Por Editorial

A prisão do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) na terça-feira serviu para transmitir um recado aos bolsonaristas que, como ele, fazem pouco da democracia, se comportam como valentões ginasianos diante das instituições e defendem abertamente uma ditadura. Em decisão unânime, o Supremo Tribunal Federal (STF) referendou a prisão decretada na véspera pelo ministro Alexandre de Moraes. Foi uma forte demonstração de unidade num momento de divisões na mais alta Corte do país.

A Procuradoria-Geral da República imediatamente denunciou Silveira pelo conteúdo do vídeo em que instiga agressões físicas a ministros do Supremo, xinga e desqualifica a instituição, além de defender o AI-5, ato da ditadura que permitiu a cassação de juízes e parlamentares, prisões, tortura e mortes. Cabe agora à Câmara tomar uma decisão sobre o destino do deputado. Ele precisa ser afastado do mandato.

Não há a menor condição de alguém com o pensamento antidemocrático e defensor da violência continuar a ocupar assento num Parlamento democrático. Silveira, expoente das falanges radicais do bolsonarismo, já é investigado em inquéritos conduzidos por Moraes sobre manifestações antidemocráticas e desinformação. Na iminência de ser preso, repetiu as agressões em seu perfil no Twitter, reforçando a justificativa da prisão em “flagrante delito”, sem direito a fiança.

Decisões como a de Moraes costumam ser criticadas com base no direito à liberdade de expressão e na imunidade parlamentar. Em seu voto, porém, o ministro demonstrou que são inconstitucionais tanto manifestações que tentam “aniquilar a força do pensamento crítico” quanto as que procuram destruir o regime democrático e as “instituições republicanas”.

Além de acusar Silveira por desrespeitar a Carta, difundir ideias contra a ordem constitucional e o Estado de direito, Moraes também o enquadrou, por ironia, na Lei de Segurança Nacional, herdada da ditadura tão defendida por ele. Tal lei não poderia ser mais clara ao definir os crimes. “Atentar contra a democracia, contra o estado de direito, não configura exercício da imunidade parlamentar”, afirmou Moraes. “Em nenhum país se confunde imunidade com impunidade.”

Uma sucessão de fatos preocupantes precedeu a crise. O vídeo de Silveira foi lançado logo depois da controvérsia que cercou o lançamento do depoimento do general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, revelando ter contado com o aval do Alto-Comando para o tuíte publicado às vésperas do julgamento de um habeas corpus em favor do ex-presidente Lula em 2018, classificado pelo general como “alerta”, mas entendido como ameaça.

O ministro Edson Fachin, relator daquele processo, afirmou que “a declaração de tal intuito, se confirmado, é gravíssima e atenta contra a ordem constitucional”. Foi seguido pelo ministro Gilmar Mendes, que, respondendo a uma ironia de Villas Bôas a respeito da nota de Fachin, disse: “A harmonia institucional e o respeito à separação entre os Poderes são valores fundamentais da nossa República. Ao deboche daqueles que deveriam dar o exemplo, responda-se com firmeza e senso histórico: Ditadura nunca mais!”.

Tais palavras em defesa da democracia deveriam inspirar a Câmara a afastar Silveira, para que depois ele responda à denúncia, seja julgado e punido nos termos da lei. Fonte: https://blogs.oglobo.globo.com