A liturgia do 5º Domingo da Páscoa convida-nos a refletir sobre a nossa união a Cristo; e diz-nos que só unidos a Cristo temos acesso à vida verdadeira.

O Evangelho apresenta Jesus como "a verdadeira videira" que dá os frutos bons que Deus espera. Convida os discípulos a permanecerem unidos a Cristo, pois é d'Ele que eles recebem a vida plena. Se permanecerem em Cristo, os discípulos serão verdadeiras testemunhas no meio dos homens da vida e do amor de Deus.

A primeira leitura diz-nos que o cristão é membro de um corpo - o Corpo de Cristo. A sua vocação é seguir Cristo, integrado numa família de irmãos que partilha a mesma fé, percorrendo em conjunto o caminho do amor. É no diálogo e na partilha com os irmãos que a nossa fé nasce, cresce e amadurece e é na comunidade, unida por laços de amor e de fraternidade, que a nossa vocação se realiza plenamente.

A segunda leitura define o ser cristão como "acreditar em Jesus" e "amar-nos uns aos outros como Ele nos amou". São esses os "frutos" que Deus espera de todos aqueles que estão unidos a Cristo, a "verdadeira videira". Se praticarmos as obras do amor, temos a certeza de que estamos unidos a Cristo e que a vida de Cristo circula em nós.

 

LEITURA I - At 9,26-31

Leitura dos Atos dos Apóstolos

 

Naqueles dias,
Saulo chegou a Jerusalém e procurava juntar-se aos discípulos.
Mas todos os temiam, por não acreditarem que fosse discípulo.
Então, Barnabé tomou-o consigo, levou-o aos Apóstolos
e contou-lhes como Saulo, no caminho,
tinha visto o Senhor, que lhe tinha falado,
e como em Damasco tinha pregado com firmeza
em nome de Jesus.
A partir desse dia, Saulo ficou com eles em Jerusalém
e falava com firmeza no nome do Senhor.
Conversava e discutia também com os helenistas,
mas estes procuravam dar-lhe a morte.
Ao saberem disto, os irmãos levaram-no para Cezaréia
e fizeram-no seguir para Tarso.
Entretanto, a Igreja gozava de paz
por toda a Judeia, Galileia e Samaria,
edificando-se e vivendo no temor do Senhor
e ia crescendo com a assistência do Espírito Santo.

 

AMBIENTE

A seção de At 9,1-31 é dedicada a um acontecimento muito importante na história do cristianismo: a vocação/conversão de Paulo. Tal fato é o ponto de partida para o caminho que o cristianismo vai percorrer, desde os limites geográficos do mundo judaico, até ao coração do mundo greco-romano.

A primeira parte da seção (cf. At 9,1-9) apresenta os acontecimentos do "caminho de Damasco" e o decisivo encontro de Paulo com Jesus ressuscitado; a segunda (cf. At 9,10-19a) descreve o encontro de Paulo com a comunidade cristã de Damasco; a terceira (cf. At 9,19b-25) fala da atividade apostólica de Paulo em Damasco; e, finalmente, a quarta (cf. At 9,26-30) mostra a forma como Paulo, depois de deixar Damasco, foi recebido pelos cristãos de Jerusalém.

A maior parte dos autores pensa que a conversão de Paulo aconteceu por volta do ano 36. Depois da sua conversão, Paulo ficou três anos em Damasco, colaborando com a comunidade cristã dessa cidade. Após esse tempo, a oposição dos judeus forçou Paulo a abandonar a cidade. Uma vez que as portas da cidade estavam guardadas, os cristãos desceram Paulo pelas muralhas abaixo, dentro de um cesto (cf. At 9,23-25). Depois, Paulo dirigiu-se para Jerusalém. A chegada de Paulo a Jerusalém deve ter acontecido por volta do ano 39 (cf. Gal 1,18).

O texto que nos é proposto é a quarta parte desta seção dedicada a Paulo e refere-se à estadia de Paulo em Jerusalém, depois de ter abandonado Damasco (inclui, além disso, num versículo final, um breve sumário da vida da Igreja: é um dos tantos sumários típicos de Lucas, através dos quais ele faz um balanço da situação e prepara os temas que vai tratar nas secções seguintes).

 

ATUALIZAÇÃO

O cristão não é um ser isolado, mas uma pessoa que é membro de um corpo - o corpo de Cristo. A sua vocação é seguir Cristo, integrado numa família de irmãos que partilha a mesma fé, percorrendo em conjunto o caminho do amor. Por isso, a vivência da fé é sempre uma experiência comunitária. É no diálogo e na partilha com os irmãos que a nossa fé nasce, cresce e amadurece e é na comunidade, unida por laços de amor e de fraternidade, que a nossa vocação se realiza plenamente. A comunidade, contudo, é constituída por pessoas, vivendo numa situação de fragilidade e de debilidade... Por isso, a experiência de caminhada em comunidade pode ser marcada por tensões, por conflitos, por divergências; mas essa experiência não pode servir de pretexto para abandonar a comunidade e para passar a agir isoladamente.

