o chamou a Roma para presidir o Dicastério dos Bispos, nomeando-o Prefeito, o Cardeal Prevost costumava celebrar diariamente a Eucaristia e participar da oração da manhã na Capela da Cúria Geral, compartilhando também o almoço com os irmãos desta casa.

"Foi um dia muito emocionante, pois nosso irmão retornou à comunidade para estar conosco novamente, compartilhando e aumentando nossa alegria."

 

“Dar a conhecer a magnífica herança espiritual de Santo Agostinho”

O Santo Padre, depois de felicitar dois irmãos que comemoram seus aniversários e dias de santo, respectivamente, encorajou os presentes a perseverarem na difusão da maravilhosa herança doutrinal e espiritual de Santo Agostinho.

Ele contou que ainda se lembra de algumas palavras que o Papa Bento XVI lhe dirigiu nos Jardins do Vaticano, quando ainda era Prior Geral, por ocasião da bênção de um mosaico dedicado à Virgem Maria, Mãe do Bom Conselho. Nessa circunstância, Bento XVI encorajou apaixonadamente os agostinianos a estudar, aprofundar e difundir o pensamento de Santo Agostinho.

Ecoando a exortação do Papa Bento XVI, o Papa Leão XIV destacou a importância do trabalho do Pontifício Instituto Patrístico Augustinianum, uma instituição acadêmica fundamental para promover esta missão. Fonte: https://www.augustinianorder.org

Família se revolta com padre flagrado embriagado após acidente em SJC

 

 

Foto: Reprodução / TV Câmara de Jacareí / Polícia Civil

A família de um homem de 55 anos, que continua internado em estado delicado, expressou indignação com a forma como a Diocese de São José dos Campos divulgou o acidente de trânsito envolvendo um padre, na noite da última segunda-feira (5). O episódio envolveu o padre Fábio Ferreira Costa. Ele tem 47 anos e atua como pároco da Paróquia São Benedito, localizada no bairro Alto da Ponte, na região norte da cidade. 

acidente aconteceu na Rodovia dos Tamoios, em São José dos Campos.  Segundo os familiares da vítima, o boletim publicado pela instituição religiosa minimiza a gravidade da situação e distorce os fatos.

De acordo com a filha do motorista ferido, o homem dirigia normalmente quando o “carro foi atingido na traseira com tanta força que capotou diversas vezes”. Durante o acidente, ele foi arremessado para fora do veículo pelo para-brisa. Uma testemunha ocular, que vinha logo atrás, teria afirmado que o carro conduzido pelo padre quase causou outra colisão segundos antes do impacto principal.

 

Vítima segue internada

O estado de saúde da vítima ainda inspira cuidados. Ele passou por cirurgia no tornozelo, está com pino na perna e apresenta escoriações por todo o corpo. Além disso, sofre com cortes profundos na testa e na nuca, fala com dificuldade devido aos medicamentos e sente tonturas com frequência. Conforme relatado pela filha, ele segue sob observação constante, com a realização de novos exames.

O boletim de ocorrência registrado pela Polícia Civil confirma que o padre estava ao volante do outro veículo envolvido e foi submetido ao teste do bafômetro. O resultado apontou 0,56 miligramas de álcool por litro de ar alveolar, quantidade considerada crime de trânsito. Ainda segundo o documento oficial, ele também não possuía habilitação.

Diante das evidências, o padre recebeu voz de prisão em flagrante por embriaguez ao volante, lesão corporal culposa e direção sem habilitação. Apesar da gravidade dos fatos, ele foi liberado após pagamento de fiança no valor de R$ 1 mil.

 

O que diz a Diocese – Flagrado embriagado

A Diocese de São José dos Campos afirmou, em nota oficial, que o religioso não estava embriagado e que ele apenas se envolveu em um acidente que já teria ocorrido momentos antes. Segundo o comunicado, o padre trafegava pela rodovia quando se deparou com um carro capotado e, por conta da baixa iluminação e da falta de sinalização no local, acabou colidindo com o veículo. A Diocese também destacou que o padre permaneceu no local e cooperou com as autoridades.

A reportagem da CBN Vale procurou a Diocese para saber se o padre continuará atuando normalmente ou se será afastado durante as investigações, mas até o fechamento desta matéria não houve resposta.

 

Nota da Diocese de São José dos Campos – Flagrado

“A Diocese de São José dos Campos, vem por meio desta, esclarecer, um acidente que um padre da Diocese de São José dos Campos se envolveu na última segunda-feira (5).

Informamos que o padre estava trafegando normalmente quando se deparou com um carro capotado na pista. Pela baixa luminosidade e falta de sinalização do carro e do local, acabou se envolvendo neste acidente que já tinha acontecido alguns momentos antes. Tanto é que a vítima do carro capotado não estava dentro do veículo, mas no gramado fora da pista. Todavia o padre se colocou à disposição para as necessidades e aguardou no local as autoridades competentes e chegada do socorro médico.

Sobre o que está sendo veiculado da embriaguez ao volante, o padre não se recusou a assoprar o bafômetro pela consciência tranquila em não estar

embriagado, porém a avaliação coube as autoridades competentes.

A Diocese e o jurídico está acompanhando o caso que agora segue em tramitação na justiça.” Fonte: https://www.cbnvale.com.br

Religioso foi hospitalizado na semana passada após picos de pressão alta

 

Cônego Eronildo Manoel da Cruz foi encontrado morto dentro de cisterna - Foto: Arquivo pessoal

 

Por Portal Folha de Pernambuco

A cidade no Agreste de Pernambuco, amanheceu de luto. Nesta segunda-feira (12), o cônego Eronildo Manoel da Cruz, de 60 anos, que era vigário Episcopal para a Vida Consagrada e diretor do Instituto de Teologia São João Crisóstomo, foi encontrado sem vida dentro da cisterna de sua residência, no bairro de Indianópolis. 

Por meio de nota, a Diocese de Caruaru revelou que o religioso havia sido hospitalizado na semana passada e que é provável que a causa da morte tenha sido um mal súbito. 

 

"Informamos que, na semana passada, o padre havia procurado atendimento hospitalar após picos de pressão alta. Na ocasião, foi acompanhado pelo Padre José Valter, recebeu medicação e foi orientado a procurar um cardiologista para avaliação mais aprofundada", iniciou a diocese. 

"Desde então, encontrava-se em acompanhamento. Lamentavelmente, foi encontrado sem vida na data de hoje. Tudo indica que ele teve um mal súbito, a ser ainda confirmado pela necrópsia", finalizou a instituição. O velório acontecerá na Paróquia Nossa Senhora do Rosário. 

 

 A Polícia Civil de Pernambuco registrou o caso por meio da 14ª Delegacia e informou que investigações do caso já foram iniciadas. 

A Polícia Civil de Pernambuco informa que registrou no dia 12 de maio, por meio da 14ª Delegacia Seccional - Caruaru, a ocorrência de morte a esclarecer. De acordo com relatos, um homem de 60 anos foi encontrado sem vida dentro da cisterna de sua residência, no bairro de Indianópolis, em Caruaru. As investigações foram iniciadas e seguem em andamento até a completa elucidação do caso. Fonte: https://www.folhape.com.br

Obra acompanha família sem teto em Los Angeles e seu resgate por organização religiosa

 

Juliano Spyer

Antropólogo e historiador, autor de 'Crentes' (Record) e 'Povo de Deus' (Geração), pesquisa cristianismo, mundo popular, mídias digitais e esportes de combate

Uma mãe jovem, com cinco filhos, mora em uma cidade empobrecida da Califórnia. À medida que seu filho mais velho avança na educação formal, ela percebe que a escola não o levará para a universidade, mas para o crime e/ou a drogadição. Então, decide mudar o rumo da família.

O novo papa, americano e sensível ao tema das desigualdades, se interessará pelo livro "Seeking Shelter: A Working Mother, Her Children, and a Story of Homelessness in America" (Em busca de abrigo: uma mãe trabalhadora, seus filhos e uma história de pessoas sem teto nos Estados Unidos), do escritor Jeff Hobbs, publicado no início deste ano.

A protagonista decide mudar a família para um bairro de Los Angeles onde a escola pública tem melhor qualidade. Mas comete um erro de cálculo e, pelos cinco anos seguintes, ela e as cinco crianças, de dois a 11 anos, viverão nas ruas ou em abrigos provisórios. A partir dessa experiência, o leitor é apresentado ao tema da desigualdade nos EUA e convidado a refletir sobre como lidar com o problema dos moradores de rua nas grandes cidades.

Embora se passe em Los Angeles, cidade do cinema, o livro não conta uma história espetacular, mas algo comum e banal, sem promessa de final feliz. E o autor não molda seus personagens em uma narrativa de superação —tão típica do rótulo hollywoodiano. É a história de uma mãe que se divide entre os empregos possíveis e o esforço para proteger os filhos.

O autor mostra como um texto seco, sem sentimentalismos, quase exclusivamente descritivo e factual, pode produzir uma história de suspense. Fui fisgado desde o início pela maneira crua e direta com que ele conta os desafios cotidianos dessa família.

