O necessário equilíbrio na regulação das redes sociais começa por expectativas realistas. Uma nova lei não resolverá todos os problemas. Regulação rígida pode gerar novas distorções

 

Há crescente consenso da necessidade de regulação das redes sociais. O atual regime jurídico tem dado margem a muitos abusos, como se o mundo digital fosse território sem lei. Sob pretexto de liberdade de expressão, verifica-se intensa difusão de ameaças, ataques e notícias mentirosas, que tensionam o tecido social, distorcem o debate público e colocam em risco as instituições democráticas. Nesse cenário, o Judiciário tem sido instado a atuar e, apesar de indispensável para a defesa das liberdades e do Estado Democrático de Direito, sua atuação acaba por gerar novas distorções e tensões. É urgente prover um novo marco legal para as redes sociais.

No entanto, por mais evidente que seja a necessidade de regulação do setor, é preciso advertir que o desenho desse novo marco legal exige especial cuidado, começando por calibrar, de maneira realista, as expectativas em relação a seus efeitos. Os desafios sociais e políticos decorrentes das redes sociais não serão resolvidos simplesmente com uma nova lei, por mais perfeita que ela possa ser.

Por exemplo, os atos do 8 de Janeiro explicitaram e confirmaram uma vez mais o perigo que as redes sociais trazem para a democracia. Muitos dos crimes ali praticados foram incentivados, anunciados e organizados nas plataformas digitais. A ideia, bastante difundida, de que essas empresas seriam totalmente irresponsáveis pelo conteúdo publicado em seus canais permitiu a ocorrência dos crimes. Além disso, as empresas operam com algoritmos que ampliam a exposição de mensagens que geram engajamento, favorecendo a difusão de conteúdos radicais e extremistas. Na prática, as redes sociais não só foram indiferentes, como também ajudaram a construir o ambiente de desinformação e de ameaça ao regime democrático.

Ao mesmo tempo, seria ingenuidade achar que uma adequada regulação das redes sociais resolva – ou deva resolver – todos os problemas sociais e políticos envolvidos no 8 de Janeiro. Não é só uma questão de expectativa irreal, o que depois vai gerar frustração. O problema é mais grave. Essa expectativa desequilibrada modifica a própria ideia do que deve ser uma adequada regulação das redes sociais.

Há quem proponha, por exemplo, que empresas como Google ou Facebook recebam o mesmo tratamento jurídico que as companhias de comunicação, que têm uma responsabilidade muito mais acentuada sobre o conteúdo publicado. A proposta, que talvez possa entusiasmar muita gente – seria um modo imediato de acabar com a circulação irresponsável de conteúdo criminoso –, ignora, no entanto, o fenômeno específico das redes sociais, inviabilizando seu funcionamento. Seja para qual setor for, uma adequada regulação jurídica tem como condição indispensável o conhecimento do seu modus operandi. A lei não pode ignorar a realidade.

Relacionada com a primeira proposta, outra ideia, que vez por outra se ventila, consiste em conceder às plataformas digitais poder irrestrito para retirada de conteúdo, sem necessidade de decisão judicial. Diz-se que essa autorização proveria a tão sonhada agilidade na contenção de conteúdos criminosos. O mecanismo acarreta, no entanto, problemas sérios em relação à liberdade de expressão, com riscos de abusos e distorções ainda maiores no debate público.

Há de se conceder razão, portanto, ao presidente da Câmara, Arthur Lira, quando defendeu a necessidade de “encontrar o caminho do meio para legislar sobre e julgar questões envolvendo liberdade de expressão, redes e democracia”. No dia 13 de março, em evento sobre o tema, Lira reconheceu que se trata de “equilíbrio delicado”, que “envolve valores inestimáveis para a vida pública brasileira”. E advertiu: “Esse equilíbrio não é uma utopia, mas uma necessidade”.

Com suas duas Casas, o Legislativo existe precisamente para esses casos: quando, diante de muitos interesses e perspectivas possíveis, o País precisa de um marco jurídico equilibrado, que expresse os vários anseios da população, respeite a Constituição e defenda a democracia. Não se espera menos do Congresso. Fonte: https://www.estadao.com.br

Há vida além do Facebook

Apaguei meu perfil do FB. Foi um banho de sal grosso digital. Mantive o Instagram. Eu me tornei menor no mundo digital. Mas muito mais autêntica

 

Por Martha Batalha — Rio de Janeiro

Passei nos últimos dias uma quantidade vergonhosa de horas tentando apagar meu perfil no Facebook. A intenção era deixar de ser pessoa para me tornar uma página de autora, mas a mudança, possível de se realizar com dois ou três cliques, escondia-se sob camadas inúteis de informação.

Segundo a página de ajuda, as instruções estavam no account center (meu FB é em inglês). E onde estaria o account center? Depende, dizia a página. Ele poderia estar tanto no topo da tela quanto abaixo e à esquerda. Achei estranho, um account center com direitos de locomoção, mas eu estava disposta a relevar se ao menos ele EXISTISSE. Não era o caso.

Em resumo, para apagar meu perfil a regra era: apaga no account center, que não existe, logo, não apaga, mas, se quiser apagar, vai ao account center, que não existe. É como estar numa festa, perguntar pelo banheiro e ouvir do anfitrião — pega esse corredor. Se o quadro com andorinhas estiver pendurado, dobre à direita. Mas, se for o calendário asteca, dance a “Macarena”.

O FB, com essa interface inocente de pracinha com coreto, de local de encontro, reencontro e troca de ideias, é na verdade um labirinto do Minotauro, um ardil 22, uma narrativa de Gogol ou de Kafka, e se o leitor está atordoado com tanta referência é porque desejo mostrar o que essa pracinha capciosa, o álbum de figurinhas do Instagram e o pula-pula do TikTok fazem com a minha cabeça. Eu me sinto bombardeada com muito mais do que posso absorver, e isso, eu descobri, me faz infeliz.

Mas eis outro ardil: preciso estar on-line para divulgar o que faço e preciso estar off-line para fazer o que eu faço. Leitura e escrita, as duas atividades que nutrem o melhor em mim, só se dão com qualidade em longos períodos e longe de ruídos.

Resolvi o dilema após ler o livro “Minimalismo digital”, de Cal Newport. É um manual para quem achou que usaria as redes sociais, e passou a se sentir usado por elas. Minimalismo digital, segundo o autor, se define por “usar o tempo on-line em um pequeno número de sites e atividades cuidadosamente selecionadas e que endossam os valores da pessoa, e perder feliz todo o resto.”

Não uso mais Twitter, apaguei aplicativos supérfluos no celular e meu perfil pessoal do FB (venci, Zuckerberg). Foi assim, um descarrego. Um banho de sal grosso digital. Mantive o Instagram, mas não me submeto à ditadura da rede que exige posts diários para aumento de visibilidade. Eu me tornei menor no mundo digital. Mas muito mais autêntica.

Não posso dizer que as redes sociais são nocivas para todo mundo. Pegue uma Cora Rónai, um Eduardo Affonso. São pequenas empresas de sólido conteúdo e público fiel. Mas para mim não estava funcionando. Sou ansiosa demais para expor constantemente meu ego ao número de curtidas e corações, eu que desde sempre estou num aprendizado para não julgar, me colocava inteira e vulnerável para ser julgada por um algoritmo.

Fora da pracinha o mundo é bom. Gosto dos dedos escurecidos por tinta depois de ler o jornal, de segurar a caneta Bic para anotar as margens do livro brochura, da rotação de títulos na mesinha de cabeceira. Gosto de solidão e silêncio e de cantos pequenos. Não é para onde o mundo está indo, mas é que me proporciona contentamento, essa espécie de primo renegado da felicidade, menos sexy e mais satisfatório. Fonte: https://oglobo.globo.com

Perfis conservadores espalham conspiração que culpa Carnaval por chuvas no Brasil

Em vídeos, tragédias e destruição são associadas a 'representações satânicas' em desfiles de escolas de samba

 

Manuela Ferraro

Diversos perfis estrangeiros e religiosos estão espalhando nas redes sociais uma teoria da conspiração que associa a "ira divina" provocada pelo Carnaval às inundações, destruição e tragédias causadas pelas chuvas no Brasil. Nesta segunda (13), "Brazil" esteve nos assuntos mais comentados no Twitter, com mais de 34 mil tuítes.

