Passageiro de ônibus é baleado na cabeça e av. Brasil é fechada em operação da PM no Rio
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Ação contra roubo de veículos no Complexo de Israel ainda interrompeu circulação de trens e linhas de ônibus na zona norte
Tiroteio fecha avenida Brasil e pessoas se protegem em mureta - Reprodução/@ramonlage no Twitter
Rio de Janeiro
O passageiro de um ônibus foi baleado na cabeça e outros dois ficaram feridos durante tiroteio em operação da Polícia Militar no Complexo de Israel, zona norte do Rio de Janeiro. A ação bloqueou a avenida Brasil e impactou a circulação de trens na manhã desta quinta-feira (24).
A ação da PM é contra roubos de veículos e cargas nas comunidades Cidade Alta, Cinco Bocas e Pica-Pau, onde criminosos incendiaram barricadas.
Segundo o Ministério da Saúde, o homem atingido na cabeça está em estado grave e passa por cirurgia no Hospital Geral de Bonsucesso. Outros dois passageiros foram socorridos para a mesma unidade e encontram-se estáveis.
Devido ao confronto, por volta das 7h, a avenida Brasil foi bloqueada no sentido zona oeste, a partir do BRT Cidade Alta, e no sentido Centro, na altura do viaduto de Vigário Geral.
Imagens nas redes sociais mostram o congestionamento na via e pessoas fora dos carros, abrigadas atrás de muretas para se proteger dos disparos. Em um vídeo, passageiros aparecem abaixados dentro de um ônibus.
Segundo o Rio Ônibus, mais de 20 linhas foram impactadas com o fechamento da Avenida Brasil. "Mais um dia em que o direito de ir e vir dos cariocas é comprometido pela falta de segurança pública. Apelamos às autoridades para que tomem as devidas providências e garantam o direito básico de deslocamento", disse o sindicato, em nota.
Além disso, o confronto nas proximidades da estação de trem de Cordovil afetou o ramal Saracuruna, que passou a operar apenas entre Central do Brasi/Penha e Duque de Caxias/Saracuruna, com intervalos de 30 minutos.
As estações Penha Circular, Brás de Pina, Cordovil, Parada de Lucas e Vigário Geral foram fechadas, conforme a SuperVia, por medida de segurança para passageiros e funcionários.
A Secretaria de Estado de Educação informou que uma escola estadual foi fechada na região. Já a Secretaria Municipal de Educação relatou que 16 escolas municipais foram impactadas, sendo oito na Cidade Alta, cinco em Vigário Geral e Parada de Lucas, e três nas comunidades Cinco Bocas e Pica-Pau.
A Secretaria Municipal de Saúde informou que o CMS (Centro Municipal de Saúde) Iraci Lopes e a Clínica da Família Heitor dos Prazeres ativaram o protocolo de segurança e suspenderam o atendimento. O CMS José Breves dos Santos atrasou a abertura e avalia a possibilidade de funcionamento. Segundo a secretaria, em 2024, até o momento, a violência gerou 900 registros de fechamentos temporários de unidades de saúde. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Atleta que não viajou com equipe de remo quer rever único sobrevivente 'para abraçá-lo'
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Lucas Brum ficou em Pelotas e deseja encontrar com João Milgarejo, que já recebeu alta, para 'lamentar os amigos que perdemos'; noves pessoas morreram no acidente na BR-376
Lucas (no canto inferior esquerdo) ficou em Pelotas para treinar a equipe infantil — Foto: Reprodução/Instagram
Por O Globo — Rio de Janeiro
Único atleta que não viajou com a equipe de remo, vítima do acidente que resultou em nove mortes na BR-376 na noite deste domingo, Lucas Brum da Rosa, de 16 anos, disse que "não consegue acreditar" que nunca mais verá seus colegas. O estudante, morador de Pelotas (RS), fazia parte do projeto Remar para o Futuro há cerca de dois anos e não participou da viagem por falta de vaga na van, ficando na cidade para treinar a equipe infantil.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, na segunda-feira, Lucas contou estar ansioso para reencontrar o colega João Pedro Milgarejo, de 17 anos, único atleta sobrevivente.
"João é um grande amigo meu. Ele sempre foi muito focado e queria conquistar o melhor lugar nas competições. Fico muito feliz que ele tenha sobrevivido ao acidente e mal posso esperar para abraçá-lo e lamentar pelos amigos que perdemos", afirmou o jovem.
Lucas também relatou sua boa relação com toda a equipe, destacando que os considerava como parte de sua família e o projeto, como uma segunda casa. O atleta elogiou seu treinador, Oguener Tissot, que também faleceu no acidente.
"Meu treinador foi um dos melhores caras que já conheci. Sem dúvidas, o melhor professor de todo o Brasil", disse Lucas, com a voz embargada.
'Gente berrando': como aconteceu o acidente com os atletas de remo de Pelotas?
A carreta de contêiner que perdeu o controle e tombou em cima de uma van de turismo causou a morte de nove pessoas da equipe do projeto social "Remar para o Futuro", de Pelotas (RS). Os jovens atletas retornavam ao estado após uma competição em São Paulo. As identidades das vítimas ainda não foram divulgadas oficialmente pela Polícia Rodoviária Federal.
Um motorista que passou pelo local do acidente relatou ter ouvido "gente berrando" dentro do veículo que conduzia os atletas. O condutor, identificado como Macksuel Souza, de 27 anos, teve seu carro atingido na traseira pela van que levava os atletas do projeto social "Remar para o Futuro", de Pelotas (RS). Ele contou ao ND Mais que, após sentir o impacto da pancada, acelerou o carro.
Em seguida, viu pelo retrovisor a van rodopiando na pista. Depois, o caminhão tombou sobre o utilitário que conduzia os esportistas na mata ao lado da rodovia.
"Depois eu voltei ali no acidente e estava lá o caminhão em cima da van, e um monte de gente berrando", disse Souza.
Acidente com atletas de remo de Pelotas: Vitória em competição
Os atletas tinham conquistado sete medalhas no Campeonato Brasileiro Unificado, representando o Clube Centro Português 1º de Dezembro na competição por equipes, realizada na raia olímpica da USP, em São Paulo. A Confederação Brasileira de Remo comemorou nas redes sociais a conquista de uma medalha de ouro por uma das equipes do projeto social, composta por quatro jovens.
No sábado, o projeto de remo garantiu o ouro no four skiff masculino com Samuel Benites, Henri Fontoura, João Kerchiner e João Milgarejo. No domingo, último dia de provas, o time venceu o ouro no four skiff feminino, com Helen Belony Centeno ao lado de Evelen Cardoso (GNU), Vitória Brandão e Isabela Silveira (Botafogo).
Além disso, o Remar para o Futuro conquistou três medalhas de prata e duas de bronze, encerrando a competição como a sexta melhor equipe, à frente de clubes tradicionais como o Pinheiros. Todos os oito atletas do projeto ganharam medalhas. O coordenador técnico, Oguener Tissot, classificou o desempenho como “excelente” e “histórico”. O evento reuniu 32 clubes de todo o Brasil, sendo o Flamengo a maior delegação, com 80 atletas. Fonte: https://oglobo.globo.com
Brasil registrou 338 casos de violência política na campanha de 2024, diz levantamento
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Grupo da Unirio aponta que violência física, como a que atingiu prefeito de Taboão da Serra, representa mais de metade dos episódios
O prefeito de Taboão da Serra (SP), José Aprígio da Silva, foi vítima de um atentado a tiros na tarde desta sexta-feira, 18 de outubro - Divulgação Policia Militar
São Paulo
A campanha eleitoral de 2024 registrou um número recorde de casos de violência política no Brasil: foram ao menos 338 de julho a setembro deste ano, segundo levantamento do Grupo de Investigação Eleitoral da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Giel/Unirio).
Mais da metade dos casos foi de violência física, como o que vitimou o prefeito de Taboão da Serra (SP), José Aprígio da Silva (Podemos), atingido por ataque a tiros quando estava dentro de um carro nesta sexta-feira (18). Internado, ele tinha estado de saúde estável. A polícia investiga a motivação do ataque.
Dentre os casos de violência política registrados pelo grupo da Unirio, 88 constituem atentados, com 55 casos em que o alvo sobreviveu e 33 em que foi morto pelo agressor.
O levantamento, registrado no 19° Boletim do Observatório da Violência Política e Eleitoral, considera episódios de violência cometidos contra políticos com e sem mandato. Neste grupo, estão incluídos vereadores, prefeitos, secretários, governadores, candidatos e ex-ocupantes de cargos públicos. Casos de violência contra eleitores não são contabilizados.
Lideranças sem cargo representam a maior parte (166) dos alvos na campanha de 2024. E os grupos mais atingidos, segundo o levantamento, são homens (71%), pessoas entre 40 e 59 anos (52%) e com ensino superior (61%).
Estado de maior população no país, São Paulo também lidera no número de casos de violência, com 58 episódios entre julho e setembro. Vinte e cinco partidos de todos os espectros políticos foram atingidos, com União Brasil, PT e MDB à frente na lista.
Segundo a metodologia do Giel, 2024 superou as eleições passadas em número de casos de violência política. Foram 263 episódios no ano de 2022, que teve pleito marcado por numerosos casos de violência, sobretudo entre eleitores de Jair Bolsonaro (PL) e Lula (PT). Já durante o pleito municipal de 2020, em meio à pandemia da Covid, 235 casos.
"A violência sempre aumenta no período eleitoral" diz Felipe Borba, professor da Unirio e coordenador do Giel. Ele enfatiza que geralmente os cargos locais são alvos mais frequentes, já que pequenos municípios têm disputa mais personalizada, menos ideológica e o Poder Executivo municipal como fonte importante de renda.
Os dados com relação aos anos anteriores têm que ser vistos com alguma cautela, diz o docente, já que a coleta de dados, feita sobretudo a partir de fatos noticiados na imprensa, foi aprimorada ao longo dos anos.
Outro fator a se considerar, segundo ele, é que o tema da violência política ganhou mais atenção e cobertura nos últimos anos. "O assassinato da Marielle, os tiros contra a caravana do Lula e a facada no Bolsonaro deixaram o tema em evidência, e isso pode influenciar os números", diz.
Além do atentado em Taboão, duas vereadoras relataram ter sofrido ataques a tiros em seus veículos no início deste mês.
Tainá de Paula (PT), do Rio de Janeiro, disse em rede social que estava dentro de seu carro na Vila Isabel, zona oeste carioca, quando dois homens atiraram na direção das portas do veículo.
Já Janaína Lima (PP), de São Paulo, relatou que seu carro foi alvo de seis tiros enquanto estava estacionado na frente da casa de uma familiar no Jardim Souza, zona sul paulistana. A vereadora não estava dentro do veículo. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
A cegueira da fama
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Parcelas da sociedade, ao invés de repudiarem com vigor o crime de pessoas com alguma notoriedade, glamurizam-no
Por Roberto Livianu
Tentando fugir de flagrante de traição, há três anos e meio o MC Kevin faleceu no Rio ao despencar de uma varanda, interrompendo assim sua vida aos 23 anos de idade.
Sua mulher, a doutora Deolane Bezerra, circulava no showbiz como primeira-dama do funk, mas, a partir do infausto acontecimento, ganhou protagonismo no debate público como viúva traída, e foi ao estrelato da subcelebridade. Espalhafatosa, sempre ostentou luxo.
Fomos surpreendidos pela notícia da prisão de Deolane e de sua mãe, envolvidas com lavagem de dinheiro, no mundo das bets e em outros ilícitos.
Deixou claro que o status de celebridade venerada por mais de 20 milhões de seguidores fazia-a se sentir intocável pelas leis dos homens.
Isso se reforçou quando obteve a prisão domiciliar, mediante o compromisso de não se manifestar em redes sociais. Mas, ao ser libertada, publicou postagem, em razão do que o benefício foi revogado e ela retornou à prisão.
Não imaginou que a Justiça revogaria seu benefício, contando com a impunidade de seu ato afrontoso. Mais do que isso, insuflou as pessoas que a reverenciavam a protestar contra sua prisão, que foi classificada indevidamente por ela como abusiva e injusta.
Chamou a atenção a massa aglomerada na parte externa na prisão pedindo enlouquecidamente a libertação de Deolane, investigada por gravíssimos crimes. Pessoas deixaram o trabalho e outras deixaram suas famílias para lutar pela influenciadora digital, como se fosse questão de vida ou morte.