Nem jornalismo nem literatura nem sociologia: o livro escapa desses gêneros e, ao mesmo tempo, carrega o melhor de cada um.

Da sociologia, herda o interesse em examinar um caso com sobriedade e método. Do jornalismo, o desejo de abordar temas atuais da sociedade. E da literatura, a disposição para contar uma história. A leitura flui sem a interrupção de citações; as frases são simples, diretas e livres de jargão.

O autor entrega duas reflexões. A primeira é mostrar que não são apenas pessoas com transtornos psiquiátricos ou drogaditos que vivem essa experiência. É a mesma temática, por exemplo, do filme britânico "Eu, Daniel Blake", sobre um aposentado que, por um problema burocrático, quase é despejado.

A outra mensagem é sobre a solução que funciona melhor para reintegrar quem passou pela experiência de viver nas ruas.

Organizações bem-sucedidas têm, entre outras características, vínculo religioso. Pense na atuação do padre Júlio Lancellotti em São Paulo. Além disso, essas instituições atendem poucas famílias, garantindo que o acompanhamento —com treinamentos e assistência— continue mesmo depois de a família se reestabelecer.

O cristianismo aparece de modo discreto, sem proselitismo nem autopromoção. Por isso, não me surpreenderia se Leão 14 o recomendasse também ao vice-presidente J.D. Vance, católico como ele e que escreveu um ótimo livro sobre o descaso do Estado pelos pobres nos EUA. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

Aline Ghammachi liderava mosteiro na Itália até ser acusada de maus-tratos e manipulação; agora ela quer recorrer a Leão 14

 

Chico Felitti

Cartagena (Colômbia)

Nos 18 dias entre a morte do papa Francisco e a eleição do papa Leão 14, uma religiosa brasileira passou a viver na Itália uma história que parece ter saído de um romance de Dan Brown, autor de "O Código da Vinci". Foi deposta do seu alto cargo na Igreja após ser denunciada ao papa em uma carta anônima. E sua saída causou a debandada de mais onze freiras, deixando o monastério pela metade. Agora, essa freira brasileira afirma que vai lutar por justiça.

Até o dia da morte de Francisco, Aline Pereira Ghammachi era madre-abadessa do Mosteiro San Giacomo di Veglia, uma construção de pedra centenária que fica perto de Veneza. Nascida no Amapá e formada em administração de empresas, irmã Aline dedicou sua vida à religião. Foi tradutora de documentos sigilosos e intérprete de eventos da Igreja. Até que, em fevereiro de 2018, foi indicada para chefiar o mosteiro. Tinha 33 anos e era a madre-abadessa mais jovem da Itália.

A comunidade que encabeçava tinha pouco mais de 20 religiosas. Desde que Aline assumiu o lugar, as freiras abriram as portas para a comunidade: passaram a oferecer auxílio para mulheres vítimas de violência e criaram uma horta comunitária para pessoas com autismo, além de plantarem uvas para a produção de prosecco.

Até que, dois anos atrás, irmã Aline foi denunciada em uma carta anônima que foi enviada ao papa Francisco. "Disseram que eu destratava e manipulava as irmãs." A denúncia anônima também afirmava que Aline ocultava o orçamento do mosteiro. Após a carta chegar a Francisco, começou uma auditoria do mosteiro. A primeira inspeção foi em 2023. Durou semanas e, após ela, sugeriu-se que o caso fosse arquivado, em um documento a que

Mas o caso foi reaberto meses depois. "Acredito que tenha sido a pedido de frei Mauro Giuseppe Lepori", diz a freira. Lepori é abade-chefe da ordem que dirige o mosteiro, e Aline havia trabalhado com ele por anos. "Ele dizia que eu era bonita demais para ser abadessa, ou mesmo para ser freira. Falava em tom de piada, rindo, mas me expôs ao ridículo."

Em 2024, o Vaticano mandou outra visitadora apostólica até o mosteiro. "Ela não fez nenhum teste conosco, não fez absolutamente nada, apenas teve uma conversa. E chegou à conclusão de que eu era uma pessoa desequilibrada e que as irmãs tinham medo de mim."

Quase um ano depois da visita, enquanto o papa Francisco convalescia, irmã Aline ficou sabendo da decisão: ela havia perdido seu cargo, e uma nova madre-abadessa assumiria a comunidade.

A nova abadessa, de 81 anos, chegou no dia da morte do papa argentino. Afirmou que estava lá em nome dele, inclusive. "Isso aconteceu num dia de luto para a Igreja, e num dia em que nós não poderíamos recorrer a ninguém. Chega essa comissária e se diz representante de uma pessoa que não existe mais."

Aline afirma ter ouvido que precisaria sair do mosteiro e ficar isolada em outra comunidade católica. "Disseram que eu teria de fazer um caminho de amadurecimento psicológico."

Ela não aceitou a mudança. "Primeiro, porque eu não sabia a razão de ter sido mandada embora do mosteiro. E segundo porque não existiu uma denúncia formal ou um julgamento."

Aline partiu do Mosteiro San Giacomo di Veglia no dia 28 de abril, uma semana após a morte do papa. No dia seguinte, cinco irmãs fugiram do mosteiro e foram até uma delegacia de polícia da cidade. Afirmavam que foram embora só com o hábito do corpo, sem levar os próprios documentos, por não aguentar a pressão que se criou no lugar com a intervenção. Outras freiras e noviças também deixaram a comunidade desde então. Onze das 22 mulheres que viviam no mosteiro saíram desde que irmã Aline se foi. "As que ficaram são as irmãs anciãs, de 85 anos, 88 anos", diz a brasileira.

Uma das freiras que fugiu se manifestou publicamente para defender a ex-abadessa brasileira. "Foi inaugurado um tratamento medieval, um clima de calúnias e acusações infundadas contra a irmã Aline que, por sua vez, é uma pessoa muito séria e escrupulosa e que nos últimos anos se tornou o ponto de referência para a comunidade", disse a freira Maria Paola Dal Zotto ao jornal Gazzettino.

A Igreja não se pronuncia sobre o caso. Mas frei Mauro Giuseppe Lepori comentou os acontecimentos com o jornal. Lepori escreveu em uma mensagem: "A ex-abadessa está se libertando, acreditando que pode recuperar o poder e a vaidade por meio de mentiras e manipulação da mídia".

Desde que saiu do mosteiro, Aline passou alguns dias na casa da sua irmã (de sangue) em Milão e, na semana do conclave, foi até o Vaticano, para tentar recorrer do que considera uma injustiça. "Eu não tive direito de defesa. Fui colocada para fora do mosteiro, sem motivação. Estamos até recorrendo no Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica. Por que aconteceu? Porque eu sou mulher, porque eu sou jovem e porque, principalmente nesse contexto, sou brasileira."

O caso ganhou as manchetes da imprensa italiana. A RAI, um dos principais canais de televisão da Europa, fez uma reportagem especial sobre o tema. Um repórter foi até a região e entrevistou moradores. A chamada da matéria era: "Freira em fuga: bela demais para ser abadessa?". O jornal Corriere del Veneto noticiou na última quarta-feira (7) que uma produtora audiovisual da Alemanha já planeja transformar essa história em um filme.

Irmã Aline diz que sua aparência não deveria ser um fator levado em conta numa questão profissional. Mas concorda que sua origem, sua idade e mesmo sua feição podem ter tido peso nessa história. "Aí mostra a questão sexista, machista. Porque uma pessoa jovem e bonita deve ser burra. Não pode ser inteligente, tem que ficar calada."

Ela afirma que não vai se calar. Nem parar de trabalhar. Um benfeitor do mosteiro colocou à disposição das irmãs uma villa, uma mansão onde as freiras que fugiram vão poder continuar seu serviço social. No dia em que o novo papa foi eleito, irmã Aline falou à Folha. Estava a caminho do novo abrigo, que precisa ser mobiliado antes de ser aberto para a comunidade. Ela ainda não se reencontrou com as outras irmãs que saíram do mosteiro.

Mesmo que as 11 freiras em fuga sigam sua obra, elas vão ter de se afastar do cargo. "Infelizmente, vai haver uma ruptura. Nós vamos ter que pedir a dispensa de votos, que é uma obrigação canônica, mas queremos continuar nossa vida de trabalho e de oração. Nós amamos a Igreja. Vamos começar do zero. Mas com uma visão de futuro, de talvez começar de novo, em outra congregação".

