CORA RÓNAI

Pequenas editoras audaciosas, ciência, História e, claro, um bom romance policial

Começo a lista de recomendações desse Natal com duas palavras mágicas: Carambaia e Antofágica. Duas pequenas editoras audaciosas, que se dedicam a fazer edições primorosas de títulos pouco óbvios, clássicos ou fora de mercado, a quem já fiz declarações públicas de amor e pelas quais continuo apaixonada. A Carambaia, que fará cinco anos em breve e lançou 24 títulos apenas esse ano, é uma veterana comparada à Antofágica, que mal começa a molhar a ponta dos pés com cinco livros publicados (entre eles “Um conto de Natal”, de Dickens, traduzido por Leonardo Alves, que ficou pronto semana passada); mas ambas trilham o caminho da saudosa Cosac Naify. Qualquer um dos seus livros é um presente raro e lindo.

(Por exemplo: ambas lançaram “Memórias póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis, e é um bom exercício ir à livraria para tentar descobrir qual das edições é mais bonita. Eu, honestamente, não consegui me decidir.)

Mais comparação, mas essa num livro só, “Churchill e Orwell, a luta pela liberdade”, de Thomas Ricks (Zahar, tradução de Rodrigo Lacerda). Por que Churchill e Orwell, tão diferentes entre si? Ora, argumenta Ricks, porque ambos entenderam o valor do indivíduo para a democracia, e a importância de discordar da maioria. Uma biografia dupla que se lê de um fôlego, e que tem tudo a ver com os nossos dias. Para quem gosta de História, de política, de biografias e, pura e simplesmente, de boa escrita.

Dois livros distintos, mas igualmente fascinantes: “A maré humana”, de Paul Morland (Zahar, tradução de Maria Luiza Borges), e “Ascensão e queda dos dinossauros”, de Steve Brusatte (Record, tradução de Catharina Pinheiro). Um trata das mudanças do mundo causadas pelo vertiginoso crescimento demográfico dos últimos dois séculos; o outro, do que aconteceu com o segundo grupo de habitantes mais intrigantes do planeta ao longo de 150 milênios. Presentes perfeitos para quem se interessa por ciências e pelo mundo em que vive.

O primeiro grupo de habitantes mais intrigantes do planeta está vivo e bem, ainda que apareça em números alarmantes nos nossos pratos: são os cefalópodes, personagens de “Outras mentes: o polvo e a origem da consciência”, do filósofo e mergulhador Peter Godfrey-Smith (Todavia, tradução de Paulo Geiger). Mas Cora Rónai, um livro sobre polvos? Sim, sim — acreditem, essa é uma obra formidável (e altamente legível) sobre a evolução da consciência, sobre a vida na Terra (ainda que debaixo d'água) e sobre o mais estranho dos animais.

E, por falar em animais — “Why not: como os irmãos Joesley e Wesley, da JBS, transformaram um açougue em Goiás na maior empresa de carnes do mundo, corromperam centenas de políticos e quase saíram impunes”,de Raquel Landim (Intrínseca). Uma história que nunca deveria ter acontecido, espetacularmente bem contada. Para quem gosta de História e de jornalismo, e ainda não desistiu de entender o Brasil.

Como nenhuma lista de livros para o Natal fica completa sem um bom romance policial, é com particular alegria que informo que há um novo Camilleri na praça, “Uma voz na noite” (Record, tradução de Ivone Benedetti). Nele encontramos mais uma vez o inspetor Montalbano, que, aos 58 anos, começa a sentir o peso da idade. Como diz o blurb da contracapa, “Ou você adora Andrea Camilleri ou você nunca leu um livro dele”. Exatamente! Fonte: https://oglobo.globo.com