Não se importavam com a gravidade dos crimes ou com a consistência das suspeitas. O que importava era a amada Deolane – ela não poderia ficar presa, segundo elas, pois ela seria um ser acima do bem e do mal. Pareciam estar em transe.
Matéria veiculada no Metrópoles registrou que a família de Deolane pagou a fãs na porta do presídio, o que também deve nos trazer à lembrança a existência de um aquecido mercado de venda de seguidores para redes sociais.
Ou seja, as aparências podem enganar em relação à exata compreensão sobre aquelas presenças pró-Deolane, assim como sobre o total de seguidores ostentados, o que nem sempre é algo orgânico, podendo ser um número artificial e manipulado.
Isso não significa que os apoiadores de Deolane fossem todos contratados, nem que necessariamente seus seguidores tenham sido comprados. Mas a verdade é que hoje em dia essa compra é tida como algo natural.
E endeusar pessoas “famosas” envolvidas com o mundo do crime não é incomum. Fernanda Costa, por exemplo, filha de Fernandinho Beira-Mar, acaba de ser eleita como a décima vereadora mais votada em Duque de Caxias – Baixada Fluminense.
O goleiro Bruno, do Flamengo, foi condenado pelo homicídio de Eliza Samudio, sua ex-amante, que foi cruel e brutalmente morta e esquartejada há 14 anos, sendo as partes de seu corpo lançadas a cães que as devoraram.
O crime chocou a opinião pública, mas não impediu que número significativo de mulheres pedissem sua absolvição e demonstrassem o desejo de se casar com o famoso atleta assassino, que inclusive chegou a ser contratado por clube de futebol, mas que acabou rescindindo o contrato ante a repercussão negativa.
Algo parecido ocorreu no caso de Francisco de Assis Pereira, o “Maníaco do Parque”, condenado a quase 300 anos de reclusão por estuprar e assassinar diversas mulheres em São Paulo.
Parcelas da sociedade, ao invés de repudiarem com vigor e de forma uníssona o crime de pessoas com alguma notoriedade, glamurizam-no, apoiando e concedendo doses inaceitáveis de complacência social, como nos casos dos horrendos estupros cometidos por Cuca, Robinho e Daniel Alves, conhecidos jogadores de futebol, condenados por estupros praticados na Europa, cujas condutas não foram repudiadas de forma veemente e uníssona – comportamentos esperados e desejáveis.
É grave o rebaixamento ético que levou a Escola de Samba União Cruzmaltina a pensar em homenagear em seu samba-enredo no Rio o ex-governador Sérgio Cabral, do alto de seus 400 anos de reclusão por corrupção, que devemos relacionar à negação de saúde pública, escola pública a crianças pobres, saneamento básico, etc.
Temos grave déficit escolar e informacional, inclusive no âmbito da educação política. A plenitude da cidadania é utopia distante. Mesmo que a polícia prenda, que o promotor peça a condenação e que juiz sentencie, pela lei os acusados têm o direito de mentir impunemente.
Além disso, é fato notório que o poder econômico fala mais alto e quem tem muito dinheiro contrata os melhores advogados e dificilmente é alcançado pela lei e pela Justiça, como no caso do cantor Gusttavo Lima, implicado na mesma investigação de Deolane.
Lembremos que ele comemorou aniversário em festa VIP no seu iate milionário, na Grécia, com o ministro do Supremo Kassio Nunes e com o governador Ronaldo Caiado. E que, apesar de ter tido a prisão determinada pela Justiça, antes mesmo da tentativa de cumprimento do mandado sua poderosa equipe de advogados obteve revogação da ordem judicial.
Nossa escala de valores sofreu progressivo e profundo processo de erosão, e referências éticas são raridades cultivadas e mantidas por pouquíssimos. Como reverter este quadro e transformar a exceção em regra? Fonte: https://www.estadao.com.br
*PROCURADOR DE JUSTIÇA NO MPSP, DOUTOR EM DIREITO PELA USP, ESCRITOR, PROFESSOR, PALESTRANTE, É IDEALIZADOR E PRESIDENTE DO INSTITUTO ‘NÃO ACEITO CORRUPÇÃO’
*28º- DOMINGO DO TEMPO COMUM
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A liturgia do 28.º Domingo do Tempo Comum convida-nos a refletir sobre as escolhas que fazemos. Exorta-nos a não nos conformarmos com valores perecíveis, que “sabem a pouco” e não saciam a nossa fome de vida; encoraja-nos a abraçarmos os valores eternos, aqueles valores que nos trazem alegria e paz e que dão significado pleno à nossa existência.
Na primeira leitura, um “sábio” de Israel exalta a “sabedoria”, dom de Deus. A partir da sua própria experiência, esse sábio convida-nos a fazer da “sabedoria” a nossa aposta fundamental. Ela é, mais do que qualquer outro valor (o poder, a riqueza, a saúde, a beleza), a base perfeita para construir uma vida com sentido.
No Evangelho um homem de boa vontade questiona Jesus sobre o caminho que leva à vida eterna. Jesus desenha-lhe o mapa desse caminho. Convida aquele homem a despojar-se dos bens materiais que o aprisionam, a abrir o coração à solidariedade e à partilha, a percorrer o caminho do amor que se dá totalmente, a tornar-se discípulo e a integrar a comunidade do Reino. A indicação de Jesus continua válida, no séc. XXI, para quem estiver interessado em encher de significado a sua vida.
A segunda leitura convida-nos a escutar e a acolher a Palavra de Deus que nos chega através de Jesus. Essa Palavra é viva, eficaz, atuante. Uma vez acolhida no coração do homem, transforma-o, renova-o, ajuda-o a discernir o bem e o mal e a fazer as opções corretas, indica-lhe o caminho certo para chegar à vida plena e definitiva.
EVANGELHO – Marcos 10,17-30
CONTEXTO
Jesus está a caminhar com os discípulos através da Judeia e da Transjordânia, em direção a Jerusalém. Contudo, o caminho que fazem não é apenas geográfico; é, sobretudo, um caminho espiritual, durante o qual Jesus vai completando a sua catequese aos discípulos sobre as exigências do Reino e as condições para integrar a comunidade messiânica. Pretende-se que, à medida que vão avançando nesse caminho com Jesus, os discípulos deixem para trás os seus interesses egoístas e interiorizem cada vez mais a lógica do Reino. Só no final desse caminho serão verdadeiros discípulos de Jesus e estarão preparados para serem arautos do Reino de Deus.
O Evangelho deste vigésimo oitavo domingo comum narra o encontro de Jesus com um homem rico que está interessado em conhecer a maneira de alcançar a vida eterna. Esse encontro dá a Jesus a oportunidade para avisar os discípulos acerca da incompatibilidade entre o Reino e o apego às riquezas.
Na perspetiva dos teólogos de Israel, as riquezas são uma bênção de Deus (cf. Dt 28,3-8); mas a catequese tradicional também está consciente de que colocar a confiança e a esperança nos bens materiais envenena o coração do homem, torna-o orgulhoso e autossuficiente e afasta-o de Deus e das suas propostas (cf. Sl 49,7-8; 62,11). Jesus vai retomar a catequese tradicional, mas desta vez na perspectiva do Reino de Deus.
INTERPELAÇÕES
Aquele homem que vai ter com Jesus na estrada para Jerusalém, tem urgência em descobrir a reposta para uma questão que é, talvez, a mais decisiva que enfrentamos: que havemos de fazer e como devemos viver para alcançar a vida eterna, uma vida plena, verdadeira e com sentido? Trata-se de uma questão que nos inquieta a todos e que certamente já pusemos muitas vezes a nós próprios, com estas ou com outras palavras semelhantes. Já encontramos a resposta para esta questão? Qual é? Muitos dos nossos contemporâneos, mergulhados na cultura do “ter”, limitam-se a “navegar à vista”, sem horizontes amplos, procurando rodear-se de bem-estar e segurança, apostando tudo nas coisas fúteis e efémeras, apenas preocupados em satisfazer necessidades periféricas… Onde nos leva uma opção deste tipo? Ela é capaz de preencher o vazio existencial que tantas vezes toma conta da nossa vida?
Marcos diz-nos que Jesus tem uma resposta definitiva para a questão colocada por aquele homem inquieto. Para Jesus, viver “com sentido” passa, naturalmente, por respeitar a dignidade e os direitos dos irmãos e irmãs (“não mates; não cometas adultério; não roubes; não levantes falso testemunho; não cometas fraudes; honra pai e mãe”); mas, mais que tudo, aproxima-se da vida eterna quem se liberta da escravidão dos bens, está disponível para partilhar tudo o que tem com os irmãos que caminham ao seu lado, aceita tornar-se discípulo e seguir Jesus no caminho do amor que se dá até às últimas consequências. Afinal, alcança a vida eterna quem vive menos para si e mais para os outros; e afasta-se da vida eterna quem vive mais para si próprio e menos para os outros. Nas estranhas contas de Deus, menos dá mais, e mais dá menos. Estamos disponíveis para alinhar nesta paradoxal matemática de Deus e para nos despojarmos de nós próprios a fim de alcançarmos a vida eterna?
A história do homem rico, que coloca o seu amor ao dinheiro à frente do seguimento de Jesus alerta-nos para a impossibilidade de conjugar a pertença à comunidade do Reino com o amor aos bens deste mundo. Quando a “doença do dinheiro” toma conta de nós, encerra-nos no nosso próprio mundo, leva-nos a ignorar os nossos irmãos e as suas necessidades, endurece o nosso coração, faz com que sejamos corrompidos pela cobiça, torna-nos aliados da injustiça e da exploração, faz-nos ceder à corrupção e à desonestidade… É, portanto, incompatível com o seguimento de Jesus. Podemos levar vidas religiosamente corretas, participar nos atos litúrgicos mais relevantes, ter até o nosso lugar de destaque na comunidade paroquial; mas, se o nosso coração vive obcecado com os bens deste mundo e fechado ao amor, à partilha, à solidariedade, não podemos fazer parte da comunidade do Reino (“é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus”). Como é a nossa relação com os bens materiais? Qual o lugar que os bens materiais ocupam na nossa vida?
O “império do dinheiro” é um império iníquo, que tem deixado feridas insaráveis na vida dos homens e do planeta. Nos “países de bem-estar”, situados maioritariamente a norte do nosso mundo, tudo está submetido a mecanismos económicos que atuam de forma cega e impessoal e que todos os dias deixam nas bermas da da sociedade um cortejo de vítimas; a “economia de mercado” sacrifica a dignidade das pessoas ao lucro e exclui os mais vulneráveis da mesa da vida; o reforço da competitividade atira irremediavelmente os menos preparados para a pobreza e a marginalidade; a exploração egoísta dos recursos naturais destrói esta casa comum que Deus preparou para todos os seus filhos e filhas… Podemos conformar-nos com um mundo assim? A Igreja poderá ser fiel a Jesus sem se pronunciar contra este “império do dinheiro” (o sistema económico neoliberal) que deixa marcas tão desastrosas no nosso mundo? E cada um de nós, pessoalmente, o que poderá fazer para que o mundo e a história dos homens sejam construídos noutros moldes?
A expressão “vida eterna” não define apenas essa outra vida que encontraremos no céu, quando terminarmos o nosso caminho na terra. Ela refere-se também à qualidade da nossa vida aqui e agora, à excelência da vida que construímos cada dia neste caminho marcado pela finitude e pela debilidade da nossa condição humana. Uma vida vivida ao estilo de Jesus oferece-nos, já aqui na terra, a possibilidade de nos libertarmos da escravidão das coisas, de vivermos o nosso dia a dia com o coração repleto de alegria e de paz; uma vida marcada pela solidariedade, pela partilha, pelo serviço aos irmãos oferece-nos, já aqui na terra, a possibilidade de nos sentirmos plenamente realizados, “cúmplices” de Deus na criação de um mundo novo… Assim talvez faça mais sentido abraçarmos sem hesitações a proposta de Jesus: ela dirige-se já ao nosso “hoje” e garante-nos, desde já, uma vida com sentido, uma vida que vale a pena viver. Temos consciência disto?