A freira brasileira vê com bons olhos a eleição de Leão 14 como papa. "Eu acredito que seja positivo, porque ele luta pelos direitos humanos. E ele é um papa canonista, ou seja, é formado em direito canônico. Então, ele vai entender a lei. Isso para mim já fala muito. Eu não estou pedindo nada mais do que a lei." Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

 

1) Oração

Concedei, ó Deus todo-poderoso, que, celebrando o mistério da ressurreição do Senhor, possamos acolher com alegria a nossa redenção. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

 

2) Leitura do Evangelho (João 10, 22-30)

Naquele tempo, 22Em Jerusalém celebrava-se a festa da Dedicação. Era inverno. 23Jesus andava pelo templo, no pórtico de Salomão. 24Os judeus, então, o rodearam e disseram-lhe: “Até quando nos deixarás em suspenso? Se tu és o Cristo, dize-nos abertamente!” 25Jesus respondeu: “Eu já vos disse, mas vós não acreditais. As obras que eu faço em nome do meu pai dão testemunho de mim. 26Vós, porém, não acreditais, porque não sois das minhas ovelhas. 27As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem. 28Eu lhes dou a vida eterna. Por isso, elas nunca se perderão e ninguém vai arrancá-las da minha mão. 29Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior do que todos, e ninguém pode arrancá-las da mão do Pai. 30Eu e o Pai somos um”.

 

3) Reflexão

Os capítulos 1 a 12 do evangelho de João são chamados “O Livro dos Sinais”. Neles acontece a revelação progressiva do Mistério de Deus em Jesus. Na mesma medida em que Jesus vai fazendo a revelação, crescem a adesão e a oposição a ele de acordo com a visão com que cada um espera a chegada do Messias. Esta maneira de descrever a atividade de Jesus não é só para informar como a adesão a Jesus acontecia naquele tempo, mas também e sobretudo como ela deve acontecer hoje em nós, seus leitores e suas leitoras. Naquele tempo, todos esperavam a chegada do Messias e tinham os seus critérios para poder reconhecê-lo. Queriam que ele fosse do jeito que eles o imaginavam. Mas Jesus não se submete a esta exigência. Ele revela o Pai do jeito que o Pai é e não do jeito que o auditório o gostaria. Ele pede conversão no modo de pensar e de agir.  Hoje também, cada um de nós tem os seus gostos e preferências. Às vezes, lemos o evangelho para ver se encontramos nele a confirmação dos nossos desejos. O evangelho de hoje traz uma luz a este respeito.

João 10,22-24: Os Judeus interpelam Jesus.  Era frio. Mês de outubro. Festa da dedicação que celebrava a purificação do templo feita por Judas Macabeu (2Mc 4,36.59). Era uma festa bem popular de muitas luzes. Jesus anda na esplanada do Templo, no Pórtico de Salomão. Os judeus o questionam: "Até quando nos irás deixar em dúvida? Se tu és o Messias, dize-nos abertamente". Eles querem que Jesus se defina e que eles possam verificar, a partir dos critérios deles, se Jesus é ou não é o Messias. Querem provas. É a atitude de quem se sente dono da situação. Os novatos devem apresentar suas credenciais. Do contrário não terão direito de falar e de atuar.

João 10,25-26: Resposta de Jesus: as obras que faço dão testemunho de mim.  A resposta de Jesus é sempre a mesma: "Eu já disse, mas vocês não acreditam em mim. As obras que eu faço em nome do meu Pai, dão testemunho de mim; vocês, porém, não querem acreditar, porque vocês não são minhas ovelhas”. Não se trata de dar provas. Nem adiantaria. Quando uma pessoa não quer aceitar o testemunho de alguém, não há prova que o leve a pensar diferente. O problema de fundo é a abertura desinteressada da pessoa para Deus e para a verdade. Onde houver esta abertura, Jesus é reconhecido pelas suas ovelhas. “Quem é pela verdade escuta minha voz” dirá Jesus mais adiante a Pilatos (Jo 18,37). Esta abertura estava faltando nos fariseus.

João 10,27-28: As minhas ovelhas conhecem minha voz.  Jesus retoma a parábola do Bom Pastor que conhece suas ovelhas e é conhecido por elas. Este mútuo entendimento  -  entre Jesus que vem em nome do Pai e as pessoas que se abrem para a verdade  -  é fonte de vida eterna. Esta união entre o criador e a criatura através de Jesus supera a ameaça da morte: “Elas jamais perecerão e ninguém as arrebatará de minha mão!” Estão seguras e salvas e, por isso mesmo, em paz e com plena liberdade.

João 10,29-30: Eu e o Pai somos um.  Estes dois versículos abordam o mistério da unidade entre Jesus e o Pai: “Meu Pai, que tudo entregou a mim, é maior do que todos. Ninguém pode arrancar coisa alguma da mão do Pai. O Pai e eu somos um”. Esta e várias outras frases nos deixam entrever algo deste mistério maior: “Quem vê a mim vê o Pai” (Jo 14,9). “Eu estou no Pai e o Pai está em mim” (Jo 10,38). Esta unidade entre Jesus e o Pai não é automática, mas é fruto da obediência: “Eu sempre  faço o que o Pai me mostra que é para fazer” (Jo 8,29; 6,38; 17,4). “Meu alimento é fazer a vontade do Pai (Jo 4,34; 5,30). A carta aos hebreus diz que Jesus teve que aprender, através do sofrimento, o que é ser obediente (Hb 5,8). “Ele foi obediente até à morte, e morte de Cruz” (Fl 2,8). A obediência de Jesus não é disciplinar, mas é profética. Ele obedece para ser total transparência e, assim, ser revelação do Pai. Por isso, ele podia dizer: “Eu e o pai somos um!” Foi um longo processo de obediência e de encarnação que durou 33 anos. Começou com o Sim de Maria (Lc 1,38) e terminou com “Tudo está consumado!” (Jo 19,30).

 

4) Para um confronto pessoal

 1) Minha obediência a Deus é disciplinar ou profética? Revelo algo de Deus ou só me preocupa com a minha própria salvação?

2) Jesus não se submeteu às exigências dos que queriam verificar se ele era mesmo o messias. Existe em mim algo desta atitude dominadora e inquisidora dos adversários de Jesus?

 

5) Oração final

Deus tenha pena de nós e nos abençoe, faça brilhar sobre nós a sua face. para que se conheça na terra o teu caminho, entre todos os povos a tua salvação. (66, 2-3)

Com eleitorado formado basicamente por indicados por Francisco, Robert Prevost, o cardeal de duas Américas, emergiu rapidamente no conclave

Prefeito do Dicastério para os Bispos, ele é o primeiro pontífice norte-americano e foi missionário no Peru

 

CIDADE DO VATICANO — Os cardeais que elegeram um novo papa para liderar a Igreja Católica saíram da Capela Sistina exaustos e famintos.

Uma meditação para iniciar o conclave se prolongou e empurrou sua primeira votação até bem para dentro da noite de quarta-feira, 7. O resultado foi uma contagem inconclusiva, com três principais concorrentes. Mantendo seu voto de segredo, eles retornaram para a Casa Santa Marta, a casa de hóspedes onde estavam isolados sem seus telefones, e começaram a conversar.

Durante o jantar, enquanto um cardeal celíaco selecionava seus vegetais e outros davam de ombros para a comida simples, eles ponderaram suas escolhas. O cardeal Pietro Parolin, de 70 anos, o italiano que comandava o Vaticano sob o papa Francisco, havia entrado no conclave como favorito, mas não recebeu apoio esmagador na votação.

Os italianos estavam divididos, e alguns dos cardeais na sala estavam incomodados por sua falha em enfatizar as reuniões colaborativas que Francisco priorizou para governar a igreja.

O cardeal Peter Erdo, da Hungria, de 72 anos, apoiado por uma coalizão de conservadores que incluía alguns apoiadores africanos, não teve como construir um clima a seu favor, em um eleitorado amplamente nomeado por Francisco.

Isso deixou o Cardeal Robert Francis Prevost, 69, um americano calado e um azarão surpreendente que havia emergido na votação da noite como uma fonte de interesse particular.

Missionário transformado em líder de ordem religiosa, transformado em bispo peruano, transformado em jogador de poder do Vaticano, ele preenchia muitos dos requisitos que uma ampla gama de cardeais esperava completar. Sua aparente capacidade de ser de dois lugares ao mesmo tempo — América do Norte e do Sul — agradou cardeais de dois continentes. À medida que os prelados sondavam os cardeais latino-americanos que o conheciam bem, eles gostaram do que ouviram.

Durante o jantar, Prevost evitou qualquer politicagem ou maquinação óbvia, disseram os cardeais. Até a manhã seguinte, ele havia se transformado em um fenômeno inesperado que, no fim das contas, deixou pouco espaço para candidaturas rivais e campos ideológicos.

“Você começa a ver a direção e diz, ‘Nossa senhora, não vou usar minhas roupas de cinco dias’”, brincou o Cardeal Pablo Virgilio Siongco David das Filipinas. “Vai ser resolvido muito rápido.”

Entrevistas com mais de uma dúzia de cardeais, que só podiam revelar até certo ponto por causa das regras de sigilo que carregam a pena de excomunhão, e relatos de insiders do Vaticano contaram a história de como Prevost se tornou o Papa Leão XIV. O consenso rápido, impressionante e que quebrou tabus em torno de um americano desconhecido para muitos de fora da igreja surgiu na quinta-feira, 8, entre um Colégio de Cardeais difícil de manejar com muitos novos membros que não se conheciam. Tinham interesses, línguas e prioridades diferentes, mas uma única escolha.