A dificuldade da comunidade de Jerusalém em acolher Paulo (e que é compreensível, do ponto de vista humano) pode fazer-nos pensar nesses esquemas de fechamento, de preconceito, de instalação, que às vezes caracterizam a vida das nossas comunidades cristãs e que as impedem de acolher os desafios de Deus. Uma comunidade fechada, com medo de arriscar, é uma comunidade instalada no comodismo e na mediocridade, com dificuldade em responder aos desafios proféticos e em descobrir os caminhos nos quais Deus se revela. Há, neste texto, um convite a abrirmos permanentemente o nosso coração e a nossa mente à novidade de Deus. Como é a nossa comunidade? É uma comunidade fechada, instalada, cheia de preconceitos, criadora de exclusão, ou é uma comunidade aberta, fraterna, solidária, disposta a acolher?

Barnabé é o homem que questiona os preconceitos e o fechamento da comunidade, convidando-a a ser mais fraterna, mais acolhedora, mais "cristã". Faz-nos pensar no papel que Deus reserva a cada um de nós, no sentido de ajudarmos a nossa comunidade a crescer, a sair de si própria, a viver com mais coerência o seu compromisso com Jesus Cristo e com o Evangelho. Nenhum membro da comunidade é detentor de verdades absolutas; mas todos os membros da comunidade devem sentir-se responsáveis para que a comunidade dê, no meio do mundo, um verdadeiro testemunho de Jesus e do seu projeto de salvação.

O encontro com Jesus ressuscitado no "caminho de Damasco" constituiu, para Paulo, um momento decisivo. A partir desse encontro, Paulo tornou-se o arauto entusiasta e imparável do projeto libertador de Jesus. A perseguição dos judeus, a oposição das autoridades, a indiferença dos não crentes, a incompreensão dos irmãos na fé, os perigos dos caminhos, as incomodidades das viagens, não conseguiram desencorajá-lo e desarmar o seu testemunho. O exemplo de Paulo recorda-nos que ser cristão é dar testemunho de Jesus e do Evangelho. A experiência que fazemos de Jesus e do seu projeto libertador não pode ser calada ou guardada apenas para nós; mas tem de se tornar um anúncio libertador que, através de nós, chega a todos os nossos irmãos.

A Igreja é uma comunidade formada por homens e mulheres e, portanto, marcada pela debilidade e fragilidade; mas é, sobretudo, uma comunidade que marcha pela história assistida, animada e conduzida pelo Espírito Santo. O "caminho" que percorremos como Igreja pode ter avanços e recuos, infidelidades e vicissitudes várias; mas é um caminho que conduz a Deus, à realização plena do homem, à vida definitiva. A presença do Espírito dirigindo a caminhada dá-nos essa garantia.

 

EVANGELHO - Jo 15,1-8

 

MENSAGEM

Para definir a situação dos discípulos face a Jesus e face ao mundo, Jesus usa a sugestiva metáfora da videira, dos ramos e dos frutos... É uma imagem com profundas conotações vétero-testamentárias e com um significado especial no universo religioso judaico.
No Antigo Testamento (e de forma especial na mensagem profética), a "videira" e a "vinha" eram símbolos do Povo de Deus. Israel era apresentado como uma "videira" que Jahwéh arrancou do Egito, que transplantou para a Terra Prometida e da qual cuidou sempre com amor (cf. Sal 80,9.15); era também apresentado como "a vinha", que Deus plantou com cepas escolhidas, que Ele cuidou e da qual esperava frutos abundantes, mas que só produziu frutos amargos e impróprios (cf. Is 5,1.7; Jer 2,21; Ez 17,5-10; 19,10-12; Os 10,1). A antiga "videira" ou "vinha" de Jahwéh revelou-se como uma verdadeira desilusão. Israel nunca produziu os frutos que Deus esperava.
Agora, Jesus apresenta-Se como a verdadeira "videira" plantada por Deus (vers. 1). É Jesus que irá produzir os frutos que Deus espera. E, de Jesus, a verdadeira "videira", irá nascer um novo Povo de Deus. Hoje, como ontem, Deus continua a ser o agricultor que escolhe as cepas, que as planta e que cuida da sua vinha.

 

ATUALIZAÇÃO

Jesus é "a verdadeira videira", de onde brotam os frutos da justiça, do amor, da verdade e da paz; é n'Ele e nas suas propostas que os homens podem encontrar a vida verdadeira. Muitas vezes os homens, seguindo lógicas humanas, buscam a verdadeira vida noutras "árvores"; mas, com frequência, essas "árvores" só produzem insatisfação, frustração, egoísmo e morte... João garante-nos: na nossa busca de uma vida com sentido, é para Cristo que devemos olhar. Temos consciência de que é em Cristo que podemos encontrar uma proposta de vida autêntica? Ele é, para nós, a verdadeira "árvore da vida", ou preferimos trilhar caminhos de auto-suficiência e colocamos a nossa confiança e a nossa esperança noutras "árvores"?

