Gabriel Alves

Não é fácil quando nos deparamos pela primeira vez com morte, luto e sensação de finitude. A professora Ana Paula Peixoto conta como o assunto foi discutido na sala de aula com crianças de 5 anos de idade e como, de repente, essas inquietações podem se mostrar muito mais fortes e profundas em uns do que em outros.

 

Por Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.psicopedagoga e jornalista 

Um aluno de 5 anos da turma da tarde chegou na sala contando que o avô faleceu. Logo em seguida uma aluna falou:

“Depois que morre a gente não vê mais quem a gente ama!”

E enquanto as outras crianças assentiam com a cabeça e diziam “é”, o Danilo (nome fictício), um outro aluno, pôs-se a chorar. Veja bem, vira e mexe eles contam do avô que morreu, do peixe, do cachorro, da bisa que faleceu… Mas o Danilo não parava de chorar. E, soluçando, me disse, após eu questionar a razão do choro, que estava muito triste porque não ia mais ver os pais.

“Quando eles morrerem, eu não vou ver mais eles?”

E chorava copiosamente. Os colegas logo disseram:

“Quando você morrer você encontra eles no céu!”

“É!”

“Vai virar estrelinha, o meu vô ta cuidando de mim agora”, disse o menino que chegou na sala contando da morte do avô.

“Depois que morre todo mundo se encontra e vê o papai do céu.

O Danilo, porém, não entendia.

“Mas se encontra no céu por que tem que morrer? E se morre, como que encontra depois? Eu vou ver meus pais então?”

A cabeça dele estava a mil por hora. Ele estava tentando entender mais profundamente o que acontecia. Ele já sabia que todos vamos morrer, o que ele não tinha entendido ainda era o “nunca mais vou ver meus pais”. Nunca mais ver quem se ama.

As outras crianças, já distraídas, pegaram seus livros para fazer a lição. O Danilo ainda sofria. Pedi para ele vir para o meu colo.

Eu queria chorar junto com ele. Porque eu era o Danilo. Eu também fui uma criança questionadora. Eu não ouvia a explicação e simplesmente voltava para a rotina. Eu pensava, questionava, queria entender os porquês. “Tia Paulinha, mas se tem duas vidas, se a gente se vê no céu, pra que morrer?”. Ele não parava de questionar.

Quando, enfim, eu o abracei, era como se eu abraçasse a Ana Paula criança. Eu senti a dor dele perfeitamente. Eu também só queria chorar.

Olhei nos olhos do Danilo e não soube perfeitamente o que dizer para acalmar a sua dor da percepção da vida. Mas eu disse que quando eu tinha a idade dele eu era igual. Que eu também sofri e chorei, tive medo, mas que depois eu entendi que o que importa é o momento. Disse pra ele abraçar muito a mamãe e o papai quando chegasse em casa e disse que eles só vão morrer quando eles estiverem beeeeem velhinhos!

Ele secou a lágrima, me deu um abraço e voltou para seu lugar, ainda com a feição de quem não compreendia aquilo totalmente, mas com o coração mais calminho. Eu queria continuar abraçando o Danilo pelo resto do dia.

Hoje foi o dia mais marcante da minha profissão, o dia que eu testemunhei uma criança compreender mais a fundo o que é viver –e a finitude e a incerteza do depois. Fonte: https://cadeacura.blogfolha.uol.com.br