 

A construção do apoio

Após a morte de Francisco em 21 de abril, cardeais de todo o mundo começaram a chegar em Roma. Eles se juntaram a poderosos jogadores no Vaticano que comandavam a burocracia da igreja, incluindo Prevost, cuja carreira Francisco havia impulsionado.

Apesar de seu entendimento íntimo do Vaticano, Prevost ainda estava entre os novatos, tendo sido cardeal por nem mesmo dois anos. Ele tinha perguntas sobre o conclave.

Prevost recorreu a um dos supostos favoritos, o Cardeal Luis Antonio Gokim Tagle das Filipinas, em busca de ajuda.

“‘Como isso funciona?’” o americano disse, de acordo com Tagle, que contou a conversa. “Eu tinha experiência em um conclave,” disse Tagle, “e ele não tinha.”

Ao contrário de Tagle, ele também não tinha o reconhecimento de nome considerado necessário em uma eleição entre tantos novos cardeais que mal se conheciam. Sem um perfil alto ou base de apoio óbvia, o graduado pela Villanova University, nascido em Chicago, moveu-se sob o radar.

“Eu nem sabia o nome dele,” disse David das Filipinas.

Mas Prevost não era um completo desconhecido. Como ex-líder da Ordem de Santo Agostinho, que opera em todo o mundo, e como chefe do escritório do Vaticano supervisionando os bispos do mundo, ele havia desenvolvido conexões poderosas e apoiadores. O primeiro entre eles havia sido Francisco, que colocou sua carreira na via rápida. E suas décadas no Peru, espanhol fluente e liderança da Comissão Pontifícia para a América Latina lhe deram relações profundas e decisivas no continente.

“Quase todos nós o conhecemos. Ele é um de nós,” disse o Cardeal Baltazar Enrique Porras Cardozo, da Venezuela, que o conhece há décadas.

Nas semanas antes do conclave, os cardeais participaram de uma série de reuniões privadas para discutir suas preocupações sobre o futuro da igreja. Ao contrário de Francisco, que marcou sua presença com um discurso curto compartilhando sua visão para a igreja, vários cardeais disseram que os comentários de Prevost não se destacaram. “Como todos os demais”, disse o Cardeal Juan José Omella Omella, da Espanha.

O Cardeal Jean-Paul Vesco, da França, o arcebispo de Argel, também não conseguia se lembrar do que o americano havia dito, mas conseguiu falar com ele à margem das reuniões — o que foi importante, disse ele, porque ele estava sendo cada vez mais mencionado como um candidato com base em seu currículo “incrível”, italiano fluente, reputação de moderado e conexão com Francisco. O cardeal começou a perguntar às pessoas que haviam trabalhado com o americano para avaliá-lo, e aprendeu que ele ouvia e trabalhava bem em grupos. “Fiz meu trabalho,” disse Vesco. “Eu tenho de votar. Eu tenho que conhecer a pessoa.”

O Cardeal Wilton Gregory, dos Estados Unidos, também disse que Prevost havia se engajado “bastante eficazmente” nas discussões em grupo menor com cardeais.

Esses ambientes mais íntimos jogaram a favor de Prevost, pois ele havia ganhado reputação em Roma como um colaborador estudiosamente preparado, colegiado e organizado, especialmente como chefe de um departamento importante do Vaticano.

“Eu simplesmente admiro a maneira como ele conduz uma reunião,” disse o Cardeal Blase J. Cupich, de Chicago, sua cidade natal. “Quero dizer, isso é difícil de fazer, quando você tem pessoas de diferentes grupos linguísticos e culturas, e você está tentando aconselhar um papa sobre quem deveria ser um bispo, e você está ouvindo todas essas pessoas.”

No sábado, 3 de maio, cinco dias antes do conclave, os cardeais foram sorteados e atribuíram funções-chave. Com 127 dos 133 que votaram finalmente presentes, Prevost foi escolhido para ajudar na condução das reuniões diárias antes de serem isolados e começarem a votação.

À medida que as diferentes facções discutiam nessas reuniões diárias sobre a futura direção da igreja, os cardeais das Américas pareciam se unificar em torno dele.

O Cardeal Timothy M. Dolan, de Nova York, uma figura franca e extrovertida, disse que tentou conhecer melhor seu colega americano durante um café da manhã.

O Cardeal Gerhard Ludwig Müller, da Alemanha, notou uma base eleitoral que parecia estar se formando, dizendo, “É um bom número de cardeais da América do Sul e América do Norte.”

Porras, da Venezuela, disse que os cardeais da América Latina e dos Estados Unidos pareciam estar na mesma página sobre Prevost. “Quando você tem amizade primeiro”, ele disse, “tudo é mais fácil.”

Quanto mais os cardeais aprendiam sobre Prevost, mais eles gostavam, disseram os religiosos. “Bob, isso poderia ser proposto a você,” o Cardeal Joseph W. Tobin de Newark, Nova Jersey, contou que disse a Prevost logo antes do conclave começar.

Prevost tinha muito da experiência que eles estavam procurando, disse o Cardeal Vincent Nichols, da Inglaterra. Ele tinha o coração de um missionário, profundidade acadêmica e conhecimento do mundo. Ele havia comandado uma diocese como bispo, o que o colocou em contato próximo com os paroquianos, mas também havia trabalhado na Cúria, a burocracia romana que ajuda a governar a Igreja.

Não escapou aos cardeais, Nichols disse, que Parolin, o principal diplomata do Vaticano, que estava sendo promovido por seus apoiadores dentro e fora do conclave, tinha experiência profunda apenas na burocracia da igreja.

“Nós não somos estúpidos”, ele disse.

 

Rápida mudança

Na quarta-feira, 7, após uma longa e solene procissão até a Capela Sistina, os cardeais se reuniram em seus assentos designados e fizeram seus votos. Pouco antes das 18h, as portas se fecharam para o início do conclave.

A meditação no início, comentários sobre a gravidade da tarefa em mãos, durou cerca de uma hora. Foi tão longa que Parolin, que estava conduzindo o conclave, perguntou se eles queriam encerrar por ali e adiar a primeira votação para a manhã seguinte.

“Não tivemos jantar, e também não houve intervalos — nem para ir ao banheiro”, disse David das Filipinas, mas o grupo decidiu que queria uma votação.

À medida que a votação começou por volta das 19:30, o atraso, sem explicação para o mundo externo, causou agitação entre as multidões que esperavam. Parecia, talvez, que os cardeais já haviam escolhido um papa que estava se vestindo para sair na varanda.

Em vez disso, a primeira votação naquela noite resultou no que Omella, da Espanha, chamou de “uma espécie de pesquisa preliminar.”

“Na primeira votação, houve vários candidatos que ganharam votos significativos,” disse o Cardeal Lazarus You Heung-sik, da Coreia do Sul, segundo a agência de notícias sul-coreana Yonhap. Insiders do Vaticano disseram que esses candidatos incluíam Parolin, Erdo e Prevost.

Foi quando os cardeais retornaram à casa de hóspedes e começaram a discutir os pontos fortes e fracos de cada um deles.

“Uma vez que em Santa Marta, houve conversa sobre candidatos individuais”, Nichols, da Inglaterra, disse. “É isso que se supõe fazer.”

Müller, da Alemanha, um crítico conservador destacado de Francisco que o falecido papa havia demitido de sua posição como chefe do oficial doutrinário da Igreja, disse ter falado com os latino-americanos sobre Prevost e foi informado que ele “não era divisivo.”

O clima favorável a Prevost parecia estar crescendo. A eleição estava chegando até ele.

As votações da manhã seguinte — a segunda e terceira do conclave — esclareceram o panorama.

“Na quarta votação, os votos mudaram esmagadoramente” para Prevost, disse You, da Coreia do Sul.

Müller sentou-se atrás do favorito americano na Capela Sistina e percebeu que ele parecia calmo. Tagle, que se sentou ao lado de Prevost, notou que ele respirava fundo à medida que os votos se acumulavam a seu favor.

“Eu perguntei a ele, ‘Você quer um doce?’ e ele disse ‘Sim’”, disse Tagle.

Durante uma das votações, Tobin, enquanto segurava sua cédula alto e a colocava na urna, virou-se e viu Prevost, a quem conhecia há cerca de 30 anos.

“Eu olhei para o Bob”, disse Tobin, de Nova Jersey, “e ele estava com a cabeça entre as mãos.”

Posteriormente, na parte da tarde, eles votaram novamente, e então contaram as cédulas uma a uma. Quando Prevost atingiu 89 votos, o limiar da maioria de dois terços necessário para se tornar papa, a sala irrompeu em uma ovação de pé. “E ele permaneceu sentado!” disse David. “Alguém teve que puxá-lo para cima. Todos nós ficamos com lágrimas nos olhos.”

