Frei Cláudio van Balen, O. Carm., do Convento do Carmo de Belo Horizonte-MG.

Em 1936, morre sua mãe, o que possibilita que sua irmã Rosa venha unir-se a ela, em Colônia. Há tempo, ela desejava ser batizada, mas resolveu poupar sua mãe desse sofrimento. O batismo acontece na véspera do Natal, na presença de Edith.  No ano seguinte, festa de 300 anos do mosteiro, a religiosa escreve: “Vamos ao encontro de grandes mudanças. Na expectativa das mesmas, temos como dever apoiar com nossa oração todos que já estão envolvidos na luta”.  Em 1938, 21 de abril, ela faz a Profissão Perpétua. Nesse ano, os alemães são convocados duas vezes para se pronunciar a respeito do Führer, mas Edith perdeu seu direito de voto. Na primeira votação, dois senhores se apresentam para colher informações sobre a ausência da Dra Stein. Ela assume sua condição de não ariana, e responde à priora que lhe pergunta o que decide fazer: “Se estes senhores apreciam tanto meu não, eu não o posso negar a eles”. 

Na segunda vez, a maioria das irmãs resolve omitir-se para não votar contra Hitler. Edith acha isso um absurdo. Uma delegação vem buscar os bilhetes das religiosas e elas são convocadas. No fim, a superiora tem de explicar a ausência de duas irmãs. Resposta: a irmã Ana é doente mental e não tem condições. E quando, insistindo, perguntam pela Dra Stein, a superiora responde: ”Ela não é ariana”. A declaração é anotada e os homens se despedem apressados. Edith resolve deixar o país. Na noite de 9 de novembro (Kristallnacht), em 1938, os nazistas vingam a morte de um companheiro, Ernest von Rath que, em Paris, é assassinado por um rapaz judeu,  Herschel Grynszpan, cujos pais tinham sido deportados. A explosão anti-semita resultou na profanação e destruição de todas as quase 1000 sinagogas do país que foram incendiadas. E 7.500 estabelecimentos comerciais de judeus foram saqueados e 30.000 judeus são brutalmente jogados em campos de concentração, sendo que milhares são assassinados. Livros judaicos são queimados e decretos raciais instituem a discriminação. Iniciou-se a destruição do judaísmo na Alemanha. Na sociedade e na religião, faltaram gestos de protesto.

O mundo está consternado e Edith carrega uma dor que a esmaga. “É a sombra da cruz que cai sobre meu povo”, escreve. Perseguir judeus é perseguir a humanidade de Jesus. “Ai da cidade, do país, das pessoas sobre quem a ira divina vai manifestar-se, devido a tantos crimes cometidos contra os judeus”. Ela tentou ir para a Palestina, o Carmelo de Belém, mas lhe negaram a permissão. Na noite de 31 de dezembro de 1938, ela foge para o Carmelo de Echt, na Holanda. Para lá, tinham fugido as irmãs alemãs nos anos de 1871-1878, durante a “Kulturkampf” de Bismarck contra os católicos alemães, e a maioria das religiosas ainda era alemã. No verão de 1940, sua irmã Rosa veio unir-se a ela naquela comunidade. Quando em setembro daquele ano, foi eleita a nova priora, esta a encarregou de escrever algo sobre São João da Cruz, por ocasião do 4o Centenário do grande Santo Carmelita.

Trata-se do livro “A Ciência da Cruz”, iniciado em 1941 e escrito de uma vez. Nele, ela apresenta um tipo de auto-biografia espiritual, registrando também seu protesto contra a ideologia racista do nazismo.

De fato, o que escreve nessas páginas tem tudo a ver com o que ela mesma está passando. No símbolo da cruz, morte e vida estão inseparavelmente interligadas; e Edith externa a certeza absoluta da vitória da luz sobre as trevas. Melhor ainda, transmite a convicção de que a luz surge das profundezas da escuridão, embora ela tivesse de esperar para completar corporalmente o que permaneceu incompleto no livro. Nunca ela insinuou encontrar-se em um esconderijo, atrás dos muros do mosteiro, dos quais disse com senso de humor: “Deus não se obrigou de deixar-nos para sempre ali dentro”. Em 1935, já respondera a uma amiga que ali a julgava segura: “Não tenha isto como uma certeza! Certamente eles vão me procurar aqui. E eu não acredito de forma alguma que vou ser poupada”. Na noite do domingo da Paixão, em 1939, ela escreve um bilhete para a Priora: Querida Madre: por favor, permita-me Vossa Reverendíssima me oferecer ao Coração de Jesus como instrumento eficaz pela paz autêntica: que o poder do mal se derrube e, se for possível, sem uma nova guerra mundial, que se possa instaurar uma nova ordem de coisas. Desejaria fazê-lo hoje”.

Frei Carlos Mesters, O.Carm

1) Oração

Despertai, ó Deus, o vosso poder e socorrei-nos com a vossa força, para que vossa misericórdia apresse a salvação que nosso pecados retardam. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,  na unidade do Espírito Santo. Amém.

2) Leitura do Evangelho  (Mateus 7, 21.24-27)

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 21Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus. 24Aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as põe em prática é semelhante a um homem prudente, que edificou sua casa sobre a rocha. 25Caiu a chuva, vieram as enchentes, sopraram os ventos e investiram contra aquela casa; ela, porém, não caiu, porque estava edificada na rocha. 26Mas aquele que ouve as minhas palavras e não as põe em prática é semelhante a um homem insensato, que construiu sua casa na areia. 27Caiu a chuva, vieram as enchentes, sopraram os ventos e investiram contra aquela casa; ela caiu e grande foi a sua ruína. - Palavra da salvação.

3) Reflexão

O evangelho de hoje traz a parte final do Sermão da Montanha. O Sermão da Montanha é uma nova leitura da Lei de Deus. Começa com as bem-aventuranças (Mt 5,1-12) e termina aqui com a casa na rocha.