Hoje, Jesus, "a verdadeira videira", continua a oferecer ao mundo e aos homens os seus frutos; e fá-lo através dos seus discípulos. A missão da comunidade de Jesus, que hoje caminha pela história, é produzir esses mesmos frutos de justiça, de amor, de verdade e de paz que Jesus produziu. Trata-se de uma tremenda responsabilidade que nos é confiada, a nós, os seguidores de Jesus. Jesus não criou um gueto fechado onde os seus discípulos podem viver tranquilamente sem "incomodarem" os outros homens; mas criou uma comunidade viva e dinâmica, que tem como missão testemunhar em gestos concretos o amor e a salvação de Deus. Se os nossos gestos não derramam amor sobre os irmãos que caminham ao nosso lado, se não lutamos pela justiça, pelos direitos e pela dignidade dos outros homens e mulheres, se não construímos a paz e não somos arautos da reconciliação, se não defendemos a verdade, estamos a trair Jesus e a missão que Ele nos confiou. A vida de Jesus tem de transparecer nos nossos gestos e, a partir de nós, atingir o mundo e os homens.

No entanto, o discípulo só pode produzir bons frutos se permanecer unido a Jesus. No dia do nosso Baptismo, optámos por Jesus e assumimos o compromisso de O seguir no caminho do amor e da entrega; quando celebramos a Eucaristia, acolhemos e assimilamos a vida de Jesus - vida partilhada com os homens, feita entrega e doação total por amor, até à morte. O cristão tem em Jesus a sua referência, identifica-se com Ele, vive em comunhão com Ele, segue-O a cada instante no amor a Deus e na entrega aos irmãos. O cristão vive de Cristo, vive com Cristo e vive para Cristo.

O que é que pode interromper a nossa união com Cristo e tornar-nos ramos secos e estéreis? Tudo aquilo que nos impede de responder positivamente ao desafio de Jesus no sentido do O seguir provoca em nós esterilidade e privação de vida... Quando conduzimos a nossa vida por caminhos de egoísmo, de ódio, de injustiça, estamos a dizer não a Jesus e a renunciar a essa vida verdadeira que Ele nos oferece; quando nos fechamos em esquemas de auto-suficiência, de comodismo e de instalação, estamos a recusar o convite de Jesus e a cortar a nossa relação com a vida plena que Jesus oferece; quando para nós o dinheiro, o êxito, a moda, o poder, os aplausos, o orgulho, o amor próprio, são mais importantes do que os valores de Jesus, estamos a secar essa corrente de vida eterna que deveria correr entre Jesus e nós... Para que não nos tornemos "ramos" secos, é preciso renovarmos cada dia o nosso "sim" a Jesus e às suas propostas.

A comunidade cristã é o lugar privilegiado para o encontro com Cristo, "a verdadeira videira" da qual somos os "ramos". É no âmbito da comunidade que celebramos e experimentamos - no Baptismo, na Eucaristia, na Reconciliação - a vida nova que brota de Cristo. A comunidade cristã é o Corpo de Cristo; e um membro amputado do Corpo é um membro condenado à morte... Por vezes, a comunidade cristã, com as suas misérias, fragilidades e incompreensões, decepciona-nos e magoa-nos; por vezes sentimos que a comunidade segue caminhos onde não nos revemos... Sentimos, então, a tentação de nos afastarmos e de vivermos a nossa relação com Cristo à margem da comunidade. Contudo, não é possível continuar unido a Cristo e a receber vida de Cristo, em ruptura com os nossos irmãos na fé.

O que são os "ramos secos"? São, evidentemente, aqueles discípulos que um dia se comprometeram com Cristo, mas depois desistiram de O seguir... Mas os "ramos secos" podem também ser aquelas pequenas misérias e fragilidades que existem na vida de cada um de nós. Atenção: é preciso "limpar" esses pequenos obstáculos que impedem que a vida de Cristo circule abundantemente em nós. Chama-se a isso "conversão".

Como podemos "limpar" os "ramos secos"? Fundamentalmente, confrontando a nossa vida com Jesus e com a sua Palavra. Precisamos de escutar a Palavra de Jesus, de a meditar, de confrontar a nossa vida com ela... Então, por contraste, vão tornar-se nítidas as nossas opções erradas, os valores falsos e essas mil e uma pequenas infidelidades que nos impedem de ter acesso pleno à vida que Jesus oferece.

*Leia a reflexão na íntegra. Clique ao lado no link- EVANGELHO DO DIA.