À medida que a contagem continuava e os votos para Prevost se aproximavam dos três dígitos, Parolin teve que pedir para que se sentassem para que pudessem terminar.

“Ele obteve uma maioria muito, muito grande dos votos”, disse o Cardeal Désiré Tsarahazana, de Madagascar.

Após sua eleição, os cardeais felicitaram entusiasticamente o novo papa. Um conclave curto e sem contendas estava encerrado e Leão XIV atravessou as cortinas carmesim para a varanda da Basílica de São Pedro e para o palco mundial.

Tagle, o outrora favorito que dias antes havia sido questionado pelo americano sobre as regras, lhe disse: “‘Se há algo que você quer mudar sobre as regras do conclave — está tudo em suas mãos agora.’”.  Fonte: https://www.estadao.com.br

"Dou-lhes as boas-vindas, representantes da mídia de todo o mundo. Agradeço o trabalho que realizaram e realizam neste tempo que, para a Igreja, é essencialmente um tempo de Graça", disse o Papa Leão XIV durante o encontro com a imprensa mundial.

 

Mariangela Jaguraba – Vatican News

O Papa Leão XIV encontrou-se, nesta segunda-feira (12/05), na Sala Paulo VI, no Vaticano, com a imprensa mundial.

Dou-lhes as boas-vindas, representantes da mídia de todo o mundo. Agradeço o trabalho que realizaram e realizam neste tempo que, para a Igreja, é essencialmente um tempo de Graça.

Depois dessas palavras de boas-vindas no início de seu discurso, Leão XIV prosseguiu, citando o “Sermão da Montanha”, no Evangelho de Mateus, em que Jesus proclamou: “Felizes os que promovem a paz”.

 

O modo como comunicamos é de fundamental importância

Segundo o Pontífice, esta é uma bem-aventurança que nos interpela a todos e chama quem trabalha nos meios de comunicação "ao compromisso de levar adiante uma forma de comunicação diferente, que não busque o consenso a todo custo, não se revista de palavras agressivas, não abrace o modelo da competição, não separe nunca a busca da verdade do amor com que devemos humildemente buscá-la".

“A paz começa em cada um de nós: no modo como olhamos os outros, ouvimos os outros, falamos dos outros. Neste sentido, o modo como comunicamos é de fundamental importância: devemos dizer “não” à guerra das palavras e das imagens, devemos rejeitar o paradigma da guerra.”

 

A solidariedade da Igreja aos jornalistas presos

A seguir, Leão XIV reiterou "a solidariedade da Igreja aos jornalistas presos por terem buscado e relatado a verdade", pedindo sua libertação.

“A Igreja reconhece nestas testemunhas, penso naqueles que relatam a guerra mesmo à custa da própria vida, a coragem de quem defende a dignidade, a justiça e o direito dos povos à informação, porque só os povos informados podem fazer escolhas livres. O sofrimento destes jornalistas presos interpela a consciência das Nações e da Comunidade internacional, chamando-nos a todos a salvaguardar o bem precioso da liberdade de expressão e de imprensa.”

 

Agradecimento pelo "serviço à verdade"

A seguir, Leão XIV agradeceu aos jornalistas pelo seu "serviço à verdade".

 

“Vocês estiveram em Roma nestas semanas para contar a Igreja, a sua variedade e, ao mesmo tempo, a sua unidade. Vocês acompanharam os ritos da Semana Santa; depois, contaram a história da dor pela morte do Papa Francisco, que, no entanto, ocorreu à luz da Páscoa. Essa mesma fé pascal nos introduziu no espírito do Conclave, que os viu particularmente ocupados em dias cansativos; e, também nessa ocasião, vocês conseguiram narrar a beleza do amor de Cristo que nos une a todos e nos torna um só povo, guiados pelo Bom Pastor.”

 

Uma comunicação capaz de nos tirar da “Torre de Babel” 

Leão XIV recordou, em seu discurso, que "vivemos tempos difíceis de percorrer e contar, que são um desafio para todos nós e dos quais não devemos fugir. Pelo contrário, pedem a cada um de nós, em nossos diferentes papéis e serviços, para nunca ceder à mediocridade. A Igreja deve aceitar o desafio dos tempos e, da mesma forma, não pode haver comunicação e jornalismo fora do tempo e da história. Como nos lembra Santo Agostinho, que disse: «Vivamos bem e os tempos serão bons. Nós somos os tempos»".

Segundo o Papa Leão XIV, "um dos desafios mais importantes hoje é promover uma comunicação capaz de nos tirar da “Torre de Babel” em que às vezes nos encontramos, da confusão de linguagens sem amor, muitas vezes ideológicas ou tendenciosas. Por isso, o seu serviço, com as palavras que vocês usam e o estilo que vocês adotam, é importante".

 

Comunicação, criação de ambientes humanos e digitais

"A comunicação, de fato", disse o Pontífice, "não é apenas a transmissão de informações, mas a criação de uma cultura, de ambientes humanos e digitais que se tornam espaços de diálogo e discussão".

“Olhando para a evolução tecnológica, essa missão se torna ainda mais necessária. Penso, em particular, na inteligência artificial com seu imenso potencial, que exige, no entanto, responsabilidade e discernimento para orientar os instrumentos para o bem de todos, para que possam produzir benefícios para a humanidade. Essa responsabilidade diz respeito a todos, na proporção da idade e dos papéis sociais.”

"Queridos amigos, com o tempo aprenderemos a conhecer-nos melhor. Vivemos, podemos dizer juntos, dias realmente especiais", partilhados "por todos os meios de comunicação: TV, rádio, internet, redes sociais".

 

Desarmar a comunicação do ódio e do preconceito

"Gostaria que cada um de nós pudesse dizer deles que eles nos revelaram um pouco do mistério da nossa humanidade e que nos deixaram um desejo de amor e de paz", disse o Papa Leão XIV, recordando o convite do Papa Francisco em sua última mensagem para o próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais, celebrado em 1º de junho próximo:

“Desarmemos a comunicação de todo preconceito, rancor, fanatismo e ódio; purifiquemo-la da agressividade. Não precisamos de uma comunicação estrondosa e muscular, mas de uma comunicação capaz de ouvir, de acolher a voz dos frágeis que não têm voz. Desarmemos as palavras e ajudaremos a desarmar a Terra. Uma comunicação desarmada e desarmante permite-nos partilhar uma visão diferente do mundo e agir de modo coerente com a nossa dignidade humana.”

"Vocês estão na linha de frente narrando conflitos e esperanças de paz, situações de injustiça e pobreza, e o trabalho silencioso de muitos por um mundo melhor. Por isso, peço-lhes que escolham com consciência e coragem o caminho da comunicação da paz", concluiu o Papa Leão XIV. Fonte: https://www.vaticannews.va

Para o sociólogo Francisco Borba Ribeiro Neto, as críticas ao governo americano, como fazia Francisco, agora 'virão de um Papa conterrâneo e branco', tornando o 'embate' um assunto interno

 

Por Amanda Scatolini

Em um conclave que se definiu de forma surpreendentemente rápida para as expectativas, o cardeal Robert Prevost emergiu como novo líder da Igreja Católica, tornando-se Papa Leão XIV, um nome que ecoa e reforça a continuidade do legado de Francisco, seu antecessor. Além de ter se destacado por um discurso pacificador e de visão reformista, o primeiro Pontífice americano, que também é naturalizado peruano, chama a atenção por ser um crítico do conservador governo americano, representando um desafio simbólico ao presidente Donald Trump.

Para o sociólogo Francisco Borba Ribeiro Neto, ex-coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP, não há dúvidas de que há possibilidade de um diálogo em um primeiro momento. Porém, agora, as críticas ao governo americano, sobretudo em relação a questões como a imigração, "virão de um Papa conterrâneo e branco", lembra o especialista, tornando um possível embate um assunto "interno".

 

A escolha do novo Papa ocorreu de forma relativamente rápida, surpreendendo todas as expectativas. Quais fatores o senhor apontaria que podem ter contribuído para essa rapidez?

 

Prevost é muito semelhante a Francisco. No social, no pastoral, no espiritual. O discurso dele foi curto, mas pra quem está acostumado a ler os textos de Francisco, vê que ele tem uma sensibilidade muito parecida, sobretudo em relação ao amor de Deus por nós. E, apesar de ser um reformador na linha de Bergoglio, tem posições mais cautelosas, como Francisco também tinha, em relação a vários temas controversos, como, por exemplo, a questão do sacerdócio feminino.

Então, de certa forma, ele representava uma garantia muito grande de continuidade, sobretudo segura, do trabalho de Francisco. Ele dificilmente vai criar mais "problemas" do que Francisco. Pelo contrário, deve dar continuidade ao trabalho com até menos desafios do que os que Francisco enfrentou.

O fato de ser um cardeal com uma função estratégica dentro da Cúria Romana também pode ter influenciado na decisão. Ele estava à frente do órgão que escolhe e orienta o Papa na escolha dos novos bispos, o que o obrigava a estar o tempo todo em contato com a Igreja no mundo inteiro, e esse pode ter sido um diferencial.

