André Muzell, do Canal Factual RJ, foi atacado por 15 criminosos armados, teve dentes quebrados e perdeu R$ 40 mil em equipamentos; ele recebeu alta e lançou vaquinha para reposição dos materiais
O cinegrafista André Muzell, espancado por criminosos durante cobertura da operação na Vila Aliança — Foto: reprodução
Por Anna Bustamante
— Rio de Janeiro
O repórter cinematográfico André Muzell, que trabalha no Canal Factual RJ, foi agredido por traficantes da Vila Aliança, na Zona Oeste do Rio, durante a cobertura da operação policial que deixou seis mortos nesta quinta-feira na comunidade. Ao GLOBO, André contou ter sido surpreendido por 15 criminosos, que o agrediram, sobretudo, no rosto, fazendo com que ele perdesse dois dentes. Ele foi socorrido no Hospital municipal Albert Schweitzer, em Realengo, e já recebeu alta, segundo a unidade.
— Chegaram a atirar na minha cabeça, mas a arma falhou. Depois falaram que não queriam um novo Tim Lopes — disse André Muzell.
Segundo o repórter cinematográfico, além de espancá-lo, os criminosos levaram todos seus pertences.
— Eles quebraram meus dois dentes da frente e meu maxilar. Mal consigo falar direito por conta disso. Foram no mínimo 15 minutos me chutando e socando — disse Muzell, que agora busca um tratamento odontológico.
Entre os objetos furtados estavam uma câmera, um capacete, um tripé e um celular, totalizando cerca de R$ 40 mil em prejuízo. Sem condições de arcar com a reposição dos equipamentos de trabalho, o repórter lançou uma vaquinha online para arrecadar recursos e conseguir comprá-los novamente.
André detalhou que registrava imagens dos ônibus incendiados pelos criminosos usados como barricadas, em Senador Camará, na Estrada do Taquaral, quando foi surpreendido por pelo menos 15 homens armados com fuzis, que o ameaçaram.
— Eles chegaram dizendo 'vamos te matar'. Me chutaram e levaram minhas coisas — disse Muzell.
A PM contou que policiais militares do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) deram apoio ao homem ferido e o levaram para a unidade de saúde.
Relembre caso Tim Lopes
A morte do jornalista Tim Lopes, em 2002, chocou o Rio e o país. O gaúcho, então com 52 anos, desapareceu em 2 de junho enquanto fazia uma reportagem sobre abuso de menores e tráfico de drogas em um baile funk da Vila Cruzeiro, na Penha, Zona Norte. Depoimentos indicaram que ele foi sequestrado, torturado, julgado e executado por traficantes comandados por Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco. Seu corpo foi carbonizado numa fogueira de pneus, e somente em 5 de julho exames de DNA confirmaram sua identidade; o enterro ocorreu em 7 de julho.
Entre os restos mortais encontrados, técnicos da UFRJ identificaram DNA de outras três vítimas do tribunal do tráfico. Sete acusados do crime foram presos e levados a julgamento em 2005, incluindo Elias Maluco, condenado a 28 anos e seis meses. Outros envolvidos receberam penas entre 15 e 23 anos e seis meses. A prisão de Elias Maluco ocorreu 109 dias após a morte de Tim Lopes, em 19 de setembro de 2002.
Tim decidiu investigar após denúncias de moradores da Vila Cruzeiro sobre menores sendo obrigadas a participar de bailes funks, usando drogas e se prostituindo. Com mais de 30 anos de carreira, ele já havia sido premiado por reportagens investigativas e frequentemente usava disfarces para revelar injustiças sociais. Formado pela Faculdades Hélio Alonso (Facha), trabalhou em diversos veículos de grande porte e deixou esposa e um filho.
Entenda a operação
A ofensiva policial na Vila Aliança transformou a manhã de ontem em cenas de terror para os moradores da região. A Polícia Civil e a Polícia Militar mataram seis suspeitos. No entanto, a ação tinha como principais alvos o traficante Bruno da Silva Loureiro, conhecido como Coronel, e José Rodrigo Gonçalves Silva, o Sabão da Vila Aliança, ligados ao Terceiro Comando Puro (TCP). Ambos seguem foragidos.
Coronel é apontado como mandante do assassinato brutal de Sther Barroso dos Santos, de 22 anos, espancada até a morte após recusar se relacionar com ele em um baile funk na comunidade da Coréia, também na Zona Oeste. Já Sabão é apontado como chefe do tráfico de drogas na Vila Aliança e na Coréia, em Senador Camará.
Segundo as forças de segurança, os seis mortos estavam em uma casa onde criminosos mantinham um pastor e uma criança como reféns. As vítimas foram libertadas em segurança. Além disso, a polícia prendeu duas pessoas e apreendeu quatro fuzis e diversas pistolas.
O intenso tiroteio, que contou com o sobrevoo de helicópteros e a presença de equipes do Bope e da Core, deixou famílias encurraladas em casa e escolas em desespero.
Em uma creche municipal da região, crianças foram registradas deitadas no chão ou encostadas nas paredes para se proteger dos disparos. Relatos em redes sociais também mostraram a dificuldade de pais para buscar os filhos, já que a Secretaria Municipal de Educação informou que a operação começou após o horário de entrada, impossibilitando a saída dos alunos.
Além das trocas de tiros, criminosos montaram barricadas e usaram ao menos seis ônibus para bloquear vias na região, obrigando o desvio de linhas e afetando a rotina de rodoviários e passageiros. A circulação de trens também foi parcialmente suspensa pela Supervia, interrompendo o trecho entre Senador Camará e Augusto Vasconcelos. Ruas importantes da comunidade ficaram interditadas, e o Centro de Operações da Prefeitura recomendou que motoristas evitassem os acessos à Rua Coronel Tamarindo e à Rua Doutor Augusto Figueiredo. Fonte: https://oglobo.globo.com