*   Trata-se de adquirir a verdadeira sabedoria. A fonte da sabedoria é a Palavra de Deus expressa na Lei de Deus. A verdadeira sabedoria consiste em ouvir e praticar a Palavra de Deus (Lc 11,28). Não basta dizer “Senhor, Senhor!” O importante não é falar bonito sobre Deus, mas sim fazer a vontade do Pai e, desse modo, ser uma revelação do seu amor e da sua presença no mundo.

*   Quem ouve e pratica a palavra constrói a casa sobre a rocha. A firmeza da casa não vem da casa em si, mas vem do terreno, da rocha. O que significa a rocha? É a experiência do amor de Deus que se revelou em Jesus (Rom 8,31-39). Tem gente que pratica a palavra para poder merecer o amor de Deus. Mas amor não se compra nem se merece (Cnt 8,7). O amor de Deus se recebe de graça. Praticamos a Palavra não para merecer, mas para agradecer o amor recebido. Este é o terreno bom, a rocha, que dá segurança à casa. A segurança verdadeira vem da certeza do amor de Deus! É a rocha que nos sustenta na hora das dificuldades e das tempestades.

*   O evangelista encerra o Sermão da Montanha (Mt 7,27-28) dizendo que a multidão ficou admirada com o ensinamento de Jesus, pois "ele ensinava com autoridade, e não como os escribas". O resultado do ensino de Jesus é a consciência crítica do povo com relação às autoridades religiosas da época. Admirado e agradecido, o povo aprovava os ensinamentos tão bonitos e tão diferentes de Jesus.

4) Para um confronto pessoal

 

  1. Sou dos que dizem “Senhor, Senhor”, ou dos que praticam a palavra?
  2. Observo a lei para merecer o amor e a salvação ou para agradecer o amor e a salvação de Deus?

5) Oração final

Dá, Senhor, tua salvação! Dá, Senhor, tua vitória Bendito o que vem em nome do Senhor! (Sal 117, 25-26a)

Frei Carlos Mesters, O.Carm

1) Oração

Senhor Deus, preparai os nossos corações com a força da vossa graça, para que, ao chegar o Cristo, vosso Filho, nos encontre dignos do banquete da vida eterna

e ele mesmo nos sirva o alimento celeste. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém.

2) Leitura do Evangelho (Mateus 15, 29-37)

Naquele tempo, 29Jesus saiu daquela região e voltou para perto do mar da Galiléia. Subiu a uma colina e sentou-se ali. 30Então numerosa multidão aproximou-se dele, trazendo consigo mudos, cegos, coxos, aleijados e muitos outros enfermos. Puseram-nos aos seus pés e ele os curou, 31de sorte que o povo estava admirado ante o espetáculo dos mudos que falavam, daqueles aleijados curados, de coxos que andavam, dos cegos que viam; e glorificavam ao Deus de Israel. 32Jesus, porém, reuniu os seus discípulos e disse-lhes: Tenho piedade esta multidão: eis que há três dias está perto de mim e não tem nada para comer. Não quero despedi-la em jejum, para que não desfaleça no caminho. 33Disseram-lhe os discípulos: De que maneira procuraremos neste lugar deserto pão bastante para saciar tal multidão? 34Pergunta-lhes Jesus: Quantos pães tendes? Sete, e alguns peixinhos, responderam eles. 35Mandou, então, a multidão assentar-se no chão, 36tomou os sete pães e os peixes e abençoou-os. Depois os partiu e os deu aos discípulos, que os distribuíram à multidão. 37Todos comeram e ficaram saciados, e, dos pedaços que restaram, encheram sete cestos. - Palavra da salvação.

3) Reflexão

O evangelho de cada dia é como o sol que se levanta. Sempre o mesmo sol, todos os dias, a alegrar a vida e a fertilizar as plantas. O maior perigo é a rotina. A rotina mata o evangelho, e apaga o sol da vida.

*   São sempre os mesmos elementos que compõem o quadro do evangelho: Jesus, a montanha, o mar, a multidão, os doentes, os necessitados, os problemas da vida. Apesar de já bem conhecidos, como o sol de cada dia, estes mesmos elementos sempre trazem uma nova mensagem.

*   Como Moisés, Jesus sobe a montanha e o povo reúne ao redor. Eles trazem consigo seus problemas: os doentes, os coxos, aleijados, cegos, mudos, tantos... Não são os grandes, mas os pequenos. Eles são o começo do novo povo de Deus que se reúne ao redor do novo Moisés. Jesus cura a todos.

*   Jesus chama os discípulos. Ele sente compaixão do povo que não têm o que comer. Para os discípulos, a solução deve vir de fora: “Onde conseguir pão para tanta gente?” Para Jesus, a solução deve vir de dentro do povo: “Quantos pães vocês têm?” –“Sete e uns peixinhos”. Com este pouco Jesus matou a fome de todos, e ainda sobrou. Se houvesse partilha hoje, não haveria fome no mundo. Sobrava, e muito! Realmente, um outro mundo é possível!

*   A narração da multiplicação dos pães evoca a eucaristia e dela revela o valor, ao dizer: “Jesus tomou o pão em suas mãos, deu graças, o partiu e deu aos seus discípulos”.

4) Para um confronto pessoal

  1. Jesus teve compaixão. Existe compaixão em mim pelos problemas da humanidade? Faço algo?
  2. Os discípulos esperam a solução de fora. Jesus desperta para a solução de dentro. E eu?

5) Oração final

O Senhor nosso Deus chegará com poder e encherá de luz os seus fiéis. (Is 40,10; cf. 34,5)

Frei Carlos Mesters, O.Carm

1) Oração

Senhor nosso Deus, dai-nos esperar solícitos a vinda do Cristo, vosso Filho. Que ele, ao chegar, nos encontre vigilantes na oração e proclamando o seu louvor. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém.