Em inglês, as publicações trazem vídeos e fotos que criticam as representações religiosas cristãs em desfiles de escolas de samba, como a encenação entre entre Jesus e o diabo no desfile da Gaviões da Fiel em 2019 e o carro alegórico do Salgueiro que trazia, este ano, um gigantesco boneco representando o demônio.

As imagens dos carnavais brasileiros são alternadas com vídeos de chuvas e inundações que arrastam veículos e derrubam casas, mas que não especificam onde, nem quando, tais episódios aconteceram. Os usuários que divulgam os vídeos evocam uma suposta "justiça dos céus" contra o que chamam de "festejo satânico".

"Os brasileiros zombaram de Deus durante o Carnaval realizado em 18 de fevereiro de 2023, o que provocou Deus e também os cristãos no Brasil a exigir justiça. Portanto, Deus atingiu o Brasil com grandes tempestades e uma inundação", diz uma das publicações.

Alguns vídeos trazem ainda imagens de tragédias brasileiras que não aconteceram após o Carnaval deste ano. Um vídeo divulgado pelo perfil de um cantor gospel no YouTube, por exemplo, traz imagens de desfiles, mas mostra, em seguida, imagens da chuva que matou 104 pessoas em Petrópolis (RJ) em fevereiro de 2022.

O narrador do vídeo diz que o desastre aconteceu porque "zombaram de Deus". A publicação, feita há cerca de duas semanas, tem mais de 760 mil visualizações. O blog #Hashtag tentou contato com o dono do perfil, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

Outros tuítes chegam a divulgar fotos e vídeos de carros alegóricos do Carnaval que acontece nas cidades alemãs de Düsseldorf e Colônia, na Alemanha, afirmando que as imagens se referem à festa brasileira. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

Delegado foi acusado de organizar emboscada contra Vicente Cañas, que vivia com os Enawenê-Nawê

 

Por O Globo

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) confirmou a condenação do ex-delegado da Polícia Civil do Mato Grosso Ronaldo Antônio Osmar por intermediar a emboscada em que foi morto o missionário jesuíta Vicente Cañas, conhecido como Kiwxí. O crime foi em abril de 1987, na terra indígena Enawenê-Nawê, no município de Juína (MT).

De acordo com o processo, além de orientar os executores do crime sobre o modo de execução e realizar o pagamento pelo serviço, o ex-delegado também dificultou o andamento da investigação que buscava esclarecer a morte do missionário.

Em 2006, Ronaldo Antônio foi absolvido pelo Tribunal do Júri do Mato Grosso. O MPF recorreu da decisão e, em 2015, o TRF-1 anulou o júri, por considerar a decisão manifestamente contrária à prova dos autos, determinando a realização de um novo julgamento.

Em 2018, o acusado foi submetido a novo júri e condenado a mais de 14 anos de prisão em regime inicial fechado. Após nova etapa do processo, a defesa apresentou recurso.

O trâmite da ação, que levou mais de 30 anos para se chegar à condenação do agenciador, foi cercado por muitos entraves. Além do tempo decorrido, o que dificultava a coleta de provas, as principais testemunhas não queriam mais falar do assunto, que foi traumático para eles.

— Foi necessário um trabalho intenso de convencimento para tranquilizá-los, assegurando que seria a última vez — diz o procurador da República Ricardo Pael.

O banco das testemunhas também contou com a participação do antropólogo Rinaldo Arruda, estudioso da cultura Enawenê-Nawê. Na ocasião, ele explicou aos jurados que Vicente Cañas havia sido batizado pelos indígenas, era um deles, por isso nunca seria assassinado por um “irmão”. Vicente Cañas viveu parte de sua vida como um Enawenê-Nawê.

Aa confirmação da condenação do ex-delegado Ronaldo Antônio tem mais um significado para os indígenas da etnia. O crânio de Kiwxí permanece até hoje vinculado ao processo, como prova do crime. Para os Enawenê-Nawê, enquanto todo o corpo não é submetido ao funeral, o espírito não descansa.

Eles esperam que com a confirmação da condenação em segunda instância, o crânio seja finalmente liberado para ser levado ao território Enawene, com a concordância dos familiares espanhóis de Vicente, onde será sepultado com o restante do corpo dando descanso ao seu espírito.

O trabalho de Cañas foi fundamental também para o início do processo de demarcação da terra indígena dos Enawenê-Nawê. O missionário denunciava constantemente a presença de fazendeiros e madeireiros nas áreas dos povos indígenas que viviam no noroeste do Mato Grosso.

Além disso, de 1985 até seu assassinato, ele era integrante do grupo de trabalho da Funai que atuava nos estudos de demarcação do território dos Enawenê-Nawê. Diante disso, eram comuns os relatos de ameaças de morte dirigidas ao missionário espanhol e a outros voluntários que o ajudavam.

Em abril de 1987, Cañas foi surpreendido enquanto se preparava para voltar à aldeia dos Enawenê-Nawê, que na época, era chamada de Salumã. Os assassinos o atacaram quando ele voltava do rio, onde estava tomando banho. Em seu barraco, às margens do Rio Juruena, o missionário foi agredido e assassinado.

O corpo foi encontrado cerca de 40 dias depois por indígenas e pelo padre Thomaz de Aquino Lisboa, que na década de 1970, atuou nos primeiros contatos com os índios Enawenê-Nawê. A perícia constatou sinais de violência no local e um orifício na barriga da vítima aparentemente causado por arma branca. Fonte: https://oglobo.globo.com

Dispositivo estabelece que plataformas de mídia social não podem ser responsabilizadas pelos danos decorrentes de postagens dos usuários

 

Por Pablo Ortellado

O seminário na Fundação Getulio Vargas (FGV) reuniu ministros do Supremo, o ministro da Justiça e o presidente da Câmara para discutir a regulação das mídias sociais. O evento consolidou entre as elites políticas o consenso de que o atual regime de responsabilização das plataformas por conteúdos publicados pelos usuários está obsoleto e deve ser substituído em breve. Se isso se confirmar, será a mais importante mudança no regime de regulação das mídias sociais desde a aprovação do Marco Civil da Internet.

O ponto mais discutido das intervenções foi o artigo 19 do Marco Civil da Internet. Esse artigo estabelece que plataformas de mídia social como o Facebook não podem ser responsabilizadas pelos danos decorrentes de postagens dos usuários. Isso significa que se um usuário do Twitter atacar a honra de alguém, a responsabilidade por essa postagem será do usuário e não da plataforma.

Desde que foi concebido, em 2014, esse regime foi sendo relativizado para certos tipos de conteúdos — aqueles que violam direitos autorais e aqueles que contêm nudez não consentida (revenge porn). O que as lideranças dos três Poderes sinalizam agora é que esse regime deve ser definitivamente enterrado.

Embora não sejam obrigadas a retirar conteúdos ilegais (a não ser por ordem judicial), as plataformas se autorregulam moderando postagens, isto é, apagando e restringindo o alcance de conteúdos de usuários que violam regras das suas comunidades.

Depois do 8 de janeiro, porém, se formou um consenso que essa autorregulação é insuficiente. O novo modelo que será proposto pelo governo federal — e que deve ser incorporado pelo Legislativo e respaldado pelo Judiciário — é que essa autorregulação seja por sua vez regulada, numa forma híbrida conhecida como “autorregulação regulada”.

Neste modelo, a lei estabelece parâmetros para certos tipos de conteúdos — o ministro Flávio Dino (Justiça) mencionou os casos dos discursos de ódio, ataques à democracia, terrorismo e proteção à infância — e as empresas passariam a ter a obrigação de agir para moderar esses conteúdos. Essas ações das plataformas seriam documentadas em relatórios de transparência, e uma autoridade regulatória avaliaria o seu alcance, podendo impor sanções se forem consideradas insuficientes.