 

Essa semelhança com Francisco se reflete também na escolha do nome Leão XIV, especialmente em relação às questões sociais...

 

Sim, Leão XIII é considerado o fundador da doutrina social da Igreja contemporânea. Foi um grande defensor dos pobres e que criticou muito, dentro dos padrões do século XIX, o capitalismo na época. Então, a escolha por Leão XIV o faz se aproximar muito de um perfil social como o de Francisco.

 

Diferente de Francisco, que optou por vestes papais mais simples logo em sua primeira aparição, Leão XIV apareceu com uma mais tradicional. Que mensagem isso passou, mesmo diante das semelhanças e da promessa de continuidade?

 

Francisco, desde o início como um grande reformista, teve a necessidade de demonstrar uma posição diferente, de explicitar e visibilizar a sua postura. Prevost já está num contexto que, depois de 12 anos de Francisco, não há uma necessidade premente de adotar sinais claros de uma grande mudança de postura. Além disso, um posicionamento muito explícito poderia dificultar um diálogo com os conservadores agora no início de seu pontificado.

 

Um dos assuntos mais comentados foram as críticas quanto à forma como ele lidou com casos de abuso sexual na Igreja no passado, embora tenha apresentado as denúncias recebidas ao Vaticano. É uma questão que ainda pode balançar seu pontificado?

 

É muito difícil um bispo com mais de 60 anos que não seja passível desse tipo de crítica. O problema era como a Igreja enfrentava o problema, não como ele pessoalmente o fazia. Havia uma orientação explícita para "lavar a roupa suja em casa" e resolver os problemas internamente.

O próprio Joseph Ratzinger, antes de se tornar Bento XVI, tentou acabar com essa orientação na época de João Paulo II, mas foi voto vencido entre os cardeais.

 

E essa acabou sendo uma das grandes questões do pontificado de Bento XVI também.

 

Exatamente. Enquanto cardeal, Ratzinger foi contra essa postura. E quem depois teve que segurar o rojão foi ele mesmo, que não queria segurar.

 

Alguns já consideram Leão XIV o segundo Papa latino-americano, apesar de ser nascido nos Estados Unidos. Como essa proximidade pode influenciar sua relação com a América Latina? E o que esperar da relação da Igreja Católica com o governo de Donald Trump, sabendo que Prevost é um crítico de sua agenda?

 

Eu diria para você que nós temos, sim, o segundo Papa latino-americano. Afinal de contas, ele é naturalizado peruano. E não deixa de ser uma coisa inesperada. A análise que se fazia era que, de modo geral, teríamos dificuldade de ter um segundo Papa sul-americano, pois haveria uma tendência dos cardeais de procurá-lo em outros continentes.

Em relação aos Estados Unidos, provavelmente vai haver uma facilitação do diálogo num primeiro momento. Trump se manifestou falando que estava muito feliz, orgulhoso. Um discurso protocolar e que se esperaria dele. Mas não deixa de ser um sinal de que ele terá de procurar um diálogo favorável com Leão XIV.

Então, de certa forma, a Igreja criou uma armadilha para Trump. Agora, ele não pode mais dizer que as críticas ao seu governo são antiamericanas, terceiro-mundistas, comunistas ou coisa parecida. As críticas agora vêm de um Papa conterrâneo e branco, como ele. É uma situação que facilita, por um lado, o diálogo, mas também fortalece a moral católica ao criticar as posturas de Trump. Agora, a crítica, de certa forma, é interna. Fonte: https://oglobo.globo.com

 

Depois de eleito, Leão XIV celebra sua primeira missa com os cardeais. Em sua homilia, citou o Concílio Vaticano II, Santo Inácio de Antioquia e seu predecessor Francisco.

 

Vatican News

Após a eleição na tarde de 8 de maio, o Papa Leão XIV voltou esta manhã à Capela Sistina para presidir à Santa Missa com todos os membros do Colégio Cardinalício.

No início de sua homilia, fez em inglês uma saudação aos cardeais, repetindo as palavras do Salmo responsorial: “Cantarei um cântico novo ao Senhor, porque ele fez maravilhas”.

"E, de fato, não apenas comigo, mas com todos nós. Meus irmãos cardeais, ao celebrarmos esta manhã, convido-os a refletir sobre as maravilhas que o Senhor fez, as bênçãos que o Senhor continua a derramar sobre todos nós por meio do Ministério de Pedro. O Senhor me chamou para carregar essa cruz e realizar essa missão, e sei que posso contar com cada um de vocês para caminhar comigo, continuamos como Igreja, como uma comunidade de amigos de Jesus, como fiéis para anunciar a Boa Nova, para anunciar o Evangelho."

 

Fiel administrador a favor de todo o Corpo místico da Igreja

Em seguida, começou a ler o texto previamente preparado, em que refletiu sobre a frase que Simão Pedro dirige a Jesus, contida no capítulo 16 do Evangelho de Mateus: 'Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo'."

Essas palavras de Pedro, afirma o Papa recém-eleito, expressam em síntese o patrimônio que há dois mil anos a Igreja preserva, aprofunda e transmite através da sucessão apostólica. Ou seja, Jesus é o único Salvador e o revelador da face do Pai.

Citando a “Gaudium et spes” do Concílio Vaticano II, Leão XIV recorda que o Filho de Deus se revela a nós através dos olhos confiantes de uma criança, mostrando-nos assim um modelo de humanidade santa que todos podemos imitar.

Este tesouro agora “é confiado também a mim, para que eu seja um fiel administrador a favor de todo o Corpo místico da Igreja, de modo que esta seja sempre mais cidade colocada sobre o monte (cfr Ap 21,10), arca de salvação que navega através das ondas da história, farol que ilumina as noites do mundo. E isso não tanto pela grandiosidade de suas estruturas, mas pela santidade dos seus membros".

 

Chamados a testemunhar a alegria da fé

Retomando o episódio bíblico narrado em Mateus, Leão XIV reflete ainda sobre a resposta de Jesus a Pedro, quando diz “Quem dizem os homens ser o Filho do homem?”.

Não se trata de uma questão banal, afirma o Papa, pelo contrário, é de grande atualidade. Pois há duas possíveis interpretações. A primeira é a que identifica Jesus como uma pessoa sem importância alguma, ao máximo um personagem curioso, como fizeram os habitantes de Cesareia de Filipe. Outra possível resposta é a das pessoas comuns, que veem Jesus não como um charlatão, mas uma pessoa reta, com coragem e que diz coisas justas. Mas o consideram somente um homem e, por isso, no momento do perigo, durante a Paixão, O abandonam.

“Também hoje, não são poucos os contextos em que a fé cristã é considerada algo absurdo destinada a pessoas débeis e pouco inteligentes; contextos em que a ela preferem-se outras seguranças, como a tecnologia, o dinheiro, o sucesso, o poder e o prazer.”

Trata-se de ambientes onde não é fácil testemunhar nem anunciar o Evangelho, e onde quem acredita se vê ridicularizado, contrastado, desprezado, ou, quando muito, suportado e digno de pena.

No entanto, precisamente por isso, são lugares onde a missão se torna urgente, porque a falta de fé, muitas vezes, traz consigo dramas como a perda do sentido da vida, o esquecimento da misericórdia, a violação da dignidade da pessoa, a crise da família e tantas outras feridas das quais a nossa sociedade sofre, e não pouco.

 

“Ainda hoje, não faltam contextos nos quais Jesus, embora apreciado como homem, é simplesmente reduzido a uma espécie de líder carismático ou super-homem, e isto não apenas entre quem não crê, mas também entre muitos batizados, que acabam por viver, a este nível, num ateísmo prático.”

 

Este, portanto, é o mundo que nos está confiado e no qual, como tantas vezes nos ensinou o Papa Francisco, somos chamados a testemunhar a alegria da fé em Jesus Salvador.

Antes de concluir, citou a frase de Santo Inácio de Antioquia ao se encaminhar para o seu martírio: «Então serei verdadeiro discípulo de Jesus, quando o meu corpo for subtraído à vista do mundo» (Carta aos Romanos, IV, 1).

Essas palavras, afirmou, recordam um compromisso irrenunciável para quem, na Igreja, exerce um ministério de autoridade: desaparecer para que Cristo permaneça, fazer-se pequeno para que Ele seja conhecido e glorificado gastar-se até ao limite para que a ninguém falte a oportunidade de O conhecer e amar.

“Que Deus me dê esta graça, hoje e sempre, com a ajuda da terna intercessão de Maria, Mãe da Igreja.” Fonte: https://www.vaticannews.va

O papa herda uma Igreja em transformação em um mundo conturbado. Para ser um pontífice da paz numa era de conflitos, precisará dialogar sem abandonar convicções, reformar sem romper

“Após um papa gordo, um papa magro”, diz o provérbio. Após um papa “do fim do mundo”, um papa da nação mais rica e poderosa do planeta, que liderou uma nova ordem mundial – e agora abala seus fundamentos.