Jesus avisa aos discípulos que o “caminho do Reino” é um caminho contra a corrente, que gerará inevitavelmente o ódio do mundo e que se traduzirá em perseguições e incompreensões. É uma realidade que conhecemos bem… Quantas vezes as nossas opções cristãs são criticadas, incompreendidas, apresentadas como realidades incompreensíveis e ultrapassadas por aqueles que representam a ideologia dominante, que fazem a opinião pública, que definem o socialmente correto… Quem optou pelo seguimento de Jesus sabe, no entanto, que a perseguição e a incompreensão são realidades inevitáveis, que não podem desviar-nos do Reino de Deus e da sua justiça. Mantemo-nos fiéis ao caminho de Jesus, sem medo dos rótulos que nos colocam, das críticas que nos fazem, das perseguições que nos movem?
*Leia a reflexão na íntegra. Clique no link ao lado- EVANGELHO DO DIA.
O sonho como única realidade
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Forma estranha de sucesso mistura heresia, decrepitude e zombaria, que desvia a concentração do cidadão da nobreza que é buscar vencer na vida
Por Paulo Delgado
A política eleitoral sucumbe em prol de si mesma em patética autoidolatria. Tudo se expressa quase que exclusivamente em termos pessoais. Tanta confusão, tão pouca luta! Na deformadora escola de eleições, políticos neófitos e partidos autoritários se esquecem de que ninguém vence eleição sem voto dos adversários. Buscar coalizões fora das urnas produz governos sem reserva de poder autêntico e base instável com partidos adversários.
A redemocratização não surgiu do enterro do coronel, nem de uma ordem nacional competitiva, com regras claras em direção à produtividade econômica, ambiente de paz psicossocial e emancipação cultural. Formou-se aos trancos e barrancos em virtude das deficiências na circulação de classes e a crônica desigualdade social que não permite ao País uma grandeza calma previsível para nenhum setor da sociedade.
Agora, o que se vê, é o desdobramento do sistema eleitoral e partidário não cumprir o papel de revigorar o País. Antes avança voraz para se apropriar do indivíduo isolado sem que as instituições do Estado – igualmente individualistas – possam oferecer em contrapartida a força propulsora da organização coletiva. Neste niilismo avassalador cresce o desmembramento do povo brasileiro, reduzindo-o a tribos, guetos, plateias – forma de dissolver seus laços espirituais e culturais e o enquadrar em círculos de influência ao modo patriarcal e colonialista.
As classes sociais não conseguem mais se manter influentes para modificar e aperfeiçoar a atividade política na direção da república democrática representativa. Vários fatores marcam o País nos últimos anos, com destaque para a religiosidade exaltada e intolerante das igrejas; o mal do século que se tornou o açoite que são as redes sociais e as reformas interrompidas ou deturpadas do modelo político, educacional, jurídico e econômico brasileiro. A precária forma como tratamos problemas estruturais e conjunturais retirou da sociedade a força, o orgulho e o esforço para se projetar na vida pública e atingiu frontalmente o aproveitamento de seus quadros nos processos de gestão do Estado.
Forma estranha de sucesso mistura heresia, decrepitude e zombaria, que desvia a concentração do cidadão da nobreza que é buscar vencer na vida. O trabalho e a riqueza no Brasil não estão no mesmo nível. Não adianta combater bets quando há fortunas tão rápidas que até parecem virtude. Sonhar errado vai continuar a influenciar de forma mística, ingênua ou oportunista pessoas cujo sonho é a única realidade. Startups predadoras, certos açougueiros e sertanejos; não são gênios, nem banqueiros clássicos, industriais pioneiros, inventores, urbanistas ou sanitaristas. Não são especialistas, nem artistas verdadeiros, são o prato principal de animadores do mercado dos ambiciosos, hipnotizadores que os fazem parecer normais.
Nada sabem de práticas exemplares. Espancam leis, não se submetem ao seu poder, antes as fizeram de escravas. Não nasceram da vontade geral, mas nela se meteram por refinados ardis que tiram a autonomia de qualquer público e o transforma em gente idiotizada. Quando se infiltram no meio da massa reduzem qualquer possibilidade de formação de opinião. É mentira que os que jogam perdem mais. Quem perde sempre é sempre quem não joga. Pobres não apostam na impulsividade sem limites das maquininhas do poder jurídico-político.
O País está cansado dos fatos que não dão em nada e mais parecem um disparate. Há uma cisão que está em curso na cabeça do cidadão em virtude da ruína dos partidos, do Direito e da lei e dos erros detalhados da liberdade e dos privilégios dos que os consumaram para si. Bilionário exibido e entrosado permite supor que no Brasil é possível conciliar tudo isso com a graça eficaz da autoridade que se orienta pelo princípio de legitimidade operacional que visa, de tempos em tempos, a tornar tudo controverso e paradoxal. Vem dos juízes purificadores o phátos das vozes e sentenças espantosas que temos que suportar. Uns não estão nem aí, outros são o “aí”.
A eleição é um grito de alerta. O feudalismo de donos do inconsciente coletivo nos espreita. Riqueza fácil, campanha cara e maus candidatos são irmãos gêmeos da carne que corta, dinheiro apreendido, medidas provisórias, emendas parlamentares, tribunais de faz de conta, jogos de azar, liminar encomendada. Olhando bem certas regras que fazem alguns tipos prosperarem, observamos que um é o outro revelado em suas atitudes cujos traços estão aí na realidade da vida das instituições. Eles são um outro de si mesmo. Há outros náufragos que navegam pelas ondas da política e da justiça do interesse, mudam de lado com as marés e se aquecem pelo calor corrosivo do poder.
O individualismo triunfante deve ser visto como freio à igualdade social geral. Está evidente a prosperidade de pessoas bizarras, coaches, influencers – evacuadores de regra, diria meu avô português – que impedem as instituições de se expressarem por sua história.
Assim como a qualidade de rico e de cultura não se adquire com riqueza ou poder, a grandeza do titular de certos cargos e fortunas costuma inspirar mais piedade do que respeito.
*É SOCIÓLOGO. E-MAIL: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar. Fonte: https://www.estadao.com.br
Eu voto pelo acesso ao básico
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Pergunte ao seu candidato o que ele fará sobre a situação do acesso à água tratada e coleta e tratamento dos esgotos
Por Luana Pretto
O ano de 2024 é ano eleitoral. Escolheremos em outubro quem nos representará nas prefeituras e Câmaras Municipais de nosso país pelos próximos quatro anos. A ação de votar, por vezes banalizada, ainda é um dos maiores trunfos para mudarmos nossa realidade e a de quem nos rodeia.
Quais serão as prioridades do governo, se será construído um novo hospital, reformado o antigo ou nenhuma das duas opções, se a avenida será recapeada ou não, se funcionários para a escola serão contratados ou não. Apesar de cada município contar com as suas leis (não começamos a cada quatro anos do “zero”), o impacto de uma gestão municipal é imenso no dia a dia de cada cidadão.
Entre essas inúmeras atribuições dos prefeitos e vereadores, uma delas é garantir o acesso ao saneamento básico para a população. Essa responsabilidade municipal já é prevista na própria Constituição federal, com as responsabilidades reforçadas pela Lei n.º 14.026/2020, o novo Marco do Saneamento. Quando os eleitores escolhem representantes comprometidos com a universalização do saneamento, contribuem para a melhoria da saúde pública, a preservação ambiental e o desenvolvimento econômico de suas cidades.
Infelizmente, entretanto, essa responsabilidade não é levada a sério em centenas de municípios brasileiros. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis), mais de 32 milhões de pessoas não contam com acesso à água tratada em suas residências e mais de 90 milhões vivem sem coleta de esgoto. Deste efluente gerado, apenas 52,2% é tratado, o que significa que o equivalente a 5.253 piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento são despejadas diariamente na natureza. Até o primeiro turno das eleições, 6 de outubro, mais de 1,4 milhão de piscinas de esgoto bruto serão lançadas na natureza.
Quase metade das moradias brasileiras conta com algum tipo de privação de saneamento básico. Da totalidade de 74 milhões de moradias, quase 9 milhões não têm acesso à rede geral de água; quase 17 milhões contam com uma frequência insuficiente de recebimento de água; cerca de 11 milhões não têm reservatório; cerca de 1 milhão não têm banheiro; e 22 milhões não contam com coleta de esgoto.
Essa carência impacta mais severamente as mulheres, que, além de todas as atividades do dia a dia, costumam ser as responsáveis pelos cuidados com a família e tarefas domésticas. De acordo com o estudo O Saneamento e a Vida da Mulher Brasileira, uma em cada quatro mulheres não tem acesso à água tratada ou não é abastecida com regularidade. Dezoito milhões de brasileiras sairiam da pobreza se tivessem água e esgoto tratados, o que resultaria numa injeção de R$ 13,5 bilhões na economia brasileira.
Caso o saneamento seja universalizado, será gerado cerca de R$ 1,4 trilhão em benefícios socioeconômicos para o Brasil. Mais de R$ 25 bilhões serão economizados com saúde, visto que a falta de saneamento leva a uma série de doenças de veiculação hídrica, como diarreia, dengue, cólera, etc. Com a redução das faltas no trabalho, já que os trabalhadores estarão mais saudáveis, é estimado um ganho de R$ 437 bilhões até 2040 em produtividade.
A universalização do tema também afetará positivamente o mercado imobiliário e o turismo. É estimado que o ganho para os proprietários de imóveis que alugam ou que vivem em moradia própria alcance R$ 48 bilhões no período, em razão da valorização dos imóveis com a melhoria das condições de saneamento.
O turismo seria beneficiado em cerca de R$ 80 bilhões no período, visto que regiões turísticas com água limpa, praias despoluídas e sistemas eficientes de coleta e tratamento de esgoto oferecem uma experiência mais segura e agradável para os turistas, incentivando o retorno e o aumento da demanda.
Investir hoje em saneamento é investir em qualidade de vida, em saúde, num futuro digno para milhões de brasileiros. É criar um círculo virtuoso, que afetará positivamente todas as futuras gerações. Apesar de ficarmos repetindo esses inúmeros benefícios e ninguém de fato ser contra o saneamento (você já ouviu algum político dizer que é contra a população ter banheiro ou água encanada?), o tema infelizmente não é priorizado pela grande maioria dos gestores públicos.
Uma obra de saneamento, como toda obra de infraestrutura, é algo caro e demorado. A infraestrutura que comece a ser construída hoje talvez não acabe até o fim da gestão de determinado candidato. E, por isso, muitos candidatos nunca começam essas obras. Mas, se elas nunca começarem, nunca serão finalizadas! E quem sofre com isso é a população. É seu filho, seu neto que acaba contraindo uma série de doenças que poderiam ser evitadas com o acesso ao básico.
Por isso é de suma importância colocar o tema no debate público. Pergunte ao seu candidato o que ele fará sobre a situação do acesso à água tratada e coleta e tratamento dos esgotos. Consulte dados públicos para saber como de fato anda o saneamento em sua cidade. Se nada for feito, seguiremos com milhões de brasileiros à margem da sociedade, toda uma geração com um futuro comprometido. Fonte: https://www.estadao.com.br
*É PRESIDENTE-EXECUTIVA DO INSTITUTO TRATA BRASIL
Estado e Igreja no Brasil
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Estado e Igreja no Brasil
Após 15 anos de sua ratificação, Acordo entre Brasil e Santa Sé ainda precisa ser mais conhecido no domínio público e nas instituições representativas do Estado e da Igreja
No próximo dia 7 de outubro transcorrerá o 15.º aniversário da aprovação, pelo Congresso Nacional, do Acordo entre o Brasil e a Santa Sé sobre o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil. O acordo foi assinado pelo presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e promulgado, após aprovado o Decreto Legislativo n.º 698, de 2009, no dia 11 de fevereiro de 2010. Portanto, ele possui força de lei em todo o território nacional. O acordo é um reconhecimento público da natureza jurídica da instituição chamada Igreja Católica Apostólica Romana pelo Estado brasileiro. Ele está em total sintonia com a Constituição brasileira.
Longamente discutido e elaborado entre as partes, o acordo tem a natureza de um tratado internacional entre dois entes soberanos com personalidade jurídica de Direito Internacional Público, no caso, o Brasil e a Santa Sé, representando a Igreja Católica. Da parte desta, o acordo representa o reconhecimento do Estado brasileiro e de suas legítimas instituições e representações; da parte do Estado, ele representa o reconhecimento jurídico da instituição Igreja Católica Apostólica Romana e de suas legítimas representações no Brasil. Também estabelece as formas da contribuição da Igreja Católica nos diversos campos da vida cultural, educacional e assistencial, bem como as modalidades de colaboração entre a Igreja Católica e o Estado brasileiro.
