Dom Frei Jaime Spengler, OFM, Arcebispo Metropolitano de Porto Alegre

O momento político nacional exige discernimento. A democracia é certamente a forma mais adequada de organizar a política, embora existam contradições e limitações, provocadas, talvez, pelo pouco conhecimento e capacidade de observação, pelos agentes políticos de fundamentos ético-morais sólidos.

Não existe autêntica democracia sem fundamentos ético-morais consensuais que possibilitem uma determinação livre da vontade das pessoas. Ora, a política é o reino do relativo, pois permite a diversidade de opiniões sobre os temas mais diversos.

No sistema democrático, os eleitores podem ser manipulados em suas escolhas através da propaganda veiculada pelos meios de comunicação social, segundo orientações de uma oligarquia.
O bem comum, referência basilar da atividade política, é uma miragem! Diante desse fato, vale se perguntar se o sistema da maioria e da minoria é verdadeiramente um sistema de liberdade. 
A democracia fundamenta-se no princípio da liberdade. Mas, o que é a liberdade? Não é certamente o direito de se fazer o que se deseja! É, antes de tudo, o pressuposto de uma racional autodeterminação da vontade.

A democracia que se orienta simplesmente pelo princípio da maioria é uma forma de relativismo ético-moral, que pode desembocar na anarquia ou no totalitarismo.

Tais elementos requerem serenidade, reflexão e discernimento. Há no coração do povo brasileiro um desejo de renovação, purificação e autêntico exercício democrático.

A história nacional é marcada por figuras que dignificaram a República, mas também pela presença de oligarquias que dominaram e dominam, o cenário sócio-político-financeiro nacional.
É urgente a necessidade de construir um projeto de nação, tendo à frente estadistas. Conchavos, bancadas e partidos políticos sem identidade e sem ideal, não têm o que dizer diante do desespero de tantos ‘filhos e filhas da Pátria amada’.

A liberdade conquistada com braço forte, cantada no Hino Nacional, transformou o Brasil na sétima economia do mundo. No entanto, a nação está entre os 10 países com a pior distribuição de renda do mundo. Os sinais são inocultáveis!

Porque a Igreja se ocupa e preocupa com tais questões? A partir do Evangelho, ao longo de seus dois mil anos de história, com erros e acertos, ela desenvolveu uma doutrina ética que orienta o agir das pessoas e uma doutrina social que contempla a sociedade como um todo. Atenta ao exercício da política, a Igreja é impelida a ser “advogada da justiça e defensora dos pobres diante das intoleráveis desigualdades sociais e econômicas, que clamam ao céu” (CELAM. Doc. de Aparecida, n. 395).

A Igreja deseja e promove a mobilização de todos, independentemente de partidos políticos, em vista de uma convivência pacífica, fraterna e solidária, desejosa de colaborar na construção de uma ‘Terra sem males’.

Não se pode permitir que nos roubem a esperança! Os discípulos e discípulas de Jesus estão a serviço da vida plena para todos. Esse é um serviço de purificação e renovação.
Não podemos perder aquele desejo humano profundo por sentido: sentido da vida e da morte, do eu e do tu, em vista de um nós, do amor, da esperança e da história.
O Brasil deseja contar com homens e mulheres que “sejam abertos a ouvir e a aprender no diálogo democrático, que conjuguem a busca da justiça com a misericórdia e a reconciliação” (Papa Francisco), dispostos a realizar um autêntico caminho de renovação e purificação, em vista da construção sólida da ‘Pátria amada’, onde seus cidadãos possam se sentir verdadeiramente ‘filhos de uma mãe gentil’. Fonte: www.arquidiocesepoa.org.br