Frei Carlos Mesters, O. Carm.

No Calvário, estamos diante de um ser humano torturado, excluído da sociedade, condenado como herético e subversivo por três tribunais: religioso, civil e militar. Ao pé da cruz, pela última vez, as autoridades religiosas confirmam a sentença: trata-se realmente de um rebelde fracassado, e o renegam publicamente (Mc 15,31-32). Pendurado na cruz, privado de tudo, Jesus grita “Eli, Eli!”. O soldado pensava: “Ele está chamando por Elias!” (Mc 15,35) Os soldados eram todos estrangeiros, mercenários. Não entendiam a língua dos judeus. O homem pensava que Eli fosse o mesmo que Elias. Assim, pendurado na cruz, Jesus está num isolamento total. Mesmo que quisesse falar com alguém, não teria sido possível. Ninguém o entenderia. Seria o mesmo que falar português para quem só entende inglês. Ele ficou totalmente só: Judas o traiu, Pedro o negou, os discípulos fugiram, as autoridades zombam dele, os transeuntes caçoam, e nem a língua que ele fala serve mais para se comunicar.

As mulheres amigas tinham que ficar de longe, observando, sem poder fazer nada (Mc 15,40). Isolado, sem qualquer possibilidade de comunicação humana, Jesus se sente abandonado até pelo Pai: “Meu Deus! Meus Deus! Por que me abandonaste?” (Mc 15, 34). E soltando um grito, ele morre!

É assim que morre o Messias Servo! Foi este o preço que Jesus pagou pela sua fidelidade à opção de seguir sempre pelo caminho do serviço para resgatar seus irmãos e suas irmãs, para que, de novo, pudessem recuperar o contato com Deus e viver na fraternidade. Mas foi exatamente nesta hora da morte, a hora em que tudo desmoronava, que um novo sentido renasceu das cinzas.

A morte de Jesus foi uma vitória! Aquela sua obediência radical até à morte, a morte de cruz, no total abandono de uma Noite Escura sem igual, fez explodir as amarras que escondiam a sua identidade. A cortina do templo, símbolo do poder que condenou Jesus, rasgou de alto a baixo. O sistema que isolava Deus no Templo, longe da vida do povo, estava encerrado. O centurião, um pagão, que fazia a guarda, faz uma solene profissão de fé: “Verdadeiramente, este homem era filho de Deus!” (Mc 15,39) Ele descobre e aceita o que os discípulos não foram capazes de descobrir e de aceitar, a saber, reconhecer a presença do Filho de Deus num ser humano crucificado

Quem quer encontrar, verdadeiramente, o Filho de Deus, não deve procurá-lo no alto, num céu distante, mas deve olhar ao seu lado, para o ser humano excluído, torturado, desfigurado, sem beleza, e para aqueles e aquelas que, como Jesus, doam sua vida pelos irmãos. É lá que o Deus de Jesus se esconde, se revela e nos atrai, e é lá que ele pode ser encontrado. É lá que está a imagem desfigurada do Filho de Deus, dos filhos e filhas de Deus. “Prova de amor maior não há que doar a vida pelo irmão!”