Essa forma de regulação indireta está sendo implementada em toda a Europa, o que deve diminuir resistências. Apesar disso, é quase certo que para enfrentar esse novo modelo veremos a formação de uma aliança inusitada entre as plataformas que não querem esse tipo de regulação, bolsonaristas que temem ser “censurados” e ONGs que não aceitam o fim do artigo 19 do Marco Civil. Fonte: https://oglobo.globo.com

Não deixa de ser uma prova de coragem sustentar seus desejos

 

Betty Milan

Escritora e psicanalista, é autora de “O Papagaio e o Doutor” e “Baal”; membro da Academia Paulista de Letras

No dia 8 de março de 1917, 90 mil operárias russas percorreram as ruas reivindicando melhores condições de trabalho e se manifestando contra as ações do czar Nicolau 2º, o último imperador da Rússia. O evento ficou conhecido como "Pão e Paz" porque as manifestantes também lutavam contra as dificuldades decorrentes da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

A luta das mulheres e as suas conquistas não cessou e, em 1975, o Dia Internacional da Mulher foi definitivamente instituído pela ONU, e o dia 8 de março escolhido em homenagem às operárias russas.

No Brasil, duas datas são particularmente relevantes na história da luta das mulheres: 1932, ano em que foi adquirido o direito ao voto —durante o governo de Getúlio Vargas—, e 2006, ano em que foi sancionada a Lei Maria da Penha, que assegura o direito de proteção à mulher sujeita à violência doméstica.

Talvez seja necessário sancionar uma lei para assegurar o direito de proteção às esculturas que são símbolos da mulher e estão sujeitas à violência urbana. Digo isso por ter visto, no dia 12 de fevereiro a imagem da escultura de Brecheret, "Depois do Banho", jogada por vândalos no chão do largo do Arouche, no centro de são Paulo. Uma imagem tão revoltante quanto a que nós vimos no dia 8 de janeiro.

Poucos dias antes, esta Folha havia publicado texto sobre as obras do escultor. Ocorreu-me que podia ser uma vingança contra um jornal que não apoiou o ex-presidente e os atos golpistas. Mas não é só disso que se trata porque, antes de ser jogada no chão, a escultura foi, durante um bom tempo, o mictório do largo do Arouche, sem que a prefeitura, que é a responsável legal, tomasse providências.

"Depois do Banho" é um símbolo da mulher e da beleza feminina, uma obra tão única como as esculturas de Maillol, expostas entre o Museu do Louvre e o Jardin des Tuileries, em Paris. São dezoito nus que simbolizam a força e a beleza, exibindo a sensualidade, a elegância do gesto e a graça. Homenagem maior não existe.

dia 8 de março deve servir para evocar a coragem das mulheres na adversidade e para certificá-las de que tanto o espaço privado quanto público é tão delas quanto do outro sexo. Noutras palavras, o igualitarismo é um direito que pode ser conquistado.

No plano pessoal, significa que as mulheres —assim como os homens— devem dispor do seu corpo livremente e se tornarem ou não mães conforme seu desejo. Em 67 países do mundo, a gravidez pode ser interrompida com até 12 semanas da gestação. Ou seja, já existe o direito ao aborto. Segundo a Organização Mundial da Saúde, as taxas de aborto são semelhantes em países onde o procedimento é legal e em países onde não é. Nestes, o aborto é frequentemente praticado de forma danosa por mulheres pobres, com sequelas como perfuração do útero, peritonite e septicemia.

assunto é controverso por motivos religiosos, morais e políticos. No entanto, a legalização do aborto se impõe em todos os países, não só por ser uma questão de saúde pública, mas porque o desejo é transgressor e o aborto ilegal não vai deixar de ser praticado. Não deixa de ser uma prova da coragem das mulheres que são capazes de sustentar o seu desejo, correndo inclusive graves riscos.

No plano público, o igualitarismo significa a entrada maciça das mulheres na vida profissional. Como, de um modo geral, elas são menos agressivas e mais predispostas à negociação, haverá um maior equilíbrio. Têm mais respeito pela vida —que elas dão. Podemos imaginar um cenário em que a presença das mulheres em cargos de alta responsabilidade levará a uma melhor comunicação entre os povos.

O Dia Internacional da Mulher também existe para celebrar a existência das mães, que tendem a proteger os filhos e desejam um futuro sem guerra e sem a destruição do planeta. Para ser viável, o mundo precisa apostar nas mulheres.

TENDÊNCIAS / DEBATES

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br 

 

"Neste dia Internacional da mulher, agradeço-lhes pelo empenho na construção de uma sociedade mais humana, através da sua capacidade de perceber a realidade com um olhar criativo e um coração terno. Este é um privilégio apenas das mulheres!"

 

Ir. Grazielle Rigotti - Cidade do Vaticano

O Dia Internacional da mulher traz em si um resgate de valores que são essencialmente femininos. Muito além de uma luta de gêneros, a data comemorativa procura ressaltar características que lhe são particulares. Em sua Audiência Geral desta manhã o Papa Francisco relembra em sua catequese, de forma especial, a celebração de hoje:

Neste dia Internacional da mulher, agradeço-lhes pelo empenho na construção de uma sociedade mais humana, através da sua capacidade de perceber a realidade com um olhar criativo e um coração terno. Este é um privilégio apenas das mulheres! Uma bênção especial para todas as mulheres presentes na praça. E uma salva de palmas para as mulheres! Elas merecem!’

De fato, olhar para a mulher neste dia, faz retomar as características divinas que levam à afirmação de que Deus é Pai, e também é Mãe. E pensando à maternidade divina, se confirmam estas duas características humanas: a criatividade e a ternura.

A criatividade como dom do Espírito, que faz ver com olhar potencialmente confiante a criatura divina, por vezes reduzida aos limites da própria realidade. Discorrendo ainda sobre o tema da Evangelização, o Papa relembrou a responsabilidade de cada evangelizador e evangelizadora em anunciar com a criatividade que é característica própria da vida cristã. Nesta missão, muitas mulheres doam suas vidas no caminho do seguimento de Jesus, iniciado no batismo.

Também à imagem de Deus que ama a todos os seus filhos com coração grande e terno, vemos ressoar nas mulheres o desafio de acolher a humanidade, principalmente os mais pobres e sofredores, com a característica própria do coração de Deus: sua ternura infinita com a qual abraça a todos os seus filhos, e a cada um em particular.

Diante de Nossa Senhora, nosso espelho e modelo de vida cristã, está refletida a imagem do sonho de Deus para todo ser humano, por isso, de modo especial neste dia, o apelo seja adentrar no espaço sagrado do próprio interior com olhos novos, sempre mais inspiradas e inspirados pelo Espírito, pela Santa Ruah, que guia e dá dinamismo e feminilidade à vida cristã. Fonte: https://www.vaticannews.va

Casal foi encontrado morto na sexta-feira (3); principal linha de investigação é de feminicídio seguido de suicídio

 

Catarina Scortecci

A vereadora de Juazeiro do Norte (a 492 km de Fortaleza) Yanny Brena, 26, e seu namorado, Rickson Pinto, 27, morreram por asfixia, de acordo com laudo da Pefoce (Perícia Forense do Estado do Ceará). Eles foram encontrados mortos na última sexta-feira (3) em um imóvel onde moravam no bairro Lagoa Seca, em Juazeiro do Norte.

A causa das mortes foi divulgada nesta terça-feira (7) pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará.

O caso está a cargo da Delegacia de Defesa da Mulher de Juazeiro do Norte e a principal linha de investigação é de feminicídio seguido de suicídio.

A delegacia já ouviu 20 pessoas até o momento e segue realizando diligências e oitivas.

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social afirma que outros laudos ainda são aguardados pela delegacia. "São laudos solicitados à Pefoce sobre o local de crime e de imagens de câmeras de segurança, além do laudo de pesquisa de substâncias em amostras de sangue e urina."

Yanny é irmã do deputado federal Yury Bruno, conhecido como Yury do Paredão (PL-CE). Ela estava filiada ao PL e exercia seu primeiro mandato na Câmara de Juazeiro do Norte.