Esse reconhecimento jurídico da condição institucional da Igreja Católica havia deixado de existir no Brasil desde a proclamação da República, que extinguiu o Tratado do Padroado, regulador das relações entre Estado e Igreja durante o período imperial e também, anteriormente, durante o período colonial. A partir de então, embora a Igreja Católica não tenha sido proscrita nem deixado de existir e de dar sua contribuição ao País, a sua situação perante o Estado estava sem amparo jurídico e insegura. Há mais de meio século vinham sendo feitas tentativas para elaborar e validar algum instrumento jurídico que resolvesse essa situação. Finalmente, o acordo foi celebrado e ratificado em 2009.
Da parte da Santa Sé, há uma praxe secular e bem consolidada de celebrar tratados com os Estados onde a Igreja Católica se encontra e atua. Atualmente, há muitos desses tratados em vigor, mais ou menos abrangentes, com os mais diversos países, mesmo onde os católicos são apenas uma pequena minoria. Não se trata da pretensão de ser religião oficial em algum país; a isso, por princípio, ela já renunciou em todos os países. O objetivo da celebração de tratados é deixar claro perante o Estado e a sociedade quem ela é, quem a representa, qual é sua organização e quais são suas normas internas; quais são suas atuações públicas e suas possíveis colaborações para com o Estado e a comunidade local. Ao mesmo tempo, fica claro nos tratados que a Igreja Católica reconhece as instituições representativas do Estado e seu legítimo ordenamento jurídico. Da parte do Estado, ela espera ter o reconhecimento da liberdade religiosa e de atuação religiosa e nos diversos campos da vida social, como a educação, a cultura, a assistência social e a colaboração com o Estado, nos termos da legislação local.
Nos seus 20 artigos, além do reconhecimento jurídico da Igreja Católica e das instituições que a representam, o acordo trata dos objetivos da existência e atuação da Igreja no Brasil; da cooperação entre as partes no que se refere ao patrimônio histórico e cultural; da proteção dos lugares de culto e dos objetos e símbolos religiosos católicos; da assistência religiosa e espiritual às Forças Armadas, aos hospitais e prisões; da ação missionária; do reconhecimento dos títulos acadêmicos obtidos em instituições ligadas à Santa Sé, fora do Brasil; da cooperação na educação; do ensino religioso; do casamento religioso com efeito civil; das instituições beneficentes da Igreja Católica; além de outros assuntos.
Três lustros depois de sua ratificação, o Acordo entre o Brasil e a Santa Sé ainda precisa ser mais conhecido no domínio público e nas instituições representativas do Estado e da própria Igreja. Ainda pairam no ar certos questionamentos sobre a legitimidade desse instrumento jurídico de Direito Internacional. Para alguns, o acordo seria como um “pecado capital” contra a laicidade do Estado e a demonstração de que a Igreja Católica busca privilégios perante o Estado. Os três lustros que se passaram desde a assinatura do acordo já oferecem motivos para afastar esses eventuais temores.
A Igreja Católica não busca privilégios e nem de longe sonha em se tornar novamente a religião oficial do País. Ela reconhece e respeita o sadio princípio da laicidade mediante o qual o Estado reconhece e protege a liberdade religiosa e a livre manifestação religiosa dos cidadãos. Com o acordo, a Igreja Católica se apresenta perante o Estado e a sociedade e coloca as cartas na mesa, deixando claro quem ela é, quem a representa, o que ela faz, como se organiza e como interage com a sociedade brasileira. Tudo no respeito da lei que governa a todos. Fonte: https://www.estadao.com.br
*CARDEAL-ARCEBISPO DE SÃO PAULO
Jovem implora para ladrão não levar celular no RJ e diz que pai ainda está pagando
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Crime aconteceu na noite de segunda-feira (2) na Baixada Fluminense e foi registrado por câmeras de segurança
Rio de Janeiro
Uma jovem que teve seu celular roubado durante um assalto em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, entrou em desespero e implorou para o assaltante não levar o aparelho.
O caso, noticiado pela TV Globo, ocorreu na noite de segunda-feira (2) em frente à Câmara Municipal e foi registrado por câmeras de segurança. Na gravação, a vítima chega a implorar para não ter o telefone celular levado pelos criminosos porque, segundo ela, o pai ainda pagava pelo aparelho.
As imagens mostram a jovem acompanhada de outras duas mulheres quando é abordada por dois homens que estavam em uma moto. Um deles desce do veículo e vai em direção às jovens.
No vídeo, ainda é possível ver que o homem chega a enforcar a vítima, jogando a jovem no chão, para pegar o celular. Outra jovem que aparece com a vítima pede para que ela entregue o aparelho. "Vai, cara, dá. Dá o telefone!", diz a mulher enquanto o assaltante tenta tomar o celular. Então, a vítima implora e diz que o pai ainda estaria pagando pelo aparelho: "Não, cara. Papo reto, mano. Meu telefone. Meu pai tá pagando no cartão".
Em seguida, o ladrão pega o celular e foge com o comparsa na moto. Após o ocorrido, a jovem fica no chão, chorando. A Polícia Militar disse que não foi acionada para a ocorrência. No entanto, afirmou que atua em parceria com a delegacia da região para localizar e prender os envolvidos.
A PM informou ainda que houve uma queda de 5% nos roubos a pedestres na região no primeiro semestre deste ano em comparação com o ano passado.
Procurada, a Polícia Civil disse que "não localizou registro de ocorrência com essas características na delegacia da área". A Câmara Municipal de São João de Meriti não se manifestou sobre o ocorrido. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Liberdade de expressão?
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Você pode – e deve – criticar o STF. Há muito o que questionar na corte. Só o que não dá para dizer é que o que aconteceu com o Twitter foi mordaça
Por Eugênio Bucci
No tempo da ditadura, sinais de emissoras exóticas chegavam livremente aos rincões da pátria armada e fardada. Em ondas curtas, a Rádio Moscou ressoava com seu português escorreito em todo o território nacional, dos igapós amazônicos às roças de Nuporanga. E não era só ela. Junto, vinham também as locuções da Rádio Pequim, da Rádio Tirana e da Rádio Bulgária. Comunismo na carótida, calafrios na caserna. As autoridades se inquietavam: como bloquear a radiofrequência da Cortina de Ferro?
Não havia como. Veteranos da radiodifusão lembram até hoje que os militares tentavam usar engenhocas para atrapalhar o som das invasoras, ao menos nas regiões ditas estratégicas, mas a manobra não dava certo. Vetaram peças de teatro, canções de protesto, revistas de mulheres nuas, filmes sortidos, telenovelas picantes e romances de esquerda, mas fracassaram indigentemente no projeto de emudecer as estações alienígenas. Falta de vontade não foi.
Agora, o mundo é outro, já sabemos. Você quase não encontra mais aparelhos de rádio de ondas curtas, e, quando os encontra, não vê ninguém de ouvido colado na geringonça. Tudo ficou diferente. Só uma coisa não mudou: desafiando a lei da evolução natural das espécies, os apoiadores do golpe de 1964 ainda andam por aí, preservadíssimos, e não escondem de ninguém a saudade que sentem da ditadura, da tortura e da censura – ridícula, mas teimosa.
Essa turma andou alvoroçada ao longo da semana. Ao saber que a plataforma denominada X, antes conhecida como Twitter, foi banida de celulares e computadores por uma decisão judicial, voltou a enxergar fantasmas. As assombrações são as mesmas de antigamente, mas as aparições sobrenaturais vieram com os sinais trocados. Antes, o espectro do comunismo era externo, vinha de fora para dentro. Agora, é interno, vem da sede do Supremo Tribunal Federal (STF) e se irradia mundo afora. Antes, a proteção da liberdade marchava de coturno sobre o mármore branco do Palácio da Alvorada. Agora, mora longe e atende pelo nome de Elon Musk. Ectoplasmas reencarnados e revirados.
Fantasmagorias reversas. Nas suas alucinações miasmáticas, as viúvas do AI-5 são tragadas por mirações aterrorizantes. Veem a magistratura dos nossos tempos perpetrando à luz do dia a malvadeza que a magistratura de meio século atrás não foi capaz de perpetrar na escuridão: bloquear de uma canetada a comunicação do adversário exógeno. Mas como assim? Os saudosistas não se conformam e se contorcem de inveja: “Como é que os poderes da democracia são mais efetivos que os nossos na tirania de 1970?”. Não engolem o desaforo histórico: “Deram no X o sumiço que a gente não conseguiu dar na Rádio Moscou!”.
Para não passar recibo de que tudo não passa de dor de cotovelo auriverde, a claque tardia da ditadura extinta inventou que seu problema não é ciúme, mas o compromisso raivoso que ela teria com a “liberdade de expressão”. É isto mesmo: estamos vendo a bandeira da “liberdade” ser desfraldada pelas forças que sempre a conspurcaram. Não que os apoiadores do arbítrio mudaram – apenas repaginaram a própria vaidade. Eles, que ontem só admitiam a crítica se fosse “construtiva”, hoje se declaram favoráveis à manifestação do pensamento e até do não-pensamento. Principalmente do segundo.
É curioso, antropologicamente curioso. Você nunca vai ver este pessoal respaldando a liberdade de expressão dos moradores de rua, das mulheres pró-aborto, da população trans, dos trabalhadores pobres, dos quilombolas e dos indígenas, pois, segundo denunciam energicamente, esses setores, além de preconceituosos e intolerantes, são uns ongueiros mancomunados com as potências que só querem roubar nosso nióbio e nosso grafeno. Não, os saudosistas não se deixam engrupir. Eles têm lado. Defendem a liberdade de gente desprotegida, das vítimas indefesas da brutalidade togada. Combativos, prestam sua solidariedade pungente ao estropiado mártir da democracia: Elon Musk, este, sim, um injustiçado.
Os nostálgicos do arbítrio se converteram em musketeiros aguerridos. São todos por Musk, e estão convencidos até o bolso de que Musk sempre será por todos eles. Embalados pelos pesadelos das mil e uma noites de aquecimento global, não se lembraram de acordar para os fatos e para a realidade. Fatos: o ex-Twitter saiu do ar porque se negou a cumprir uma decisão judicial – decisão ratificada, por unanimidade, pela Primeira Turma do STF. Realidade: nenhum Poder Judiciário, em nenhum país conhecido ou desconhecido, poderia ter tomado outra atitude. Era preciso resguardar a autoridade judicial de um país soberano. Fato e realidade: isso não teve nada que ver com ataque à “liberdade de expressão”.
No mais, você pode – e deve – criticar o STF. Há muito o que questionar na corte. Só o que não dá para dizer é que o que aconteceu com o Twitter foi mordaça. Não há ninguém censurado aí, nem o pobre perseguido Elon Musk, que segue discursando à vontade. Mais que discursando, segue abusando de seu poder econômico, mas isso é outra conversa. Fonte: https://www.estadao.com.br
*JORNALISTA, É PROFESSOR DA ECA-USP
Democracia na UTI – reagir é preciso
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Democracia na UTI – reagir é preciso
A História mostra que projetos construídos de costas para a política terminam em decepção ou autoritarismo
Recente editorial do jornal O Estado de S. Paulo precisa ser lido e refletido por todos aqueles que, sinceramente, prezam a democracia. O espectro do niilismo político é o título da nota publicada no sábado, 24 de agosto, data que evoca o suicídio do presidente Getúlio Vargas, político e estadista que marcou fortemente a história deste país.
O editorialista fez uma análise preocupante a respeito da eleição municipal da maior cidade brasileira. Radicalização e extrema polarização são, mais uma vez, os ingredientes que vão sendo aquecidos no caldeirão da ausência de propostas, incapacidade de diálogo e morte da política.
O editorialista foca sua lente num personagem novo, mas que traz no seu DNA o velho veneno de demonização da política: Pablo Marçal. Dizendo barbaridades, não apresentando propostas sérias e apostando no conflito radical, Marçal tenta cativar o eleitorado de Jair Bolsonaro. Nada disso, no entanto, justifica a indevida censura judicial que lhe foi imposta.
Bolsonaro, embora entranhado no sistema (foi deputado em várias legislaturas), cresceu à sombra da descrença na política e da defesa de valores conservadores. Marçal, como bem frisou o editorialista, “usa a impopularidade da esquerda como pretexto para atacar seu verdadeiro alvo: a política”. Tem o perfil de um aventureiro.
Os aventureiros são sedutores, bons encantadores de serpentes. Mas a História mostra que projetos construídos de costas para a política terminam em decepção ou no autoritarismo dos pretensos salvadores da pátria.
