Atravessando o deserto de Beersheba, Elias entrou no deserto da montanha de Deus, o Horeb(1 R 19,8). Lá ele ouviu a pergunta: "Elias, que fazes aqui?" E ele respondeu, por duas vezes: "O zelo por Javé dos exércitos me consome, porque os israelitas abandonaram tua aliança, derrubaram teus altares e mataram teus profetas. Sobrei somente eu, e eles querem me matar também". (1 R 19,10.14)

Existe uma contradição entre a resposta e a realidade vivida, entre o discurso e a prática de Elias. Conforme o discurso ele é o único que sobrou; mas havia sete mil (1 R 19,18). Conforme o discurso ele está cheio de zelo; mas a prática mostra um homem medroso que foge (1 R 19, 3). Conforme o discurso ele sabe analisar o fracasso da nação; mas na prática não sabe analisar o seu próprio fracasso. Elias não se dá conta de que a situação de derrota e de morte em que se encontra é o lugar onde Deus o atinge, pois não percebe a presença do anjo que o orienta. Ele só pensa em comer e dormir. (1 R 19,6)

O olhar de Elias está perturbado por algum defeito que o impede de perceber a realidade tal como ela é: ele se considera dono da luta contra Baal (e não é); acha que sem ele tudo estará perdido (e não esta­rá); pensa que Deus sai perdendo caso ele, Elias, for derrotado (e Deus não sai perdendo). Qual o defeito nos olhos de Elias? Qual o defeito em nossos olhos hoje? A resposta está na história da Brisa Leve.

A expressão "Brisa Leva" traduz o hebraico: “qôl demamáh daqqáh”. Literalmente: “voz de calmaria suave”. A palavra hebraica, demamáh, usada para indicar a calmaria vem de uma raiz, DMH, que signi­fi­ca parar, ficar imóvel, emudecer. A brisa leve indica algo, um fato, que, de repente, faz emudecer, faz a pessoa ficar calada, cria nela um vazio e, assim, a dispõe para escutar; provoca nela uma expectativa.

A "Brisa Leve" não deve ser entendida no sentido romântico de uma brisa suave no fim da tarde, mas sim no sentido de algo que, de repen- te, fez desintegrar tudo que Elias pensava e vivia até àquele momento. Ela indica o impacto de algum fato que o obrigou a uma mudança radical e o levou a uma visão totalmente nova das coisas. É como diz a poesia: "Diante da vida do povo sofrido, a gente não fala, só sabe calar. Esquece as ideias do povo sabido, e fica humilde, começa a pensar".

Qual foi a "brisa leve" que provocou tudo isto na vida de Elias? O texto não o diz expressamente, mas sugere que foi a descoberta dolorosa de que Javé, o Deus de Israel, já não estava nem no vento, nem no terremoto, nem no raio! (Os sinais tradicionais da manifestação de Deus). Deus já não era como ele, Elias, o imaginava. Elias descobriu que, apesar de toda a sua fidelidade e luta pela causa de Javé, ele estava lutando por algo que já não era a causa de Javé!

Deus se fez presente na ausência! A luz apareceu na escuridão! A voz de calmaria suave era o silêncio de todas as vozes! Elias descobriu que ele estava errado. E descobrindo que estava errado, descobriu coisa certa! A "Brisa Leve" é a noite escura da experiência mística; é o sair de si para se encontrar. Ela derrubou tudo e abriu o espaço para uma nova experiência de Deus que, aos poucos, foi penetrando na vida de Elias e o levou a redescobrir sua missão na reconstrução da Aliança.

*IV-FOCAL. MIRAFLORES- LIMA PERU (1 a 15 de agosto de 1998)