2) Leitura do Evangelho   (Mateus 8, 5-11)

Naquele tempo, 5Entrou Jesus em Cafarnaum. Um centurião veio a ele e lhe fez esta súplica: 6Senhor, meu servo está em casa, de cama, paralítico, e sofre muito. 7Disse-lhe Jesus: Eu irei e o curarei. 8Respondeu o centurião: Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha casa. Dizei uma só palavra e meu servo será curado. 9Pois eu também sou um subordinado e tenho soldados às minhas ordens. Eu digo a um: Vai, e ele vai; a outro: Vem, e ele vem; e a meu servo: Faze isto, e ele o faz... 10Ouvindo isto, cheio de admiração, disse Jesus aos presentes: Em verdade vos digo: não encontrei semelhante fé em ninguém de Israel. 11Por isso, eu vos declaro que multidões virão do Oriente e do Ocidente e se assentarão no Reino dos céus com Abraão, Isaac e Jacó, - Palavra da salvação.

3) Reflexão

O Evangelho de hoje é um espelho. Ele evoca em nós as palavras que dizemos durante a Missa na hora da comunhão: “Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e serei salvo”. Olhando no espelho deste texto, ele sugere o seguinte:

*   A pessoa que procura Jesus é um pagão soldado do exército romano que dominava e explorava o povo. Não é a religião nem o desejo de Deus, mas sim a necessidade e o sofrimento que o levam a procurar Jesus. Jesus não tem preconceito. Não faz exigência prévia, mas acolhe e atende ao pedido do oficial romano.

*   A resposta de Jesus surpreende o centurião, pois ela ultrapassa a expectativa. O centurião não esperava que Jesus fosse até à casa dele. Ele se sente indigno: “Não sou digno!”  Sinal de que considerava Jesus como uma pessoa muito superior.

*   O centurião expressa sua fé em Jesus dizendo: “Diga só uma palavra e o meu empregado estará curado”. Ele crê que a palavra de Jesus possa fazer a cura. De onde ele tirou esta fé tão grande? Da sua experiência profissional como centurião! Pois quando um centurião dá suas ordens, o soldado obedece. Deve obedecer! Assim ele imagina Jesus: basta Jesus dizer uma palavra, e as coisas acontecem conforme a palavra. Ele crê que a palavra de Jesus tem força criadora.

*   Jesus ficou admirado e elogiou a fé do centurião. A fé não consiste em aceitar, repetir e decorar uma doutrina, mas sim em crer e confiar na pessoa de Jesus.

4) Para um confronto pessoal

  1. Colocando-me na posição de Jesus: como atendo e acolho as pessoas de outra religião?
  2. Colocando-me na posição do centurião: qual a experiência pessoal que me leva a crer em Jesus?

5) Oração final

Lembra-te de mim, Senhor, pelo amor do teu povo, visita-me com teu auxílio salvador; para eu sentir a felicidade dos teus eleitos, e me alegrar com a alegria do teu povo e me gloriar com tua herança. (Sal 105, 4-5)

TEMA: A ORAÇÃO NAS ORIGENS E NA REGRA DO CARMELO.

O Beato Titus Brandsma, Mártir da 2ª Guerra mundial,  escreveu que a oração é vida, não um oásis no deserto da vida. A oração é uma parte essencial do carisma carmelitano. Espera-se que sejamos homens de oração e que formemos comunidades orantes. O Carmelo é certamente símbolo da oração para a maioria das pessoas em todo mundo.

Necessitamos escutar atentamente de modo que sejamos capazes de ouvir a voz de Deus em meio a outras vozes e poder discernir o que Deus quer nos dizer. Nossos sentidos espirituais necessitam afinar-se constantemente e isto acontece através do nosso modo de viver com fé os valores da Regra meditando na lei do Senhor dia e noite e velando em oração.

Como abelhas do Senhor

Na base da oração-contemplação vivida no Carmelo encontramos a experiência e o modo de entendê-la dos eremitas que, no final do século XII e nos primeiros decênios do século seguinte, viviam à imitação do Profeta Elias, no Monte Carmelo, perto da fonte chamada de Elias, - “Em pequenas celas, semelhantes a alvéolos, como abelhas do Senhor, recolhendo o mel divino da doçura espiritual” (Jacques de Vitry) - esforçando-se continuamente para assimilar o modo de ser de Cristo.

Esta atitude dos primeiros carmelitas vem codificada na Vitae Formula (depois Regra do Carmo), pelo santo Patriarca de Jerusalém,

Perspectiva cristocêntrica

O fundamento de todo o discurso albertino é a colocação do Absoluto da experiência humana em Jesus Cristo. Nele adquire sentido a expressão de conotação bíblica (cf. 2Cor 10,5), “Viver em obséquio de Jesus Cristo” (RC, n. 2), aplicado conforme a mentalidade da época medieval: colocando realmente Cristo como início e fim de toda a realidade e de toda a vida carmelitana.

O centro vital da proposta é a Eucaristia (cf. RC, n. 14), compreendida não como simples rito, mas como realidade que constrói a Igreja, cujo significado está expresso no simbolismo do convergir quotidano para a capela ou oratório, construído no meio das celas. O discurso sobre a oração no Carmelo não pode ser compreendido sem esta sua característica cristocêntrica e sem a referência eclesial do mesmo.

A estrutura dinâmica da oração segundo a Regra

Indicações e prescrições sobre a oração na Regra, no contexto do primeiro grupo carmelitano encontramos mais que evidente o seu caráter cristológico que unifica o empenho concreto (estrutura e formas de oração) e exige a encarnação na realidade onde está se formando a Igreja, corpo místico e total de Cristo. Em todo o discurso feito, através do estudo da Regra sobre a oração, é possível individuar a estrutura dinâmica que vem proposta ao carmelita como caminho - itinerário de crescimento em direção à plenitude de vida e a comunhão com Deus e o seu mistério.