Foi eleita no pleito de 2020 com 3.956 votos, a segunda maior votação da Casa naquela disputa. No início deste ano, assumiu a cadeira de presidente da Câmara de Vereadores.

"Fico muito grata e honrada em ser a segunda mulher a presidir a Câmara Municipal de Juazeiro do Norte. Quero fazer um mandato de muita transparência, aproximando o Legislativo do povo, do Executivo e, acima de tudo, um mandato em prol da população de Juazeiro do Norte", escreveu ela, em seu perfil no Twitter, onde publicava com frequência.

O corpo da vereadora foi enterrado no sábado (4), em Juazeiro do Norte. Já o enterro de Rickson Pinto foi realizado em uma cidade próxima, Aurora. Ele tinha uma filha e, em rede social, se apresentava como atleta de vaquejada. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

A escravização de trabalhadores no RS já é repugnante em si, mas conseguiram adicionar insulto à injúria

 

A notícia de que mais de 200 trabalhadores estavam sendo mantidos em condições análogas à escravidão no serviço terceirizado de colheita para vinícolas de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, já é repugnante em si mesma. Mas houve quem conseguisse adicionar insulto à injúria.

Um obscuro vereador de Caxias do Sul, por exemplo, saltou do merecido anonimato para a ribalta nacional ao discursar, na Câmara local, aconselhando os empresários da região a não mais contratar ninguém da Bahia, Estado de origem dos trabalhadores escravizados, porque os baianos são um povo que “vive na praia tocando tambor” e está “acostumado com festa e carnaval”. Defendeu que os agricultores passassem a contratar argentinos, que são “limpos, trabalhadores e corretos”. Nem é preciso dizer que o verboso parlamentar é orgulhoso seguidor do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Mas não é só a ralé bolsonarista que torna o caso ainda mais revoltante. O episódio também serviu para que o Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (CIC-BG), malgrado ter inequivocamente condenado as “práticas inaceitáveis” verificadas em Bento Gonçalves, encontrasse ocasião para atacar as políticas assistenciais do País, responsabilizando-as pela falta de mão de obra na cidade.

“Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade”, diz uma “nota de posicionamento” divulgada pela associação empresarial. Depreende-se que o recurso ao trabalho terceirizado, sem controle, seria consequência da falta de pessoas da região dispostas a trabalhar, pois quem tem “plenas condições produtivas” prefere o ócio dependente de auxílio do Estado.

Ou seja, para uns, os trabalhadores brasileiros são indolentes que preferem viver de esmolas estatais a pegar no batente; para outros, os trabalhadores brasileiros são culturalmente mais afeitos à vagabundagem. Entre uns e outros, estão duas centenas de brasileiros submetidos a uma rotina de trabalho que, segundo denúncias, incluía jornadas exaustivas, confinamento, comida estragada, assédio moral e atrasos nos pagamentos, entre outras violações. E não é um caso isolado.

Se a escravidão, em si mesma, já deveria causar horror, mais repulsiva ainda é a tentativa de justificá-la. Nenhuma sociedade que se pretende saudável pode ficar indiferente à escravidão ou, pior, encontrar argumentos para considerá-la como consequência quase natural de um desequilíbrio na oferta de mão de obra.

Ora, nem os trabalhadores brasileiros são sujos e malandros nem os programas de transferência de renda são financiadores de vadiagem. O Brasil é um país de profundas desigualdades, que empurram milhões de cidadãos para um mercado de trabalho desumano, quando não frontalmente criminoso, e os tornam totalmente dependentes de caraminguás oficiais. Quando há quem seja incapaz de compreender essa realidade, embora esteja brutalmente à vista de todos, percebe-se o tamanho do fosso moral em que o Brasil caiu. Fonte: https://www.estadao.com.br

Ódio à razão

Depois da tragédia do antagonismo que vivemos com a divisão nas famílias, nos colegas, sinto que estamos voltando ao modo educação, civilidade, respeito

 

Por Nelson Motta — Rio de Janeiro

Depois da tragédia do antagonismo que vivemos com a divisão, e separação, nas famílias, nos amigos, nos colegas de trabalho, sinto que a Terra voltou a ser redonda e que estamos voltando, lentamente, ao modo back to basics: educação, civilidade, respeito — não só às instituições democráticas, à Constituição e às leis, mas principalmente ao outro, seja quem for o outro.

Amar o próximo como a si mesmo é um exagero cristão psicanaliticamente inalcançável, mas respeitá-lo como a si próprio não é tão difícil assim (chama-se civilização), embora muita gente não se respeite, esculhambando seu corpo, suas ideias, sua vida e tentando esculhambar a dos outros. Qual a graça de criticar e reprimir comportamentos e atitudes que em nada afetam a sua vida, ou da comunidade? Então qual é o problema de duas mulheres se beijando no bar, de homens de mãos dadas, de um grupo de jovens fumando um baseado ? Como eles interferem na sua felicidade? Me sinto um idiota escrevendo coisas tão óbvias há tanto tempo, e só um período de regressão como o que vivemos explica tanta resistência, e ódio, ao império da razão.

Agora vejo que passamos por um processo de destruição da razão, como método, para tornar um boçal um mito e estabelecer uma linguagem tosca e grosseira em que verdade e mentira se confundem, em nome do slogan salazarista Deus, Pátria e Família. Só que a família é assunto privado, Deus, cada um tem o seu, e alguns, nenhum, e Pátria não é o Estado oprimindo, controlando e explorando o cidadão que paga impostos para sustentá-lo.

Quanto a Bolsonaro, entendo que o reverso do amor não é o ódio e o rancor — mas o desprezo e o esquecimento.

Busões negreiros

Que estupidez, ou forças satânicas, levam uma vinícola rica e poderosa do Rio Grande do Sul a importar mão de obra barata, e preta certamente, da Bahia, para trabalhar no frio, em uma cultura que não conhecem? Os gaúchos já não querem trabalhar por salários tão baixos em condições tão duras, os uruguaios, nem pensar, mas só um racismo estrutural e perverso explica os busões-negreiros Salvador-Bento Gonçalves. Os catarinas e os paranaenses lourinhos estão mais próximos e também precisam trabalhar... Economizariam no transporte da carga, (mal) paga, mas sempre escrava. Fonte: https://oglobo.globo.com

Seja em Auschwitz ou em vinícolas do Sul, fomos feitos para obediência e chicote

 

Jairo Malta

Designer, fotógrafo e jornalista. É autor do blog Sons da Perifa.

No portão de entrada de Auschwitz, a frase "o trabalho liberta" dava a ilusão de que, para homossexuais, testemunhas de Jeová, ciganos e a grande massa judaica que era levada até lá, bastava trabalhar para serem libertados. O fim dessa história sabemos muito bem. Um dos vários argumentos dos nazistas era o de que as vítimas deportadas para o campo de concentração polonês eram preguiçosas e antissociais.

Esse discurso e essas ideias não morreram em 1945. Na terça-feira (28), o vereador Sandro Fantinel (Patriota), de Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, pediu em seu discurso na Câmara Municipal para que "não contratem mais aquela gente lá de cima", referindo-se aos trabalhadores baianos. Fantinel disse ainda que empregados vindos da Argentina são melhores porque seriam "limpos, trabalhadores, corretos".

As falas de ódio se devem aos 207 funcionários nordestinos libertados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) de vinícolas de Bento Gonçalves (RS), que trabalhavam em regime análogo à escravidão e, segundo seus relatos, foram extorquidos, ameaçados, agredidos e torturados com choques elétricos e jatos de spray de pimenta.

O parlamentar afirma ainda que a "única cultura que os ‘baianos’ tem é viver na praia tocando tambor" —frase racista. Finaliza mencionando que eram bêbados e debocha do termo "análogo à escravidão". Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

O trabalho escravo permanece nas entranhas brasileiras. Chamar o baiano de festeiro e o argentino de limpinho é deixar nas entrelinhas que o branco é superior ao preto. E, como diria o influencer Negão da BL, "não adianta mentir, o racismo não vai acabar nunca".

