Frei Carlos Mesters, O. Carm.

João teve que ir à rodoviária receber a irmã do tio do pai dele. Visto que ele não conhecia a pessoa, deram a ele uma foto. Quando chegou o ônibus, João foi conferindo as pessoas, fotografia na mão. Só um pequeno detalhe. A foto era de 45 anos atrás. No fim, por último, sai do ônibus uma senhora de idade. João pergunta, mostrando a foto: “Por acaso, a senhora viu se esta pessoa estava no ônibus?” Ela olhou, sorriu e disse: “Sou eu!” João olhou a pessoa conferiu com a foto e disse: “A senhora pode enganar os outros, mas não a mim!” Deixou a dona na rodoviária, voltou para casa e disse: “Pai, ela não chegou não. Acho que perdeu o ônibus!”. Foi a foto antiquada que impediu a João de reconhecer a tia na rodoviária.

Nós temos muitas fotos antiquadas de Deus na cabeça que bloqueiam tudo e nos impedem de reconhecer a presença de Deus na rodoviária da vida. Há pessoas que identificam Deus com a imagem que dele têm na cabeça. Não permitem que alguém a coloque em dúvida, pois é a sua segurança. Elas não se dão conta de que toda imagem de Deus é apenas uma imagem, uma metáfora, um símbolo, mas não é Deus. Deus é maior. Deus não pode ser identificado com nenhuma imagem, seja ela qual for (1Tim 6,16). Ultrapassa tudo que nós possamos imaginar. Esse tipo de fundamentalismo é uma tentativa de obrigar a Deus a ser como nós queremos que Ele seja para nós.

O problema da imagem de Deus em nós

O que mais dificulta a descoberta da mensagem da Bíblia é a imagem de Deus que nos orienta na vida e determina nosso olhar. Todos temos, dentro de nós, uma imagem de Deus. Até os ateus! Se eles se dizem ateus, é porque não concordam com uma determinada imagem de Deus. No fundo, era a imagem que o professor universitário se fazia de Deus, que o levou a ver a Bíblia como um livro infantil. A imagem de Deus se transmite, não só pelo que informamos sobre Deus através de doutrinas, mas também e sobretudo pelo que transmitimos através das atitudes que tomamos. Mesmo sem falar de Deus, dele somos um reflexo. Algo se comunica.

Um ex-drogado disse uma vez: “Fui criado na religião católica. Hoje não participo mais. Meus pais eram muito praticantes e queriam que nós, os filhos, fôssemos como eles. A gente era obrigado a ir à igreja sempre, todos os domingos e festas. E quando não ia, eles diziam: "Deus castiga!” Eu ia a contragosto, e quando fiquei adulto, deixei de ir. Fui deixando aos poucos. Eu não gostava do Deus dos meus pais. Não conseguia entender como é que Deus, criador do mundo, ficava em cima de mim, menino da roça, ameaçando com castigo e inferno. Eu gostava do Deus do meu tio que não pisava na igreja, mas que, todos os dias sem falta, comprava o dobro de pão, de que ele mesmo precisava, para dar para os pobres!"