São elementos desta estrutura dinâmica:

A atitude dialógica de escuta e de acolhimento da Palavra (RC, nn. 10, 11, 14, 24); A busca de Deus no quotidiano, baseada na interiorização (RC, nn.18-19; cf. também a espiritualidade do caminho-peregrinação); Entre a contemplação e a ação. Fica claro em todo o conjunto do “discurso” que esta é problemática mais tardia na vida da Ordem;

A atitude dinâmica do “Vacare Deo”

Na Regra Carmelitana a oração, antes de ser um precioso exercício, constitui-se numa postura dinâmica no sentido do “Vacare Deo”, com seu caráter de continuidade, conduzindo a uma dependência de Deus, buscado na própria vida, em cada situação e aspecto da realidade quotidiana.

  1. Por isto, segundo a Regra, o carmelita deve concretizar a oração numa atitude vital, tornando-se sempre disponível ao encontro com o Senhor, deixando-se tomar e conduzir por Ele, saboreando sua presença, buscada e experimentada na realidade da vida, nas várias circunstâncias que formam o seu quotidiano.

O “Vacare Deo” produz, como consequência, o desenvolvimento mais profundo da dimensão contemplativa do ser humano, levando-o à total transformação de seu mundo relacional: sair dos próprios esquemas mentais para, em Deus, ver a realidade com os seus “olhos” e amá-la com o seu “coração”, em cada um dos momentos da vida que se tornam momentos de salvação, doados a cada um, “enquanto espera o retorno definitivo do Senhor” (Regra, n. 24).

1º TEMA: O CARISMA DO CARMELO: Traços principais.

Texto de Frei Egídio Palumbo O. Carm (Tradução por Frei Pedro Caxito O.Carm).

Adaptação para Ordem Terceira do Carmo, Frei Petrônio de Miranda, O. Carm

1º- COMUNIDADE.

            Nas origens do Carmelo não encontramos uma pessoa isolada como Fundador, mas sim uma comunidade. Ela está provavelmente vivendo uma certa evolução interna: de pessoas mais ou menos isoladas rumo a um grupo; pede ajuda e discernimento ao Patriarca de Jerusalém, Alberto, a fim de que (a nível não apenas jurídico, mas também teológico-espiritual) consolide e codifique o projeto de vida deles que a seguir, com o discernimento do Papa, adquirirá o status de Regra.

            Além disso, aquela expressão, que aparece mais vezes nas Primeiras Constituições e em outros escritos medievais sintetiza tanto o discernimento feito pelo Patriarca Alberto como a fisionomia dos primeiros irmãos do Carmelo.

            Podemos, então, dizer que Fundadores do Carmelo foi aquela primeira comunidade de fratres do Monte Carmelo, não outros. Eles devem permanecer o ponto de referência constante, original do carisma e da missão do Carmelo.

2º- O ESPÍRITO MISSIONÁRIO DO CARMELO.

Em 1247, com a Bula PAGANORUM INCURSUS de Inocêncio IV as primeiras gerações de frades carmelitas, que nesta época tinham emigrado da Palestina para o novo contexto sócio-eclesial da Europa, viveram a primeira evolução da sua história: a Bula do Papa dava a possibilidade de transformar a sua forma de vida prevalentemente contemplativa em vida "contemplativa e ativa ao mesmo tempo", de orientar-se, portanto, para um modo de vida capaz "de  ser  de utilidade  para a salvação  própria  e  do próximo".

            Ao longo dos séculos esta consciência missionária, ainda que às vezes dilacerada por um falso dilema ação-contemplação, sempre foi cultivada no Carmelo, assumindo formas e linguagem diversas conforme o contexto sócio- cultural e eclesial.

            Contemplando o passado e o presente, podemos dizer que na Família do Carmelo o espírito missionário é vivido como:

-Testemunho-irradiação do estilo de vida: criar novas "colmeias" para recolher o divino mel da contemplação, como se diz em alguns escritos da Idade-Média; ser "espelho", testemunho da divina presença do Deus-Trindade, escrevem nossos místicos.

- Proposta de itinerários mistagógicos até à experiência de Deus: é a forma de serviço privilegiada pelos nossos místicos (em particular João da Cruz, João de São Sansão, Miguel de Santo Agostinho, Isabel da Trindade).

-Solidariedade para com os pobres: Ângelo Paoli chamado "Pai-Caridade"; dizia: "Quem ama a Deus deve procurá-lo entre os pobres"; e ainda Maria Ângela Virgili chamada "Mãe-Caridade" e os nossos Institutos Apostólicos Femininos.

- Promoção da justiça, da paz e do encontro ecumênico: recordemos Pedro Tomás, André Corsini, Aloísio Rabatà, Tito Brandsma.

3-O CARMELO ENQUANTO CASA DE ACOLHIMENTO

            O projeto de vida da Regra do Carmo, no seu capítulo VI, delineia uma fraternidade aberta ao mundo num estilo de acolhimento carinhoso e disponibilidade total, mas amadurecido no discernimento, tendo como motivo bíblico inspirador a hospitalidade acolhedora de Abraão assentado junto à entrada da sua tenda (Gn 18,1-4; Hb 13,2). Juntamente com esta observação não se pode esquecer de que na tradição dos frades o convento é o lugar do convenire, do encontro familiar, da "koinonia" que é aberta e irradiante etc.

            Pois bem; as comunidades carmelitas, ao menos aquelas que têm estruturas e meios adequados, poderiam estar abertas ao acolhimento de todos os que pretendem fazer experiência de oração, de escuta orante da Palavra, de tempos de deserto. Trata-se de oferecer, com a força do testemunho e comunicação da fé, os frutos mais amadurecidos do nosso estar todos os dias diante de Deus como fraternidade contemplativa e em oração.

4-O CARMELO PROMOTOR DA JUSTIÇA E  DA PAZ

            A Regra do Carmo propõe o exercício da correção fraterna mediante a caridade (Capítulo XI) como método único, não-violento para resolver os conflitos e recuperar o irmão para a "koinonia" fraternal; a  outros  métodos  que  recorram  a  castigos  ou  a excomunhões a Regra, segundo o meu parecer, não faz nenhum aceno, nem explícito nem implícito. Exorta, além disto, a revestirmo-nos das "armas espirituais", para podermos desarmar o "adversário" e, com a fé, a esperança e o amor, testemunharmos o Evangelho da Paz (Capítulo XIV).