Vamos, amigo leitor, fazer um exercício retrospectivo. Em 1964, sob o pretexto de preservar a democracia, os militares tomaram o poder. E o que se anunciava como intervenção transitória, com ânimo de devolver o poder aos civis, se transformou numa longa ditadura. A imprensa foi amordaçada. Lideranças foram suprimidas. Muitas injustiças foram cometidas em nome da democracia. Lembro-me da decepção de um primo-irmão de minha mãe, o professor Antonio Barros de Ulhôa Cintra, ex-reitor da Universidade de São Paulo e ex-secretário da Educação do Estado. Seu espírito liberal e independente, incompatível com a mentalidade de pensamento único que então prevalecia, provocou a ira dos donos do poder. Como ele inúmeros brasileiros, cultos e intelectualmente inquietos, escorregaram para o limbo do regime. Resistiram empunhando as armas da inteligência e da autoridade moral que não cede à sedução do poder.
A atual situação do Brasil preocupa. E muito. O desencanto da população é imenso. Os Poderes da República, isolados no bem-bom da Ilha da Fantasia, vivem de costas para a cidadania.
O Congresso Nacional, com exceções que devem ser registradas, está de costas para a sociedade. Está “se lixando” para a opinião pública. O abuso das emendas parlamentares, que o ministro Flávio Dino tentou, corretamente, dar um freio de arranjo, acabou vencendo a parada.
A política brasileira está podre. Ela é movida a dinheiro e poder. Dinheiro compra poder e poder é ferramenta poderosa para obter dinheiro. É disso que se trata. O poder arrecada o dinheiro que vai alçar os candidatos ao poder. Saiba que, atualmente, você faz pouca diferença quando aperta o botão verde de alguma urna eletrônica para apoiar aquele candidato que, quem sabe, possa virar o jogo. No Brasil, não importa o Estado, a única coisa que vira o jogo é uma avalanche de dinheiro. O jogo é comprado, vence quem paga mais.
O sistema eleitoral brasileiro está bichado e só será reformado se a sociedade pressionar para valer. Hoje, teoricamente, as eleições são livres, embora o resultado seja bastante previsível. Não se elegem os melhores, mas os que têm mais dinheiro para financiar campanhas sofisticadas e boa performance no mundo digital. A máquina de fazer dinheiro para perpetuar o poder tem engrenagens bem conhecidas no mundo político: emendas parlamentares, convênios fajutos e licitações com cartas marcadas.
As classes dirigentes estão entupidas de privilégios. Os partidos são balcões de negócios. O Executivo gasta muito e mal. Promove a jogatina, uma verdadeira tragédia moral, para faturar com impostos. E agora nos brinda com o maior IVA do mundo. O Judiciário está insensível e politizado. A Corte Suprema é hoje uma das instituições de menor credibilidade. O fato de que um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) não possa ir a um restaurante com tranquilidade é muito preocupante. Mas mais preocupante é a ausência de uma autocrítica que tente entender as razões de tamanha rejeição.
O cenário é desanimador? Sim. Mas quem escreve esta coluna, por paradoxal que possa parecer, é um otimista. Acredito no Brasil e na democracia. Como bem sublinhou o editorial do Estadão, “não se pode abafar o grito de desespero nem menosprezar a revolta do eleitorado. Há algo de podre na democracia brasileira. Mas não se reformará a democracia destruindo a democracia”. Diante de manifestações tão formidáveis de antipolítica, é preciso valorizar ainda mais a política, o diálogo e as posturas propositivas.
O Brasil não pode continuar refém de aventureiros. Precisa de estadistas que sejam capazes de descortinar sonhos e projetos do tamanho deste país continental.
*JORNALISTA. E-MAIL: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.
Ônibus que tombou em rodovia com fiéis de uma igreja do Leblon teve o pneu furado antes do acidente
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Uma vítima relatou que o motorista tentou trocar de veículo para voltar de Aparecida e seguir viagem: 'os socorristas disseram que poderíamos ter morrido'
Marlene Silva de Oliveira, uma das vítimas, relatou que o motorista tentou trocar de veículo para voltar de Aparecida e seguir viagem: 'os socorristas disseram que poderíamos ter morrido' — Foto: Divulgação
Por Lívia Neder
— Rio de Janeiro
O ônibus que transportava 46 fiéis da Paróquia dos Santos Anjos, no Leblon, que voltavam de Aparecida do Norte (SP), e tombou no KM Zero da BR 465 (antiga Rio-São Paulo), na altura de Nova Iguaçu, na noite deste sábado (31), teve o pneu furado antes do acidente. Uma vítima relatou que o motorista tentou trocar o veículo para seguir viagem, mas, sem sucesso, resolveu o problema em um borracheiro na estrada.
Muito assustada com tudo que passou, Marlene Silva de Oliveira esteve na paróquia, na manhã deste domingo (1°), para buscar seus pertences que ficaram no ônibus. Moradora de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, ela ganhou a viagem de presente da patroa, que é moradora do Leblon e paroquiana. O ônibus saiu de São Paulo às 15h e o acidente aconteceu por volta das 21h50.
—A gente estava meio que cochilando na hora do acidente. Logo no início da viagem, o pneu tinha furado e o motorista disse que pediu para trocarem o ônibus, mas ninguém chegou. Parece que avisaram que era melhor ele procurar um borracheiro. Ele procurou, deu um jeito, e a gente continuou a viagem. Não sei exatamente como aconteceu o acidente. A gente acordou no susto, parecia cena de guerra, todo mundo desesperado, caído. Machuquei um pouco o ombro, mas precisei ser forte porque tinha gente pior e muito mais nervosa, então tentei acalmar as colegas. Eram muitas senhoras e crianças. Foi um susto muito grande — relatou a vítima.
Segundo Marlene, os socorristas disseram que, pela forma que foi o acidente, todo mundo poderia ter morrido:
—Foi um livramento. Graças a Deus todos estavam de cinto, porque poderia ter sido muito pior.
De acordo com a Arquidiocese do Rio, 20 pessoas que estavam no ônibus e apresentaram ferimentos leves chegaram a receber atendimento médico no Hospital Geral de Nova Iguaçu e foram liberadas. O padre Thiago Azevedo, pároco da Paróquia dos Anjos, foi ao hospital acompanhar as vítimas durante a madrugada.
A missa deste domingo foi celebrada pelo padre Wagner, que agradeceu o "livramento":
—Rezamos essa missa agradecendo pelo livramento e pedindo pronta recuperação para os feridos do acidente. As vítimas viraram a noite no hospital e o padre Thiago chegou aqui na igreja às 7h, mas já está todo mundo em casa, graças a Deus.
A Polícia Civil informa que o caso foi registrado na 48ª Delegacia de Polícia (Seropédica). Testemunhas estão sendo ouvidas e diligências estão em andamento para apurar as circunstâncias do acidente e esclarecer todos os fatos. https://oglobo.globo.com
Como ajudar quem tem depressão e pânico.
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Doenças mentais não se curam com trabalho, chá de camomila, sono ou reza
Jornalista e roteirista de TV.
Estávamos na porta de casa, prontos para sair e curtir uma noite de Rock in Rio. Entradas VIP, com uma porção de mordomias que fazem diferença num festival que recebe milhares de pessoas a cada dia. A programação era ótima e ainda passaríamos a noite com amigos queridos. Antes de cruzar o batente, olhei para o meu marido e disse "não consigo". Comecei a tremer só de imaginar aquele mar de gente, música alta e fui engolida pelo medo de ter uma crise de pânico naquele tipo de condição.
O que eu recebi em troca foi um abraço. Ouvi dele que estava tudo bem, que poderíamos ver os shows em casa, tinha cerveja na geladeira, ele pediria pizza. Foi uma rotina nos meus dois primeiros anos de diagnóstico de Síndrome do Pânico, quando eu ainda não entendia quais eram os sinais de uma crise e tinha medo de que ela voltasse a acontecer como já havia, dentro de um restaurante, num baile de Carnaval, no provador de uma loja.
Certa vez tive que me deitar no chão do banheiro do aeroporto, encostar o rosto no piso frio e esperar que o remédio fizesse efeito e o sentimento de quase morte me abandonasse. Diante disso, muitas vezes, escolhia ficar em casa.
E tinha a depressão que me causava um vazio de sentimentos, nenhuma disposição de interagir, nenhum estímulo era suficiente para me comover. Mas o que eu me lembro de todo esse tempo é que tive apoio, empatia, carinho, amor, mesmo quando fui incapaz de retribuir.
Ajudar quem tem doenças psicológicas não é fácil, longe de ser. Mas um bom começo é aceitar e acreditar. Depressão não é frescura, não é preguiça, não é falta de fé, não é falta de louça para lavar, não é doença de rico. Sempre que escrevo sobre o assunto, recebo dezenas de mensagens de pessoas que não tem apoio das pessoas mais próximas, que minimizam o problema e adoram dar soluções mágicas. Depressão não se cura com trabalho, chá de camomila, sono ou reza.
Quando olho para meu marido, minha família e amigos próximos, não sei como eles aguentaram os meus períodos mais barra-pesada, quando eu só queria me recolher dentro de mim mesma, dormir ou beber, qualquer coisa que anestesiasse meus sentimentos.
O que eles me ofereceram foi presença. Estiveram sempre com uma mão estendida para quando eu tentasse me agarrar a alguma esperança de ficar bem. Não significa que eu não tenha me sentido sozinha ou revoltada. Hoje, entendo que esses sentimentos eram todos sobre a doença, que eu mesma demorei a aceitar. Eu tinha sido abandonada pela alegria, sentia raiva da dor que me afligia e eu não conseguia entender. Mas as pessoas que estavam no meu entorno formaram uma rede que me protege de mim mesma quando não consigo ser quem sempre fui.
Meu marido e meus pais jamais tentaram atropelar o tempo da minha recuperação. Nunca me forçaram a fazer nada ou trataram a depressão como a maioria ainda faz, como uma doença menor que pode ser resolvida com uma noite de sono, um banho de mar, exercício físico, um pouco de sol, boas companhias. Tudo isso pode ajudar, mas essa crença pelo paliativo apenas reforça o preconceito.
Embora cada pessoa precise de tratamento individualizado e reaja de forma distinta aos estímulos que recebe, se você convive com alguém que tem depressão ou/e pânico ou que demonstre sintomas de doenças psicológicas, ofereça apoio. Converse sobre os tratamentos, pergunte sobre os resultados, sobre os médicos. Mostre-se interessado e confiante no processo. Comente sobre as coisas que lê sobre o assunto, sem que seja o único assunto.
Você não terá a solução, talvez nem as melhores palavras. Nem sempre sabemos o que dizer diante do sofrimento alheio. Diga que está disponível, ofereça colo, consolo, companhia. Não deixe de estimular pequenas coisas no dia a dia ou convidar para programas mais elaborados, mas sem pressão. Dê espaço para que o outro respire, se recupere, mas sem se ausentar tanto para que ele possa se sentir abandonado e sem importância.
Apoie o Setembro Amarelo, uma campanha brasileira de prevenção ao suicídio, iniciada em 2013. O mês foi escolhido porque desde 2003 o dia 10 de setembro é o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
A tragédia do carisma
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A tragédia do carisma
Biden, ao reconhecer que a idade avançada não lhe facultaria disputar a reeleição, desistiu da empreitada. Lula poderia mirar-se nesse exemplo?
Por Paulo Roberto de Almeida
Certos líderes políticos possuem carisma, outros, não. Pode-se perder o carisma original e recuperá-lo. Mas existem características únicas no fenômeno, o que o torna intransmissível a outrem, ainda que discípulo do detentor original.
Winston Churchill adquiriu carisma como jornalista e voluntário nas forças britânicas que lutaram no Sudão e na África do Sul. Tornou-se lorde do Almirantado na Grande Guerra, mas perdeu o cargo no desastre de Dardanelos. Recuperou o prestígio ao se engajar nas forças britânicas que lutavam contra as tropas do império alemão na França. Foi ministro do Tesouro em 1925, mas a insistência em retomar o padrão-ouro na paridade de 1914 levou à crise de 1926, que provocou sua queda. Ficou no ostracismo, clamando contra os totalitarismos da época: só voltou ao poder no desastre de 1940 e na guerra contra o nazismo. A despeito do carisma perdeu as eleições de 1945 para o Labour.