Seja em Auschwitz ou nas vinícolas de Bento Gonçalves, para eles nós —negros, nordestinos, nortistas, indígenas e qualquer outra classe de povos originários— fomos feitos para o trabalho, para a obediência e para o chicote. E sem Carnaval, tambor ou amparo. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

‘Fui espancado com cabo de vassoura. Mandaram matar os baianos’, diz resgatado no RS sobre trabalho escravo

Depoimentos à PRF mostram ainda que nos alojamentos havia apenas quatro banheiros para mais de 200 pessoas

 

Por Ana Flávia Pilar — Rio

No dia 21 de fevereiro, três trabalhadores da Fênix Prestação de Serviços decidiram encaminhar um vídeo de denúncia no grupo da empresa. Nas imagens, eles apareciam encharcados e mostravam o que haviam recebido para o almoço. O menu era sempre o mesmo: arroz, feijão e frango com cheiro azedo.

Quando voltaram da colheita, cinco “capangas” do administrador da empresa já os aguardavam na porta do alojamento. Os funcionários foram agredidos com mordidas, choques, socos, cadeiradas nas costas e “gravatas”.

Em depoimentos ao Ministério do Trabalho, aos quais O GLOBO teve acesso, trabalhadores resgatados na semana passada no Rio Grande do Sul contam mais detalhes sobre o cotidiano nas dependências da Fênix. A empresa fornecia mão de obra terceirizada para vinícolas da região, como Aurora, Salton e Cooperativa Garibaldi.

Os seis relatos confirmam que os funcionários chegaram em Bento Gonçalves, vindos da Bahia, e assinaram um contrato de prestação de serviços no valor de R$ 3 mil por 45 dias de trabalho, o período da safra de uvas. Estava acordado que a jornada diária seria de 15 horas. Nenhum deles foi pago.

 

Falta de equipamentos

Eles receberam apenas R$ 400 para gastar em um mercadinho que pertencia ao dono da empresa, onde eram vendidos itens básicos a preços muito mais acima do normal. Um pacote de biscoito água e sal, por exemplo, custava R$ 15.

Além disso, havia apenas quatro privadas para mais de 200 trabalhadores, que viviam amontados em beliches, separados em quartos pequenos sem manutenção ou limpeza.

Em depoimento à PRF, X., de 36 anos, conta que os trabalhadores tinham de usar sua própria roupa de cama e travesseiro. “Um deles não tinha travesseiro e improvisava com a mochila para dormir.” Os itens de higiene tinham de ser comprados no mercadinho do administrador da Fênix.

relata ainda que, na véspera de fugir, foi trancado no quarto por quatro capangas. “Fui espancado com spray de pimenta, gravata no pescoço, pancadas com cabo de vassoura e mordida no ombro esquerdo. Depois, dois colegas chegaram e também foram espancados.” Ele diz ainda que houve uma “ordem de matar os trabalhadores baianos.”

Y., de 23 anos, diz que a marmita — “arroz, feijão e um pedaço de frango, geralmente com cheiro desagradável e azedo” — não vinha com talheres. Quem não tivesse tinha de usar a tampa da marmita. A água também era por conta dos trabalhadores.

W., de 20 anos, diz que os capangas “davam choque com laser para acordar” alguns trabalhadores. Quanto aos equipamentos de proteção, ele recebeu apenas um par de luvas e um par de botas. “As luvas eram de pano. Rasgaram em dois dias e não foram trocadas. As botas rasgaram em uma semana e não foram trocadas. No contrato dizia que receberíamos óculos de sol e protetor solar, o que não aconteceu.”

Um deles relata ter desmaiado durante a colheita. Foi levado de carro a um hospital por um funcionário da empresa, mas na volta teve de caminhar quatro quilômetros. Outro trabalhador viu dois colegas se esfaquearem. No dia seguinte, ambos foram trabalhar normalmente.

“Presenciei também o espancamento de um colega pelos motoristas e por mais um segurança. Todos andavam armados o tempo todo”, conta Z., de 22 anos. Pouco depois, ele e um colega foram levados a uma sala e “agredidos com uma cadeira de ferro na cabeça e socos na cabeça e nos braços. Durante as agressões, fomos ameaçados de morte.”

Veio então a decisão de fugir. No dia 22 de fevereiro, eles pularam a janela do alojamento, a uma distância de dois metros até uma laje. Depois, se jogaram diante de outros cinco metros de altura até o chão. Como caíram em um jardim, não se machucaram.

Um dos homens no grupo tinha um celular escondido, que foi usado para pedir dinheiro às famílias e chamar um carro de aplicativo. Os trabalhadores foram de carro até um posto de gasolina em Garibaldi e se esconderam no banheiro.

Pouco depois, pegaram outro carro de aplicativo até a rodoviária, onde compraram passagens para Caxias do Sul. No caminho, eles contataram agentes em um posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

 

Vinícolas repudiam

Procuradas, as vinícolas foram unânimes em repudiar os fatos relatados. A Cooperativa Garibaldi e a Salton ressaltaram ter encerrado imediatamente seus contratos com a Fênix após a revelação de que esta mantinha trabalhadores em condições análogas à escravidão.

A Salton informou ainda que “está adotando medidas austeras para que os fatos sejam devidamente esclarecidos e que não se repitam” e que “intensificou a fiscalização de fornecedores e prestadores de serviço”.

A Aurora afirmou que se solidariza com as vítimas e ressaltou que nenhum dos fatos relatados aconteceu dentro de suas instalações. A empresa disse ainda que “se colocou à disposição das autoridades competentes e vem atuando em conjunto com o Ministério Público do Trabalho.”

A Garibaldi informou que está prestando solidariedade aos trabalhadores e seus familiares, e reiterou que “jamais aceitará tais conduções em suas relações de trabalho.”

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foi procurada para saber se compra vinho canônico de alguma dessas vinícolas. A entidade afirmou em nota que, para a celebração da missa, devem ser buscados “vinhos de proveniência sobre a qual não existam dúvidas a respeito dos critérios éticos na sua produção.”. Fonte: https://oglobo.globo.com

O jurista tinha pautas que transcenderam o seu tempo e estão presentes no debate hodierno, o que comprova a genialidade do patrono do Senado da República

 

Rodrigo Pacheco

Ruy Barbosa é, até os dias de hoje, o político jurista mais notável da história nacional. Nascido na Bahia, em 1849, faleceu há exatos cem anos, em 1.º de março de 1923, no exercício de seu quinto mandato como senador da República. O baiano foi recordista de mandatos legislativos: passou 45 anos de sua vida no exercício de cargos eletivos, sendo 32 deles no Senado Federal. Dizia que “o senador é a personificação eletiva de um Estado”, ao ponderar que a Câmara Alta era composta de representantes da Federação.

Barbosa foi tanto para o desenvolvimento da República brasileira que é difícil de elencar tudo o que realizou sem cometer a injustiça de deixar algum feito no esquecimento. Ruy viveu muitas vidas em uma, além de colecionar postos públicos de grande relevância e de deixar como legado muitas reflexões que até hoje se fazem oportunas. Foi advogado, jornalista, diplomata, orador, ministro da Fazenda e da Justiça, deputado, senador na primeira legislatura da República, candidato à Presidência do Brasil, coautor da primeira Constituição republicana, membro fundador da Academia Brasileira de Letras e representante do Brasil na Conferência de Haia, o que lhe rendeu o apelido de “Águia de Haia”.

Patrono do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União e da advocacia brasileira, é lembrado em tribunais, em discursos políticos e em faculdades de Direito no Brasil inteiro. Reconhecimento merecido e justo. Afinal, foi Barbosa quem estabeleceu os pilares da República Democrática de Direito do nosso país, dedicou-se a criar uma consciência política na população brasileira e atuou fortemente em projetos que visavam à melhoria da qualidade do ensino no Brasil.

No Senado Federal, o baiano só deixou a Casa quando veio a falecer, aos 73 anos de idade. É uma figura tão distinta para o Poder Legislativo brasileiro que seu busto reside solitário no plenário da Câmara Alta brasileira, acima da Mesa. É uma espécie de guardião das leis da nossa República, exercendo até hoje o papel que se dispôs a realizar em vida. Estava lá, inclusive, quando as sedes dos Poderes da República foram invadidas em 8 de janeiro de 2023, dia triste e marcante para a nossa República, mas se manteve firme, assim como nossa democracia.