            Quanto ao mais é necessário observar que nunca faltaram ao Carmelo figuras exemplares de solidariedade para com os últimos, como, por exemplo, Ângelo Paoli chamado "Pai-Caridade", Maria Ângela Virgili chamada "Mãe dos Pobres"; os próprios modelos bíblicos  -  Maria e Elias  -  são às vezes contemplados como inspiradores da solidariedade: Maria de Nazaré, como mulher humilde, capaz de caminhar com os pobres da terra; Elias Profeta, como homem da solidariedade em defesa da justiça.

            Nem sequer faltam ao Carmelo figuras modelares de testemunho ou de dedicação em favor da paz: alguns autores medievais contam-nos, com efeito, o martírio dos primeiros carmelitas nas mãos dos sarracenos invasores da Terra Santa e, falando de martírio, como não recordar o trabalho e o testemunho não-violento e de paz do Beato Tito Brandsma martirizado em Dachau

5-O CARMELO ENQUANTO ESCOLA DE ORAÇÃO-CAMINHO.

            Uma das características da espiritualidade carmelitana é a de se propor como "espiritualidade do caminho", como itinerário mistagógico para uma experiência de Deus mais autêntica e amadurecida.

            Esta dimensão mistagógica nós a encontramos presente na maior parte dos escritos carmelitas, em particular nos escritos dos nossos místicos: pensemos, por exemplo, na Instituição dos primeiros monges, onde vem delineado um itinerário espiritual  com o Profeta Elias; no Caminho da Perfeição de Teresa de Ávila, no qual a experiência contemplativa se faz itinerário de oração; na Subida do Monte Carmelo, na Noite Escura e no Cântico Espiritual de São João da Cruz, que traçam um itinerário espiritual, onde o fiel aprende a amar como Deus ama; em Miguel de Santo Agostinho, que propõe um itinerário místico de "vida marieforme", intermediação da presença da Mãe do Senhor; no "pequeno caminho" de Teresa de Lisieux; em Isabel da Trindade, que redige para uma mãe de família um pequeno escrito: Como se pode encontrar o Céu na terra.

São apenas alguns exemplos suficientes para nos recordar a grande herança pedagógica, que o Carmelo adquiriu no acompanhamento espiritual dos fiéis; até mesmo podemos dizer que neste setor quase se constituiu em ponto de referência obrigatório, uma espécie de "magistério", que possui autoridade. Hoje, portanto, o Carmelo não pode deixar de sentir-se chamado a reconsiderar esta outra "indiscutível" diaconia-serviço.

 

Frei Carlo Cicconetti, O. Carm. Roma.

Adaptação para a Ordem Terceira do Carmo, Frei Petrônio de Miranda, O. Carm, Delegado Provincial. (1º de dezembro-2018)

Contexto sociocultural e Autoridade

A Autoridade, sem dúvida alguma, é um conceito dissonante para a nossa mentalidade, principalmente para a realidade corrupta e corrompida do poder da política no Brasil. Na Bíblia e na espiritualidade carmelitana o poder-autoridade é qualificado como graça de Deus e vocação desde as primeiras linhas espirituais da primeira comunidade cristã e da Regra da Ordem dos Irmãos da Bem-Aventura Virgem Maria do Monte Carmelo.

A relação tradicional superior- súdito, é posta diante do visor do julgamento pela mentalidade caraterística da nossa época, que se caracteriza pela forte acentuação que se põe sobre a liberdade da pessoa e no desejo de reencontrar no indivíduo as últimas raízes do seu agir evitando qualquer formalismo. Por outra parte, cresceu no indivíduo a consciência da sua interdependência com relação aos outros seres humanos, não somente no pequeno mundo, onde estava acostumado a viver, mas também num mundo mais amplo, globalizado, no diálogo entre as culturas, as classes sociais, as nações, as economias.

(O Poder aprofunda as suas raízes no Ágape Divino e é expressão de amor. Ef 4,7.11-16)).

O "Poder Sagrado" na Igreja, mistério de comunhão

            A Autoridade ou o poder de dar uma ordem, de pretender que seja cumprida, na Igreja e, portanto, em um Sodalício da Ordem Terceira do Carmo, tem uma componente mística, que está relacionada com o Mistério da Igreja e em última análise, com o Mistério do Deus-Trindade.

            Dentro de um Sodalício, e em conformidade com o carisma carmelitano, a autoridade de superior procede do Espírito do Senhor em união com a hierarquia (Prior, Delegado Provincial, Padre Provincial e Prior Geral da Ordem do Carmo).

            O ofício de governar ou organizar um Sodalício traz consigo a exigência de competência e responsabilidade do Prior e seu conselho, de fazer convergir as suas ações, os seus dons e seus projetos comuns de vida espiritual e de missão da comunidade. É um ofício de unidade, de comunhão, mesmo no sentido da visibilidade e da real eficiência, seja embora a nível dos indivíduos, da comunidade, mas também da Paróquia, Diocese ou da Província Carmelitana de Santo Elias

A Autoridade no Carmelo

O grupo de eremitas, "moradores do Monte Carmelo junto à Fonte", apresenta-se logo sob o signo da Autoridade-Obediência: estão sob a obediência de Brocardo e desejam exprimir a sua voluntária e total "obediência" a Cristo Jesus, reconhecendo-Lhe a "Soberania" universal (Regra 1 e 2), sacramentalmente manifestada na sua Igreja e nos seus Pastores. Desde o início procuram a aprovação da Igreja. "Alberto, por graça de Deus chamado a ser Patriarca da Igreja de Jerusalém, aos amados filhos Brocardo e outros eremitas, que vivem debaixo da sua obediência junto à Fonte, no Monte Carmelo, saúde no Senhor e bênção do Espírito Santo" (Regra 1).