A Igreja que escolheu o americano Robert Prevost para chefiá-la também é diferente da que elegeu o falecido Francisco. Foi o conclave mais global da História. A fé definha no Ocidente, mas cresce no Oriente. Na América Latina, os evangélicos trazem uma visão nova de Cristo, mas também dúvidas e desafios. Conversões florescem na África e Ásia, mas também atritos com ditaduras e o Islã.

O mundo é diferente: conflitos despertam o espectro da guerra mundial; as democracias estão em recessão, as autocracias, em ascensão, o multilateralismo, em descrédito. A economia se desacelera; as populações envelhecem; tecnologias despertam sonhos de empoderamento sobre-humano, mas também o pesadelo da desumanização.

Na Praça São Pedro, em seu primeiro pronunciamento após ser eleito papa, Leão XIV pronunciou dez vezes a palavra “paz”. “Que a paz esteja convosco”, disse, repetindo a saudação do Cristo ressuscitado. “Uma paz desarmada, uma paz desarmadora, humilde e perseverante, que vem de Deus”, e que o papa gostaria que entrasse em nosso “coração”, alcançasse nossas “famílias”, “todas as pessoas, onde quer que estejam”. E disse como cumprirá essa missão: com uma Igreja que “constrói pontes, que dialoga, sempre aberta a receber”, que “caminha”, que busca “sempre a caridade” e “sempre estar próxima, especialmente dos que sofrem”.

Rios de tinta e saliva correrão sobre o perfil do pontífice. Seu pontificado se adaptará ao mundo moderno, ou tentará adaptá-lo? Qual será sua posição ante a causa LGBT, a ordenação de mulheres, a guerra na Ucrânia ou – inevitável – seu conterrâneo Donald Trump?

Perguntas legítimas, desde que não sejam reducionistas. A mídia secular aplica sua régua – conservador versus progressista –, mas os riscos desse achatamento cognitivo são evidentes. Basta olhar para aquele de quem Leão XIV é vicário. Pode-se afirmar que Jesus não era nem reacionário nem revolucionário, mas a pergunta sobre se era conservador ou progressista colapsa tão logo é formulada. Leão XIII, por exemplo, propôs uma doutrina robusta da justiça social, mas criticou o socialismo e o capitalismo; dialogou com a modernidade, mas reavivou a teologia patrística e escolástica. Conservador ou progressista?

A Igreja precisa ser conservadora: ela se vê como depositária de um dom divino. Mas precisa ser progressista, porque esse dom não pode só ser conservado: deve penetrar o mundo, expandir-se sobre ele, transformá-lo. O cristianismo se vê como a síntese de um acontecimento – a encarnação do Deus-homem –, uma promessa – a união de Deus com a humanidade e a criação – e uma missão – a realização dessa promessa pela regeneração pessoal, social e natural.

Prevost tem formação científica, foi missionário, prior agostiniano e próximo a Francisco. Se quer trazer paz a um mundo conturbado, tem formidáveis instrumentos nas mãos. A Igreja Católica é a instituição mais antiga e mais globalizada do planeta – não só seus 1,4 bilhão de fiéis de todas as etnias, classes e culturas, mas as homenagens de líderes religiosos, chefes de Estado e pessoas de todo o mundo no funeral de Francisco são a prova viva.

A Igreja não tem armas nem capital, mas está na melhor posição para dialogar com protestantes e ortodoxos; com judeus e muçulmanos – todos filhos de Abraão e tributários de Moisés. Ela compartilha da fé humanista na dignidade absoluta do ser humano e na fraternidade universal – mas porque crê em um Pai –; compartilha o anseio muçulmano de servir a um Deus absolutamente bom – mas um Deus humano.

Nessa missão, o juízo sobre se Leão XIV – como Francisco e os sucessores de Pedro – será um bom “progressista” ou um bom “conservador” é secundário. O mundo deve julgar se o papa é um bom homem e um bom cristão. O critério foi dado pelo seu mestre: amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, ou, em outras palavras, amar como Cristo amou. Se Leão XIV for fiel a esse mandamento, será um bom papa – e o mundo terá um pouco mais de paz. Fonte: https://www.estadao.com.br

 

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Primeiro papa agostiniano, é o segundo pontífice americano depois de Francisco, mas, ao contrário de Bergoglio, o estadunidense Robert Francis Prevost, de 69 anos, é originário do norte do continente. De fato, o novo bispo de Roma nasceu em 14 de setembro de 1955 em Chicago, Illinois, filho de Louis Marius Prevost, de ascendência francesa e italiana, e de Mildred Martínez, de ascendência espanhola. Ele tem dois irmãos, Louis Martín e John Joseph.

Passou a infância e a adolescência com a família e estudou primeiro no Seminário Menor dos Padres Agostinianos e depois na Villanova University, na Pensilvânia, onde se formou em 1977 em Matemática e estudou Filosofia. Em 1º de setembro do mesmo ano, ingressou no noviciado da Ordem de Santo Agostinho (OSA) em St. Louis, na província de Nossa Senhora do Bom Conselho, em Chicago, e fez sua primeira profissão em 2 de setembro de 1978. Em 29 de agosto de 1981, emitiu seus votos solenes.

Estudou na Catholic Theological Union em Chicago, graduando-se em Teologia. Aos 27 anos, foi enviado por seus superiores a Roma para estudar Direito Canônico na Pontifícia Universidade de Santo Tomás de Aquino (Angelicum). Na Urbe, foi ordenado sacerdote em 19 de junho de 1982, no Colégio Agostiniano de Santa Mônica, por Dom Jean Jadot, pró-presidente do Pontifício Conselho para os Não Cristãos, hoje Dicastério para o Diálogo Inter-religioso.

Prevost obteve a licenciatura em 1984 e, no ano seguinte, enquanto preparava sua tese de doutorado, foi enviado para a missão agostiniana em Chulucanas, Piura, Peru (1985-1986). Em 1987 defendeu sua tese de doutorado sobre "O papel do prior local da Ordem de Santo Agostinho" e foi nomeado Diretor de Vocações e Diretor de Missões da Província Agostiniana "Mãe do Bom Conselho" em Olympia Fields, Illinois (EUA).

No ano seguinte, ingressou na missão de Trujillo, também no Peru, como diretor do projeto de formação comum para os aspirantes agostinianos dos vicariatos de Chulucanas, Iquitos e Apurímac. Durante onze anos, ocupou os cargos de Prior da comunidade (1988-1992), Diretor de Formação (1988-1998) e formador dos professos (1992-1998) e na Arquidiocese de Trujillo foi Vigário Judicial (1989-1998) e Professor de Direito Canônico, Patrística e Moral no Seminário Maior “São Carlos e São Marcelo”. Ao mesmo tempo, também lhe foi confiado o cuidado pastoral de Nossa Senhora Mãe da Igreja, que mais tarde foi erigida como paróquia com o título de Santa Rita (1988-1999), na periferia pobre da cidade, e foi administrador paroquial de Nossa Senhora de Monserrat de 1992 a 1999.

Em 1999, foi eleito prior provincial da Província Agostiniana “Mãe do Bom Conselho” de Chicago, e dois anos e meio depois, no Capítulo Geral Ordinário da Ordem de Santo Agostinho, seus coirmãos o escolheram como prior geral, confirmando-o em 2007 para um segundo mandato.

Em outubro de 2013, retornou à sua província agostiniana, em Chicago, e foi diretor de formação no convento de Santo Agostinho, primeiro conselheiro e vigário provincial; cargos que ocupou até que o Papa Francisco o nomeou, em 3 de novembro de 2014, administrador apostólico da diocese peruana de Chiclayo, elevando-o à dignidade episcopal como bispo titular de Sufar. Ele entrou na diocese em 7 de novembro, na presença do Núncio Apostólico James Patrick Green, que o ordenou bispo pouco mais de um mês depois, em 12 de dezembro, festa de Nossa Senhora de Guadalupe, na Catedral de Santa Maria.

O seu lema episcopal é “In Illo uno unum”, palavras que Santo Agostinho pronunciou em um sermão, a Exposição sobre o Salmo 127, para explicar que “embora nós cristãos sejamos muitos, no único Cristo somos um”.

Em 26 de setembro de 2015, foi nomeado bispo de Chiclayo pelo pontífice argentino e, em março de 2018, foi eleito segundo vice-presidente da Conferência Episcopal Peruana, na qual também foi membro do Conselho Econômico e presidente da Comissão de Cultura e Educação.

Em 2019, por decisão de Francisco, foi incluído entre os membros da Congregação para o Clero em 13 de julho de 2019 e, no ano seguinte, entre os membros da Congregação para os Bispos (21 de novembro). Nesse meio tempo, em 15 de abril de 2020, recebe a nomeação pontifícia também como administrador apostólico da diocese peruana de Callao.