Aliás, sobre o regime democrático, Barbosa foi seu defensor, por considerar que a democracia representa poder do povo, igualdade e progresso. De fato, é dele a brilhante frase “o princípio do futuro é a democracia”. Hoje, quando olhamos para o nosso passado, podemos ver claramente que governos autoritários representaram retrocessos e que a democracia simboliza avanço civilizatório, de modo que, sim, podemos dizer que o começo do progresso é o estabelecimento de um governo democrático, e que Barbosa estava certo.

Além de defender a democracia, a “Águia de Haia” alertou para a necessidade de respeitar a legislação. O patrono do Senado é autor de uma célebre frase que resume a necessidade de submissão ao Estado de Direito, ao defender que é necessário agir “com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação”. Barbosa concluiu que esta lição, relativa ao respeito às leis, era “o programa da República”.

Grande orador, era conhecido por proferir discursos inflamados, e usou a tribuna do Senado diversas vezes para pronunciar verdadeiras aulas de política. O conteúdo de sua oratória era tão rico que, até hoje, sua vida e obra são objeto de pesquisa do Setor Ruiano. No plenário do Senado Federal, em 1911, mostrou que usava a palavra e o direito como armas de sua luta por um país justo e igualitário. Disse: “Não podia trazer a esta tribuna nem uma carabina nem uma espada. Trago ao recinto dos legisladores apenas um volume das nossas leis. Infelizmente bem fracas nestes tempos, têm sido sempre a minha única arma”.

Em Oração aos moços, seu discurso mais famoso, que escreveu como paraninfo de formatura da turma de 1920 da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, Barbosa confidenciou: “Tudo envidei por inculcar ao povo os costumes da liberdade e à República as leis do bom governo, que prosperam os Estados, moralizam as sociedades e honram as nações. Preguei, demonstrei, honrei a verdade eleitoral, a verdade constitucional, a verdade republicana”.

Barbosa foi um divisor de águas na política brasileira, trabalhando arduamente para plantar uma semente de consciência político-eleitoral na população brasileira. Para tanto, defendia a necessidade de que a população tivesse acesso à educação e à imprensa. Dizia que “os meios de educar a opinião não são outros senão a escola e a imprensa, dois sacerdócios sublimes”. É notório que o jurista tinha pautas que transcenderam o seu tempo e estão presentes no debate hodierno, o que comprova a genialidade do patrono do Senado da República.

Por tudo o que representou para o Parlamento brasileiro e para o Brasil, o Senado Federal realizará, às 10 horas deste 1.º de março, sessão solene em homenagem aos cem anos da morte desta personalidade que viveu à frente de seu tempo e cujos ensinamentos ecoam nos ambientes jurídico e político até a atualidade.

* PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL.Fonte: https://www.estadao.com.br

 

 

Declaração é resposta a ultimato da Casa Branca para agências federais desinstalarem aplicativo

 

Ilustração de logomarca do TikTok vista através de vidro quebrado - Dado Ruvic - 25.jan.23/Reuters

 

PEQUIM | REUTERS

China criticou nesta terça-feira (28) a decisão dos Estados Unidos de proibir suas agências governamentais de usarem o TikTok. Em um encontro regular com a imprensa, Mao Ning, uma das porta-vozes do Ministério das Relações Exteriores chinês, afirmou que a ação excede os limites do conceito de segurança nacional e representa um abuso de poder do Estado para reprimir empresas estrangeiras.

A fala de Ning se dá um dia após a Casa Branca estabelecer ultimato de 30 dias para a exclusão do app de dispositivos e sistemas federais. Segundo o governo americano, a medida foi tomada para preservar informações sigilosas —os EUA suspeitam que a plataforma seja usada para espionagem, embora a ByteDance, empresa que a desenvolveu, afirme não coletar mais dados do que outros programas do tipo.

A decisão impulsiona o cerceamento ao aplicativo nos últimos meses, em meio ao acirramento das tensões sino-americanas. Cerca de 19 dos 50 estados americanos já bloquearam ao menos parcialmente o acesso ao serviço em computadores governamentais. Diversas agências federais dos EUA, incluindo a Casa Branca e os departamentos de Defesa, Segurança Interna e de Estado, também baniram o app.

Essas medidas não impactam, porém, os mais de 100 milhões de americanos que usam a plataforma em dispositivos pessoais —ao menos até agora. Em dezembro, o Congresso apresentou projeto para proibir o TikTok nos EUA, em um texto que prevê o bloqueio de empresas de mídia sob influência de China e Rússia.

Na ocasião, a ByteDance, firma que controla o aplicativo de vídeos curtos, divulgou um comunicado repudiando o projeto. Segundo a companhia, as preocupações dos congressistas são alimentadas por desinformação. A ByteDance não se manifestou sobre o memorando da Casa Branca da segunda.

A American Civil Liberties Union, organização que luta pelos direitos e liberdades individuais dos americanos, criticou as tentativas de proibição do aplicativo no país. Em 2020, o então presidente Donald Trump tentou impor medidas para bloquear o uso do TikTok, mas perdeu uma série de batalhas judiciais.

Ainda na terça, o Comitê de Relações Exteriores da Câmara deve votar um projeto de lei que pode dar ao atual presidente americano, Joe Biden, autoridade para banir o TikTok de todos os dispositivos dos EUA. "Qualquer pessoa com o TikTok instalado deu ao Partido Comunista Chinês informações pessoais. É um balão espião no telefone", disse o deputado republicano Mike McCaul, autor da proposta.

Ele fazia referência à crise mais recente entre os países, ocasionada pela descoberta de um balão chinês sobrevoando o território americano no início do mês. Washington afirma que o balão era um instrumento de espionagem, enquanto Pequim diz que é um item de pesquisas, sobretudo meteorológicas.

A disputa agravou as diferenças entre as duas maiores potências mundiais nos últimos anos, motivadas por fatores que vão do apoio dos EUA à Taiwan, ilha considerada uma província rebelde pela China, à expansão militar americana no Sudeste Asiático em geral. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br

Já vimos esse filme antes e, mesmo soterrados e asfixiados, ele segue em cartaz. Perguntamos até quando se repetirá

 

Desde o dia 18 de fevereiro, o Brasil vem acompanhando o desastre que ocorreu no Litoral Norte de São Paulo. Segundo especialistas, isso aconteceu por uma combinação muito particular de fatores relacionados à chuva, ao vento e ao mar, gerando “um evento absolutamente extremo e histórico”. O número de mortos chegou a 65. Também há 2.251 vítimas desalojadas (deixaram suas casas, mas não necessitam de abrigo) e 1.815 desabrigados (em abrigos públicos ou privados).

Não sei se você que lê este texto agora compartilha o mesmo sentimento que tomou conta de mim, mas já reparou que todo ano sofremos com um desastre natural cuja causa foi a maior chuva de todos os tempos? Todo ano tem isso. Nunca estamos preparados. E sempre são as mesmas consequências: muitos mortos, autoridades indo ao local com discurso de que está sendo feito o máximo possível para ajudar.

Mas não está.

Em fevereiro do ano passado, Petrópolis registrou um recorde de chuva, causando a morte de 241 pessoas e deixando mais de 8.100 famílias dependentes do aluguel social.

Saindo das cidades mais afastadas e chegando às metrópoles, que sentimento surge em quem sai do trabalho para casa quando chove por apenas 15 minutos? Quem não se lembra do vídeo do carioca revoltado com os efeitos de mais um temporal na cidade? Isso foi em 2010. O que mudou de lá para cá?

O último fato da série retrô aqui: dias 11 e 12 de janeiro de 2011, o Estado do Rio de Janeiro viveu o que muitos consideram a maior tragédia climática da História do Brasil. Segundo registros de órgãos públicos, foram 918 mortos e 34.600 desalojados.