            Nos três ramos carmelitas; Ordem Primeira, Ordem Segunda e Ordem Terceira, a Autoridade está orientada para o bem e o serviço da própria Igreja e, mais diretamente, para o serviço daqueles fiéis que com a profissão religiosa abraçam a vida e a santidade da Igreja na Forma de Vida carmelita, aprovada canonicamente pela própria Igreja. (Regra da OTC Nº 12)

Homem da Unidade e do Carisma da Ordem.

Santo Inácio da Antioquia na sua Carta aos Cristãos de Filadélfia chamava o responsável por uma Comunidade pelo nome de "Homem determinado à Unidade", governado pela preocupação com a unidade. Homem da unidade, seja das pessoas, seja das várias instâncias e funções da comunidade - no nosso caso, da comunidade do Sodalício.

O bem do Sodalício, que é a primeira e indispensável contribuição para a missão da Igreja, é o Carisma Carmelitano vivido e testemunhado na cidade de Angra dos Reis pelos irmãos e irmãs que, livremente-repito- LIVREMENTE- através dos Votos Perpétuos ou Solenes (OTC-Regra Nº 14) assumem publicamente viver a espiritualidade sob a orientação ou autoridade de um Prior ( a ). Em outras palavras, viver em comunidade é, na verdade, viver todos juntos a vontade de Deus seguindo a orientação do dom do Carisma carmelitano sob a autoridade do Prior e seu Conselho. Portanto, a autoridade consolida a unidade da Ordem Terceira do Carmo em cada um dos 37 Sodalícios é  baseada sobre a caridade e a cooperação harmoniosa na luta pelo ideal que nos propusemos através da nossa consagração pelos votos.

O Prior da Ordem Terceira do Carmo (a ) não é o guardião do status quo, que procura não incomodar os irmãos que estão dormindo ou que se limita a atender eventuais iniciativas de cada um em particular. Ele, consciente de que ao centro da comunidade está presente Cristo com o seu Evangelho, coloca-se ao serviço da vontade de Deus e dos irmãos, guiando-os à obediência a Cristo por meio do diálogo e oportuno discernimento, embora deixando firme a sua autoridade de decidir e ordenar o que se deve fazer. O Prior é no Sodalício estímulo a viver o nosso Carisma e é sinal e estímulo de união.

Estilo de exercício da Autoridade: Um olhar Bíblico sobre o Poder. (1Cor 12,4-11. 28).

A teologia da Autoridade tem as suas consequências quanto ao estilo de exercício: é o estilo de Deus, manifestado em Cristo Jesus. "Fazer as vezes de Deus", ser dóceis à sua vontade, expressar o amor paternal de Deus defronte aos religiosos confiados aos nossos cuidados pessoais, isto é um compromisso ascético-místico de conformação com a caridade de Deus Pai, que trata como a "filhos", no seu modo de respeitar a dignidade e a liberdade do homem (Câns. 617-619- Cân. 617 - Os Superiores desempenhem seu ofício e exerçam seu poder de acordo com o direito universal e com o direito próprio- Pode-se mesmo pensar numa "Espiritualidade da Autoridade".

Perguntas para reflexão.

1- Que lugar o Carisma Carmelita ocupa no exercício da minha relação com a autoridade do Sodalício? 

2- Estou consciente da importância e da missão do prior e seu concelho no Sodalício?

3- Após este olhar sobre o poder a partir da Bíblia, dos Documentos da Igreja e da Espiritualidade Carmelitana, quem melhor representa para ser o futuro prior ( a ) ou conselheiro ( a ) para este Sodalício?      

Frei Egídio Palumbo O. Carm. (Tradução por Frei Pedro Caxito O.Carm).

Tendo presente a perspectiva hermenêutica da fidelidade dinâmica ao carisma do fundador, vejamos nas suas linhas essenciais o Carisma do Carmelo.

NAS ORIGENS, UMA COMUNIDADE.

            Nas origens do Carmelo não encontramos uma pessoa isolada como Fundador, mas sim uma comunidade. Ela está provavelmente vivendo uma certa evolução interna: de pessoas mais ou menos isoladas rumo a um grupo; pede ajuda e discernimento ao Patriarca de Jerusalém, Alberto, a fim de que (a nível não apenas jurídico, mas também teológico-espiritual) consolide e codifique o projeto de vida deles, o seu "propositum", numa "vitæ formula", que a seguir, com o discernimento do Papa, adquirirá o status de Regra.

            Confirmação do que dizemos nos vem antes de tudo do próprio texto da Regra - ou melhor do dinamismo e dos valores do projeto de vida que ela propõe - enquanto mediação para transmitir a "experiência do Espírito" do Fundador ou do carisma de fundação.

            Além disso, aquela expressão, que aparece mais vezes nas Primeiras Constituições e em outros escritos medievais - "(...) Albertus Ierosolymitanæ ecclesiæ Patriarcha in unum collegium congregavit, scribendo eis Regulam(...)" - sintetiza tanto o discernimento feito pelo Patriarca Alberto como a fisionomia dos primeiros irmãos do Carmelo.

            Podemos, então, dizer que Fundadores do Carmelo foi aquela primeira comunidade de fratres do Monte Carmelo, não outros. Eles devem permanecer o ponto de referência constante, original e originante do carisma e da missão do Carmelo. A questão, pois, de Elias e de Maria como "fundadores" do Carmelo, no meu parecer, precisa de uma releitura na ótica do "modelo de vida" fortemente personalizado, em sintonia com toda a tradição monástica e, além disso, com a carmelitana.

Frei Egídio Palumbo O. Carm. (Tradução por Frei Pedro Caxito O.Carm).

             Uma das características da espiritualidade carmelitana é a de se propor como "espiritualidade do caminho", como itinerário mistagógico para uma experiência de Deus mais autêntica e amadurecida.