Franklin Roosevelt conduziu os Estados Unidos na depressão dos anos 1930 e na guerra em duas frentes a partir de 1941, mas não transmitiu nenhum carisma a seu sucessor, Harry Truman. Dwight Eisenhower não tinha carisma, mas sim prestígio, como comandante das forças aliadas contra o domínio nazista na Europa. John Kennedy, em contrapartida, adquiriu um prestígio extraordinário por ser o mais jovem presidente da história americana, adquirindo carisma sobretudo ao confrontar os soviéticos no episódio dos mísseis soviéticos em Cuba.
O vice-presidente Lyndon Johnson, político tradicional do Texas, não tinha nenhum carisma; a guerra do Vietnã demoliu sua imagem, tanto que optou por não disputar novo mandato. O vencedor na disputa de 1968, Richard Nixon, adquiriu prestígio ao reinserir a China comunista no sistema mundial, mas perdeu ao se tornar um vulgar larápio no escândalo do Watergate. Ronald Reagan tinha prestígio vindo de Hollywood; ganhou carisma ao lograr, junto com Margaret Thatcher, implodir a União Soviética; seu vice, Bush pai, foi derrotado na tentativa de reeleição pelo carismático Bill Clinton, um grande animal político (a despeito das escapadas). Barack Obama tinha grande carisma, o que não impediu a vitória de um bizarro outsider, Donald Trump. Seu sucessor em 2020, Joe Biden, vice de Obama, desistiu da reeleição em 2024, pelo peso da idade.
No Brasil, Getúlio Vargas construiu seu carisma pelo controle da máquina de propaganda do Estado Novo. Juscelino Kubitschek ganhou o seu, ao fazer o Brasil crescer “50 anos em 5″, com democracia. O carisma de Jânio Quadros, um populista dos mais notáveis, sobreviveu à renúncia aos seis meses de governo e conseguiu preservar capital político para retornar como prefeito da maior cidade do País. Não se pode dizer que os presidentes militares tenham exibido qualquer carisma, o que tampouco foi o caso do presidente da redemocratização, José Sarney, embora o candidato eleito, Tancredo Neves, tivesse enorme prestígio político ao encerrar 21 anos de ditadura militar. Fernando Collor, o primeiro eleito por voto direto desde 1960, começou com grande sucesso ao dar início a importantes reformas econômicas, mas soçobrou ao serem revelados os negócios obscuros de um assessor.
Não se pode dizer que Itamar Franco, alçado presidente, tenha tido carisma, mas o sucesso do Plano Real levou seu ministro da Fazenda pouco carismático a vencer duas eleições no primeiro turno. Finalmente, chegamos a uma figura política de fato carismática, Lula da Silva, embora eleito apenas na quarta tentativa, depois de esconder seus instintos intervencionistas; reforçou seu lado populista na enorme expansão dos programas sociais criados por Fernando Henrique Cardoso. Saiu ungido por 80% de aprovação popular, o que lhe garantiu prestígio suficiente para retornar ao poder em 2023, a despeito de ter presidido o mais vasto esquema de corrupção da história do País.
No intervalo, uma administradora medíocre, Dilma Rousseff, sem qualquer carisma, conseguiu produzir a maior recessão da história econômica do Brasil. Jair Bolsonaro, por sua vez, era mais um fenômeno fabricado pela manipulação das redes sociais do que um movimento político organizado. A polarização contra o lulopetismo preservou-lhe inusitado prestígio, mesmo em presença de fraudes, malversações e até golpismo. Tal cenário pode suscitar novo embate entre petismo e antipetismo em 2026.
Lula continua com carisma, mais disseminado entre os beneficiários da assistência pública do que entre eleitores de regiões avançadas; os mapas eleitorais do PT confirmam que, dos anos 2000 à atualidade, ele se transformou no partido dos “grotões”. A tragédia do carisma de Lula, que é a de todos os carismas, é o fato de o fenômeno não ser transmissível a qualquer sucessor designado; mas o próprio Lula encarregou-se de sabotar eventuais discípulos dotados de voo próprio.
Biden, ao reconhecer que a idade avançada não lhe facultaria disputar a reeleição, desistiu da empreitada. Lula, que também enfrenta o peso da idade e um carisma declinante, poderia mirar-se nesse exemplo para optar por não enfrentar nova difícil disputa em 2026?
*DIPLOMATA E PROFESSOR
Fonte: https://www.estadao.com.br
Ladrão de carro arranca aliança de vítima com os dentes
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Vítima foi rendida em São Cristóvão por 6 bandidos. Um deles assumiu a direção, perdeu o controle do carro e acabou batendo. Na fuga, criminoso exigiu que professor colocasse o dedo na boca para tirar o anel à força.
Por Jefferson Monteiro, Bom Dia Rio
Professor teve aliança arrancada do dedo a dentadas — Foto: Reprodução/TV Globo
Um professor foi assaltado por ladrões de carro na manhã desta terça-feira (27) em São Cristóvão, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Um dos bandidos exigiu que ele entregasse a aliança, mas, como o anel não saía, o criminoso arrancou, com os dentes, a joia do dedo da vítima.
O ataque foi por volta das 6h40, nas imediações da Quinta da Boa Vista, e testemunhas acreditavam ser um arrastão. O professor vinha de Teresópolis, na Região Serrana, dirigindo um Volkswagen Nivus com a filha no carona quando foi fechado por um Honda HR-V, onde havia 6 bandidos.
Pelo menos 5 saltaram armados de pistolas e renderam o motorista. Ele não reagiu e deixou o automóvel. Um criminoso assumiu a direção do Nivus, mas, como era câmbio automático, perdeu o controle e bateu no HR-V. Esses 2 veículos acabaram abandonados pela quadrilha.
Enquanto comparsas rendiam um Jeep Renegade para fugir, um ladrão exigiu a aliança do professor — foi quando, diante da dificuldade de retirá-la, ele deu a ordem para que a vítima colocasse o dedo em sua boca e, a dentadas, conseguiu arrancar. No fim, o professor ainda foi agredido com uma coronhada. Celulares e carteiras também foram levados.
A polícia descobriu que o HR-V constava como roubado e foi adulterado, circulando com outra placa. Fonte: https://g1.globo.com
O pequeno país com a taxa de suicídios mais alta do mundo
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A BBC conversou com uma mãe que perdeu um filho, uma assistente social e um parlamentar para descobrir o que está por trás das estatísticas em Lesoto
dê um conteúdo
Tlohang falou com a mãe sobre seus problemas de saúde mental - BBC
Da estrada principal até a casa de Matlohang Moloi, de 79 anos, há uma subida íngreme pelas montanhas que fazem de Lesoto um dos países com a altitude mais elevada do mundo.
Esta mãe de 10 filhos me recebe em sua casa bem cuidada —e me mostra fotos da família numerosa. Estou aqui para conversar com ela sobre um de seus filhos: o primogênito, Tlohang.
Aos 38 anos, ele se tornou parte de uma estatística sombria. Lesoto, apelidado de "reino no céu" devido à sua altitude, tem a taxa de suicídios mais alta do mundo. "Tlohang era um bom filho. Ele me contou sobre seus problemas de saúde mental", diz Moloi.
"Ele veio até mim e disse: 'Mãe, um dia você vai ouvir que tirei minha vida'." "A morte dele me doeu muito. Eu realmente gostaria que ele pudesse ter explicado com mais detalhes o que estava acontecendo com ele. Mas ele tinha receio de que, se contasse às pessoas, pensariam que ele era uma pessoa fraca, incapaz de resolver seus próprios problemas."
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 87,5 pessoas por 100 mil habitantes tiram a própria vida todos os anos em Lesoto. Este número é mais que o dobro do registrado pelo próximo país da lista, a Guiana, na América do Sul, onde a taxa de suicídio é de pouco mais de 40 por 100 mil habitantes.
Também é quase dez vezes a média global, que é de nove suicídios para cada 100 mil pessoas. Esta é uma estatística que ONGs, como a HelpLesotho, estão determinadas a mudar, munindo os jovens com as habilidades necessárias para gerenciar sua saúde mental.
Terapia de grupo
Na cidade de Hlotse, a cerca de duas horas de carro da capital Maseru, participei de uma das sessões regulares de terapia de grupo para mulheres jovens, dirigidas pela assistente social Lineo Raphoka.
"As pessoas pensam que isso vai contra os nossos princípios, as nossas experiências culturais, a nossa espiritualidade como africanos e como comunidade em geral", diz Patience, de 24 anos, ao grupo.
"Mas também estamos escondendo o que está acontecendo. Perdi três amigos por suicídio. Eu mesma tentei." Todos aqui já tiveram pensamentos suicidas ou conhecem alguém que cometeu suicídio.
Ntsoaki, de 35 anos, se emociona ao compartilhar sua história com o grupo. Ela foi estuprada no hospital. "O médico me disse que eu era muito atraente. Aí ele sacou uma arma, e me disse que queria ter prazer comigo, e que se eu não deixasse, me mataria."
"Pensei em suicídio, e que era a única solução. Não consegui, não tive forças para fazer isso. A única coisa que me manteve em movimento ou viva foi o rosto dos meus irmãos. Eles acham que sou forte, mas sou fraca", relatou.
O grupo garante que ela é forte por dividir seus sentimentos. Quando a sessão termina, todas as mulheres conversam e sorriem, dizendo que estão se sentindo melhor por terem compartilhado suas histórias.
As razões pelas quais as pessoas tiram a própria vida são muitas vezes complicadas - e é difícil isolar uma única causa.
Padrões que ajudam a entender
Apesar disso, Raphoka diz que vê padrões que explicam por que o Lesoto tem uma taxa de suicídio tão alta. "Na maioria das vezes, são pessoas que passam por situações como estupro, desemprego, perda de um ente querido. Fazem uso abusivo de drogas e álcool."
De acordo com um relatório de 2022 do World Population Review, 86% das mulheres em Lesoto sofrem violência de gênero. Enquanto isso, o Banco Mundial afirma que dois em cada cinco jovens não têm emprego nem formação.
"Não recebem apoio suficiente de suas famílias, amigos ou de qualquer tipo de relacionamento que tenham", acrescenta Raphoka.
É algo que você ouve com frequência em Lesoto. As pessoas dizem repetidamente que não se sentem à vontade para falar sobre sua saúde mental - e que outros podem julgá-las.
Uma noite, sentado em um bar em Hlotse, onde a clientela masculina bebe cerveja local e conversa sobre política enquanto assiste a uma partida de futebol na TV, mudo o assunto para saúde mental.
"Nós conversamos sobre isso, dizemos: 'vamos nos abrir'", afirma Khosi Mpiti. Alguns receiam que, se revelarem demais, isso possa gerar fofocas sobre eles. Apesar disso, Mpiti diz que as coisas estão melhorando.
"Como grupo [de amigos], nos apoiamos muito. Se tenho um problema, eu conto ao grupo, e nos apoiamos mutuamente."
No entanto, quando as pessoas buscam ajuda profissional, enfrentam dificuldades no sistema público de saúde. A única unidade psiquiátrica do país foi criticada no ano passado pelo ombudsman, funcionário cuja função é zelar pelos interesses públicos, por não ter um psiquiatra desde 2017.
Ele também destacou abusos generalizados, incluindo "condições que violam os direitos humanos". Tampouco havia uma política nacional de saúde mental para lidar com a crise, embora o governo, eleito em outubro de 2022, diga que está em processo de elaboração de uma.
"O problema de saúde mental se tornou uma epidemia", admite Mokhothu Makhalanyane, parlamentar que dirige uma comissão voltada para questões de saúde.
"Estamos nos certificando de que a mensagem chegue a todos, desde escolas primárias até escolas secundárias, e locais onde os jovens se reúnem, como torneios de futebol", disse ele à BBC.
"A política também será específica em termos de tratamento, e permitirá que as pessoas afetadas se submetam à reabilitação." Segundo ele, Lesoto pode aprender com sua luta contra o HIV, vírus causador da Aids.
Falar abertamente
Em 2016, Lesoto se tornou o primeiro país a introduzir uma estratégia de "teste e ensaio", o que significa que as pessoas podem iniciar o tratamento assim que forem diagnosticadas. As taxas de infecção pelo vírus diminuíram constantemente.
"A experiência que tivemos é que falar abertamente, e não culpar nem criticar as pessoas pela situação, ajudou a mudar as coisas." De volta às montanhas, Moloi faz uma curta caminhada até chegar ao túmulo do filho.