— Não é possível que todo verão a gente seja surpreendido. Existe tecnologia para evitar grandes estragos. Há pouco tempo foram instaladas sirenes, sistema de alarme, em áreas de risco em épocas de fortes chuvas. Precisamos estar muito atentos, e o poder público sabe disso. Existem instituições que fazem um ótimo trabalho para ajudar na identificação e na prevenção de desastres — diz Christovam Barcellos, coordenador do Observatório de Clima e Saúde e vice-diretor de Pesquisa, Ensino e Desenvolvimento Tecnológico do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz.

Voltando a 2023, o g1 revelou que o governo de São Paulo tinha plena ciência com dois dias de antecedência do risco de tragédia no Litoral Norte, inclusive na área mais afetada, a Vila Sahy, mas os avisos foram feitos apenas on-line.

O governador Tarcísio de Freitas declarou:

— Então, foram disparados 2,6 milhões de alertas antes das chuvas que nós tivemos agora via SMS. E a gente viu que isso, eventualmente, não tem a maior efetividade. Aqui para o litoral, mais de 30 mil pessoas receberam o SMS de alerta. Então a gente precisa ter uma maneira mais efetiva.

Esse tipo de postura demonstra o menosprezo pelas pessoas em situação de vulnerabilidade. Todos os fatos escancaram que não é uma chuva que mata, mas sim o poder público. Não, não fomos surpreendidos. Já vimos esse filme antes e, mesmo soterrados e asfixiados, ele segue em cartaz. Perguntamos até quando ele se repetirá. Fonte: https://oglobo.globo.com

Corpo de Bombeiros localizou corpo com após escavação de quatro metros de profundidade na Vila Sahy.

 

Por g1 Vale do Paraíba e região

O corpo de uma mulher foi encontrado na tarde deste sábado (25) na Vila Sahy, em São Sebastião (SP), com a ajuda do aparelho que rastreia sinal de celular. Com isso, o número de mortes no Litoral Norte sobe para 58, sendo 57 em São Sebastião e uma em Ubatuba. A vítima ainda não foi identificada e as buscas seguem para encontrar mais sete desaparecidos.

O Corpo de Bombeiros localizou o corpo em meio aos escombros após uma escavação de quatro metros de profundidade, por volta das 14h40. A localização só foi possível após um rastreador móvel da Anatel emitir a presença de um aparelho de telefone celular. Desde a tragédia, ocorrida no último domingo (19), este é o terceiro corpo encontrado com o uso do equipamento.

As buscas por sobreviventes entraram no sétimo dia neste sábado (25). A maior parte das vítimas foi localizada no bairro da Vila Sahy, em São Sebastião, e é nessa região onde se concentram as buscas.

Durante as primeiras horas do dia, o tempo era firme na cidade, o que facilita o trabalho do Corpo de Bombeiros. No entanto, a prefeitura de São Sebastião emitiu um alerta em suas redes sociais para o risco de fortes chuvas entre este sábado e a próxima segunda-feira (27). Há previsão de que chova cerca de 85 milímetros no período, com chances de desabamentos, deslizamentos e enchentes.

Na tarde desta sexta-feira (24), as buscas chegaram a ser paralisadas também por conta das chuvas, mas foram retomadas por volta das 21h e seguiam durante a manhã, sem intercorrências. Na madrugada, porém, nenhum corpo foi encontrado.

Além do trabalho de buscas, os Bombeiros também agem para tentar convencer os moradores de áreas de risco a deixarem suas casas enquanto a situação não for normalizada, a fim de evitar novas tragédias.

Roberto Farina, tenente do Corpo de Bombeiros, afirma, em entrevista ao GloboNews, que a entidade está fazendo um "trabalho de conscientização" com esses moradores e que o número de desalojados e desabrigados vem crescendo dia após dia.

De acordo com o último boletim do estado, são 2.251 desalojados e 1.815 desabrigados. Desalojados são aqueles que deixam a residência e vão para casa de parentes ou amigos. Já os desabrigados são aqueles que saem de casa e não têm para onde ir. Para essas pessoas, a cidade já montou 19 abrigos.

A prefeitura de São Sebastião, o governo estadual e os Bombeiros pedem, ainda, que turistas não viagem para a cidade neste fim de semana. Além dos riscos de novos deslizamentos e enchentes, o turismo pode sobrecarregar os hotéis e hospitais da cidade, que atualmente estão focados em atender os moradores e pessoas que trabalham nas buscas. Fonte: https://g1.globo.com

 

Um ano de guerra, 7,8 milhões de crianças do país foram privadas de 365 dias de jogos, memórias, educação e tempo com amigos e familiares.

Um ano após o início da guerra na Ucrânia, 438 crianças foram mortas e 854 feridas. Cerca de 3,4 milhões de crianças necessitam de assistência humanitária no país. 1,5 milhões de crianças correm o risco de depressão, ansiedade, TEPT e outras doenças mentais, mais de 5 milhões de crianças sofreram interrupções em sua educação, 2 em cada 3 crianças refugiadas ucranianas não estão matriculadas no sistema escolar do país anfitrião, mais de 1.000 instalações de saúde foram danificadas ou destruídas, assim como mais de 2.300 escolas primárias e secundárias.

Estes não são apenas números, diz um comunicado do UNICEF/Italia: as crianças ucranianas sofreram 365 dias de violência, trauma, perda, destruição e deslocamento desde o início da guerra em fevereiro de 2022. As 7,8 milhões de crianças do país foram privadas de 365 dias de jogos, memórias, educação e tempo com amigos e familiares.

Isso significa 365 dias em que as crianças passaram seus aniversários amontoadas em abrigos, em vez de em casa com seus entes queridos. 365 dias em que as crianças tiveram que se adaptar a uma vida em outros países, em vez de brincar com seus amigos no parque perto de suas casas. 365 dias em que as crianças conheceram seus colegas e professores através de uma tela, em vez de em uma sala de aula segura e aquecida. 365 dias em que as crianças esperavam que a vida logo 'voltasse ao normal'.

À medida que se aproxima da marca de um ano, as crianças ucranianas começaram a perceber que o mundo é instável, imprevisível e pode ser um lugar terrível. A perda de um senso básico de segurança tem um efeito catastrófico em seu aprendizado, desenvolvimento emocional e social.

Embora as crianças e famílias ucranianas tenham mostrado uma tremenda resiliência, as feridas psicológicas desta guerra podem, de fato, deixá-las marcadas para o resto de suas vidas. Um ano após o início da guerra, as crianças continuam a enfrentar o medo, a ansiedade e a dor associadas à perda de entes queridos, separação da família, deslocamento forçado de suas casas, isolamento e a completa reviravolta em suas vidas. As feridas mentais da guerra podem reverberar nas crianças até a idade adulta. Para evitar uma geração de crianças marcadas pela guerra, sua saúde mental e necessidades psicossociais devem ser priorizadas.

Situação que angustia também o Papa Francisco, que na entrevista ao Canal 5 da tevê italiana recorda que elas "esqueceram-se de rir... Muitas crianças vieram aqui, muitas da Ucrânia, não riem... São amáveis, sim, mas não não riem, elas perderam isso. Fui encontrar as crianças que estavam no Bambino Gesù ucranianas, feridas, ninguém (tinha) um sorriso”. Para o Santo Padre, “tirar o sorriso de uma criança significa... uma tragédia!”. E esta tragédia está marcando o nosso tempo.

Esta guerra também já privou os bebês ucranianos de um ano de suas vidas. Não podemos permitir que isso os prive de seu futuro também. As crianças ucranianas precisam de paz e devemos ajudá-las a se recuperar e reconstruir suas vidas”. Fonte: https://www.vaticannews.va

STF decide que provedores estrangeiros devem entregar dados requisitados pela Justiça, como qualquer empresa local

 

No dia 23 de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que as autoridades nacionais podem solicitar dados diretamente a provedores de internet estrangeiros que prestam serviços no Brasil. Ao ratificar a constitucionalidade do art. 11 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), a decisão do Supremo assegura um ponto fundamental do Estado Democrático de Direito. Todas as plataformas digitais e empresas de tecnologia que atuam no País, mesmo que suas sedes ou seus provedores estejam situados no exterior, se sujeitam à lei brasileira.