            Esta dimensão mistagógica nós a encontramos presente na maior parte dos escritos carmelitas, em particular nos escritos dos nossos místicos: pensemos, por exemplo, na Institutio primorum monachorum, onde vem delineado um itinerário espiritual  com o Profeta Elias; no Caminho da Perfeição de Teresa de Ávila, no qual a experiência contemplativa se faz itinerário de oração; na Subida do Monte Carmelo, na Noite Escura e no Cântico Espiritual de São João da Cruz, que traçam um itinerário espiritual, onde o fiel aprende a amar como Deus ama; em Miguel de Santo Agostinho, que propõe um itinerário místico de "vida marieforme", intermediação da presença da Mãe do Senhor; no "pequeno caminho" de Teresa de Lisieux; em Isabel da Trindade, que redige para uma mãe de família um pequeno escrito: Como se pode encontrar o Céu na terra. São apenas alguns exemplos suficientes para nos recordar a grande herança pedagógica, que o Carmelo adquiriu no acompanhamento espiritual dos fiéis; até mesmo podemos dizer que neste setor quase se constituiu em ponto de  referência  obrigatório, uma  espécie  de  "magistério", que possui autoridade.

            Hoje, portanto, o Carmelo não pode deixar de sentir-se chamado a reconsiderar esta outra "indiscutível" Diaconia, revitalizando-a de forma renovada e criativa: quer propondo itinerários de fé adequados à situação do homem contemporâneo, quer aplicando uma acentuada dimensão mistagógica ao trabalho pastoral e à orientação vocacional.

No último domingo 25, esteve em Ouro Preto-MG o Padre Provincial, Frei Evaldo Xavier, O. Carm, para coordenar a eleição da nova mesa administrativa daquele sodalício. Assim ficou constituída;

Prior

Gustavo 

Conselheiros (a)

Carlos Alberto

Lucia Silva 

Dalva

FREI EMANUELE BOAGA O.Carm. e AUGUSTA DE CASTRO COTTA C.D.P.

Jesus deu-me certa manhã, em minha ação de graças, um meio simples de cumprir minha missão. Fez-me compreender a palavra dos Cantares: "Atrai-me, correremos ao odor de vossos perfumes" . Jesus, nem sequer se torna necessária uma explicação: "Quando me atrairdes, atraí também as almas que amo!" Basta a simples palavra: "Atraí-me!" Compreendo, Senhor, que ao deixar-se a alma prender pelo inebriante odor de vossos perfumes, não conseguiria correr sozinha. Todas as almas que ela ama, são empuxadas a segui-la. Isto acontece sem coação, sem esforço. É conseqüência natural de sua atração para vós. Como a torrente, lançando-se com ímpeto no oceano, arrasta após si tudo quanto encontra de passagem, assim também, ó meu Jesus, a alma que imerge no ilimitado oceano de vosso amor, arrebata consigo todos os tesouros que possui... Senhor, vós o sabeis, não tenho outros tesouros senão as almas que vos aprouve unir à minha.[...].

Noto que quanto mais o fogo do amor me abrasar o coração, tanto mais exclamarei: Atraí-me! - tanto mais, também, as almas que se achegarem de mim (pobre e minúsculo argueiro de ferro inútil, se me arredar do divino braseiro), correrão lépidas ao odor dos perfumes de seu Bem-Amado, pois a alma abrasada de amor não consegue permanecer inativa. Como Santa Madalena, conserva-se indubitavelmente aos pés de Jesus, a escutar-lhe a palavra doce e ardente. Parecendo não dar nada, dá muito mais do que Marta, a qual se atormentava com muitas cousas, e queria que a irmã a imitasse.

Não são as ocupações de Marta que Jesus censura. A tais ocupações, sua divina Mãe humilde se sujeitou toda a sua vida, pois tinha que preparar as refeições para a Sagrada Família. Queria apenas morigerar o açodamento de sua ardorosa hospedeira. [...]

Não foi na oração que os santos Paulo, Agostinho, João da Cruz, Tomás de Aquino, Francisco, Domingos, e tantos outros ilustres amigos de Deus hauriram a ciência divina, que arrebata os maiores gênios? Disse um Sábio: "Dai-me uma alavanca, um ponto de apoio, que levantarei o mundo de seus eixos". O que Arquimedes não pôde alcançar, porque sua solicitação não se dirigia a Deus e se colocava num ponto de vista material, obtiveram-nos os Santos em toda a sua plenitude. Como ponto de apoio, deu-lhes o Todo-poderoso a SI MESMO, E SÓ A SI MESMO; como alavanca: a oração, que incandesce com o fogo do amor, e foi desta maneira que soergueram o mundo. Assim é que os Santos ainda militantes o soerguem, e os Santos vindouros o soerguerão, e até o fim do mundo.

TEXTOS BÍBLICOS

A verdadeira pregação - 1Cor 1,10-31.

O Corpo Místico - Ef 4,15-16; 1Cor 12,12-29.

Igreja vinha do Senhor - Jo 15,1-8.

AUTO-AVALIAÇÃO

1-Como a Igreja (local e além fronteiras) está presente em seu projeto de vida? De que forma acompanha suas lutas?

2-O que faz para que a Igreja se beneficie do carisma carmeli­tano?

3-“O amor abrange todas as vocações, o amor é tudo, alcança todos os tempos e todos os lugares” (ST). Examinar-se: seu amor é assim? O que falta nele? Tem alguém fora dele?

MOMENTO DE DECISÃO

3-Procure falar a Deus, espontaneamente como ST o fazia, colocando em seu coração de Pai, suas reflexões, temores, anseios, expectativas, enfim sua vida.

Frei Carlos Mesters, O. Carm

Jesus era leigo

* Jesus não era da tribo sacerdotal. Era um leigo que não aparece fazendo um trabalho sacerdotal. Jesus nunca aparece oferecendo sacrifícios no Templo, nem é consultado pelo povo a respeito de questões próprias do sacerdócio. Ao contrário, ele envia as pessoas por ele curadas, para que se apresentem aos sacerdotes. Ele chegou a questionar o Templo (“Podem destruir este Templo, e eu faço um outro!”) e a denunciar o culto corrupto desviado que nele se praticava.