A morada final de Tlohang está localizada em um terreno com uma vista impressionante, repleta de riachos, vegetação e pequenas casas. Moloi é uma entre várias pessoas em Lesoto que estão enfrentando a dor de perder alguém por suicídio.
Enquanto admiramos a vista, ela diz que tem uma mensagem para aqueles que se encontram na mesma situação mental que o filho estava.
"Eu diria às pessoas que tirar a própria vida nunca é uma solução. O que você precisa fazer é conversar com as pessoas ao seu redor para que possam ajudá-lo." Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Por que somos atraídos pela tragédia?
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Advogada, escritora e dramaturga, é autora de 'Caos e Amor'
Você consegue passar por um acidente de trânsito sem desacelerar o carro para dar uma "olhadinha"? Consegue passar reto por uma briga de casal sem se sentir atraído por uma estranha curiosidade? Fica ligado nos detalhes de um acidente aéreo e mergulha nas histórias pessoais das vítimas?
Para o filósofo Thomas Hobbes, esse fenômeno poderia reforçar a teoria de que o homem nasce essencialmente mau e é fundamentalmente egoísta —por isso, depende de um estado autoritário para ditar-lhe normas de convivência.
Existe, porém, uma explicação mais simples do que uma suposta tendência mórbida: fisiologicamente, nosso instinto humano —ou animal— é atraído por infortúnios, tragédias e catástrofes.
Um avião modelo ATR 72-500, da companhia aérea Voepass, que saiu de Cascavel (PR), e seguia para Guarulhos (SP), caiu dentro de um condomínio residencial no município de Vinhedo, interior de São Paulo, deixando 62 mortos - Bruno Santos/Folhapress
Uma inquietação emerge, surge um desejo instintivo de desvendar as complexidades do extraordinário. Uma parte de nós parece ficar inebriada pela ânsia de buscar mais informações e detalhes, o que nos faz vivenciar um sofrimento ao enfrentar a efemeridade da nossa existência, mas com o conforto de não estarmos diretamente afetados.
Eventos como esses nos afastam do mundano, do familiar e da garantia do amanhã. Somos convocados a usar as vestes emocionais dos aflitos (e se fosse comigo?), mergulhar nas nossas profundezas (quem somos nós diante de eventos que desafiam a compreensão?) e confrontar os nossos medos através das histórias dos outros. É, ao mesmo tempo, uma sensação perturbadora causada pela dor dos outros e um alívio por estarmos a salvo.
Cada reviravolta trágica é um chamado para o terreno do desconhecido, um enigma que desafia os limites da nossa compreensão, que chacoalha a sensação de estabilidade que a normalidade nos faz acreditar.
Encontramos mais significado nos acontecimentos negativos do que positivos (não é à toa que se vendem mais notícias ruins do que boas). Na psicologia evolutiva existe a ideia de que "o mal é mais forte do que o bem", porque a nossa sobrevivência histórica depende muito mais da capacidade de reagir a ameaças do que de aproveitar as oportunidades.
Passamos a vida fugindo da única certeza que temos: a nossa finitude. É o único jeito de tornar a vida suportável. Viver com uma consciência incessante no dia a dia da nossa fragilidade e insignificância, seria pesado, triste, insustentável. Por isso, é justamente nos momentos em que somos tocados por infortúnios alheios, que devemos nos fortalecer e reforçar a nossa significância.
Tragédias têm o poder de transformar momentaneamente a atmosfera social, como se déssemos uma pausa aos ressentimentos e às reclamações ranhetas. A desolação comum une as pessoas pela dor, os sons da animosidade diminuem, as pessoas ficam mais gentis, valorizam os abraços e os afetos. É como se precisássemos de tragédias para nos tolerar uns aos outros.
Uma dose secreta de Schadenfreude (prazer que se sente ao ver o infortúnio de outra) faz parte de todos nós, desde os tempos em que nos divertíamos com as puxadas de tapete da dupla Tom e Jerry no desenho animado ou ríamos do amigo que escorregava numa casca de banana.
Há um episódio de "Os Simpsons" em que Ned Flanders, o vizinho irritantemente perfeito de Homer, resolve abrir uma loja. Tomado pelo Schadenfreude, Homer fantasia que o negócio de Ned entra em colapso. Primeiro imagina a loja sem clientes, depois, o vizinho empobrecendo, e depois uma fila de credores batendo na sua porta. Só quando Homer imagina o túmulo de Flanders e seus filhos chorando ao seu redor, que ele se detém. "Longe demais", ele diz. A loja falida era suficiente.
Se conseguirmos moderar essa "alegria dos impotentes", como definiu Nietzsche, e aprender a ter um olhar compassivo, poderemos evoluir com os fatos, bons e ruins, que nos cercam.
Só não vale ficar indiferentes; a indiferença é o maior desperdício da vida. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
A fascinante descoberta de pequeno tesouro junto a casal morto em Pompeia
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Erupção do Vesúvio os levou a se refugiarem num pequeno cômodo que se tornaria seu
BBC
Um casal que tentou escapar da erupção do Vesúvio há quase 2.000 anos, acabou se refugiando —e ficando preso— em um pequeno cômodo.
Cientistas encontraram os restos mortais do homem e da mulher, que guardavam um pequeno tesouro, durante uma escavação arqueológica em Pompeia, a antiga cidade romana destruída pela erupção vulcânica em 79 d.C., localizada no sul da Itália.
As descobertas foram reveladas nesta semana.
Segundo artigo publicado no E-Journal of the Pompeii Excavations, a casa onde o casal estava tinha um pequeno cubículo que estava sendo usado provisoriamente como quarto, enquanto uma reforma era feita no restante do imóvel.
Quando a erupção do Vesúvio começou em 79 d.C., os dois se refugiaram no pequeno cômodo, enquanto a tempestade de cinzas e material vulcânico caía do lado de fora.
Mas, em determinado momento, as pedras vulcânicas acabaram bloqueando a única porta disponível.
"Presos no cômodo pequeno e estreito, eles morreram quando os fluxos piroclásticos os alcançaram", explicou o Parque Arqueológico de Pompeia em comunicado.
A violenta erupção do Vesúvio —que ocorreu numa noite de agosto ou outubro de 79 d.C., algo que os cientistas ainda debatem— pegou de surpresa as cidades de Pompeia, Herculano e Estábia. Quase 20 mil pessoas morreram, deixando para trás seus restos mortais nestas cidades do sul da Itália.
Moedas e joias
Em escavações recentes, os cientistas se depararam com o pequeno cômodo em que jazia o casal, na ínsula dez, um dos sítios de exploração arqueológica de Pompeia.
O esqueleto da mulher foi encontrado sobre uma cama, em que ela guardava "um pequeno tesouro de moedas de ouro, prata e bronze", explicaram os pesquisadores.
Também havia algumas joias, como brincos de ouro e pérolas. Os restos mortais do homem estavam caídos aos pés da cama.
Um dos dois esqueletos utilizados em pesquisa para avaliar o efeito de terremoto na destruição de Pompeia, na Itália Pompeii Archaeological ParkMais
Fora do pequeno cômodo, os arqueólogos também encontraram pistas de como era aquela casa.
"Vestígios nas cinzas permitiram reconstruir o mobiliário e identificar sua localização exata no momento da erupção: uma cama, uma arca, um candelabro de bronze e uma mesa com tampo de mármore, com os móveis de bronze, vidro e cerâmica ainda em seus devidos lugares", indica o artigo.
Esses trabalhos ajudam os cientistas a obter "dados arqueológicos muito valiosos" sobre o cotidiano dos moradores de Pompeia da época, afirmou o diretor do Parque Arqueológico, Gabriel Zuchtriegel. Fonte: https://www.folha.uol.com.br
Sequestro e libertação da beleza atlética
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A narrativa da abertura dos Jogos Olímpicos submergiu a presença epifânica dos movimentos corporais numa nova cartilha de educação moral e cívica
Por Marcos Lopes
Em suas Confissões, Santo Agostinho criticava o teatro por despertar as paixões na alma do espectador. A compaixão do público pelo sofrimento da personagem produziria efeitos semelhantes ao de alguns fármacos que causam dependência. Narrando seu processo de conversão, ele indicava que a vida religiosa e a arte do espetáculo (circos, teatros e anfiteatros) seriam conflitantes. O prazer dramático, além de excitar as emoções, poderia se tornar compulsivo ou um vício, distanciando a pessoa da verdade espiritual.
A crítica de Agostinho permitiria, por contraste, entender a crença atual nos benefícios sociais do espetáculo. Na visão cristã, o pecado, ruptura da criatura com o criador, explicaria sua consequência: o sofrimento e a maldade. Recuperar aquela unidade primordial exigiria da humanidade um longo périplo pelo vale de lágrimas. Sofrimento e compaixão eram vivenciados na alma de cada fiel e não apenas na contemplação do padecimento alheio. Mas todas essas metáforas tornaram-se vazias. São fósseis linguísticos que sobrevivem como fantasmas em nossa imaginação. Pelo menos é o que nos fez crer o espetáculo de abertura da Olimpíada de Paris. Em um mundo que reduziu a religião a um fenômeno da “cultura”, tornando-a uma “mercadoria” à disposição das preferências pessoais, as noções de pecado, alma e salvação são anacrônicas. Substituímos a história da salvação pela da exibição, e a ascese pela encenação.
A ética das sociedades ocidentais contemporâneas teve sua síntese na abertura dos Jogos Olímpicos. A beleza atlética foi sequestrada pelos imperativos da diversidade cultural. O princípio de emulação esportiva deu lugar à emancipação política. A narrativa dos organizadores do espetáculo e a cobertura dos comentaristas submergiram a presença epifânica dos movimentos corporais numa nova cartilha de educação moral e cívica. O esporte tornou-se um detalhe.
De todo modo, após a cerimônia e seu rosário de boas intenções, iniciaram-se as competições, como sempre marcadas por risos, lágrimas, quebras de recordes, bons e maus perdedores, momentos de glória e de excelência atlética. A comemoração do surfista Gabriel Medina, após realizar uma manobra quase perfeita, seu “voo” com o braço apontado para cima e a prancha simétrica ao corpo captam com mais energia nossa atenção do que o esforço da cerimônia em sua pregação cívica. Os jabs, cruzados e a dança da boxeadora Bia Ferreira, ao ser proclamada vencedora em sua primeira luta, são a celebração de uma disciplina corporal, mais do que a subversão das relações do poder patriarcal.
A excelência coreográfica de Medina e os golpes implacáveis de Ferreira são resíduos de uma possível transcendência, em oposição a uma horizontalidade mundana, marcada por niilismo e pela crença no poder performático da linguagem. Tal crença estimula o comentário excessivo, que suplanta o próprio acontecimento esportivo e sequestra a graça do movimento corporal em proveito da comunicação hiperinflacionada. Pouco valor semântico é agregado às práticas esportivas quando isso ocorre. Diante da grandeza e da beleza dos gestos, todo discurso se torna excessivo.
A foto de Medina, capturada pelo francês Jerome Brouillet, nos faz olhar para a substância do evento esportivo: a graça do corpo em movimento. O instante imóvel da imagem detém, por alguns momentos, o excesso de palavras. Cultiva a esperança e o silêncio ao invés da euforia e do ruído. O instantâneo fotográfico liberta a beleza atlética do cativeiro dos discursos bem-intencionados. A tensão entre instante (a imagem fotográfica) e duração (o discurso sobre o evento) pode ser pensada a partir de uma célebre passagem do livro IV das Confissões de Agostinho.
Segundo ele, as coisas, “no exato momento em que nascem e começam a existir, quanto mais rapidamente crescem para o ser, tanto mais correm para o não ser”. Tal condição lhes foi imposta por Deus, por serem elas partes daquilo que não existe simultaneamente. “São coisas que, desaparecendo e sucedendo-se umas às outras, compõem o universo.” Um exemplo disso seria a fala, através de sinais sonoros. “E o discurso não seria completo, se cada palavra, depois de pronunciada, não morresse para deixar lugar a outra.”
A sucessão de instantes compõe a duração de uma vida. Mas todos os instantes se equivalem? Para Agostinho, a vida que escoa inexoravelmente só pode ser detida e transformada pelo instante da graça. Haveria algum paralelo entre esse instante e o da beleza atlética? A dimensão da fé, como aposta na transcendência, seria vivência da presença divina no aqui e agora da existência, assim como o atleta, em seu jogo, faz do movimento corporal a encarnação de sua crença na vitória. Em ambas as apostas (religião e esporte), a transcendência é presença real e não mais a repetição interminável de um ciclo biológico. Perder ou ganhar seria apenas parábola dessa curta e contingente vida terrena.