A autora da ação, uma federação de empresas de tecnologia, defendia que o acesso judicial a dados de usuários da internet por provedores sediados no exterior deveria, necessariamente, seguir os trâmites previstos no Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal (MLAT, em inglês), assinado entre o Brasil e os Estados Unidos. O argumento da ação era um tanto absurdo. Tentava-se usar um acordo de cooperação entre dois países, firmado precisamente para facilitar investigações criminais, como uma forma de dificultar o acesso da Justiça brasileira a dados relacionados a serviços prestados no País.

Corretamente, o MLAT prevê que as solicitações relativas a questões penais devem passar por uma autoridade central designada por cada país; no caso do Brasil, o Ministério da Justiça. Essa sistemática, que se aplica a informações e eventos ocorridos no exterior, é o reconhecimento da soberania de cada país sobre seu respectivo território.

No entanto, a hipótese de solicitação de dados analisada pelo STF era diferente, referindo-se a fatos ocorridos no Brasil. E aqui está a importância do Marco Civil da Internet, que define quando atos praticados no mundo digital estão sujeitos à jurisdição brasileira. Segundo o art. 11 da Lei 12.965/2014, toda operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros e dados feita por provedores de conexão ou de aplicações de internet, “em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional”, deverá respeitar “a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros”.

Atuando como terceiro interessado na ação, a empresa Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, defendeu no STF que o MLAT seria o “procedimento correto” para obtenção de dados controlados por empresas norte-americanas. É realmente peculiar que uma empresa que atua tão intensamente no País (são cerca de 116 milhões de contas no Facebook, 99 milhões de perfis no Instagram e 147 milhões de usuários de WhatsApp no Brasil) pretenda que a Justiça brasileira, ao precisar de algum dado relativo a essas contas, tenha de recorrer a um acordo de cooperação internacional.

Seja qual for o setor de atuação, toda empresa que opera no Brasil está sujeita à lei e à jurisdição brasileiras. Tentar escapar dessa realidade (ou limitar sua incidência) não é apenas uma manobra judicial pouco honrosa. Representa um desrespeito ao País. Fonte: https://www.estadao.com.br

Juízes americanos podem responsabilizar Big Techs pelo conteúdo impulsionado pelos algoritmos de suas plataformas

 

Pedro Doria

A Suprema Corte americana começou a analisar um caso que pode mudar a cara da internet. Os pais de Nohemi Gonzalez, uma universitária de 23 anos que morreu num ataque terrorista em Paris, estão processando o YouTube. Seus advogados alegam que os três responsáveis pelo ataque no Teatro Bataclan, em 2015, foram radicalizados após assistirem a uma série de vídeos recomendados pelo site e produzidos pelo Estado Islâmico.

A praxe da Corte americana é de escolher os casos que julgará. Ela não é obrigada a aceitar nenhum, mas, sempre que considera haver uma questão constitucional importante, entra no debate. Os advogados submetem aos nove juízes seus argumentos por escrito e, depois, são convidados a sessões de sustentação oral. É quando os ministros têm a oportunidade de compreender melhor como cada lado vê o tema em debate. A primeira sessão foi na última terça-feira, 21.

O que está sendo testado é a seção 230 do Ato das Telecomunicações, aprovado pelo Congresso e sancionado pelo presidente Bill Clinton, em 1996. Em essência, a lei definiu que uma empresa com presença na web não poderia ser responsabilizada pelo que dizem usuários que publicam em seus sites. Em 1996, poucos sites ofereciam espaços para comentários. Havia também espaços de discussão, fóruns, começando a se popularizar. Não existiam ainda blogs, muito menos redes e algoritmos.

Ao falar de algoritmos, a partir de que momento as gigantes da tecnologia passam a ser responsáveis pelo que recomendam?

E esse é o argumento da família Gonzalez. A lei pode proteger o YouTube de coisas que o EI tenha publicado. A partir do momento em que o YouTube pinça um vídeo para sugerir a quem assiste, aí o exercício de expressão não é mais dos terroristas. O YouTube, como qualquer outro serviço baseado em algoritmos, se exprime através das escolhas de conteúdo que faz. O responsável pela seleção não é quem produziu o conteúdo. É o YouTube. Ou o Twitter. Ou o Facebook.

Mas alguns dos ministros exprimiram dúvidas. Afinal, mecanismos de seleção de conteúdo baseados em algoritmos tornaram a internet viável. Tornar as empresas responsáveis pelo que seus algoritmos recomendam não poderia abrir uma imensa onda de processos que trariam impactos econômicos inimagináveis?

A pergunta, que os juízes parecem estar fazendo, é onde está a linha divisória. Por óbvio, outras indústrias são responsáveis pelos danos que suas decisões internas causam. Ao falar de algoritmos, a partir de que momento as gigantes da tecnologia passam a ser responsáveis? A Suprema Corte tomará uma decisão este ano – e a decisão pode, inclusive, ser não decidir nada. Por enquanto. Fonte: https://www.estadao.com.br

Saída é valorizar dimensão ambiental do planejamento urbano e territorial

 

Nadia Somekh

Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU-BR), é professora emérita da Universidade Mackenzie

Barra do Sahy soterrada, ao menos 48 mortos (47 em São Sebastião e 1 em Ubatuba), 36 desaparecidos, cerca de 2.500 pessoas desalojadas ou desabrigadas, veranistas ilhados na praia da Baleia e o âncora da TV criticando o prefeito por não ter avisado a população dos morros.

O que poderia ter sido feito? O problema não é acionar sirenes em momentos da emergência, como o que ocorre agora no litoral norte paulista. O problema é o histórico processo de urbanização de nosso país que não dá lugar na regulação urbanística para os mais pobres e vulneráveis, agravado agora pela escalada das mudanças climáticas.

De acordo com o IBGE, o Brasil tinha em 2010 (dado mais recente), em 872 municípios mapeados, uma população aproximada de 8,2 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco, abrigadas em cerca de 1,5 milhão de moradias permanentes.

A maior parte das áreas de risco está localizada na costa leste do país justamente pelo fato de a ocupação do território ter se concentrado no litoral, mais suscetível à ocorrência de desastres naturais, associados à ocupação de encostas íngremes, topos de morros e cursos de água, conforme ressaltado por pesquisadores do Instituto Geológico.

Por sua vez, o 5º Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) já alertava que, sem mitigação do aumento da temperatura global, os maiores castigados pelas mudanças climáticas serão provavelmente os países tropicais, como o Brasil.

Sirenes serão insuficientes se dependermos apenas delas para que catástrofes como esta não se repitam nos próximos verões, com inundações, deslizamentos, colapso de serviços públicos em cidades e quedas de barreiras e isolamentos em estradas. E sobretudo gente morta.

Se houvesse uma política habitacional para a população mais carente, tal tragédia não teria acontecido. Sem essa política, onde a população vai morar? Onde é irregular, onde é ilegal; enfim, para onde foi empurrada pela especulação imobiliária em razão do preço da terra. Essas pessoas só conseguem algum tipo de abrigo, nada digno, em locais de risco.

É preciso ainda valorizar a dimensão ambiental do planejamento urbano e territorial em consequência das mudanças climáticas, como ressaltado em manifesto aos candidatos nas eleições de 2022 lançado pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil e mais seis entidades representativas dos arquitetos e urbanistas brasileiros. A Carta aos Candidatos propôs uma agenda que priorize a qualidade e o cuidado com a vida da população brasileira.

O momento é propício para colocar essa agenda em prática. Todos os municípios com mais de 20 mil habitantes estão, por dever legal, revendo seus planos diretores, considerando os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, a Nova Agenda Urbana e o pacto climático do Acordo de Paris.

A arquitetura e o urbanismo têm muito a contribuir com as revisões dos planos diretores, ajudando prefeitos, vereadores e comunidades na definição dos territórios seguros para as habitações dos mais pobres, reconhecendo a intensidade das alterações climáticas, em busca de maior justiça e resiliência para as cidades brasileiras. Nessa perspectiva, a continuidade da integração das autoridades públicas vista nos últimos dias será essencial. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br