* Jesus não era do centro, mas vinha de uma periferia, chamada ”distrito dos pagãos” (Galileia). Não pertencia a nenhum dos grupos de poder da época, como por exemplo, saduceus, fariseus, essênios, zelotes. Não era teólogo nem fez estudos especiais na escola dos rabinos em Jerusalém. Veio de uma cidadezinha insignificante, Nazaré, onde viveu trinta dos trinta e três anos como trabalhador leigo do campo e como carpinteiro.

* O chão de onde Jesus falava e agia era este chão do povo do interior da Galileia, que hoje chamaríamos de leigo, povo desprezado como ignorante pelo clero da época, sacerdotes, fariseus e escribas.

* Se você quiser conhecer a vida do Filho de Deus durante os primeiros trinta anos de sua vida, pegue a vida de qualquer leigo nazareno, procure saber como vivia e o que fazia da manhã até à noite, coloque o nome Jesus no lugar, e você terá a vida do Filho de Deus durante trinta dos trinta e três anos da sua vida. Difícil imaginar Jesus como seminarista ou como bispo.

A escola de Jesus

* Como toda criança, Jesus aprendeu com a mãe e, sendo menino, a partir de três ou quatro anos aprendeu também com o pai. Aprendeu as histórias do povo, vindas da Bíblia e da tradição oral, contadas em casa e na comunidade. Recebia sua identidade a partir do clã e da convivência na aldeia. Aprendeu a ler e escrever na Beth-há-midrash, ao lado da sinagoga. Cresceu do lado do povo pobre da periferia da Galileia e não do lado da elite, clerical ou não, da época. Escutava o ensinamento dos escribas e dos fariseus nos sábados na sinagoga. Como muitos outros meninos, passava as tardes das sextas feiras na sinagoga para preparar as leituras da celebração do sábado.

* A escola de Jesus era também a sua experiência de perceber como tanta gente era excluída da participação na comunidade em nome do conceito exigente de um Deus que não admitia o impuro na sua presença. Naquele tempo, lá nas aldeias e povoados da Galileia, o controle psico-social era muito grande. Todo mundo conhecia e controlava a vida de todo mundo! Era necessária muita coragem para um leigo tomar rumos e ensinos diferentes da tradição secular, transmitida na sinagoga pelo sistema clerical da época.

* A escola de Jesus era também o mundo do trabalho diário para sobreviver; era a realidade da opressão romana que impunha os tributos e obrigava a pagar as inúmeras taxas; era o movimento popular de oposição aos romanos, que levava muito pai de família para a clandestinidade; era o perigo constante e as ameaças de violência e de roubo, de passagem de exércitos, de desemprego, de insolvência das dívidas crescentes, o sistema escravagista dos romanos. Era este ambiente concreto que marcava o dia-a-dia da vida do povo leigo e que, muitas vezes, era desconhecido pela elite que vivia segura nas suas casas ao redor do Templo.

* A escola de Jesus era, sobretudo, a sua experiência profunda de Deus, a mística que o levava a reler tudo com outros olhos, a contemplar o mundo a partir de outro ângulo. Se Deus é Pai, então somos todos irmãos e irmãs uns dos outros e ninguém tem o direito de, em nome de Deus, excluir o outro da casa de Deus, como estava sendo feito na época de Jesus pelo sistema religioso.

Revelar o novo rosto de Deus como Pai

* A grande preocupação de Jesus, o seu alimento diário, era fazer a vontade do Pai. Esta era a raiz de onde ele vivia, agia e falava. Esta era a radicalidade da sua vida. Ele podia dizer: “Quem me vê, vê o Pai!” “Eu a cada momento faço o que meu Pai me mostra que é para fazer” “Eu e o Pai somos uma coisa só!” Por isso, Jesus revelava o rosto de Deus como Pai. Jesus não administrava sacramentos, mas, pela sua obediência desobediente, ele era o grande Sacramento de Deus, a revelação viva do Pai.

* Vivendo assim, Jesus era o novo “laos”, o “leigo”, o novo começo, a nova criação, a amostra do Reino, a semente de mostarda, o caminho, a verdade, a vida, o pastor, a videira, a luz, a ressurreição, o pão da vida, o profeta, o juiz, o irmão mais velho, o redentor, o messias, o Filho de Deus. Estes e outros tantos nomes e adjetivos foram sendo encontrados, aos poucos, pelos primeiros cristãos para expressar em palavras conhecidas e experiência totalmente nova de Deus que lhes vinha através de Jesus.

* Jesus explicava a Bíblia ao povo a partir da nova experiência que tinha de Deus e, por isso mesmo, dela revelava um sentido novo, pleno. A partir da sua experiência de Deus ele era capaz de perceber o que Deus queria quando chamou o povo em Abraão ou quando o tirou do Egito e lhe deu a Lei. Por isso mesmo, ele podia dizer: “Antigamente foi dito, mas eu vos digo!”

* O ensinamento de Jesus não era só aquilo que ele dizia e ensinava, mas era, sobretudo aquilo que ele era e fazia. Por causa da sua experiência de Deus como Pai, Jesus acolhia os excluídos, os marginalizados pelo sistema clerical da época. Ele dava um lugar aos que naquele sistema não recebiam lugar: os impuros (leprosos, deficientes, mulheres, crianças), os imorais (prostitutas, pecadores, ladrões), os heréticos (samaritanos, estrangeiros, publicanos), colaboracionistas (romanos, soldados, publicanos), os pobres, os oprimidos, os cegos, os doentes. A sua vida, a sua atuação e a sua pregação eram uma Boa Notícia de Deus para o povo e uma denúncia do sistema religioso da época que escondia o verdadeiro roto de Deus ao povo.

Imagens do último Encontro do Ano do Laicato Carmelitano da Província Carmelitana de Santo Elias, em Angra dos Reis/RJ. Convento do Carmo de Angra, Rio de Janeiro. 25 de novembro- 2018.

Imagens do último Encontro do Ano do Laicato Carmelitano da Província Carmelitana de Santo Elias, em Angra dos Reis/RJ. Convento do Carmo de Angra, Rio de Janeiro. 25 de novembro- 2018.