Em 30 de janeiro de 2023, o Papa o chamou a Roma como Prefeito do Dicastério para os Bispos e Presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, promovendo-o a arcebispo. E no Consistório de 30 de setembro do mesmo ano, ele o criou e o tornou cardeal, atribuindo-lhe o diaconato de Santa Mônica. Prevost tomou posse em 28 de janeiro de 2024 e, como chefe do dicastério, participou das últimas viagens apostólicas do Papa Francisco e da primeira e segunda sessões da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos sobre a Sinodalidade, realizadas em Roma de 4 a 29 de outubro de 2023 e de 2 a 27 de outubro de 2024, respectivamente. Uma experiência em assembleias sinodais já adquirida no passado como Prior dos Agostinianos e representante da União dos Superiores Gerais (UGS).

Enquanto isso, em 4 de outubro de 2023, Francisco o incluiu entre os membros dos Dicastérios para a Evangelização, Seção para a Primeira Evangelização e as Novas Igrejas Particulares; para a Doutrina da Fé; para as Igrejas Orientais; para o Clero; para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica; para a Cultura e a Educação; para os Textos Legislativos; da Pontifícia Comissão para o Estado da Cidade do Vaticano.

Finalmente, em 6 de fevereiro deste ano, ele foi promovido à ordem dos bispos pelo Pontífice argentino, obtendo o título de Igreja Suburbicária de Albano.

Durante a última hospitalização de seu predecessor no hospital ‘Gemelli’, Prevost presidiu o rosário pela saúde de Francisco em 3 de março na Praça São Pedro. Fonte: https://www.vaticannews.va

O Conclave elegeu o cardeal Robert Prevost como o 267º Bispo de Roma. O anúncio à multidão foi dado pelo cardeal protodiácono Dominique Mamberti.

 

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Annuntio vobis gaudium magnum; Habemus Papam! "Anuncio-vos uma grande alegria; temos um Papa!".

Há poucos instantes, da Sacada Central da Basílica de São Pedro, o cardeal protodiácono Dominique Mamberti pronunciou a tão aguardada fórmula em latim, comunicando a Roma e ao mundo o nome do novo Sucessor de Pedro:

“Eminentissimum ac Reverendissimum Dominum, Dominum Robertum Franciscum, Sanctæ Romanæ Ecclesiæ Cardinali Prevost, qui sibi nomen imposuit Leo XIII.

Traduzindo para o português: "O eminentíssimo e reverendíssimo senhor, senhor Robert Francis, cardeal da Santa Igreja Romana PREVOST, que se impôs o nome de Leão XIV". Fonte: https://www.vaticannews.va

Para ser eleito, o novo Papa deve alcançar 2/3 dos votos dos cardeais eleitores.

 

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Ainda não foi desta vez. Reunidos para duas votações na Capela Sistina na manhã desta quinta-feira, segundo dia do Conclave, os 133 cardeais votantes ainda não chegaram a um consenso em torno do nome do próximo Sucessor de Pedro. A indicar, a fumaça preta que saiu da chaminé instalada no telhado da Capela Sistina por volta das 11h50, sob o olhar das cerca de 12 mil pessoas presentes na Praça São Pedro e das câmaras e lentes de jornalistas de todo o mundo.

Os 133 cardeais eleitores ainda não escolheram o novo Papa. Para esta quinta-feira (08/05) estão previstas mais quatro votações.

Concluídas as votações da manhã, os cardeais retornam à Casa Santa Marta e às 15h45 novamente o traslado para o Palácio Apostólico, para mais uma rodada de votações na Capela Sistina. Prováveis horários da fumaça: após as 17h30 e por volta das 19h.

Para ser eleito, o novo Papa deve alcançar 2/3 dos votos dos cardeais eleitores.  Fonte: https://www.vaticannews.va

Concílio arejou a Igreja, a despeito de uma minoria que se opôs e ainda se opõe às suas decisões. Foi como se uma lufada de ar fresco entrasse em seu interior

 

*Por Isaías Pascoal

A morte do papa Francisco colocou em operação o cerimonial tradicional das exéquias do pontífice morto e da eleição do seu sucessor por uma das mais antigas instituições do mundo atual: a Igreja Católica, com sua jornada histórica de aproximadamente 2 mil anos.

Nesse tempo ela enfrentou desafios inauditos, criou um cânon doutrinário substancioso, construiu uma institucionalidade sólida e um modus operandi que lhe deu identidade com raízes profundas. Foi com esse aparato que ela atravessou inúmeras transformações históricas e estabeleceu relações com povos e culturas dos mais diversos matizes.

Nos séculos 1 e 2, era impossível vislumbrar que o cristianismo se tornaria a religião oficial do Império Romano no século 4, que a Igreja seria a principal referência política, cultural e religiosa da Idade Média europeia, e que, no alvorecer dos tempos modernos, estaria presente nos demais continentes para a maior obra evangelizadora da sua história.

Até então, os desafios que enfrentou, embora gigantescos, se situavam na dimensão religiosa e da fé. Não foi assim nos séculos posteriores ao Iluminismo, quando uma cultura laica, materialista e secularizada ocupou espaços mais amplos na sociedade e impulsionou os papas Pio IX (1846-1878) e Pio X (1903-1914) a se pronunciarem contra o “mal do modernismo”. A encíclica Pascendi (1907), de Pio X, é a mais alta expressão da guerra movida pela Igreja contra o que ela denominava de modernismo. Além dos “ídolos” que ele criava em competição com o sentimento religioso, no final conduzia ao ateísmo, à negação da fé e, portanto, do homo religiosus.

Na nova situação, a Igreja se colocou na defensiva, hostil ao mundo e em conflito contínuo com a modernidade. No pontificado de Pio XII (1939-1958), o seu sentido místico e espiritualista se acentuou, como demonstra expressamente a encíclica Mystici Corporis (1943).

O conclave que escolheu o sucessor de Pio XII, morto em 9 de outubro de 1958, se reuniu entre os dias 25 e 28 de outubro. Somente no quarto dia, na 11.ª votação, é que foi eleito o novo papa: o cardeal Roncalli, patriarca de Veneza, com quase 77 anos, e que adotou o nome de João XXIII. Foi visto como um papa de transição, com curto pontificado, para permitir à Igreja se preparar para algo mais seguro e longevo à frente.

O novo papa, contudo, chocou a Igreja e o mundo ao convocar, em 25 de janeiro de 1959, um novo concílio ecumênico. Papas anteriores haviam pensado na convocação de um concílio, mas desistiram da ideia em razão da dimensão dos esforços para colocá-lo em prática. João XXIII não desistiu e preparou o ambiente e as condições para a sua realização.

Em 11 de outubro de 1962, ele teve início. O papa morreu no ano seguinte, em 3 de junho de 1963, com apenas uma sessão do concílio tendo se realizado.

O seu sucessor, o cardeal Montini, arcebispo de Milão, adotou o nome de Paulo VI e deu continuidade ao concílio, que terminou em 8 de dezembro de 1965, após quatro sessões deliberativas. Desde então, a Igreja vive sob a moldura das decisões tomadas no Vaticano II.

Ela mudou a sua face e a sua relação com o mundo. Foi aggiornata (modernizada) e cumpriu os anseios do papa João XXIII, que deixou bem claro desde o início o seu intento. No seu discurso solene de abertura do concílio, afirmou: “No exercício cotidiano do nosso ministério pastoral, ferem nossos ouvidos sugestões de almas, ardorosas sem dúvida no zelo, mas não dotadas de grande sentido de discrição e moderação. Nos tempos atuais, elas não veem senão prevaricações e ruínas; vão repetindo que a nossa época, em comparação com as passadas, foi piorando; e portam-se como quem nada aprendeu da História, que é também mestra da vida, e como se no tempo dos concílios ecumênicos precedentes tudo fosse triunfo completo da ideia e da vida cristã, e da justa liberdade religiosa. Mas parece-nos que devemos discordar desses profetas da desventura, que anunciam acontecimentos sempre infaustos, como se estivesse iminente o fim do mundo. No presente momento histórico, a Providência está-nos levando para uma nova ordem de relações humanas, que, por obra dos homens e o mais das vezes para além do que eles esperam, se dirigem para o cumprimento de desígnios superiores e inesperados; e tudo, mesmo as adversidades humanas, dispõe para o bem maior da Igreja.”

O concílio arejou a Igreja, a despeito de uma minoria que se opôs e ainda se opõe às suas decisões. Foi como se uma lufada de ar fresco entrasse em seu interior. Documentos como a Lumen Gentium e Gaudium et Spes deram nova roupagem aos conceitos tradicionais do seu “depósito” doutrinário milenar. Deles emerge uma Igreja sorridente, otimista e acolhedora, que está no mundo, com ele, e não contra ele, padecendo as suas dores e lhe oferecendo o lenitivo do seu “tesouro”. Em maior ou menor medida, foi assim que os papas pós-concílio se apresentaram ao mundo, e que Francisco expressou no limite. As ondas estão agitadas, mas a barca precisa continuar a viagem.

*Opinião por Isaías Pascoal. Doutor em Ciências Sociais. Fonte: https://www.estadao.com.br