Instituição religiosa  se recusou a batizar João Pedro Poderoso no dia da cerimônia por ser casado com outro homem; caso está sendo investigado 

 

Fotógrafo João Pedro Poderoso e o marido Jadson Santana. Foto: Reprodução / Arquivo pessoal

 

Júnior Moreira Bordalo

O fotógrafo João Pedro Poderoso usou suas redes sociais no último final de semana para acusar a Igreja Presbiteriana Renovada de Aracaju, na capital de Sergipe, de homofobia. A vítima alegou que a instituição evangélica se recusou a batizá-lo por causa de sua orientação sexual e que, desde então, vem recebendo ataques de ‘fieis fervorosos’, que os acusam de tentar mudar as regras da religião. O sergipano é casado com o cabeleireiro Jadson Santana.  

A celebração estava marcada desde o início de abril, mas o fotógrafo só teria sido avisado do “veto” diante da igreja lotada no domingo, 15. Em entrevista ao Estadão, Poderoso garantiu que participou de um curso preparatório de seis semanas e em nenhum momento foi informado que não poderia se batizar. “ Assisti o culto; deu-se início a cerimônia de batismo e uma moça subiu ao altar; falou com a filha do pastor, trocou as folhas, e, em seguida, o líder da igreja me chamou dizendo que o pastor queria falar comigo”. 

“Fui para essa sala, chegando lá estava o pastor auxiliar. Trancou a porta e disse: ‘devido a um erro de comunicação, você não poderá se batizar por ser gay e casado com outro homem”, narrou. Ele contou que ficou em “choque” com a situação. “Como o pastor só veio saber [do meu matrimônio] agora se a filha e esposa dele frequentam o salão do meu esposo? Sem contar que nosso casamento foi algo com muita repercussão na cidade”, relembrou. Juntos há dois anos, Poderoso oficializou o relacionamento com Jadson no dia 30 de abril deste ano. 

De criação católica, o fotógrafo explicou que passou a frequentar a Família Renovada justamente por causa do — então — namorado, que já congregava no espaço há dois anos. “Como estávamos juntos e acreditamos que um casal tem que seguir o mesmo caminho, decidi ir com ele. Não tinha como a igreja não saber da nossa relação”, indicou.

Após o relato, o caso ganhou repercussão na internet e, um dos pastores da igreja, Jeter Andrade, veio a público reforçando que a instituição está na cidade há 40 anos com a “convicção baseada na Bíblia. “Não somos guiados por discriminação, desrespeito e temos provado isso em cada ano”, falou. 

“Em um dos cursos da nossa igreja, o Primeiros Passos, começamos a ensinar verdades básicas sobre a palavra de Deus. Na terceira lição, falamos sobre família e sexualidade, o que acreditamos de acordo com a palavra de Deus […] Todos são muito bem vindos à Família Renovada, mas nós não abrimos mãos dos princípios e valores da palavra de Deus”, prosseguiu o religioso.

Poderoso registrou um Boletim de Ocorrência no Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV) do município. “Espero que a justiça seja feita; que eles possam de algum modo responder por tudo isso; pelo constrangimento que me fizeram passar”. Com a situação, eles decidiram deixar de frequentar o espaço. “Não podemos estar em lugar que não somos aceitos. Acreditávamos fazer parte, era só ilusão”. 

Nesta quarta-feira, 18, ele se reuniu com um defensor dos direitos humanos para pedir auxílio, já que, desde a divulgação, disse estar enfrentando a pressão da igreja e ataques nas redes sociais. “Fieis dizendo que quero mudar as regras; destruir o que já está posto. Jamais quis isso. Estão a todo custo tentando me colocar como culpado da situação”, lamentou. “Fiquei altamente abalado. Não precisávamos dessa exposição, temos nossa vida estável. Só queríamos seguir com o alinhamento que defendíamos”, confessou. 

 

 

COM A PALAVRA, A IGREJA PRESBITERIANA RENOVADA DE ARACAJU

A Igreja Renovada de Aracaju divulgou uma nota alegando que comunicação feita com o fotógrafo a respeito da impossibilidade de seu batismo se deu de modo reservado, em espaço privativo, na secretaria da igreja, sem publicitação das razões do impedimento, com o objetivo a evitar qualquer tipo de constrangimento. Confira: 

“A Igreja Presbiteriana Renovada de Aracaju (IPRA) vem, através da presente Nota Pública, com respeito aos fatos ocorridos no domingo, 15, ao final da celebração dominical da manhã, informar que:

1 – A IPRA é uma igreja presente na sociedade sergipana há 40 anos, servindo ao Senhor acima de todas as coisas e amando ao próximo, conforme a Palavra de Deus nos ensina;

2 – Em todo este tempo, temos dado testemunho do amor de Cristo, recebendo e acolhendo a todos aqueles que nos procuram, sem qualquer distinção ou discriminação. Por nossos cultos, ao longo de todos esses anos, passam milhares de pessoas, sendo vidas impactadas, transformadas e restauradas. Grande parte dos que nos visitam, semanalmente, são membros ativos da IPRA, vinculados aos princípios e preceitos dos nossos Estatutos e principalmente da Bíblia Sagrada. Outros, congregam, mas não tomam parte da membresia da Igreja, sendo visitantes, frequentadores, todos com livre acesso e acolhidos com amor e cuidado;

3 – Para ser batizado e, posteriormente, membro da igreja, seguindo o que está definido em nosso Estatuto e nas Sagradas Escrituras, é necessário o atendimento de certos requisitos, conforme cada congregado ou visitante aprende no curso ‘Primeiros Passos’, onde se tem a oportunidade de conhecer profundamente os ensinamentos da Palavra de Deus e as normas da nossa IPRA;

4 – Neste domingo, um congregado, candidato ao batismo, por não estar apto, segundo as normas internas da IPRA e nossa regra máxima de fé e prática, a Bíblia Sagrada, não pôde participar do ato batismal”.

 

COM A PALAVRA, A IGREJA PRESBITERIANA RENOVADA DO BRASIL

Em nome de suas Diretorias Executiva e Administrativa, a Igreja Presbiteriana do Brasil tornou público o “apoio e solidariedade” à Igreja Presbiteriana Renovada de Aracaju. Em nota, a ordem justificou que a “A Igreja e o seu pastor Marcos Pereira de Andrade têm o respaldo da Constituição Federal, do Código Cil do Estatuto e Regimento interno da IPRB e do Acórdão do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão – ADO 26, sendo que a Constituição Federal o imperativo princípio da liberdade religiosa”.

“A IPR de Aracaju, subordinada ao Estatuto e Regimento Interno da IPRB, tem a Bíblia Sagrada como única regra de fé e prática, seus valores e princípios, sendo contrária a quaisquer atos de intolerância, discriminação, preconceito ou desrespeito, cuja mensagem precípua é o compromisso de amor a Deus sobre todas as coisas e o próximo”. Fonte: https://politica.estadao.com.br