*PROFESSOR DE LITERATURA GERAL E COMPARADA NA UNICAMP Fonte: https://www.estadao.com.br
O que é e como reconhecer uma pessoa narcisista? Entenda o transtorno de personalidade.
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Narciso pintado por Caravaggio entre 1597 e 1599 Foto: Galleria Nazionale d'Arte Antica
Condição é rara e pode causar sofrimento tanto ao paciente quanto às pessoas ao seu redor
Por André Bernardo
Se ganhasse um dólar toda vez que alguém lhe pedisse para descrever um narcisista, Sarah Davies já estaria rica. Por essa razão, a psicóloga britânica decidiu escrever Como se libertar de um narcisista: Aprenda a reconhecer um relacionamento tóxico, se livrar da manipulação e recuperar sua autoestima (Sextante).
No livro, para facilitar o entendimento, ela reconta a fábula do escorpião e do sapo. Para quem não conhece a história, o escorpião pede ao sapo que o ajude a atravessar um rio. O sapo hesita: tem medo porque sabe do que os escorpiões são capazes. O escorpião explica que não seria louco de atacá-lo. Se fizer isso, os dois morrerão afogados. Apesar de relutante, o sapo concorda. No meio da travessia, o que temia acontece. “Por que você me picou?”, perguntou um. “Sou um escorpião…”, respondeu o outro. “E escorpiões picam”.
“É da natureza de um escorpião picar. Todo mundo sabe disso. O sapo também sabia. Como ele poderia esperar algo diferente?”, indaga a psicóloga, que viveu uma situação de abuso narcisista.
O livro de Davies não é o único sobre o transtorno a chegar às livrarias brasileiras. O outro é A nova ciência do narcisismo – Compreenda um dos maiores desafios psicológicos da atualidade e descubra como superá-lo (Cultrix), de W. Keith Campbell.
O psicólogo americano estuda o assunto desde 1999, quando soube que os atiradores de Columbine, massacre em uma escola do Colorado que terminou com 15 mortos, queriam que fosse feito um filme a respeito deles. Não satisfeitos, ainda queriam que o tal filme fosse dirigido pelo cineasta Steven Spielberg.
Narcisistas existem muitos. Pessoas com TPN, sigla para Transtorno de Personalidade Narcisista, nem tanto. Segundo estimativas, não passa de 1% da população. Mas há lugar para todos no espectro do narcisismo, de namorados tóxicos a líderes megalomaníacos. Nem algumas mães estão livres de apresentar sintomas do transtorno, como mania de grandeza, necessidade de atenção e falta de empatia. Quem garante é a psicóloga brasileira Michele Engelke. Ela é autora do livro digital Prisioneiras do espelho – Um guia de liberdade pessoal para filhas de mães narcisistas (2016) e editora do site Filhas de Mães Narcisistas.
“Se você acha que sua mãe é narcisista, a probabilidade de você estar certa é muito grande. Não há melhor especialista em narcisismo materno do que filhas de mães narcisistas”, explica no site. Para as filhas de mães narcisistas, há duas notícias: uma boa e outra ruim. A boa é que há tratamento para o TPN. A ruim é que, dificilmente, um narcisista procura atendimento. “Quando o convívio é prejudicial à saúde mental ou provoca impacto negativo na qualidade de vida, o contato zero torna-se uma opção”, pondera Engelke.
1-O que é narcisismo?
É um traço de personalidade que envolve a autoestima. Todos nós, em algum grau, somos narcisistas.
“O narcisismo nos ajuda a enfrentar desafios, confiar em nossas habilidades e buscar reconhecimento por nossas conquistas”, explica o psiquiatra Eduardo Martinho Júnior, coordenador do Ambulatório para o Desenvolvimento dos Relacionamentos e das Emoções do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da FMUSP.
“Não há cura para o que não é doença”, ressalta o psicólogo Rodrigo Acioli, do Conselho Federal de Psicologia (CFP). “A personalidade narcisista, por si só, não gera transtornos para a vida do indivíduo”.
O narcisismo se torna problemático quando é extremo e inflexível. Ou, ainda, quando traz prejuízos e provoca danos na vida afetiva, familiar, social, acadêmica ou profissional do narcisista.
Quando isso acontece, o que era traço de personalidade vira transtorno psiquiátrico.
2-O que é Transtorno de Personalidade Narcisista (TPN)?
É o tipo clínico ou psiquiátrico do narcisismo. Está previsto no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) desde 1982.
“É uma condição de saúde mental caracterizada por dificuldade persistente tanto na regulação da autoestima quanto no relacionamento com os outros”, define Martinho Júnior.
“As pessoas com TPN podem experimentar flutuações significativas na autoestima: ora são extremamente superiores, ora são profundamente inseguras. Isso pode levar a comportamentos aparentemente arrogantes e insensíveis, mas que, na verdade, são tentativas de lidar com dor emocional e medo de rejeição”.
A personalidade narcisista é caracterizada por uma admiração excessiva por si mesmo, acrescenta o psiquiatra Cláudio Martins, da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). “Se preocupam apenas com os seus interesses e as suas necessidades”.
No ambiente de trabalho, pessoas com TPN têm dificuldade para trabalhar em equipe, obedecer ordens ou receber críticas. “Acham que suas ideias e opiniões são melhores que as dos outros”, ilustra Martins.
3-Qual é a prevalência do TPN?
É relativamente raro, avalia Keith Campbell. Afeta cerca de 1% da população. No Brasil, seria algo em torno de 2,1 milhões de pessoas com TPN.
É mais comum em homens do que em mulheres. E em jovens do que em adultos.
4-Quem foi Narciso?
Um personagem da mitologia grega. “Era um caçador belo e carismático que tinha a reputação de partir corações por rejeitar o amor dos outros”, descreve Davies.
Reza a lenda greco-romana que, como punição, a deusa Nêmesis lançou um feitiço sobre Narciso: se apaixonar pela primeira pessoa que visse.
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Num dia quente, Narciso, exausto após a caçada, decide descansar à beira de um lago. É quando, ao beber um pouco de água, se vê refletido na superfície e cai de amores por si mesmo.
“Apaixonado pelo próprio reflexo, termina morrendo afogado”, conclui Campbell. “O amor por si mesmo acaba por matá-lo”.
O mito já inspirou, entre outras manifestações artísticas, poema do inglês John Keats, pintura do italiano Caravaggio e letra do compositor Caetano Veloso.
5-Qual é a origem do TPN?
É multifatorial, ou seja, não há uma única causa. É uma combinação de fatores genéticos, biológicos e ambientais.
Entre os fatores ambientais, Martins destaca “experiências traumáticas na infância”.
Martinho Júnior acrescenta mais três exemplos: relações de apego na infância, estilo de criação e educação, e necessidade de autoestima elevada.
“Se a criança percebe que só é valorizada quando conquista algo e não pode demonstrar fraqueza, começa a acreditar que ter sucesso na vida é tudo o que importa”, observa o psiquiatra da USP.
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6-Narcisista é tudo igual ou há diferentes tipos?
Há três tipos: o grandioso, o vulnerável e um misto dos dois.
O grandioso é o tipo clássico: ambicioso, extrovertido e carismático. Tem autoestima elevada, quer ser o centro das atenções e não demonstra empatia. Também é manipulador, direto e arrogante. “É o tipo que você mais verá na vida: vai trabalhar para ele, sair com ele e se divertir com ele”, avisa Campbell.
Tony Stark, de Homem de Ferro; Gilderoy Lockhart, de Harry Potter, e Miranda Priestly, de O Diabo Veste Prada, são exemplos de narcisistas da ficção.
O vulnerável é mais sutil: inseguro, introvertido e deprimido. Diz que tem baixa autoestima, mas pensa que merece tratamento especial. É carente, dissimulado e tímido. “Serão mais difíceis de aparecer. São narcisistas enrustidos”, brinca Campbell.
Um bom exemplo de narcisista vulnerável na ficção é George Costanza, da série Seinfeld, ou a maioria dos personagens de Woody Allen, como em Noivo Neurótico, Noiva Nervosa. Enquanto os grandiosos são ofensivos, os vulneráveis são defensivos.
O terceiro tipo é uma combinação dos dois primeiros. É, por um lado, ambicioso e extrovertido e, por outro, defensivo e introvertido. Segundo Campbell, vive numa “zona intermediária”, sendo ao mesmo tempo grandioso e vulnerável.
7-Como se diagnostica o TPN?
São nove os critérios de diagnóstico:
1-Grandiosidade – Superestima suas habilidades e exagera suas realizações.
2-Fantasia – Vive uma vida ilusória de fama, status e poder. Não tem limites.
3-Especial – Se acha superior, original ou especial. A última bolacha do pacote, diriam alguns.
4-Admiração – Quer ser admirado por todos o tempo inteiro.
5-Noção de ter direitos – Seus desejos têm que ser sempre atendidos.
6-Exploração – Explora os outros para conseguir o que quer.
7-Falta de empatia – Não consegue se colocar no lugar do outro.
8-Inveja – Tem inveja dos outros. E acha que os outros têm inveja dele.
9-Arrogância – É pretensioso até dizer chega.
Se o indivíduo apresenta cinco dos nove critérios acima, em contextos diferentes e a partir da idade adulta, é forte candidato a ter TPN.
8-Como identificar uma pessoa com TPN?
É um transtorno de difícil identificação. “Atribuem a si mesmos uma importância além do normal”, explica Campbell. Mas, não basta supervalorizar a si mesmo, é preciso desvalorizar os outros.
Davies compara o relacionamento amoroso com um narcisista a um passeio na montanha-russa. “É empolgante e divertido em alguns momentos, e terrível e assustador em outros”, descreve. “E se o passeio durar tempo demais, você acaba passando mal”.
Num primeiro momento, os parceiros narcisistas jogam charme, dão presentes, rasgam elogios. Fazem o que podem e o que não podem para conquistar suas vítimas. É o que Davies chama de “bombardeio de amor”. Passado algum tempo, o romantismo exacerbado cede espaço ao abuso emocional.
Já mães narcisistas são imaturas emocionalmente. “O tempo passou e elas não amadureceram”, descreve Michele Engelke. Entre outras características, têm mania de grandeza, não demonstram empatia, são o centro das atenções, não assumem seus erros e valorizam a aparência.
9-Quais são as frases que mais gostam de repetir?
Depende do tipo de narcisista.
No caso do grandioso, vai falar o que sua vítima quiser ouvir até ele próprio conseguir o que quer. Depois, sobe o tom. Contrariado, costuma soltar farpas como: “Por que está tão estressada?”, “Você anda muito sensível” ou “Não sabe com quem está se metendo”.
No caso do vulnerável, vai se fazer de vítima e dizer que a culpa não é dele. “Isso não é justo!”, “Por que está fazendo isso comigo?” e “Você me deve desculpas”, costumam dizer num arroubo de coitadismo.
No caso das mães narcisistas, alguns lugares-comuns são: “Você não é digna de ser amada!”, “Você não passa de uma incompetente!” ou “Você não é boa o suficiente!”.
10-Tem cura?
Não tem cura, mas tem tratamento.
Opções não faltam, garante Martinho Júnior: Terapia Cognitivo Comportamental, Terapia Comportamental Dialética, Terapia do Esquema, Psicoterapia Focada na Transferência e Terapia Baseada na Mentalização. “Elas ajudam os pacientes a entender seus pensamentos e comportamentos narcisistas e a modificá-los”, observa o psiquiatra.
“O difícil é convencer o narcisista de que ele precisa de tratamento”, pondera Campbell. “Em geral, ele pensa que a culpa é dos outros”.
Davies concorda. Tratamento há, mas é difícil. “O narcisista não demonstra remorso ou arrependimento. Na cabeça dele, não há por que ou do que se tratar”.
E tão comum quanto resistir ao tratamento é abandoná-lo antes do previsto, advertem os especialistas.
Tampouco há remédio para o TPN. Apenas em casos de comorbidade, como depressão e ansiedade, é prescrito medicamento.
“É importante tratar do assunto com empatia e compreensão”, afirma Martinho Júnior. “Só assim vamos reduzir o estigma e encorajar aqueles que sofrem a procurar tratamento”. Fonte: https://www.estadao.com.br
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